Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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 "Folha de S. Paulo"

 

 

 

 

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19 de janeiro de 1990

Collor na hora da Valentia

 

O editorial de 14/1/90, da "Folha de S. Paulo", foi um verdadeiro "choque de coragem", foi com valentia pouco comum entre nós, contundiu fortemente com um tabu dominante na vida pública brasileira.

Em outros termos, os reais problemas sócio-econômicos do País vinham sendo apresentados geralmente ao público com exagero e unilateralidade berrantes. Exagero porque, em muitos casos concretos, o mal, sendo embora grave e decorrente de causas altamente censuráveis, não o é tanto quanto se diz. Unilateralidade porque desconhece, ou pelo menos subestima, os muitos aspectos positivos que avultam na realidade nacional.

A isto, a reação mais frequente tem sido uma compaixão emoliente e choraminguenta, voltada de imediato para concessões irrefletidas, que desfechavam quase sempre em afundar-nos progressivamente no atoleiro do capitalismo de Estado.

De parceria com essa compaixão, vinha boa dose de velhacaria política. O grande público foi tomando como autênticas todas as descrições pejorativas da realidade. A demagogia eleitoreira lucrava quando um candidato a cargo eletivo levava ao auge as "reivindicações" que em turbilhão poluíam nosso ambiente, justas algumas, exageradas muitas, febricitantes e ululantes quase todas.

Assim urgia que alguém falasse a verdade clara e tonificante, e propusesse as medidas fortes e salubres que o editorial da "Folha" propõe.

Não que nele concordemos com tudo. Vejo nele obscuridades que preocupam. Por exemplo, as reformas abrangentes que alterem o perfil da distribuição da renda incluem as desastrosas reformas de base, que o governo Sarney e a Constituinte lamentavelmente tanto favoreceram? O que é precisamente o "fortalecimento" do papel social do Estado para enfrentar a "miséria"?

Sem embargo, a linha geral do editorial da “Folha” merece aplauso e descortina esperanças, Se o presidente Collor, com análoga coragem, quiser tornar efetivas as aspirações da maioria que o elegeu, é de presumir que se afane em desempenhar um programa na linha do referido editorial.

Desmentiria todo o meu passado, se não realçasse um ponto. Se a situação brasileira chegou às proporções monstruosas que o editorial descreve, é porque não encontrou em seu caminho a oposição clarividente, corajosa e frontal de todas as forças vivas da nacionalidade. Pelo contrário, quase todas elas se puseram a cortejar cada vez mais a demagogia, à medida que esta avançava, e mesmo que com isto praticassem o haraquiri em si mesmas. Lembro-me aqui de várias atitudes arquetípicas de uma potência espiritual e de outra econômica do País, aliás em geral boas amigas: a CNBB e a FIESP.

Mas se se chegou a isto, foi notadamente por força de um conceito errado de boa vontade: ser bom seria dizer sim a tudo; ser mau seria dizer não. Quem, como a TFP, se viu na contingência de dizer inúmeras vezes não à demagogia, era facilmente apontado como mau; quem, pelo contrário, encabeçasse a farândola do suicídio da ordem atual era "bom".

Problema moral profundo que, em nosso País, só a Igreja pode resolver. Mas que temo não seja solúvel enquanto não se resolver a crise tremenda que vai assolando a Igreja por toda a terra...


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