Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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 "Folha de S. Paulo"

 

 

 

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20 de janeiro de 1974

"Tu que conheceste o exemplo...."

Não há quem não tenha ouvido falar, no mundo católico, do famoso Santuário Marial de Czestochowa, na Polônia.

Devido à afluência continua de peregrinos, que a campanha desabrida dos ateus não consegue reduzir, o Santuário costuma estar tão cheio, que a população católica cogitou da construção de uma capela num bairro novo da cidade. Naturalmente, sob o regime comunista, tal iniciativa não pode ser levada a efeito sem a aprovação das autoridades. E, não obstante o pedido contar com o apoio de 90% dos fiéis, foi ele ignorado pelo poder público. O pároco do local, mostrando-se à altura do seu sagrado ministério, improvisou, sem embargo, em uma casa particular, uma pequena capela e um centro para ensino do catecismo.

A realização, de proporções naturalmente acanhadas, desatou o furor da polícia, que varejou a casa e a confiscou. Pouco depois, as autoridades resolveram demoli-la, obviamente em sinal de execração pelo uso religioso da qual fora objeto.

Destemido, o Pároco pediu então que lhe fosse posto à disposição outro local. Como era de prever, este pedido, por sua vez, também foi ignorado. Algum tempo depois, as autoridades mandaram tratores para arrasar a casa "maldita".

Qual não foi entretanto a surpresa dos encarregados da demolição, ao ver que todo o edifício estava cheio de católicos, os quais, com o Pároco à testa, ali rezavam. Ou a demolição se fazia com a consequente morte de todos os que ali se encontravam, ou era preciso desistir dela. Uma saída impraticável era esperar que se esvaziasse o prédio para derrubá-lo, pois os católicos permaneciam noite e dia dentro dele, pedindo o auxílio de Nossa Senhora.

Os tratores recuaram diante de tanta fé e tanta firmeza. De medo de indignar a opinião pública, as autoridades não ousaram praticar o crime.

Mais ainda: depois de ásperas discussões com o Bispo local, os comunistas julgaram mais prudente conceder ao Pároco um outro edifício para sua capela e seu centro de catecismo.

* * *

Dentre as muitas igrejas – algumas hediondas – que em nossa época se constróem, não creio que nenhuma haja tão insigne quanto esta. Pois ela nasceu já tendo, em seus antecedentes, um episódio digno das mais altas épocas da vida da Igreja. A coragem intransigente na defesa dos direitos do bom povo de Jesus Cristo fez encolher as garras do dragão comunista.

O fato se prestaria a toda sorte de apreciações próprias a lhe realçar o fulgurante esplendor. Os limites deste artigo não o permitem.

Cinjo-me a um comentário sintético, mas que tem o mérito de ser prático.

A conduta denodada do Pároco e de seu admirável rebanho prova que a única política a dar certo é a de não fazer concessões. Fosse o Pároco seguidor da famosa máxima do "ceder para não perder", teria sido reduzido ao silêncio, e sua grei dispersa.

Enfrentou o adversário, e lá está de pé a sua capela, bem como em funcionamento seu centro catequético.

Episódios destes, não é licito admirá-los apenas. É preciso imitá-los. Sobretudo num país como o nosso, em que a lei garante a liberdade da Igreja.

No dia do Juízo, Deus nos perguntará que uso fizemos, em nossas lutas, do bom exemplo deste Vigário corajoso. Nós que tínhamos a liberdade que a ele faltava...

E a mesma pergunta nos fará antes disso a História, interrogando-nos por que não tivemos, face à corrupção e à impiedade, uma audácia pelo menos igual à que esse Sacerdote teve diante da ameaça dos tratores comunistas.

A esta reflexão não faltam, nem tristeza, nem amargura. Registro-a contudo, aqui, com o intuito de despertar energias adormecidas e increpar táticas covardes.

Se não o fizesse, é a mim que, no dia do Juízo, Deus perguntaria: tu, que conheceste o nobre exemplo daquele meu Sacerdote exímio, por que não o divulgaste?