Legionário, N.º 227, 17 de janeiro de 1937

Meia Volta, Volver

A política brasileira está sendo teatro de uma reviravolta que desnorteia os observadores mais experimentados. Quase todos os órgãos da imprensa diária silenciam sobre ela, e têm altas e sérias razões para assim proceder. Para um espirito alto e sério, essas razões não seriam nem altas nem sérias. Mas parecem muito altas e muito sérias para aqueles que observam a política pelo prisma dos mais baixos e fúteis preconceitos partidários.

Nosso dever, porém, consiste em informar os leitores. É o que procuraremos fazer neste artigo.

Antes de tudo, porém, façamos um pouco de História.

Em Novembro de 1935, estourou, quase simultaneamente, em Natal, no Recife e no Rio, um movimento comunista.

As investigações policiais então levadas a efeito revelaram uma formidável organização, com os tentáculos espalhados por todo o Brasil. Verificou o governo, imediatamente, que o perigo era tão grave que exigia uma obra preventiva, realizada a fundo, em todo o território nacional.

Tão grave pareceu o perigo, tão necessária a repressão, que o governo colocou o país inteiro em estado de alarma. Fizeram-se leis novas, para dotar o Executivo de meios de ação mais eficientes. E, parecendo insuficientes essas leis, fez-se a reforma da própria Constituição do País.

Todos  os jornais começaram a denunciar a gravidade extrema da situação. Quase diariamente, era trazida a público alguma revelação sensacional sobre novos tentáculos descobertos pela polícia.

Ao cabo de algum tempo, a estrutura do movimento comunista foi posta a nu. E o Brasil inteiro, contemplando os restos esquartejados mas ainda palpitantes do monstro que tentara devorá-lo, pode certificar-se de visu, da pujança que a corrente comunista alcançara.

De toda essa campanha jornalística, de toda essa publicidade, de toda essa luz projetada sobre a tenebrosa revolução, uma coisa ressaltou bem clara: precedido de enorme preparação, o movimento comunista, antes de sair à rua, tinha conquistado as cátedras universitárias, os palacetes burgueses, as altas posições políticas. Do alto desses poderosos postos de irradiação, procurou conquistar as massas. Estas, porém não foram sempre tão acessíveis quanto se esperava. Daí o fracasso do movimento.

O histórico da intentona poderia ser descrita neste tríptico: formidável preparação; grande sucesso em certa burguesia; simpatia indolente da massa e fracasso final.

Tão persuadido ficou o Governo dos fatos que narramos, que tomou as providências necessárias para que eles não se repetissem.

Por que dissolveu a Aliança Nacional Libertadora? Porque reconheceu sua capital responsabilidade na preparação do movimento.

Por que destituiu de suas cátedras tanto professores vitalícios? Porque os responsabilizou pelo incremento do comunismo nos círculos universitários.

Por que prendeu tantos “grã-finos”? Porque reconheceu sua cumplicidade com os agentes de Moscou.

Quem  dirigiu toda esta repressão? O Sr. Getúlio Vargas que, se não agiu, deixou ao menos “correr o marfim” da indignação geral.

Passa-se, depois disto, um longo ano. Finalmente, depois de tergiversações e demoras inexplicáveis, organiza-se a justiça de exceção. Inquirem-se as primeiras testemunhas. Quase todas elas são recrutadas entre os mais altos funcionários do Estado, entre amigos íntimos do Governo Federal.

E o que é que essa gente afirma? A inteira inocência de acusados cuja culpabilidade é mais do que evidente.

Por outro lado, as Congregações de 2 Escolas da Universidade do Rio reclama a reintegração dos professores comunistas.

Se toda a gente que ora se procura inocentar é realmente isenta de culpa, o que faziam os professores de Direito e de Medicina do Rio, e os Srs. Protogenes, Rabello, Barcellos, que não levantaram um único protesto em seu favor?

Onde está hoje toda aquela imprensa aguerrida que ainda ontem denunciava com uma veemência sagrada toda a “clique” que hoje caminha para a reabilitação?

Que mola secreta foi posta em ação para que tantas bocas, fechadas até aqui, readquirissem uma súbita loquacidade, e tantas línguas ou penas loquazes voltem a um completo mutismo?

Nossos partidos políticos estão cheios de católicos. Qual deles se levanta para denunciar este triste jogo?

Quem terá coragem de desobedecer a essa “meia volta, volver”?