Catolicismo, n.° 418, Outubro de 1985 (www.catolicismo.com.br)

 

O vigente Plano Nacional de Reforma Agrária:

O País, ansiando por clareza e garantias, recebe confusão e insegurança

A TFP promete pronunciar-se em breve de modo cabal e sereno

 

OS ÚLTIMOS ANOS deste século, inicia­do com o toque dos carrilhões, as harmonias das valsas, e os esplendores das festas cívicas e militares da Belle époque, vão correndo tor­vos, tumultuados, sempre mais pejados de in­cógnitas, de crises e de catástrofes.

E, em meio a tudo isso, o fim deste milê­nio se aproxima.

Até em seus fundamentos, a sociedade sofre sucessivos abalos, próprios a eriçar de susto os mais otimistas. Sentem-no mais ou menos confusamente todas as nações.

Neste momento, o Plano Nacional de Re­forma Agrária ora aprovado absolutamente não produziu o efeito psicológico arejado e distensivo, que dele parecem ter esperado, não sem boa dose de ingenuidade, os seus auto­res. Sente-o o intuitivo e lúcido povo brasi­leiro e disso a TFP vem recebendo testemu­nhos de todo o País.

Com efeito, em seus quase cinco séculos de História, não passou talvez nosso País uma só vez por um suspense igual ao causado pelo 1.° PNRA. De si, esse estado psicológico tor­na o homem sedento de segurança, de clare­za, de garantias. De tudo aquilo, enfim, que expulsa para bem longe o fantasma do risco que o atormenta.

Diante do anúncio de que o Governo in­troduziria profundas modificações no docu­mento, definiram-se, na grande maioria dos brasileiros, três posições, aliás explicáveis.

Uns vaticinavam que nada mudaria. Eram principalmente os "pessimistas", que naturalmente a si próprios se qualificavam de "previdentes".

Outros esperavam mudanças capazes de acalmar os "pessimistas" fazendo-lhes algu­mas concessões, e de contentar — sem os de­cepcionar demais com outras concessões — os "otimistas".

Eram esses os “otimistas cordatos” que a si mesmos se inculcavam como "prudentes", "equilibrados", "sensatos" etc. Sua atitude poderia definir-se como inspirada em máxi­mas tão velhas quanto velho é o medo, na cria­tura humana: "Vão-se os anéis, mas fiquem os dedos". Ou, um pouco mais modernamen­te, em palavras talismânicas como "diálogo", "irenismo", "ecumenismo" etc.

Por fim, e para além dos "otimistas cor­datos", estavam os "otimistas festivos". Es­tes esperavam tudo. Ou seja, que o Presiden­te Sarney encontrasse, para resolver a atual situação, uma daquelas fórmulas mágicas que a legenda getuliana — a qual comportava al­guns traços chulos — definia com fórmulas como esta: "Jeitinho para tirar as meias sem tirar os sapatos".

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NOTE-SE QUE essas três posições não equivaliam ao trinômio direita-centro-­esquerda. Entre os "pessimistas" havia, por exemplo, tanto direitistas temerosos de que nada fosse mudado no projeto do PNRA, quanto esquerdistas apreensivos à vista da hi­pótese de que nele fosse mudado tudo.

Entre os "moderados" havia direitistas que temiam perder até mesmo o pouco que lhes restasse, e esquerdistas que temiam não obter — se exigissem tudo — uma razoável parte do que de excelente podiam esperar na presente conjuntura.

E entre os “otimistas festivos”, havia os direitistas que esperavam da habilidade má­gica do Presidente Sarney a conservação do status quo. E ainda os esquerdistas que espe­ravam da mesma habilidade do chefe de Es­tado a derrubada inteira — pelo menos vir­tual — do mesmo status quo.

De todas essas apreensões heterogêneas resultava um mesmo suspense, no qual a cla­rineta dos esquálidos otimistas quase não che­gava a se fazer ouvir.

E desse suspense se evolava, de modo a saturar a atmosfera brasileira, uma ansieda­de que em alguns casos tocava às raias da afli­ção: como seria o novo texto do Plano?

Nesta conjuntura, os tão explicáveis an­seios de segurança, clareza e garantias, se exas­peravam ao máximo. E era missão indecliná­vel dos autores do Plano agora revisto, resol­ver adequadamente o grande suspense no qual o País não poderia permanecer por mais tem­po sem prejuízos e até riscos dos mais eviden­tes e consideráveis.

