Plinio Corrêa de Oliveira

 

Pierre Toussaint:

apóstolo do amor à hierarquia social

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Santo do Dia, 29 de maio de 1991

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A D V E R T Ê N C I A

Gravação de conferência do Prof. Plinio  a sócios e cooperadores da TFP, não tendo sido revista pelo autor.

Se Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério tradicional da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras "Revolução" e "Contra-Revolução", são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plínio Corrêa de Oliveira em seu livro "Revolução e Contra-Revolução", cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de "Catolicismo", em abril de 1959.

Nessa conferência, o Prof. Plinio comenta esta figura, cuja catolicidade indômita é exemplo para nós.

Leia o prefácio (em português) que o Fundador da TFP escreveu para a obra "Memoir of Pierre Toussaint, Born a Slave in St. Domingo", de autoria de Hannah Sawyer Lee, Western Hemisphere Cultural Society, Sunbury (Penn., USA), 1992.

Pierre Toussaint (1766 –1853) foi escravo de católica família de nobres franceses, proprietária de plantação de cana de açúcar em Saint Pierre (hoje Haiti), viveu feliz trabalhando na casa de seus donos, sendo encorajado por eles a ler e escrever devido à sua inteligência e precocidade. Quando o clima da Revolução Francesa atingiu aquela ilha, mudou-se ele com seus senhores para Nova York, onde aprendeu a profissão de cabelereiro, na qual logo se notabilizou, tornando-se o preferido da elite local. Com isso, pôde sustentar sua dona quando esta perdeu o marido e a fortuna. Casou aos 45 anos com uma escrava que resgatara. Toussaint morreu octogenário, sendo enterrado na igreja de Saint Peter, que ajudou a construir e frequentou até sua morte, durante sessenta anos. Seu processo de beatificação e canonização está em curso, sendo atualmente Venerável. Suas relíquias repousam na cripta da catedral de Nova York (Saint Patrick).

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* A correspondência de Toussaint

“Um dos interessantes aspectos de sua existência era a vida de família. Comenta Toussaint: "No dia do Santo de Euphémia – sua sobrinha – eu sempre a levava a uma confeitaria onde enchíamos uma cesta com bolos, biscoitos e pães de gergelim que levávamos para o Asilo". A autora de sua biografia lhe perguntou: "Ah, e aí V. deixava Euphemia distribuir tudo para as outras crianças?". "Oh! Não, Madame! Isso não seria próprio para a pequena menina negra. Eu lhe dizia que pedisse a uma das irmãs para o fazer. Ela ficava ao meu lado esperando.

“O contentamento das crianças recebendo os regalos era a alegria de Euphémia". Esse ex-escravo possuia a feliz arte de fazer com que todos o amassem por suas maneiras afetuosas e gentis. Seu comportamento em relação a sua esposa era digno de imitação mesmo para os brancos. Separou um apartamento em sua casa para uma respeitável viúva, branca, que ensinou inglês a Euphémia e que, mais tarde, abriria uma escola para crianças. Por ordem do tio, Euphémia tinha que lhe escrever semanalmente duas cartas, uma em inglês e outra em francês. Era um duro mas valioso exercício. Mais de 500 de suas cartas a Toussaint sobreviveram entre os pertences dele”.

Imaginem o que era a correspondência desse homem, de tão baixa extração social! Ou seja, o que era a irradiação da sua personalidade.

“Nada escapava à curiosidade da menina que se mostrou uma repórter nata. Com terror infantil narra, por exemplo, aquilo que terá sido uma das primeiras predições da destruição de Nova York: "Ouvi dizer que um anjo apareceu a um vidente e lhe disse que a cidade deveria ser destruída por um terremoto num dia 15 do mês". Sua dor pela morte de Euphémia foi verdadeiramente profunda. Emagreceu, evitou contato com a sociedade e se recusou a ser consolado. Mas sua mente era por demais piedosa e racional para ter indulgência com o excesso de dor, e encontrou consolação nas preces da Igreja. Aqueles que testemunharam a luta para se dominar e para cumprir com suas obrigações nessa época, falam dele com reverência. Um exemplo da discreta e silenciosa maneira pela qual Toussaint praticava as boas obras deve ser mencionado aqui. Um nobre francês, a quem Toussaint havia conhecido na abastança, ficou reduzido à pobreza. Doente, em meio aos sofrimentos, suspirava por finos alimentos que não tinha mais como adquirir. Durante vários meses Pierre e sua esposa lhe enviaram seu jantar, esmeradamente preparado de modo tal que ele não pudesse suspeitar de sua procedência”.

Esse é bem seu jeito de proceder: não querer aparecer, não humilhar aquele a quem favorecia e, ao mesmo tempo, preparar tudo esmeradamente. Não de qualquer jeito, mas primorosamente. Era a alegria de dar completa e perfeitamente, cheio de pormenores. Era um feitio especial, que revela uma alma particularmente generosa.

Eu vou-lhes mostrar o que é a virtude católica. Este é um modo de dar próprio a um nobre. Quando alguém dá assim, diz-se: "Não espanta, ele é um nobre!" Pois bem, esse preto, escravo, dava assim e poderíamos dizer: "É próprio a um preto, escravo, mas católico e filho de Deus!"

"Se ele tivesse sabido, comenta Toussaint, talvez não gostasse; poderia ficar com o orgulho ferido". Algumas vezes, quando o ia visitar, o doente comentava com Toussaint: "Ah, eu sou muito conhecido! Tenho muito bons amigos. Todo dia algum deles me envia um bom jantar, preparado por um cozinheiro francês". Juliette Toussaint, ao narrar o fato, comenta: "Meu bom marido, quando voltava para casa, contava-me o sucedido, e nós ríamos muito".

Era a alegria que tiravam de ter dado. Essas são alegrias são muito maiores do que a do egoísmo. Por exemplo, a miserável alegria de ter roubado. "Hoje consegui roubar um brilhante!" "Prejudiquei Fulano num negócio". "Ganhei muito dinheiro". É uma alegria ácida feita de fel e vinagre. Ao passo que a alegria de Toussaint é a de Nosso Senhor Jesus Cristo: generosa, aberta e boa.

“Seus métodos para encontrar meios de dar assistência aos outros eram dignos de nota. Uma senhora francesa viu-se em apuros financeiros pela depreciação de sua pequena propriedade e queda de suas rendas. Consultou Toussaint sobre a possibilidade de ele fazer qualquer coisa para ajudá-la. Ele lhe sugeriu que lecionasse francês. Como ela alegasse que não tinha conhecimentos gramaticais suficientes para isso, ele respondeu: "Madame, eu não sou juiz na matéria, mas freqüentemente ouço dizer que a Sra. fala um francês muito puro e correto". Convenceu-a então a lecionar conversação, encarregando-se ele de lhe conseguir alunas entre as filhas de suas clientes”.

* Tulipas negras e lindas no jardim da Igreja

Há fioretti de S. Francisco: a expressão é encantadora e os casinhos são uma maravilha. Há os fioretti de Toussaint: túlipas negras e lindas no jardim da Igreja.

“Para qualquer fim caritativo, Toussaint fazia um giro entre seus amigos ricos, que tinham plena confiança nele, e apresentava-lhes o problema. Desse modo foi capaz de coletar somas consideráveis para socorrer órfãs e viúvas. Alguns católicos norte-americanos, preocupados com a sorte dos órfãos, planejaram estabelecer um orfanato católico para crianças brancas. Pierre, através de seus clientes tanto católicos quanto protestantes, levantou uma larga quantia de dinheiro para ajudar a financiar o projeto. A Madre Elizabeth Seton (canonizada há pouco por João Paulo II) mandou 3 de suas Irmãs da Caridade para começar a obra. Durante quatro décadas Pierre foi um constante suporte do orfanato.”

É uma atividade enorme. São dois fatos a se notar: uma atividade colossal de um lado; de outro, multiplicada pelos próprios dons que Deus lhe tinha feito. Ele tinha, em grau eminente, o dom do conselho. Nota-se que muita gente o procurava para se aconselhar, e de muito mais cultura e instrução do que ele. Sabia que recorrendo a ele, seria atendido, encontrando uma boa palavra, pela experiência que tinha da vida, mas sobretudo pelo dom do conselho.

Outro dom que tinha e é conexo com este, era o inspirar confiança. Muitas pessoas confiavam nele debandadamente.

Se Toussaint pedisse a um deles: "Dê-me uma boa quantidade, pois garanto-lhe que a aplicarei bem e, ao cabo de um ano, terá um bom lucro". Eu acho que lhe entregariam sem recibo: "Tome lá o dinheiro, e arranje esse caso!" Sendo o Toussaint, eu tenho a certeza que sairia um bom negócio, devolveria o prometido e ainda um pouco mais, para agradecer a confiança que tiveram nele. Saía pimpão e distinto como um gentil-homem, querendo tudo menos disfarçar que era um escravo.

“Pedidos de ajuda vinham o tempo todo. Uma nota que lhe enviaram dizia: "Mme Hayes, do n. 82 da rua Woster, está doente e precisa de madeira para o fogo". Uma srta. Gillinghan lhe escreveu: "O sr. disse esta manhã que me enviaria alunas. Eu espero que não se esqueça de sua promessa porque estou passando necessidade". Até de presidiários: "É ao Sr., que é o consolador dos desafortunados, que eu apelo. Peço-lhe, suplico, que venha me ver. Eu já escrevi a várias pessoas, mas em vão. Deus o recompensará pela gentileza que tiver para comigo. Tenho muitas coisas a lhe dizer. Peço-lhe que não me falte". L. Emmerling, Bellevue Prison. Ajudava, igualmente, os sacerdotes e seminaristas, correspondendo-se com alguns de outros países. Doou os primeiros 100 dólares para a igreja de S. Vicente de Paulo, em N.Y. Em seu testamento deixou dinheiro para ajudar seus parentes do Haiti que pudessem vir a ser encontrados. Sua mãe jamais o foi, o que para ele foi uma grande dor”.

Outro lado interessante: o senso de família que tinha. Os parentes, ajudava-os com gosto especial, embora fosse gente desconhecida como ele. Mas não tinha importância, era do seu sangue, ligados por determinados vínculos. Ele ajudava os parentes que ele não conhecia, que poderiam ter ficado no mundo revolucionário do Haiti – naquele tempo um pouco o mundo comunista de hoje – e que necessitariam de algo. Na hora de morrer, ele tinha esses parentes desconhecidos em vista: deixava-lhes um legado.

Estão vendo que alma particularmente nobre e bela todos esses lados manifestam. É tão bela e tão nobre, que incito os senhores a procurar [....] Onde existe verdadeiramente a fé, floresce tudo isto. Onde ela decai, murcha. Quando desaparece, acabou-se tudo: é o mundo moderno.

“Não se deve supor, entretanto, que a caridade de Toussaint se restringisse a angariar dinheiro. Ele via a grandeza moral de fazer o bem, de dar bom conselho ao fraco e desencorajado, ao tímido, de corrigir o vicioso e, sobretudo, de confortar o doente e sofredor. Numa das epidemias de febre amarela, Toussaint descobriu que um homem tinha sido deixado completamente só. Era um estrangeiro, mas ele o levou para sua casa, dele cuidando até que recuperasse a saúde”.

Levou para casa, hem!

“Uma das vezes em que a febre amarela grassou em Nova York, aos poucos a Rua Maiden ficou deserta, com quase todas as casas trancadas. Uma pobre mulher, prostrada pela terrível peste, lá permanecera com pouca ou nenhuma assistência até que Toussaint, disso tomando conhecimento, cruzou as barricadas que indicavam a zona contagiosa, para lhe dar toda assistência necessária, dia após dia, sem o mínimo temor ao horrível contágio”.

Isso é coragem. É maior do que a de, numa batalha, enfrentar tiros.

“Outra vez ele encontrou um pobre sacerdote desprovido de tudo, abandonado num sótão, e atacado por terrível febre, apanhada no navio em que viera. Toussaint tomou conhecimento do caso e forneceu ao ministro de Deus vinho e dinheiro. Finalmente o levou para casa onde, com Juliette, cuidaram dele até que se restabelecesse. Como não podia deixar de ser, algumas vezes recebeu em troco a ingratidão por seus serviços”.

Isto é fatal!

“Tendo perseverado muito tempo, apesar das dificuldades e desencorajamentos, no auxílio a uma família francesa empobrecida, conseguindo trabalho para dois filhos, à medida que foram recuperando a prosperidade, seus membros passaram a evitar o benfeitor como se nada tivesse havido. Toussaint comenta: "Estou muito contente por eles estarem tão bem".

Voltando um pouco ao sacerdote. Toussaint, estão vendo, era homem de fé. Podem imaginar o que representava para ele ter em sua casa um ministro de Nosso Senhor Jesus Cristo, precisando dele, e a quem atendia. Era como se atendesse o próprio Cristo, Nosso Senhor. Podem imaginar com ele tratou bem. Pouco incomodava saber se esse sacerdote, por suas virtudes morais, merecia ou não esse trato. Era sacerdote de Cristo, tão só isso lhe importava.

“Um dos métodos pelos quais Toussaint fazia o bem, era pegando meninos de cor, um após outro, enviando-os à escola e, depois, quando estivessem suficientemente crescidos, ensinando-lhes alguma profissão útil”.

Toussaint é um percursor de S. João Bosco. Não tinha a idéia, comum a algumas pessoas de seu tempo, de fazer de todo o menino pobre a quem ajudasse um doutorzinho: futuro advogado, médico ou engenheiro. Não, vá ter uma profissão modesta, humilde, mas que dê dinheiro e esteja na proporção com a educação que recebera de seus pais, na qual se sinta bem". Daí o ensino profissional e as escolas profissionalizantes tão diletas dos salesianos. Assim, Toussaint queria ensinar a esses meninos profissões adequadas, nas quais eles, honradamente, exerceriam e salvariam suas próprias almas. É uma obra bem pensada.

“Acreditando que a educação católica era a chave para uma vida melhor, ele trabalhou zelosamente para amparar as Irmãs Oblatas da Providência, uma ordem religiosa de negras estabelecida em Baltimore em 1829. Ele e Juliette foram também benfeitores da primeira escola católica de Nova York para crianças negras. (Quando Toussaint já estava com 80 anos) uma grande amiga lhe perguntou: "V. é mais rico do que qualquer um que eu conheça. Tem muito mais do que necessita. Por que não pára de trabalhar agora?". "Madame, respondeu ele, tenho o suficiente para mim, mas se eu páro de trabalhar, não terei suficiente para os outros".

Mais uma vez digo aos senhores: conhecem gente que pense assim? A minha pergunta é quase asnática, de tão evidente o não haver. Até se indaga por que faço tal pergunta. Às vezes, nossa recordação fica entorpecida e não se lembra. Entretanto, é necessário lembrar, para compreender o que a Igreja dá, olhando aqueles que não querem receber o que Ela dá, e, por isso, a que miséria moral ficam reduzidos.

“Toussaint nunca se sentiu degradado por ser negro ou mesmo escravo, porque ele se considerava a si mesmo objeto da proteção divina tanto quanto qualquer outro ser humano”.

É isso mesmo, não é preciso mais nada. É querido por Deus, está acabado! Não é necessário ter um Rolls Royce!

“Mas nunca se esqueceu de que sua pele o diferenciava dos brancos, e sempre falou de si mesmo como de um negro. Algumas vezes contava fatos pitorescos surgidos dessa circunstância, e que o divertiam. P. exemplo, um dia, a filha de uma dama que visitava com freqüência, parando diante dele, ficou olhando fixamente para sua face: "Toussaint, perguntou ela de repente, V. vive numa casa preta?". Ele riu muito e depois, divertido, contava o fato com freqüência”.

Olhe a grandeza que há nesse fato. Uma superior grandeza.

“Um dos traços marcantes em Toussaint era seu desejo de enobrecer seus irmãos, fazendo-os sentir sua responsabilidade moral como negros, e a não procurar absorver, meramente os hábitos e a conversação dos brancos. Era o bom senso que traçava sua linha de conduta. Jamais misturou as duas raças. Isso pode ter sido em certa medida resultado da primeira formação na casa dos Bérard, mas havia evidentemente da parte de Toussaint um profundo respeito às desigualdades. Verdadeiramente nobre e grande era a concepção que ele tinha de sua própria natureza e responsabilidade. Nenhuma falha da parte do dono podia, em sua opinião, absolver um escravo dispensando-o de cumprir seu dever. Seu próprio rumo estava traçado, e ele o considerava reto e fácil, seguindo-o durante toda sua vida”.

Isto é muito importante. São Paulo trata disto numa epístola: obedecei a vossos donos, ainda quando sejam díscolos, quer dizer, quando não merecem, são desordeiros. O princípio da luta de classes é diferente: se ele agiu mal, eu vou agir mal também. A atitude de Toussaint é cheia de respeito, educação e perfuma a vida, dando-lhe um outro encanto.

* Toda a sua vida foi uma pregação de anti-igualitarismo

“Vivendo em Nova York, preservou a mesma tranqüilidade e contentamento de alma, que tinha em São Domingos apesar de não se falar em liberdade, e considerando a emancipação uma benção, o que provou ao acumular gradualmente soma suficiente para comprar a liberdade de sua irmã. Mas sem alimentar nenhum desejo desordenado da própria liberdade, cumpria seu dever nas circunstâncias que Deus escolheu para si, e essa idéia lhe dava paz e serenidade. Quando sua senhora, no leito de morte, o presenteou com a liberdade, ele a recebeu muito agradecidamente, e acreditamos que não teria permitido a ninguém tirar-lha. Não temos autoridade para dizer muita coisa sobre os pontos de vista de Toussaint com relação à escravidão. Nisso, como em tudo o mais, ele agiu mais do que teorizou. Não podemos duvidar do quão altamente apreciava a liberdade para o escravo, se bem que nunca quisesse falar sobre a matéria”.

Já naquele tempo, quando se falava do assunto, dizia-se um mundo de banalidades que todo o mundo conhece, e demagogicamente. Ele não era suficientemente instruído, nem nada, para fazer sermõezinhos anti-igualitários. Não fazia, mas toda a sua vida foi uma pregação de anti-igualitarismo. Ele pode ser considerado um santo anti-igualitário do mesmo modo que S. Francisco de Assis o foi do amor, da bondade etc.

“Parece ter compreendido inteiramente a dificuldade da emancipação; e, certa vez, quando uma senhora da sociedade lhe perguntou se era abolicionista ele estremeceu e respondeu: "Mme., ils n'ont jamais vu couler le sang comme moi". (Madame, eles nunca viram correr o sangue como eu vi). E acrescentou: "Eles não sabem o que estão fazendo".

Ele dizia isso dos abolicionistas, por causa das guerras, com certeza, em S. Domingos e noutros lugares.

“Quando Toussaint chegou aos Estados Unidos, negros livres e alguns Quakers tentaram persuadí-lo a deixar sua senhora, dizendo-lhe que a liberdade é um direito do homem. "A minha, respondeu ele, pertence à minha senhora". [Palmas.]

“E quando o povo de cor, em Nova York, celebrava sua libertação da escravatura em 5 de julho de 1800, foram oferecer a Toussaint uma proeminente posição no desfile. Ele agradeceu com sua costumeira polidez, congratulando-se com eles pelo grande evento. Mas recusou a honra assinalada dizendo: "Eu não devo minha libertação ao Estado, mas a minha senhora".

Vejam o equilíbrio dessa alma. Não vale muito mais isso do que ser muito cultivado e ter lido muito livros e outras coisas assim?! É católico e tem espírito católico!

“É um traço assinalável de seu caráter que tudo o que Toussaint fazia era cuidadosamente bem feito. Havia uma complementaridade entre seus planos e sua execução que requeria segurança; o que talvez seja uma das causas do respeito que ele inspirava. Isso levava algumas vezes as senhoras da sociedade novayorquina a dizerem de Toussaint que "ele era um consumado gentil-homem". Foram entretanto suas qualidades morais que lhe deram essa distinção, pois, com a mais perfeita modéstia, sabia perfeitamente o que era devido aos outros e a si mesmo, enquanto seu coração transbordava dessa gentileza cristã que sobrepassa a mera polidez mundana. Toussaint era um devotado discípulo da Santa Igreja. Os livros piedosos eram seu alimento diário, seu livro de orações estava sempre em seu bolso e frequentemente as máximas de Thomas de Kempis eram entremeadas em sua séria conversa. O modo como ilustrava seus exemplos surpreendia. A uma cliente amiga, protestante, explicou ele o culto às imagens de Nossa Senhora voltando-se para um quadro de sua parente, na sala: "A senhora gosta de olhar para esse quadro: ele a faz lembrar mais da pessoa representada, amá-la mais, e tentar fazer o que ela gostaria que a senhora fizesse". Dessa interessante maneira ele estava descrevendo seus próprios sentimentos com relação aos quadros e imagens da Virgem Maria. "Sua religiosidade era fervorosa, sincera – declara uma antiga cliente – fazia parte de sua própria pessoa, e nunca a deixou de lado por algum interesse pessoal. Mas não se deve pensar que, por isso, ele era um homem sisudo, carrancudo: era cheio de espírito e de animação e entretenidíssimo em suas pequenas narrativas”.

O que é uma qualidade natural da raça negra. Têm uma forma de vitalidade, que muitas vezes nós, brancos, não temos. Sobre essa qualidade natural, pousava uma luz da graça que produzia um efeito maravilhoso.

* Era um filho da Santa Igreja

"Vi quão incomum e quão nobre era seu caráter. Seu todo me impressionava: sua perfeita benevolência cristã desenvolvendo-se não somente em palavras mas em boas obras diárias; sua fé inteira, seu amor e caridade; seu excepcional tacto e finura de sentimento, sua justa apreciação dos que estavam ao seu redor (...)”

Vejam bem: "sua justa apreciação dos que estavam em seu redor". Não era nenhum bobo. Sabia ver bem qual era a realidade, como eram as coisas. Era um homem vivo e esperto.

“(...) seu perfeito bom gosto em matéria de vestes e mobiliário - ele não gostava, p.ex., de nada que fosse espalhafatoso. Tinha uma completa aversão a toda vã glória e presunção”.

Vejam: perfeito bom gosto em matéria de vestes e mobiliário. Se conhecessem as salas de congregações marianas e sacristias do tempo que eu freqüentava o movimento católico eram de meter medo, incríveis de feias, de mau gosto, de quebradas, de espatifadas... Assim era mais ou menos pelo Brasil inteiro. Esse pobre preto, pelo contrário: tinha bom gosto, comprava coisas acertadas, tinha noção do que era um bonito móvel. Entendia do assunto. Por quê? Não me interessa só saber que Toussaint era assim. Interessa-me que era assim, porque era um filho da Santa Igreja. [Palmas.]

