Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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 "Folha de S. Paulo"

 

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11 de novembro de 1973 

Perón na trilha de Salvador Allende

Concluo hoje minhas considerações sobre a inspiração, nitidamente de extrema esquerda, que vai tomando o governo de Perón.

O sr. José Ber Gelbard, Ministro da Economia do efêmero governo Campora, encaminhou ao legislativo vinte projetos de lei, boa parte deles já aprovados, e outros em pauta para aprovação no legislativo. Desses projetos, cada qual é mais esquerdista que o outro. Sua aplicação, feita em conjunto, porá a Argentina numa situação muito análoga à do Chile de Allende. Bem entendido, com a seqüela de crises econômicas que no Chile, como por toda a parte, a socialização acarreta.

Dada a falta de espaço, não comento esses projetos. Aliás, eles falam por si a quem quer que conheça um pouco as matérias sobre as quais versam.

Limito-me, pois, a dar uma resenha muito sumária de vários dentre eles.

A solidariedade do Governo Perón com essa ominosa legislação, já aprovada ou in fieri, criadora de injustiças e miséria, se manifesta em dois fatos iniludíveis. O Sr. José Ber Gelbard continua como ministro de Perón. E, falando ao Congresso argentino em 30 de agosto p.p., o velho caudilho exortou os seus membros a aprovarem o quanto antes todas as leis enviadas ao legislativo durante o período presidencial de Campora.

Lei de nacionalização de depósitos bancários. Foi aprovada pelo Congresso em 1º de Agosto p.p. e já se acha regulamentada pelo Banco Central. Dispõe ela que todos os depósitos recebidos pelos Bancos particulares ficam sob gestão e responsabilidade do Banco Central. Os Bancos particulares se converteram, assim, em meros agentes daquele Banco oficial, recebendo comissão pelos serviços que executam. Somente podem eles fazer empréstimos a quem, e do modo por que, o Banco Central autorize. As operações especiais ficam sujeitas, em cada caso, à consulta do Banco Central.

Lei de Imposto de renda potencial da terra. Aprovou-a o Congresso em 11 de setembro p.p. Institui um cadastro de todos os imóveis rurais, no qual deverá vir indicado o valor de cada qual. Cada proprietário deverá apresentar, sob juramento, uma declaração do valor de sua propriedade. Se ele declarar um valor inferior ao real, expor-se-á a uma desapropriação. Se, pelo contrário, declarar um valor alto demais, ficará arruinado por um imposto anual, que chega até 4% sobre o valor da terra. A rentabilidade normal de uma propriedade agrícola na Argentina não é muito maior do que essa. Assim, ocorrendo qualquer erro na declaração, o proprietário facilmente se verá arruinado.

Prorrogação dos arrendamentos urbanos. Estão suspensos os despejos dos locatários de imóveis urbanos. Assim, o proprietário urbano se vê inteiramente desarmado ante o inquilino.

Prorrogação das execuções hipotecárias. Foi aprovado pelo Senado um projeto de lei suspendendo até 31 de julho de 1974 as ações de execução de hipotecas, mesmo as que já tenham sentença passada em julgado.

Censo da propriedade urbana. No dia 23 de agosto foi convertido em lei um projeto que ordena ao Poder Executivo iniciar dentro de 90 dias e terminar dentro de 180, um recenseamento das propriedades urbanas, do qual constem o número de inquilinos por unidade habitacional; a idade e estado civil de cada qual; a data da construção do prédio; o número de cômodos disponíveis, etc.

Do mesmo modo serão recenseadas as residências desocupadas, esclarecendo se estão, ou não, à venda.

É fácil perceber que esse censo prepara uma redistribuição compulsória das habitações, segundo o mais genuíno estilo comunista.

Lei do monopólio do comércio de carnes. A Câmara dos Deputados aprovou o projeto de reforma do Estatuto da Junta Nacional de Carnes, mediante o qual o Estado fica facultado a chamar a si o monopólio do comércio da carne, ou a autorizar a intervenção em cooperativas de açougueiros. Falta agora a aprovação do Senado.

Mediante decreto n. 597/73 de 20 de agosto p.p., o Poder Executivo fez cessar as atividades do tradicional grêmio dos "matarifes", isto é, dos pequenos frigoríficos e matadouros para provisão dos açougues de Buenos Aires, e da Grande Buenos Aires. Esses pequenos frigoríficos foram substituídos pelos grandes frigoríficos e por duas entidades estatais: FERCAM e CIFEM. Simultaneamente, em 21 de agosto, o Poder Executivo decretou a intervenção na Corporação dos Produtores de Carne (CAP), proprietária de vários frigoríficos que fornecem carne para o consumo interno, bem como a exportam. A CAP pertence aos produtores agropecuários.

Essas medidas, acrescidas pelo tabelamento dos preços máximos, já em vigor para as vendas de gado, outorgam ao Estado um crescente monopólio do comércio de carne.

Falência do grupo DELTEC. A Corte Suprema confirmou a sentença de um juiz esquerdista decretando a falência do frigorífico Swift. Além disso, estendeu a falência a outras companhias pertencentes ao grupo internacional DELTEC. Entre essas empresas encontram-se o Engenho da Esperança S/A, a Provita S/A, o Complexo Avícola Ibri S/A e outras. No dia 5 de setembro o governo resolveu intervir em todas essas empresas e colocá-las na "área social" - para usar a terminologia empregada pela Unidade Popular no Chile. Essas empresas não estavam, entretanto, em condições que exigissem a falência.

Monopólio do comércio de cereais. No dia 25 de agosto, o Senado deu sua aprovação a um projeto de lei que autoriza o Estado a monopolizar todo o comércio de cereais. Se a lei for aprovada também pela Câmara, só o Estado poderá comprar cereais, armazená-los, vendê-los ou exportá-los. Nenhuma empresa privada, nacional ou estrangeira, poderá dedicar-se a tal comércio. Somente cooperativas poderão ser autorizadas a tal.

Corporação de Empresas Nacionais. Também obteve a sanção do Senado o projeto de lei de corporação de Empresas Nacionais. Esta Corporação será destinada a administrar todas as empresas que pertencem ou venham pertencer ao Estado, função análoga a que no Chile de Allende teve a CORFO. É o instrumento burocrático necessário para manejar ampla gama de empresas transferidas para a "área social", como, por exemplo, a Swift.

Outros projetos de lei apresentados pelo Poder Executivo, em pauta para serem aprovados pelo Legislativo:

Lei de terras inexploradas. Autoriza o Estado a dar terras privadas em arrendamento compulsório. O preço do arrendamento é fixado pelo Estado e pode vigorar até por 20 anos.

Lei instituindo a Corporação da pequena indústria. Permite centralizar e controlar as pequenas indústrias, e provocar a fusão de empresas, quando forem consideradas supérfluas, ou por razão de melhor exploração. Fomentará a co-gestão e a participação dos operários nos lucros das empresas.

Lei de empresas estrangeiras. Estabelece um regime sumamente estrito para as empresas estrangeiras, e dispõe, a longo prazo, a paulatina estatização de todas elas.

Imagine o leitor um pobre país sujeito simultaneamente à pressão e à distorção de todas estas leis férreas: o final será uma catástrofe como a do Chile...