Mas, dói dizê-lo, o resultado da promul­gação do texto integral do Plano, bem como dos noticiários e comentários dos mass-media sobre o assunto, produziram uma sensação ge­neralizada de ambigüidade, de carência de ga­rantias, e de desconfiança, que já toldou o Brasil de Norte a Sul. Sensação essa que vai rumorejando largamente nas fileiras, tanto da direita quanto da esquerda, e se mostra sem­pre presente no centro, se bem que ao modo deste.

E não poderia ser de outro modo. Pois já a um atento correr de olhos, o documento tão esperado parece quase feito para produ­zir resultado oposto.

Sem entrar por ora na análise do conteú­do do vigente PNRA, já se pode afirmar que. quanto à forma, este não foi simplesmente re­tocado, mas remodelado a fundo. Foi refun­dido a ponto de constituir novo documento.

Nesta refusão, a ordenação das partes foi deslocada, e em muito numerosos artigos — quase todos, talvez — houve retoques, ou substituições. Tudo de maneira a fazer do co­tejo entre a primeira e a segunda redação do Plano, um verdadeiro quebra-cabeças, no qual a visão de conjunto parece fugir ao leitor, emboscando-se quase até o fim nos meandros de um texto extenso, prolixo e não raras ve­zes confuso.

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É NATURAL QUE sendo a TFP conhe­cida em todo o País por duas décadas e meia de luta clara em prol da propriedade indivi­dual e da iniciativa privada, conduzida com convicção, coerência e clareza, incontáveis brasileiros se perguntem — e nos perguntem — o que tem ela a dizer na presente emergên­cia.

Esta palavra aqui vem: "Ver, julgar e agir" são as três etapas indispensáveis ao lúcido, honesto e sensato posicionamento do ho­mem, segundo São Tomás.

Neste itinerário, está a TFP fazendo o cuidadoso cotejo entre o projeto do 1.° PNRA e o próprio PNRA.

Isto feito, terá chegado a vez de formar um juízo sobre o Plano recém promulgado.

E, por fim, formado esse juízo, virá o momento de o enunciar e difundir. Segundo já pudemos constatar em rápido relance, da eficiência dessa difusão nos fala — com im­plicitude paradoxalmente muito clara — o próprio documento firmado pelo Presidente Sarney e pelo Ministro Nelson Ribeiro. E disto também nos dá testemunho a excelente aco­lhida (10 mil exemplares vendidos em 52 dias) que está encontrando em todo o Brasil o li­vro A propriedade privada e a livre iniciati­va, no tufão agro-reformista, de autoria do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, Presidente do Conselho Nacional da TFP, e Carlos Patricio del Campo, Master of Science em Econo­mia Agrária pela Universidade de Berkeley, Califórnia, bem como a edição extra do men­sário de cultura "Catolicismo" que contém uma condensação desse livro (29 mil exempla­res já difundidos).

O estudo agora em curso está sendo fei­to com toda a celeridade que a premência do assunto merece.

No momento em que a ação da TFP se vai desdobrando em toda a sua amplitude e firmeza, é o caso de dirigir, à margem do pre­sente comunicado, uma interpelação a oposi­tores ideológicos dela.

Veiculam esses opositores a ridícula ba­lela de que a TFP é extremista de direita e, com base em tal, pleiteiam de quando em quando a adoção de medidas governamentais contra a entidade. O que também não se abs­têm de fazer... os extremistas de esquerda!

Nesta campanha, têm tais opositores mais uma ocasião de observar a TFP "ao vi­vo". Interpelamo-los, pois, para que respon­dam definidamente: o que, nas doutrinas e nos métodos dessa campanha, é extremista? Por­ventura é extremismo defender a integridade da propriedade privada e da livre iniciativa, contra o atual tufão agro-reformista? E, acres­centamos, por que nossos opositores não qua­lificam por sua vez simetricamente de extre­mistas os propulsores da Reforma Agrária?

Numa palavra, por que dois pesos e duas medidas?

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EM SUMA, mais uma vez, se Deus qui­ser, e com toda a brevidade possível, a TFP cumprirá cabalmente seu dever para com a ci­vilização cristã e o Brasil.

Que assim a ajude Nossa Senhora Apa­recida, Mãe e Rainha deste País, chamado a Lhe dar tanta glória no 3.° milênio da era cris­tã, o qual, por entre as amarguras e tragédias deste fim de século, já se faz entrever radio­so.

 

São Paulo, 15 de outubro de 1985

 

Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade