Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

7 Dias em Revista

 

 

 

 

 

Legionário, N° 775, 15 de junho de 1947

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Os acontecimentos internacionais desta semana são verdadeiramente dramáticos, não só porque fazem recear a iminência de um novo conflito, como porque, a continuarmos em paz, teremos uma paz perfeitamente envenenada.

Com efeito, a ofensiva soviética em direção ao Ocidente europeu é manifesta. Depois do golpe abominável desferido contra a Hungria, vem o destroçamento da oposição búlgara. Por fim, um ultimatum velado à Áustria. Todos estes acontecimentos visam manifestamente reforçar a influência soviética na Europa Central, tornando-a não só preponderante, mas praticamente exclusiva, ao longo do Danúbio, e em toda a Península dos Balcãs.

Ao mesmo tempo, a Mongólia soviética invade a China, com o intuito indisfarçável de ampliar a zona de influência comunista no Extremo Oriente.

A simultaneidade destes movimentos, a ilegalidade flagrante de que eles se revestem, o despudor com que são levados a cabo, indicam bem que a URSS tem um plano de envergadura mundial, que quer realizar absolutamente, e que está levando a cabo confiante em sua força... e na fraqueza de seus adversários.

Em outros termos, estas conquistas são meros marcos para atingir a dominação do mundo.

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Se os Estados Unidos não reagirem agora, teremos ainda a paz. Mas que paz? Assistiremos, de braços cruzados, à expansão da onda bárbara. As garras soviéticas chegarão a Viena e tenderão inevitavelmente a cobrir novos territórios. A agitação comunista na Itália, na França, na Alemanha (falamos das zonas francesa, inglesa e americana, pois da zona soviética é supérfluo falar), é manifesta. O trabalhismo inglês é uma incógnita. A península ibérica, a Suíça, os Países Baixos e os Bálticos se manterão apenas enquanto a França, Inglaterra e Itália se mantiverem. Se os Estados Unidos permitirem que o perigo aumente, o que nos custará esta paz! Poder-se-á chamar de paz a uma era de ativa preparação para uma guerra dantesca?

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Em nossa ultima edição, mostramos as graves conseqüências da "evasão" de Abd-el-Krim, e o doloroso contraste que é impossível não notar, entre o espírito de iniciativa e firmeza dos elementos pan-árabes e a modorra das velhas nações da Cristandade, míopes e extenuadas.

Uma semana se escoou sobre o fato, sem que do lado da Europa houvesse uma só atitude de reação eficaz. Do lado da África, o silêncio também está completo. A fuga de Abd-El-Krim tomou o aspecto do mais natural dos fatos. Neste silêncio, só uma voz se levantou, propagando-se por toda a orla maometana do Mediterrâneo, foi a de Abd-El-Krim, incitando toda a África do Norte a sacudir o jugo europeu. Desde Suez até Gibraltar, este incitamento se fez ouvir, prestigiado pela manifesta simpatia dos reis, sultões e emires de toda espécie, pela ação ideológica das universidades muçulmanas e dos dignitários do Al-Korão e pelo entusiasmo efervescente dos jovens. Este foi, pois, um acontecimento fecundo em conseqüências: importa analisar-lhe hoje alguns aspectos que, por falta de espaço, na edição anterior não pudemos comentar.

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O modo por que o golpe de Abd-El-Krim foi realizado é muito instrutivo. Abd-El-Krim, preso na Ilha da Reunião, pediu autorização para residir na França, a fim de matricular seus filhos em uma Universidade da metrópole. O governo francês aquiesceu tão ingenuamente que Abd-El-Krim pode viajar sem fiscalização e escolher livremente o navio e o itinerário. Ao passar pelo Egito, não se sabe se por iniciativa própria ou se por pressão do Rei Faruk, Abd-El-Krim desembarcou, e resolveu ficar. Desde logo, foi dando entrevistas à imprensa, que são verdadeiros incitamentos à independência da África Setentrional. Ao que parece, hospedou-se principescamente em um grande hospital do Cairo, onde lhe era destinada toda uma ala do edifício, tendo ao seu alcance certos cuidados médicos de que precisa. A Liga árabe já se manifestou solidária com ele. Certa agitação se nota em todo o Norte da África. A França ficou desapontada - e com razão!... - e a Espanha vem aguardando em atitude de vigilância o desenrolar dos acontecimentos.

Em suma, o Ocidente tem agora um inimigo sério pelas costas. Se bem que Stalin esteja mal com a Liga Árabe, e proteja os judeus na Palestina, como lhe há de sorrir a formação deste novo fator de decadência da Europa!

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A Itália festejou, há dias, o primeiro aniversário da proclamação da República. Infelizmente, estes são dias de experiência republicana [que] confirmaram nossas apreensões. Nada se lucrou com a destruição de uma instituição secular como a dinastia de Saboia. A Itália parece ter estacionado à beira do abismo comunista. O país continua agitado, depauperado e desorganizado. E a política de contemporização com a esquerda vai produzindo os frutos nocivos que dela se podia esperar.