* Deu-me alegria esse entusiasmo

Os senhores me venceram, porque, ao contrário do que costumo fazer, quando começam aplausos que tendem a estender-se, dar um sinal para parar, como se tratava de aplaudir este fato – a fecundidade espiritual, sobrenatural, especial – de pertencermos à Santa Igreja Católica Apostólica Romana, fonte de toda a verdade e de todo o bem, eu pensei: "Não vou interromper. Poderão bater quantas palmas quiserem". Bateram tantas que eu julguei que era necessário cortar. Dá-me alegria. Nunca eu cortei palmas, ao mesmo tempo, com tanta alegria e tanto pesar.

Com tanta alegria, por ver aplaudir isto que está no centro do espírito da TFP: é propriamente a medula de seu espírito, compreender o que é Igreja e de Seu papel em todo o plano da Salvação. Com tristeza, porque gostaria que os senhores aplaudissem a noite inteira sem parar. O espírito da Igreja nos ensina que até em aplaudir existe uma certa medida. Chegada à medida, eu tive que cortar. Deu-me alegria esse entusiasmo.

"Eu me lembro, continua essa antiga cliente, de como invariavelmente consultava a dignidade dos outros e a sua própria". (E narra como exemplo o caso de uma dama francesa, sua cliente que, admirada por sua virtude, lhe pediu que guardasse um banco para ela na igreja, no domingo seguinte. "Certamente, Madame, respondeu ele, a senhora será acomodada". Quando ela chegou, ele a conduziu ao banco de Mme. Depau, que estava vago. "Eu esperava sentar-me em seu banco", disse-lhe ela. "Oh!, não madame, respondeu ele. Não seria próprio"). Quando minha irmã e eu éramos crianças – comenta ainda – ele costumava dançar para nós como costumavam dançar no tempo em que meus pais eram jovens (fins do século XVIII). Se bem que o estilo fosse tão diferente, suas atitudes eram fáceis e graciosas".

Não sei se entenderam a questão da Madame: ele achou que não estava à altura de reservar um banco para aquela senhora. Então, arranjou o banco de uma outra que estava ausente, e destinou-lhe. Explicou porque não era digno de ficar sentada numa cadeira que era a sua. Vejam o respeito que cabia nisso.

Com certeza, a Madame tinha o Toussaint na conta de santo e queria sentar-se em sua cadeira, porque causa disso. Pudesse um de nós sentar-se numa cadeira onde se sentou Toussaint!...

Pudéssemos comprar a cadeira em que ele se sentava, seria com verdadeiro encantamento e fervor, com entusiasmo, que faríamos isso. Toussaint era humilde, e sabia que sua condição social, pelo amor que tinha à hierarquia social não queria que aquela Madame descesse do grau que lhe convinha. Nem lhe passou pela cabeça, com certeza, que era por causa da sua virtude que ela estava querendo sentar-se na cadeira dele. Tudo é lindo!

"Se bem que perspicaz e encontrando coisas divertidas em várias famílias – segue o mesmo depoimento – ele era cuidadoso em nunca repetir o que se passava nas diferentes casas que freqüentava, e muito menos ainda, no trair a mais leve confiança nele depositada”.

Lembram-se de eu ter dito, na primeira reunião que tivemos sobre Toussaint, o dom que ele tinha de ser muito sério, mas, ao mesmo tempo, divertido e engraçado. Este é um dom que Nossa Senhora dá a muito poucos. Quando dá, deve-se usar. Mas nada pior do que querer ser artificialmente divertido para fazer o bem, porque se fica palhaço. Se há uma coisa que não podemos imitar é o divertimento. É divertido aquele a quem Nossa Senhora deu esse dom.

Aprender coisas e ter jeitos para ser divertido, tenham a certeza: é o caminho para ser palhaço.

“A sra. Emma Cary, descendente de famosa família de Nova York e convertida ao Catolicismo, escrevendo na revista "Ave Maria" no fim do século passado, fala de suas lembraças de Toussaint: "Sua vida era tão perfeita e ele explicava tão bem os ensinamentos da Igreja com simplicidade tão inteligente e corajosa que todo o mundo o honrava enquanto católico”.

Inteligência corajosa. Não é desses homens risonhos que só sabem agradar os outros. Ele dizia com coragem o que queria dizer. Mas tinha o dom de agradar, porque Nossa Senhora lho tinha dado. A alguns de nós, Nossa Senhora deu o dom de espetar.

Não está dito que Bayard, o chevalier sans peur et sans repoche, fosse um homem engraçado. Era trágico, épico, grandioso, e assim devia ser visto. Imaginem Bayard aprendendo piadas para contar... Se degradava. Toussaint tinha outro papel, outra situação: dele, Nossa Senhora queria isto. Deu-lhe esse dom.

“Ele explicava a devoção à Mãe de Deus com a maior clareza, ou mostrava a união do natural e do sobrenatural no sacerdote... Quando eu era jovem, costumava ouvir protestantes falarem com reverência de dois homens – o "grande" Fénélon e o humilde Pierre Toussaint!". Declara um gentil-homem francês que se hospedou certo tempo em sua casa: "Suas maneiras eram gentis e corteses. Mantinha o mais inafetado bom humor o tempo todo, a mais respeitosa e polida conduta sem a mais leve tintura de servilismo, a conversação natural e livre de artifícios. Pelo seu comportamento, discrição, bom senso, inteira veracidade e fidelidade, poderia ter se desincumbido com credibilidade das funções de um conselheiro de corte ou privado”.

Vejam esse elogio. É o dom de conselho, de que eu falava há pouco.

