Catolicismo, Nš 426, Junho de 1986 (www.catolicismo.com.br)

Menti, menti...

Têm-se multiplicado nos últimos dias, em jornais e revistas, notícias marcantemente ambíguas, as quais - esquivando-se embora de o afirmar taxativamente - visam dar ao leitor a impressão de que a TFP tem alguma forma de responsabilidade por atos de violência ligados com a agitação agrária, que vêm ocorrendo, aqui e ali, no território nacional.

De que natureza seria essa responsabilidade? Tais notícias astutamente não o dizem. Pois a acusação ambígua e vaga acoberta o acusador contra desmentidos que ele teme necessariamente lhe sejam infligidos pela vítima.

Assim, à míngua de pormenores, a TFP fica reduzida a excogitar os possíveis matizes em que a acusação genérica venha a se explicitar.

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Uma possivel modalidade em que se especificaria a calúnia consistiria talvez em que, tomando posição saliente na controvérsia agro-reformista, a TFP contribuiria para acirrar os animos. E o que teria ocorrido notadamente com a distribuição a mais de 70 jornais, feita pela TFP a pedido de fazendeiros, dos pareceres de dois insignes jurisconsultos sobre o direito de defesa dos proprietárias em caso de invasão de suas terras por hordas de desordeiros agro-reformistas.

Este acirrar de ânimos contribuiria, segundo essa visualização, para criar o clima propicio à eclosão de atos de violência.

Em dias normais, "constas" como este sequer merecem desmentido, de tal maneira são retorcidos, alambicados e ralhos de bom senso.

Entretanto, o Brasil não está vivendo dias normais. E quando problemas nacionais de grande envergadura, e até problemas internacionais, trazem quase sem fôlego a opinião pública, constituem-se, como que espontaneamente, as condições psicológicas para que os boatos mais desdenháveis encontrem guarida em setores apaixonados da opinião nacional. E, se muito repetidos e martelados, podem servir de ponto de partida para as grandes ofensivas publicitárias da calúnia. "Menti, menti, alguma coisa ficará sempre", dizia Voltaire.

O primeiro passo nessa escalada da mentira consiste precisamente em difundir boatos como o acima.

Convém, portanto, cortar pela raiz o mal, que, a julgar pelas aparências, promete crescer. É o que de momento faz a TFP.

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Assim, para desmentir essa calúnia, cumpre lembrar antes de tudo que a TFP tem 25 anos de existência, ao longo dos quais tem estado continuamente presente, e com destaque, na vida pública brasileira pela difusão sucessiva, em todo o território nacional, de 26 livros e ensaios, quase todos com tiragens de dezenas de milhares de exemplares, bem como do mensário de cultura "Catolicismo", e também através de conferências e campanhas públicas realizadas por caravanas de sócios e cooperadores, as quais vêm percorrendo em todo os sentidos nosso território-continente.

Em todo esse material escrito ou falado não há quem possa apontar uma grosseria, um insulto, menos ainda, uma mentira ou uma calúnia. Paralelamente, ao longo de toda essa atuação das caravanas junto ao público, não há quem possa alegar uma só agressão, tropelia, ou desordem. Em abono do que a TFP dispõe de mais de quatro mil cartas de prefeitos, delegados e outras autoridades municipais.

Não sabemos de entidade que apresente prova mais patente da contínua serenidade e legalidade de seu procedimento. Serenidade e legalidade estas inalteradas, mesmo quando a TFP tem sido alvo de estrondos publicitários de violência incomum.

Toca às raias do absurdo levantar portanto aquelas caluniosas insinuações contra uma entidade dotada de tantas provas de sua índole pacífica.

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Poder-se-ia talvez insinuar que a TFP teria uma participação nessas violências, por efeito de sua suposta conexão com a União Democrática Ruralista (UDR), que o mesmo noticiário se tem empenhado em envolver no assunto. Extravagante maneira de acusar! Pois bastaria que uma entidade tivesse relações com outra de constituição jurídica inteiramente diferente, sem o menor nexo estatutário, com diretorias distintas e de passado histórico perfeitamente diverso, para que as ações de uma envolvessem automaticamente a outra!

Onde a prova concreta da colaboração da TFP nos atos condenáveis pelos quais a dita campanha difamatória insiste em responsabilizar a UDR?

No esforço para dar um tal ou qual viso de verdade a tudo isto, alegou-se ser a UDR fornecedora dos subsídios para a larga publicação dos aludidos pareceres.

Não há pessoas físicas ou jurídicas que tenham concorrido muito relevantemente para o montante dos gastos efetuados pela TFP para a publicação de tais pareceres.

Com efeito, cada contribuinte tem dado quanto pode ou quer. E sua contribuição vai sempre para a publicação em seu município ou área de influência.

Sendo tão numerosos tais municípios e áreas, em nosso território-continente, é fácil avaliar quanto os vários donativos são de pouca monta em função do conjunto dos gastos da companha. E assim concluir que nenhum contribuinte por si só constituiu fator determinante no desenvolvimento da campanha. Entre estes contribuintes - acrescente-se - não está o nome da UDR.

Importa acrescentar que também fora deste fim especifico da publicação dos pareceres, a TFP não mantém conexão com nenhuma outra entidade rural, ou de qualquer outra natureza. Para tudo isto, a TFP tomou sempre contato direto com os proprietários de terra, sem indagar da eventual filiação deles a qualquer corrente politico-partidária, ideológica ou profissional.

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Tudo isto ponderado, cumpre ainda ter em vista que, publicando esses pareceres desde 12 de janeiro último, a TFP está esclarecendo os proprietários rurais de como agir dentro da lei em face das invasões de terra. Assim, a atuação da TFP é legal em si mesma, e inclusive promove o respeito à lei pelos fazendeiros. Se eventualmente algum proprietário rural sair fora da lei, é pois por sua única conta e responsabilidade, e contra a orientação que os ditos pareceres apontam. É o que há de mais cristalino.

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E vejamos, por fim, a que espécie de democracia nos vão encaminhando os que atribuam à TFP - só pelo tato de sua tomada de posição - de estar contribuindo para dar calor à controvérsia sobre a Reforma Agrária, e imaginam, em consequência, ser ela co-responsável por todos os crimes que possam nascer do excesso de calor dessa polêmica. Uma ilação dessa natureza importaria em negar a democracia, que esses detratores da TFP em geral tanto proclamam. Porque, se todo homem que toma posição ardorosa numa controvérsia, por isso mesmo é culpado de todas as paixões daí decorrentes, então é preciso reconhecer que todo debate democrático caloroso é, ele próprio, gerador de crimes. Ou seja, a conseqüência é que, na verdadeira democracia, os debates devem ser sem calor e sem vida! O que é absurdo.

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Se aparecerem, ademais, semeadores de noticias ambíguas ou caluniosas contra a TFP, que pretendam insinuar ter ela tido alguma participação na própria trama de atos de violência, negamo-lo desde já energicamente. E com profundo e enojado desdém.

Pois a tal nos dá direito nosso longo passado sem jaça, bem como o respeito e a confiança que nos têm incontáveis brasileiros, mesmo dentre os que discordam de nós, mas conservam o bom senso e espírito de justiça.

São Paulo, 22 de maio de 1986

Paulo Correa de Brito Filho

Diretor de Imprensa da TFP