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Não pode passar sem um comentário à nota dada pela imprensa moscovita acerca do fechamento do Partido Comunista no Brasil. As injúrias assacadas pelos jornais da capital russa contra o Tribunal Eleitoral são das mais grosseiras, e manifestam claramente o prejuízo que a decisão daquele alto órgão de justiça trouxe aos planos soviéticos.

Espanta-nos que a opinião pública não manifeste mais claramente ao Superior Tribunal Eleitoral sua solidariedade contra os ataques injustos que vem sofrendo dos comunistas do Brasil e do mundo inteiro.

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Cada dia que passa, vão se tornando mais manifestos os inconvenientes da chamada economia dirigida. Se há um país em que o Estado adquiriu um alto grau de eficácia administrativa é os Estados Unidos. Contudo em nenhum lugar a opinião pública se mostra mais vigilante contra os abusos da economia dirigida. E tem razão porque o próprio Estado americano não tem conseguido evitar erros graves, e até chocantes, em suas intervenções econômicas.

Um telegrama procedente de Nova York informa que no ano passado os Estados Unidos queimaram 22 milhões de toneladas de batatas para manter os preços do mercado, enquanto no mundo inteiro morre gente de fome. E isto se deve ao desacerto com que o Estado interveio no mercado.

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Falamos há alguns números atrás, da legislação injusta que nos governa em matéria de aluguéis. E acentuamos que os demagogos, em lugar de se preocuparem seriamente com a debelação das causas da crise, procuram agravá-la mediante a proibição de se derrubarem casas para construir outras maiores.

Há dias atrás, o jornal carioca "Vanguarda" publicou uma reportagem interessante, em que mostra que centenas de edifícios do Rio de Janeiro, em construção, estão paralisados porque falta mão de obra, faltam materiais, etc.

Seria verdadeiramente útil estudar as causas desta carência e empregar os meios mais drásticos para a debelar. Afirma-se, p. ex., que a construção está paralisada porque as Caixas de Aposentadorias retraíram os créditos necessários para tal.

Dependeria apenas de uma palavra da União uma modificação de tal atitude, já que tais Caixas são, no fundo, verdadeiras repartições públicas, dependentes do Estado em tudo e por tudo.

Por que motivo os crispins da Câmara não focalizam este aspecto da questão?

O motivo é simples: os demagogos não desejam senão a indefinida agravação de todos os problemas.

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Demonstra-o à saciedade o projeto de lei aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. Este projeto estabelece duas iniquidades autênticas: a proibição dos despejos ainda que o proprietário precise do prédio para uso próprio, e a proibição das demolições de prédios já construídos, para em lugar deles se edificarem outros maiores.

Analisemos a segunda destas proibições.

Numa cidade como São Paulo ou Rio, na zona central ou semi-central, não há quase terrenos baldios. Assim, o número de edifícios que poderão ser construídos em tais terrenos será insignificante. E, para minorar a crise de habitações, o único remédio seria levantar edifícios novos nos arredores da cidade, isto é, nos últimos e mais extremos confins da zona suburbana.

Mas qual o capitalista disposto a empatar dezenas de milhares de contos em construir prédios novos, já não digo na Penha ou em Cascadura, mas no meio das hortaliças e legumes das pequenas chácaras que circundam a Penha e Cascadura? Este dislate (afirmação tola, n.d.c.) não passa pela cabeça de ninguém. E, assim, não haverá mais construções.

Teremos, pois, chegado a este absurdo: para remediar a falta de prédios, fica proibido construir durante dois anos.

Daqui há dois anos, o mal se terá agravado pelo natural aumento da população. Os crispins, então, proporão na Câmara medidas novas, como, p. ex., o confisco dos prédios e, quiçá o fuzilamento dos proprietários que tenham a desonestidade e a falta de "senso social" de não aplaudir tal medida.

No fundo, esta providência seria talvez mais inteligente do que a proibição de se construírem prédios novos. Porque, ao menos, se diminuiria a população. Não faltam por este mundo crispins que pensem assim.

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Quanto à proibição dos despejos ainda que o proprietário queira ocupar o prédio para uso próprio, nada mais extravagante. O resultado prático desta medida é o seguinte:

a) um proprietário mora em casa de aluguel, e sua família aumenta com o nascimento sucessivo de alguns filhos;

b) ele tem um prédio próprio, de acomodações suficientes para abrigar todos os seus, mas que está alugado;

c) como o aluguel é antigo, este prédio rende, digamos, 600 ou 700 cruzeiros por mês, embora valha, digamos, 800 mil cruzeiros;

d) o dono do prédio não poderá exigir para si a sua propriedade, e terá de alugar a preços astronômicos um prédio novo, impondo com isto à sua família os maiores sacrifícios;

e) o inquilino do prédio velho ficará residindo a preço ínfimo em prédio alheio!

Se isto não eqüivale à abolição da propriedade privada, dois mais dois não é mais igual a quatro.

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Outro absurdo da lei. Todos sabemos que os comerciantes e industriais tem ganho fortunas ultimamente. Por que motivo a lei protege contra o aumento de aluguel os edifícios em que funcionam estabelecimentos industriais e comerciais? Por que, pelo menos, não aumenta o aluguel na proporção da renda declarada para efeito de imposto, pelo locatário?


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