“Sua polidez, que era uniforme, nunca permitiu um momento de suspeita em sua sinceridade. Esta era o natural transbordamento, a inevitável expressão de seu coração. Eu não posso imaginar que alguém lhe pudesse fazer alguma indignidade". Porque Toussaint não era um homem estudado, muita gente que ficava surpresa com o seu caráter e sem-número de boas obras, atribuía a excelência de seu ser à sua natural disposição. Mas aqueles que o conheceram melhor, sabiam que ele era governado por um alto e nobre princípio. Em um mundo de paixão e erro, é inútil falar de instintos humanos como fonte de virtude. Toussaint refletia profundamente. Ele citava muitas vezes, na sua língua nativa, o Sermão da Montanha, e as bem-aventuranças parecem ter encontrado caminho em seu coração. Sua vida inteira foi de observação e pensamento. Ele tinha um surpreendente discernimento dos espíritos e um maravilhoso tato no classificar seus amigos. Com alguns, mesmo quando sinceramente afeiçoado, ele não era nunca comunicativo porque sabia que não eram judiciosos.

“Com outros com quem tinha diária relação, era cuidadoso em não se comprometer, porque sabia que não eram sinceros. Mas a outros deu por inteiro seu coração. Pierre gostava de escrever cartas. A Biblioteca Pública de Nova York possui 5 caixas com cartas, documentos e anúncios seus. A família Schuyler os guardou durante quase um século antes de os doar. Seus correspondentes foram, desde pessoas de alto nível e consideração, até humildes irmãos de cor. Daremos aqui, alguns extratos de cartas a ele dirigidas pelos últimos para termos uma idéia de como o respeitavam e mesmo veneravam: De 1837 é esta carta de um amigo que faz este depoimento: "O que me pode tocar mais o coração do que receber suas bençãos - as bençãos de um homem religioso? Eu conheci muitos homens e os observei de perto, mas nunca vi um que merecesse como o senhor o nome de homem religioso. Sempre segui seus conselhos, mas agora mais do que nunca, porque há muito poucos como o senhor".

“A seguinte carta é de uma mulher, do Haiti, para Mme. Toussaint: "Depois dos serviços e de toda a gentileza que me proporcionaram quando de minha permanência em Nova York, espero nunca mais esquecê-los. Nós estamos num país onde não se consegue o auxílio de ninguém. Todos dizem que agora são livres e que não servirão mais a ninguém". Depois da Revolução francesa: igualitarismo. Maria-Ana Schuyler, da mais alta sociedade de Nova York, (ao que parece, protestante). Viajando pela Europa, escreveu a uma amiga: "Eu penso em meu caro Toussaint. Apresente-lhe minha estima. Diga-lhe que penso nele constantemente e nunca vou a uma igreja católica sem me lembrar do meu próprio `S. Pedro' (aludindo a Pierre Toussaint)." A Toussaint, a mesma senhora, enviou este bilhete: "Vou às igrejas católicas por toda parte. Elas são grandes e antigas. Sempre me lembro do meu `Saint Pierre' e frequentemente me ajoelho e rezo por ele de todo o meu coração".

“A limpeza e a ordem de sua casa eram surpreendentes. Toussaint comprou uma casa agradável e ampla na rua Franklin que serviria de abrigo a todos que a ele recorriam. Como ele e a esposa gozavam de excelente saúde, e ele era muito mais velho, Toussaint nunca supôs que pudesse sobreviver a ela. Mas Deus havia disposto de outro modo. A saúde de Juliette começou a decair, alguns sintomas alarmantes apareceram; e ele não pôde mais fechar os olhos à realidade. Uma das amigas da sociedade narrou: "Ia freqüentemente visitar Juliette. Entre seu quarto e o de seu marido havia uma saleta que estava decorada com um crucifixo, um genuflexório assim como muitos outros símbolos da fé Católica, dados a Toussaint, e alí cuidadosamente entesourados. `Ah!, suspirava Juliette, ele reza por mim aí. É o único conforto que tem. Em breve ficará só. Pobre Toussaint!'" Quando ela morreu, foi um golpe pungente para ele. Nunca mais se recuperou (estava com 85 anos). Contudo, dizia constantemente: "É a vontade de Deus". E, manhã após manhã, mesmo sob neve e gelo, com seu passo lento e trôpego, era ele visto em seu caminho para a Missa à qual nunca deixara de assistir diariamente durante sessenta anos, mantendo esta prática até poucos meses antes da morte.

“Uma senhora francesa comentava: "ele me fez o penteado para a Primeira Comunhão, para o meu casamento, para batizados, bailes e festas. Nos enterros, doenças e apuros, estava sempre presente". Outra afirmou: "o grande incêndio de 1835 transformou drasticamente nossa fortuna. A primeira pessoa que nos foi visitar no dia seguinte foi ele, para nos oferecer seus préstimos e simpatia". Quando vi Toussaint pela última vez – comenta a autora – percebi que seus dias estavam contados e que ele já se encontrava nas orlas da eternidade. Estava fraco, sentado em uma cadeira de braços, recostado em travesseiros, vestido com um robe de chambre. Raramente vi mais perfeita representação de um gentil-homem”.

O homem que recebia reconhecer a superioridade dos outros, nascido escravo, dele essa senhora dizia: "Raramente vi mais perfeita representação de um gentil-homem". Podia ser assim perfeitamente.

* Elevado à nobreza pela Igreja, post mortem

“De uma sua antiga cliente, que o ia visitar diariamente na última doença, transcrevemos algumas notas: "Toussaint estava na cama hoje. Ele diz que é o lugar mais confortável para ele agora ou, como se exprimiu em francês: "il ne peut pas être mieux" (Não pode estar melhor). Estava sonolento e meio confuso, mas calmo, alegre e plácido, o que é expressão de seu comportamento verdadeiramente religioso. "Ele me disse que recebeu sua última Comunhão pela qual estava sôfrego, e mencionou que duas Irmãs da Caridade o foram ver e rezaram com ele. Fala do excelente tratamento que recebe de sua dedicada enfermeira – que é branca, e diz: "Tudo está bem". "Quando entrei em seu quarto na segunda-feira ele reanimou-se um pouco e, olhando para cima, disse: "Dieu est avec moi" (Deus está comigo).

