Se o Brasil não quiser ser a China

 

O “Legionário”, N.º 217, 8 de novembro de 1936

 

O “Legionário” não é um órgão político. Por esta razão, ainda não lhe parece oportuno emitir conceitos sobre as diversas candidaturas que se vão delineando claramente na tela da política nacional. Por enquanto, nenhuma destas candidaturas se definiu de modo preciso, no que toca os princípios básicos da civilização católica no Brasil. Quando muito temos ouvido, uma ou outra vez, vagas afirmações cristãs, que absolutamente não nos bastam. Quando encaixada no vocabulário político a palavra “cristão”, é como os remédios de homeopatia, que admitem diversas dinamizações. Ora, nós católicos não admitimos um cristianismo dinamizado ou diluído. Só nos contentamos com o cristianismo total, isto é, só nos damos satisfeitos quando nos falam positiva e claramente de catolicismo, e, enquanto não aparecer uma candidatura que nos fale em alto e bom tom dos direitos da Igreja Católica, Apostólica e Romana, prometendo respeitá-los e apresentando garantias morais suficientes para nos persuadir que essas promessas não serão vãs, não descruzaremos os braços.

Como cidadãos é certo, poderemos sentir nossas preferências por um ou por outro lado, mas como católicos só há um preço mediante o qual se possa obter nossa simpatia: é o respeito a nosso direito de consciência. É, pois, com um olhar de inteira neutralidade, que assistimos por hora às manobras tendentes a consolidar as diversas candidaturas que vão surgindo.

Desde já, porém, devemos declarar, que, acima dos interesses pessoais e mesquinhos ligados à questão da sucessão presidencial, todos os brasileiros devem colocar três questões fundamentais, cuja solução não poderá e não deverá ser prejudicada pelas lutas políticas, por mais violentas que venham a ser. Passemos a examinar essas três questões:

Em primeiro lugar, é necessário que os dirigentes de todas as forças políticas anticomunistas não se esqueçam de que a Pátria espera delas um combate sem tréguas aos inimigos da Civilização.

Não somos da opinião de que as forças anticomunistas se devam fundir em uma agremiação única, para dar combate à hidra vermelha. Um partido que abrangesse simultaneamente católicos e protestantes, liberais e integralistas, monarquistas e republicanos, seria politicamente um monstro. Só cérebros primários poderiam conceber a possibilidade de se constituir um tal agrupamento.

No entretanto, convém que liberais, integralistas, monarquistas, republicanos, etc., não se esqueçam de que a Pátria espera de todos eles uma irredutível hostilidade perante os comunistas.

A opinião pública deverá fulminar com um violento anátema a corrente que, para granjear adeptos, se atreve a “flirtar” com a esquerda, no momento entre todos grave, em que o Tribunal Especial vai condenar os inimigos da Nação.

A uma tal corrente, aos seus parlamentares, seus leaders”, seu candidato, os católicos não deveriam dar um minuto de trégua ou de quartel: em tempo de guerra, os soldados fiéis atiram sem vacilação contra os desertores que se passam para as linhas inimigas.

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Outra coisa que deverá ser poupada na luta política é a unidade nacional. Consideramos simplesmente vergonhoso que certos jornais procurem transformar a luta pela sucessão presidencial em uma vil corrida dos Estados mais fortes, para a conquista do poder. A eventual luta entre algum candidato mineiro, com algum gaúcho ou algum paulista não pode ser transformada em luta de Minas contra São Paulo ou o Rio Grande porque se, de quatro em quatro anos, Minas, São Paulo e o Rio Grande lutarem entre si, como lutariam pequenas nações independentes, dentro de cinqüenta anos não haverá mais Brasil.

E é preciso que os sonhadores e os tolos não se iludam a respeito do seguinte: no dia em que o Brasil se fracionasse em duas ou três repúblicas Independentes, uma delas cairia na mão dos ingleses, outra na dos americanos, e parte da outra na dos alemães e japoneses. Independente, só ficaria na melhor das hipóteses, São Paulo, a quem restaria o destino inglório de viver trêmulo e humilhado entre povos escravos, em vez de viver altivo e tranqüilo em um povo de irmãos.

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Finalmente a terceira coisa que é preciso salvaguardar é a paz.

Os telegramas do sul nos falam em certos rumores de que alguém estaria armando tropas, para resolver a seu modo a questão da sucessão presidencial.

Ora, saiba-o algum caudilho que esteja às ocultas afiando a sua faca, o recurso às armas é no momento atual um destes crimes que não tem absolvição no Tribunal do patriotismo.

Não queremos entrar, aqui, em discussões doutrinárias sobre o direito de revolução. Basta-nos afirmar que, na dura quadra em que vivemos, deflagrar a guerra civil é um crime de que só algum Calabar não se envergonhará.

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Se os brasileiros souberem manter incólumes estes três grandes princípios que devem nortear sua atividade política, o Brasil poderá enfrentar a tormenta.

Mas se a ambição de politiqueiros vulgares arrastar nos conflitos a paz nacional, a unidade da pátria ou a estabilidade da propriedade e da família, o Brasil só terá um destino diante de si: o da China.