Catolicismo, n° 521, maio de 1994 (www.catolicismo.com.br)

Do crepúsculo ao anoitecer da Cristandade: previsão de um doloroso itinerário

O esboroamento da civilização rumo à sistematização da sua desordem apontado em 1946 pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira como o desfecho irreversível do abandono da Civilização Cristã

Choque de poderes: Supremo enfrenta governo ....; Camelôs tumultuam Copacabana; Três PMs do Rio são presos por assassinato; MP apura morte de bebês em Santa Casa; Custo do dinheiro tem nova disparada; Ex-Juiz vai depor contra Clinton; Polícia acusa IRA de tentar matar rainha; Padre morto pela maffia é enterrado; Motim .... mata 21 presos na África do Sul.

Esses são alguns dos títulos de notícias publicadas num só dia, escolhido a esmo, pela "Folha de S. Paulo" (1). Sua simples leitura reflete com intensidade um pouco maior ou menor a realidade que rodeia o homem contemporâneo.

Olhando de frente tal realidade - na qual, diga-se de passagem, está quase totalmente ausente na mídia qualquer notícia verdadeiramente esperançosa e apaziguante - aflora em muitos espíritos a pergunta inevitável: o que aconteceu para termos chegado a tal ponto e qual é o futuro que nos espera?

A resposta lúcida, varonil e profunda encontramo-la no juízo destemido, transbordante de Fé e objetividade que o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira emitiu há quase meio século sobre a situação do mundo de então, através das páginas do "Legionário" (2).

"Penso - afirmava ele - que não há, em todo o Antigo Testamento, princípio mais intimamente ligado às concepções do ‘Legionário’ sobre a civilização em geral, e particularmente sobre a civilização cristã, do que o do salmista: 'enquanto o Senhor não edificar a cidade, em vão trabalharão os que a edificam'. Escreveu Pio XI que a única civilização verdadeiramente digna deste nome é a civilização cristã. Para nós, que nascemos na glória e santidade dos últimos fulgores dessa civilização, tal verdade é fundamental. À medida que a tragédia deste imenso crepúsculo espiritual se vai desenrolando a nossos olhos desolados, lentamente se vai esboroando a civilização. Não para dar lugar a uma outra ordem de coisas, menos boa quiçá, mas enfim a uma ordem qualquer. A sociedade de aço e cimento que se vai formando por toda a parte não é uma ordem nova. É a metodização e sistematização da suma desordem. A ordem é a disposição das coisas segundo sua natureza e seu fim. Todas as coisas se vão dispondo gradualmente contra sua natureza e seu fim .... Durará esta era de aço até que as forças íntimas de desagregação se tornem tão veementes, que nem sequer tolerem mais a organização do mal. Será então o estouro final. Outro desfecho não haverá para nós, se continuarmos nesta marcha. Porque, para nós batizados, os meios termos não são possíveis. Ou voltamos à civilização cristã, ou acabaremos por não ter civilização alguma. Entre a plenitude solar da civilização cristã, e o vácuo absoluto, a destruição total, há etapas passageiras: não há, porém, terrenos onde se possa construir qualquer coisa de durável.

"Claro está, que não somos fatalistas. Se, para o suicida, da ponte ao rio há ainda a possibilidade de uma contrição, certamente também existe para a humanidade, no resto de caminho que vai de seu estado atual para sua aniquilação, possibilidade de arrependimento, de emenda e de ressurreição. A Providência nos espreita em todas as curvas desta última e mais profunda espiral. Trata-se, para nós, de ouvir com diligência a sua voz salvadora.

"Esta voz se faz ouvir, para nós, na multíplice e terrível lição dos fatos. Tudo hoje em dia nos fala de desagregação. O castigo divino está fumegando em torno de nós. Estamos no instante providencial em que, aproveitando este pouco de fôlego que a paz nos dá, podemos instruir-nos com o passado, e considerar a advertência deste futuro de que nos aproximamos com terror.

"`Se hoje ouvirdes sua voz, não endureçais vossos corações'. É este o conselho da Escritura. Abramos, pois, de par em par os nossos corações à dura lição dos fatos. Examinar com frieza, com realismo, com objetividade inexorável o mundo atual, sondar uma a uma as suas chagas, abismar o espírito na contemplação de seus desastres e suas dores, é um dever. Porque Deus nos fala pela voz de todas estas provações. Ser totalmente otimista diante delas, é fechar os ouvidos à voz de Deus" (Plinio Corrêa de Oliveira, "Deflação" in "Legionário ", São Paulo, 21-7-46) (grifos nossos).

Caos e aflição: sinais precursores do grande castigo?

Transcorridos 48 anos após a publicação deste texto, que constitui clarividente previsão da situação atual, cabe perguntar se, uma vez que não se optou pelas vias da Civilização Cristã, conforme apontava o insigne articulista como a única e verdadeira solução, qual é o caminho que os acontecimentos tomarão.

Tudo indica que a humanidade cega continue avançando rumo ao castigo divino prognosticado no artigo citado.

Entretanto, se é verdade que em quase tudo hoje se reflete o caos e a aflição de espírito - ao que parece, sinais precursores daquela suma desordem, apontados no mesmo artigo -, é preciso mais do que nunca não esquecer que, depois dos sofrimentos regeneradores pelos quais o mundo teria que passar, profetizados por Nossa Senhora em Fátima, caso este não se convertesse, permanece sempre sua consoladora e maternal promessa: "Por fim meu Imaculado Coração triunfará".

Restauração da ordem: fruto da restauração das elites

Em sentido oposto a esses males e provações, um brado luminoso de esperança ecoa pelo mundo: é o recente livro do Presidente da TFP, Nobreza e elites tradicionais análogas nas alocuções de Pio XII ao Patriciado e à Nobreza romana (3), do qual o Cardeal Oddi, em mensagem dirigida aos participantes do lançamento da obra em Washington afirmou, em consonância com o acima exposto: "A oportunidade do livro do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira .... não podia ser mais providencial. Que melhor caminho há para fazer brilhar de novo a Civilização Cristã senão o de convocar as elites, paladinas do verdadeiro progresso e guardiãs da Tradição, evocando os ensinamentos do Papa Pacelli e as suas alocuções .... as quais o Prof. Corrêa de Oliveira comentou tão magistralmente com sua penetrante erudição? A vossa participação nesse Seminário é histórica. Num sentido muito real, o futuro de vossa nação repousa nas vossas mãos. Porque os princípios expostos em 'Nobreza e elites tradicionais análogas' são perenes e devem servir de farol para qualquer genuína civilização" ("Reconquista", órgão da TFP lusa, n° 69, novembro de 1993 - grifos nossos).

Encerramos estas linhas pedindo a Nossa Senhora de Fátima que nos dê toda a lucidez para ouvir e compreender a voz de Deus, através das provações que nos rodeiam, além de nos obter o discernimento necessário para sabermos, nesta hora suprema, lutar com o zelo ardente de um Santo Elias pela restauração das autênticas elites, com vistas à implantação da Civilização Cristã.

JUAN GONZALO LARRAIN CAMPBELL

NOTAS:

1. "Folha de S. Paulo", 22-3-94.

2. órgão oficioso da Arquidiocese de São Paulo, do qual o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira foi diretor de 1933 a 1947.

3. Ver síntese da obra em Catolicismo, n° 511, julho de 1993, e repercussões das várias edições do livro nos Estados Unidos, em países europeus e sul-americanos, constantes de diversos números de nossa revista, subseqüentes ao supra enunciado.