“Quando lhe perguntei se queria algo, respondeu: "Rien sur la terre" (Da terra, nada). Eu não pensei que ele estivesse tão perto das portas do céu. Mas, na quinta-feira ao meio dia, seu espírito foi liberado de seu fardo. Quanto eu sentirei sua falta, pois o via todos os dias, todos os dias!". De uma outra de suas ex-clientes, nora de Mme. Schuyler, recebi esta nota: "Fui sábado assistir ao funeral de Toussaint. Houve Missa solene, incenso, velas, ricos paramentos, música triste e solene. A Igreja deu tudo o que poderia dar a um príncipe ou nobre”.

Isso é ser elevado à nobreza pela Igreja post mortem.

“O celebrante, seu amigo, Pe. Qüin, fez a prédica. Não se referiu nenhuma vez à cor ou origem do falecido. Um estranho não teria suspeitado que um homem de cor e de humilde origem jazesse ali entre nós. Toussaint não deixou parentes para chorarem sua morte. Contudo, muitos dos presentes sentiram que haviam perdido alguém que constantemente tinha um sábio conselho para o rico ou palavras de encorajamento para o pobre, e todos estavam muito gratos por o terem conhecido". "Quando Juliette morreu, continua ela, Toussaint pediu que nenhum dos seus amigos brancos seguisse seus restos mortais. Seu pedido foi lembrado agora e respeitado. Todos permaneceram atrás quando o caixão foi levado da igreja por seus irmãos de cor. Mas, quando ele descia à sua última morada, muitos se reuniram em torno de seu túmulo". Assim viveu e morreu Pierre Toussaint. Toussaint havia apontado como seus testamentários os irmãos Schuyler, George Lee e Robert Lee. O documento é uma expressão final de sua gentileza e generosidade. Entre seus pertences, os dois irmãos encontraram a última coleta de Pierre para os pobres, anotada metodicamente, até os centavos. Toussaint foi enterrado ao lado de Juliette e de Euphemie no Old St. Patrick's Cemitery, em Old Street”. [Palmas]

* Palavras finais 

Meus caros, são onze e quarenta. Entretanto, tinha uma palavrinha rápida a dizer aos senhores. Ela diz respeito à primeira parte de nossa reunião, Toussaint, e à segunda parte, as graças de sexta-feira. Vou dizer-lhes qual é o vínculo que, no meu pensamento, neste instante, liga essas duas partes da reunião.

* Toussaint não podia prever o entusiasmo que hoje, aqui, suscitaria sua vida: Seu nome converteu-se em um estandarte!

Se pudéssemos entrar nas cogitações de Toussaint, qual seria a sua surpresa, quando soubesse que no ano de 1991, o mundo estaria dividido nas circunstâncias em que está, bons reduzidos ao que estão, mas que haveria pelo mundo inteiro uma TFP que se expandiria por toda a parte?

Qual seria a surpresa e seu encantamento, ao saber, que os campos vão-se definindo cada vez mais, e que há de um lado uma Revolução que vence e está estabelecida por toda a parte, e, de outro lado, uma Contra-Revolução que, por toda a parte, está contestando a Revolução e, assim, começou uma grande batalhada?

Começou – mais de que uma batalha, no sentido não cruento da palavra, talvez, de futuro, evolua para tal – uma grande guerra universal entre a verdade e o erro, o bem e o mal, o pulcro e o hediondo, que são exatamente a IV Revolução e V Revolução.

Como Toussaint ficaria surpreso de saber que a sua modesta existência – acantonado na cidade de Nova Iorque, longe de ter a irradiação mundial que tem hoje, acabada de sair da condição colonial, começando apenas a sua caminhada prodigiosa pelas avenidas da fortuna – poderia servir, como está servindo agora, de um dos estandartes na luta prodigiosa da Contra-Revolução contra a Revolução.

Do alto do Céu, de onde contempla estas coisas, como sua glória acidental aumenta, e de quanta alegria se sente inundado, e que graças dará a Nossa Senhora, por saber que não só fez bem à cidade de Nova Iorque, mas que ele é um lábaro, um estandarte, e que os bons olhando-o, tomam energia e alento, vêem as coisas mais claramente e caminham mais firme no ataque à Revolução.

* Assim também, há uma promessa para todos nós: nossos nomes serão estandartes no Fim do Mundo

Este fato tão esplendido na vida de Toussaint é uma promessa para todos nós, porque também a veremos um dia, se cumprirmos o nosso dever como ele cumpriu o dele. Isto é, se formos contra-revolucionários como ele foi, no seu tempo e circunstâncias, levando nosso dever de lutadores da Contra-Revolução até o último ponto, à última dedicação, até o supremo ato de amor, até o ato de fé mais cego e mais confiante e mais incondicional que se possa imaginar, a união mais estrita, mais submissa, mais enlevada a Nossa Senhora, à adoração mais inteira, mais reverente, mais inebriada – Sanguis Christi, inebria me – a Nosso Senhor Jesus Cristo.

Se estimulados por todos estes fatores entrarmos na luta até o fim, ao longo do Reino de Maria, nossos nomes serão estandartes. No Céu, isso ser-nos-á motivo de alegria. Alegria, sobretudo, quando, no futuro, num dia ignoto mas que virá, depois do Reino de Maria, surgirem os dias de tribulação extrema e o fim do mundo, os maus triunfantes nos insultarem, estremecerem de ódio, lembrando-se que outros poderão repetir contra eles, o que fizemos com seus percursores. A recordação do que tivermos feito pelo favor e graça de Maria será a sua intranqüilidade, estragar-lhes-á a sua má alegria, no meio dos triunfos que alcançarem.

