Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Artigos na

 "Folha de S. Paulo"

 

  Bookmark and Share

19 de agosto de 1973 

Bangladesh, Watergate e nudismo 

No momento em que a intervenção pessoal do Presidente Nixon vai transformando o caso Watergate, de exploração política em drama de forte colorido, cabe uma reflexão sobre o importante assunto no contexto da política norte-americana.

Como introito dessa reflexão, ocorre-me abordar um tema bem diverso.

Li na imprensa a notícia de que a Rússia vendeu ao governo de Bangladesh 200 mil toneladas de trigo. Ora, como pode ela efetuar tal venda, ao mesmo tempo que nem de longe dispõe do trigo suficiente para abastecer sua própria população, por isto obrigada a importá-lo dos Estados Unidos? Patenteia-se aqui uma contradição que só se explica por duas hipóteses.

Esse trigo é vendido a Bangladesh a preço melhor do que o exigido pelos Estados Unidos à Rússia. De sorte que esta última teria feito um bom negócio às custas dos americanos. Se assim é, pergunta-se por que os Estados Unidos não forneceram esse trigo diretamente a Bangladesh?

A Rússia vendeu o trigo a Bangladesh não por vantagem econômica mas apenas por propaganda política. Nesse caso, é de se deduzir que a Rússia terá comprado mais trigo do que precisava para o seu consumo interno. Servindo-se do cereal norte-americano para impor-se politicamente em Bangladesh.

Só em Bangladesh? A mesma velhacaria comercial ou política de que a Rússia terá usado no pequeno Estado Asiático, presumivelmente a terá empregado em maior escala em outros Estados.

Seja como for, o episódio nos mostra claramente a deslealdade soviética e o singular proveito que esta tira da política pacifista à outrance de Nixon.

Este episódio tem o valor de um sintoma. Ele mostra bem até que ponto a política de distensão inaugurada por Nixon favorece o comunismo e prejudica a América do Sul.

À vista disto, poder-se-ia perguntar qual a reação de Nixon. Dirá algum leitor: obviamente terá sido de indignação e protesto. Nada disto. A mesma notícia nos informa que foi por indicação de Nixon que Bangladesh se dirigiu à Rússia para comprar trigo!

Este pormenor dispensa comentários. Constitui ele, dentro do sintoma, o traço mais significativo. E dentro do estapafúrdio, a nota de mais requintado absurdo. Daí nasce e se impõe uma pergunta: quem é Nixon? Onde quer chegar? Para onde nos leva a todos nós?

Tal pergunta envolve o destino de todo o Ocidente e na cauda deste o do mundo inteiro.

Tudo isto examinado, voltemos ao caso Watergate. É bem certo que este apresenta aspectos censuráveis e até repugnantes. Contudo, não é menos certo que nem de longe ele tem o interesse do que poderíamos chamar o "caso Bangladesh".

É a grande pergunta que aqui fica.

Por que os homens públicos e os dirigentes dos grandes órgãos da opinião pública americana perdem tanto tempo com o caso Watergate, em lugar de promover um inquérito em regra sobre o caso Bangladesh e, em conexão com este sobre toda política de distensão incondicional a que Nixon se vai entregando? Por que tanto barulho para consertar um cano de água poluída que estourou, e tão profunda apatia ante o incêndio que vai tomando conta da cidade?

* * *

Socialismo e monopólio estatal são termos correlatos. A idéia fixa do socialista é monopolizar tudo quanto pode.

O grande público talvez não se dê conta da extensão que a palavra "tudo" toma neste assunto. É absolutamente tudo!

Disto pode ter o leitor uma idéia ante o fato de haver o deputado sueco Sten Sjoholm apresentado ao Parlamento um projeto estabelecendo o monopólio estatal... da prostituição. De onde o Estado sueco assumiria oficialmente a função vergonhosa de explorar esse torpe comércio!

Para justificar a propositura tão imoral o deputado alegou um argumento econômico. O que aliás, é bem típico da mentalidade socialista que nega o espírito e põe o dinheiro acima de tudo. Diz ele que cada prostituta ganha 20.000 coroas por mês, pelo que sonega 13.400 coroas de impostos.

Em suma, para esse deputado as razões morais não existem. Nem o decoro, nem a compostura. Trata-se de tosquiar todos os setores da população, por todos os modos possíveis. E por isto de deitar a mão até sobre o dinheiro imundo das prostitutas.

Em sã democracia, esse golpe contra tão mísera forma de iniciativa privada não pode dar-se sem ouvir as interessadas. Organizou-se então, na Suécia, com toda a gravidade, uma pesquisa entre elas. É cômico ressaltar que o horror à socialização vai sendo tão grande, que até elas reagiram, dizendo que não queriam transformar-se em funcionárias estatais, ainda mesmo se recebessem férias pagas e aposentadoria.

Quero crer que tudo isto possa ter suscitado uma tal ou qual reação no Parlamento sueco ante o qual o projeto continua a tramitar. Em todo caso, o clima da Suécia socialista é singularmente propício a medidas conducentes às formas mais desbragadas de liberdade sexual. Assim o deputado Paul Dam apresentou ao Parlamento um projeto, também ele dos mais hirsutos. Visa o "reconhecimento oficial de casamentos entre três, quatro, cinco ou seis pessoas, sendo as partes intermutáveis". Também este projeto vai sendo estudado pelo Parlamento...

* * *

Essas notícias, tirei-as do órgão norte-americano "The Review of the News". Não confiro aqui ao meu comentário qualquer caráter de hostilidade ou menosprezo para com o povo sueco enquanto tal, pois em relação a ele nenhum motivo tenho de malquerença.

O interesse essencial do assunto vem do fato de que esses episódios da vida sueca põem em evidência traços de alma inerentes à onda de socialismo e de liberdade sexual que varre o mundo inteiro... e cujas águas vão penetrando também no Brasil.

Expressão característica da amplitude desse fenômeno é a medida tomada pelas autoridades noutro extremo da Europa, isto é, em Mônaco. Acabam elas de permitir o nudismo nas praias. A polícia está incumbida de reprimir as legítimas reações do senso moral dos monegascos, garantindo os nudistas contra manifestações de hostilidade ou desprezo!

Fato estritamente monegasco?

Quem pode pretendê-lo! Se pelo mundo inteiro já se alastrou o biquíni e hoje é até fabricado por mãos de freiras, quem pode fechar os olhos para o fato de que teremos, em prazo maior ou menor, o monoquini e depois deste o nu total?

* * *

Alguém me acusará, talvez, de pessimismo incondicional. Perguntarei, então, se neste punhado de notícias não estão postas todas as condições para um forte pessimismo.

Segundo me parece ver nestes fatos, algum motivo de otimismo importaria em professar um otimismo, este sim incondicional.


Home