Legionário, N.º 252, 11 de julho de 1937

Os católicos e a sucessão presidencial (II)

Em nosso último artigo de fundo, procuramos dar o devido relevo a uma verdade muito pouco conhecida, mas de capital importância para a restauração religiosa do Brasil. Como demonstramos, o problema da nossa recatolicisação implica no problema da conquista dos meios necessários para formar a opinião pública. Recatolicisar significa tornar católica uma opinião que o é incompletamente, ou não o é de todo. Só depois da conquista das inteligências, é que poderá ser empreendida de forma duradoura e definitiva a reforma das instituições, dos hábitos, e das leis. Se, pois, o nosso problema consiste em conquistar para nós a opinião pública, é evidente que devemos nos assenhorear dos meios de ação que de forma mais eficiente nos conduzam a isto. É este - no plano natural, convém não esquecer - o mais importante problema com que nos defrontamos.

Convém acentuar, a este propósito, um aspecto particularíssimo do problema. A conquista dos meios necessários para dirigir a opinião pública para a Verdade não constitui apenas uma providência desejável e conveniente, mas um passo indispensável, se quisermos conjurar a grande crise que se precipita sobre o Brasil.

Se, como até agora, procurarmos impressionar a opinião pública tão somente por meio de conferências públicas, e de jornais semanários ou bi-semanários de pequena circulação, perderemos certamente a partida, salva a hipótese de um milagre que nossa inércia não tem o direito de esperar. Um jornal diário de circulação mediana tem 40.000 leitores ao menos. Qual a associação, qual o conferencista, qual o comício capaz de reunir em sessão diária 40.000 ouvintes? Evidentemente nenhum.

Uma estação de rádio poderá ter, diariamente, quatro ou cinco dezenas de milhares de ouvintes. Qual a conferência, qual a associação capaz de substituir o rádio, e de fazer chegar a um igual número de pessoas a palavra de Deus? Também nenhum.

Uma Universidade funcionando normalmente pode fornecer ao Brasil anualmente algumas centenas de profissionais com toda a formação religiosa necessária, desde as humanidades, até a mais alta cultura. Qual a associação capaz de, em um ano, converter profissionais acatólicos ou esmerar a formação de profissionais já católicos, a ponto de substituir neles os péssimos preconceitos de nossas universidades pela sã formação que pode dar uma Universidade católica? Nenhuma.

As capelanias nas Forças Armadas e, principalmente, na Escola Militar, podem produzir um reerguimento religioso notável entre nossos militares, porque a Capelania leva a palavra de Deus ao militar, em lugar de esperar que este venha procurá-la nas igrejas. Qual a associação militar capaz de operar semelhante transformação religiosa? Também nenhuma.

O ensino religioso nas escolas públicas difunde de tal maneira a instrução religiosa, que não há centro catequético por mais perfeito ou organizado que o possa substituir.

Quanto aos sindicatos operários, poderíamos fazer para eles, ponto por ponto, as afirmações feitas quanto aos militares. É preciso levar a palavra de Deus às massas, já que estas não freqüentam mais a Casa de Deus. E, sem a conquista dessas massas, o que será possível fazer?

Finalmente, o casamento religioso com efeitos civis evita tantas uniões ilícitas, que cremos certamente que vinte anos de trabalho apostólico feito por alguma associação para legalizar uniões ilícitas não seria capaz de legalizar uniões mais numerosas de que aquelas que o casamento religioso poderia evitar.

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O que acabamos de demonstrar não prova que se deva abandonar o trabalho em associações que os católicos tem feito. Esse trabalho é básico, é fundamental, e deve estar na raiz de todos os demais, sob pena de se desmoronar todo o edifício de nossa ação social.

Mas é necessário tornar bem claro que os católicos devem entrar em uma nova fase de ação. Ao trabalho associativo, que eles devem continuar a desenvolver intenssissimamente, devem eles somar outro, que é o trabalho para conquista das posições e leis estratégicas, que lhes permitam envolver de um só golpe centenas de milhares de almas.

Todas as correntes de opinião estão procurando conquistar o Brasil. E ou a Igreja conserva, nesse momento melindrosíssimo, a realeza do Brasil para Nosso Senhor Jesus Cristo, ou o Brasil atravessará crises religiosas que nos conduzirão provavelmente a conseqüências imprevisíveis.

E para conservar o Brasil para Nosso Senhor e para a Santa Igreja, é necessário que os católicos lancem mão dos meios necessários para isto. Diz um provérbio francês que “qui veut la fin, veut les moyens”. É a pura verdade. Cumpre-nos, pois, trabalhar.

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Começamos, agora, a entrar no terreno da sucessão presidencial.

Quase todas as nossas grandes reivindicações tem com a política estreitíssimas afinidades. Não porque sejam de natureza política. Mas por que dependem de uma regulamentação legal que será feita pelos políticos, para os políticos, e por meio dos políticos.

Nós, católicos, temos freqüentemente uma noção errada disto. Se nos tirarem o ensino religioso, moveremos céus e terras. Mas se fizerem uma lei que dificulte indiretamente a abertura de novas estações de rádio, por exemplo, continuaremos inteiramente indiferentes. Isto a despeito de ser o rádio católico um meio de difusão de idéias talvez não inferior ao próprio ensino religioso. Quanto ao jornal católico e as demais reivindicações, diremos algo em outro artigo.

Mas queremos, antes de finalizar este, fazer uma pergunta a nossos leitores. Sobre todas essas reivindicações importantíssimas, o que prometem fazer os candidatos à presidência da República? Explicitamente, claramente, o que disseram eles até agora sobre estes pontos vitalíssimos para nós?

Que saibamos, nada. Exceto alguns vagos propósitos recristianizadores.

E agora uma pergunta: não percebem nossos leitores, pelo que já ficou dito, que é um absurdo votar em A. B. ou C. sem saber o que acham de todos estes assuntos? Despreocupar-se disto para só olhar para a politicagem não é mandar às urtigas as convicções religiosas, para entronizar somente a paixão política?