* Increpação que farão Elias e Enoc ao Anticristo

No momento, em que Elias e Enoch aparecerem se lembrarão de nós [Palmas], e dirão a esses sinistros mandarins ou tiranos a terríveis palavras:

"Vós vos encheis de pavor, lembrando-vos deles. Sabiam e tinham razão, pois nós somos incomparavelmente maiores do que eles. Nós viemos aqui para vos enfrentar. A partir do momento em que vós nos destruirdes e nossos corpos jazerem em praça pública, trocando vós presentes de alegria, porque fomos derrotados, no livro dos decretos eternos, um novo se elaborarará.

"Ó Anticristo, ó Anticristo, fatuo e vasio. Na aparência, poderoso, mas menos que um verme, a tua hora então terá chegado. Virá o Filho de Deus. O dia está próximo e com um sopro de sua boca te liqüidará!" [Palmas]

* A angústia e a alegria dos justos que fiquem vivos depois do martírio de Elias e Enoc

Estou imaginado os últimos homens que restarão, no período entre a morte de Elias e de Enoch e o extermínio do Anticristo por Nosso Senhor Jesus Cristo. Quando Elias e Enoch estiverem estendidos em praça pública e os poucos bons que restarem, depois de terem lutado de modo insano, visto milagres se multiplicarem ao longo de seu caminho, virem que chegaram Elias e Enoch e que venceram, mas, afinal, mortos por ordem o Anticristo ou até pessoalmente por ele – não saberia dizer, não me recordo bem da narração – serão tentados de desânimo. Dirão: "No mundo inteiro somos cinco, dez, não mais do que isso. Acabamos de ser completamente derrotados. Nada é mais nada, na terra de ninguém. O mundo está entregue a esses celerados que trocam entre si banquetes. Dir-se-ia que Deus está com as costas voltadas para nós. Impunemente celebram sua vitória de criminosos. Riem-se de nós, que estamos reduzidos a um porãozinho pequeno, com um toquinho de vela aceso, cochichando as nossas amarguras e esperanças, perguntando-nos: `Como será? Como será?'"

Esperarão mais tempo do que supunham. Esse intervalo quanto tempo poderá durar. Não será um tempo que desanime os bons ou, pelo menos, exponha suas almas ao perigo do desânimo? Entretanto, o que sucederá? 

* A ressurreição dos mortos e a vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo

Num determinado momento, que ninguém poderá prever, ápice – em que mais convenha para a glória de Nosso Senhor Jesus Cristo, de Nossa Senhora e da Igreja – um estralo imenso que, em plena noite, encherá de luz o Céu, de ponta a ponta, Nosso Senhor virá à Terra para julgar os vivos e os mortos.

Antes disso, uma tuba majestosa, festiva, imperativa, enchendo os espaços com um só som despertará todos os mortos. Os justos ressuscitarão. Os precitos transidos de um temor tremendo, porque percebem o que lhes irá acontecer. Os justos numa alegria sobrenatural.

No meio das sombras da noite, quando ainda o estralo não houve e quando o Justo por excelência não se mostrou ainda no alto dos céus, eles já se vêem, já se sentem ressurrectos, já se apalpam... Viveram em séculos diferentes, tiveram papéis diferentes e falaram línguas diversas, mas já se conhecem. Todos os justos se conhecem, nesta ordem superior. Passam e os precitos ressurrectos vão enchendo as grutas e as cavernas, penetrando nas cavidades da Terra para se esconder e fugir do castigo. Procurarão voar até outros astros para ver se escapam à punição de Deus, até que, enfim, venha o Filho do Homem, em pompa e majestade para julgar os vivos e mortos.

* O fim da luta da Revolução e da Contra-Revolução: o Juízo Final, e a condenação dos precitos para o Inferno

Terá, então, terminado a luta da Revolução e da Contra-Revolução? Ainda não! Há o julgamento. E, com ele, a condenação. Os demônios que houver esparsos pela Terra recebem uma ordem imperativa:

"Voltai a vossos covis imundos. Voltai para as vossas eternas torturas, com vergonha, desprezo e castigo da cólera divina. Voltai de modo feio. Voltai de modo ridículo. Voltai tremendo de medo, acovardados e achincalhados. É o que mereceis! Parti para o achincalhe eterno, miseráveis!

"E, Vós, ó homens que negastes a Deus; ó vós que quisestes acabar com a concórdia feliz entre o sacerdócio e o império, que Leão XIII cantou em sua encíclica; Vós, que encontrastes homens, quando vos lançáveis à vossa aventura, que disseram: `Momento houve dessa conjunção feliz do sacerdócio e do império, momento haverá, momento está já havendo, porque o que haverá já está nascendo, em que essa feliz concórdia renascerá e o Reino de Maria existirá'; Vós todos que lutastes pela Revolução e não vos arrependestes, ide para o inferno! [Palmas]

"Já uma vez das alturas luminosas do Céu, vós os precipitastes no Inferno. Agora estão aqui seus filhos sobre a Terra, chegou mais uma vez a vossa, Anjos do Céu, precipitai no Inferno toda essa gente. Limpai de sua presença esta Terra, para que pertença inteira a Mim, que sou Deus, e aos filhos da Luz, que são meus filhos. Chegou a hora!"

* A glória dos justos com Nosso Senhor e Nossa Senhora

Nosso Senhor Jesus Cristo, com resplendor cada vez maior; Nossa Senhora também com enlevo de glória cada vez maior olhando para Seu Divino Filho; os Anjos cada vez mais luminosos e a Santíssima Trindade resplandecendo de modo inenarrável, aparecerão todos os justos, começará um cântico e todos se elevarão juntos gradualmente ao Céu. Entrados no Céu, terá começado a eternidade. Fechou-se a História, acabou a luta da Revolução e da Contra-Revolução. A Contra-Revolução venceu!

Nessa luta, um dos estandartes trará o nome de Toussaint. Outros estandartes trarão os nomes de todos nós, é o que nos alegrará por toda a eternidade.

Meus caros, vamos encerrar.


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