Legionário, N.º 632, 17 de setembro de 1944

7 DIAS EM REVISTA

O mais trágico da situação em que o mundo se debatia antes da guerra consistia na alternativa que lhe parecia imposta pelas circunstâncias: nazismo ou comunismo. Derrotado o nazismo, a alternativa se rompeu. O mundo deve voltar-se ativamente contra o comunismo, e, assim, destruir o outro inimigo capital que lhe resta, o "inimigo 2".

Assim, o LEGIONÁRIO, na expectativa do armistício que se avizinha, se apresenta para uma campanha ativa contra o comunismo, campanha omnímoda, que deve abranger o problema comunista sob todos os seus aspectos.

É uma verdadeira felicidade que a destruição do nazismo permita a todas as forças católicas do mundo a realização de um "putsch" espiritual contra os sectários de Marx.

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Para isto, entretanto, é imperiosamente necessário que o nazismo não renasça. É uma ilusão imaginar-se que a derrota militar de Hitler representa o esmagamento definitivo do nazismo. O nazismo é resultante de uma série de defeitos profundos da mentalidade moderna. Não seria difícil apontar nos discursos de muito "leader" anti-nazista afirmações e conceitos tipicamente nazistas. Muito liberal há, como o famoso Monsieur Jourdain, que era prosador "sans le savoir"; isto é, são nazistas sem o saber. O nazismo é, em última análise, a expressão requintada do socialismo. Por onde todo o socialista tem seu "it" de nazista. Aliás, os nazistas se intitulam oficialmente socialistas: são "nacional-socialistas" segundo a linguagem oficial do partido.

A História tem reviravoltas curiosas. Napoleão, que se chamou justamente "la Revolution en bottes", foi derrotado pela Europa coligada. Reuniu-se o Congresso de Viena, para "por entre parêntesis a Revolução". E o que aconteceu? O Congresso foi um continuador da obra revolucionária em muitos pontos de uma importância capital. Por exemplo, o Congresso ousou o que Napoleão não ousara, e destruiu, com protesto categórico da Santa Sé, o Sacro Império Romano Alemão, peça essencial da relojoaria política européia, que estava longe de ser a velheira gótica irremediavelmente perdida, que em geral os historiadores nos descrevem.

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Ora, Hitler não foi o nazismo. Hitler foi apenas o homem que condensou certas tendências ideológicas e sociais que pairavam no ar, o charlatão-tipo, que soube simbolizar essas tendências graças à sua extraordinária qualidade de mímico, a figura de proa que um grupo de políticos manejou para realizar uma ideologia. Caído Hitler, as tendências que ele representou continuarão a pairar no ar, um pouco por toda a parte, densas na Alemanha, mais tênues em outros lugares, por toda a parte dotada de uma força de expansão própria ao mal. A queda de Hitler será um acidente mais ou menos grave, na história do nazismo, mas não representa seu fim.

Se, pois, queremos enfrentar claramente o comunismo cuidemos de remover não só os escombros do nazismo, mas os fatores ideológicos e sociais de que ele brotou uma vez, e de que brotará de novo se nos descuidarmos.

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Neste sentido, é preciso especialmente, ter força e prudência. Força para destruir dentro e fora da Alemanha tudo que deve ser destruído. Prudência para não destruir o que não deve ser destruído, para não exacerbar o que deve continuar vivo. Os erros [do Tratado] de Versailles não se devem mais repetir. Nunca, nunca mais, dentro do mundo germânico, devemos ter como pólo central a Prússia e Berlim. O verdadeiro consiste em transferir o polo para Viena. Nisto, mais que em qualquer medidas de outra natureza, está o segredo de uma boa parte do problema.

Mas não basta. O nazismo é filho do tecnicismo moderno e precisa ser vencido por uma utilização diferente da técnica. Em nossa civilização de aço, o nazista é bem o homem de aço, cérebro de aço, coração de aço, mãos de aço, nervos de aço - o "Stalin" - ideal, que funciona, como um acessório de aço nesse mundo pagão.

Aí está o problema. O uso cristão da técnica, em contraposição com o uso pagão da técnica, eis toda a questão.

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Lembremo-la, porque parte dos destinos do mundo, está sendo jogado na conferência de Quebec, e é essencial que os problemas fundamentais não estejam longe das vistas dos homens que, assoberbados pelos problemas imediatos que seus brilhantes e auspiciosíssimos triunfos causam, podem perder talvez a noção dos elementos fundamentais e imutáveis que caracterizam a crise contemporânea.

"Christus heri, hodie ipse et in saecula". Cristo ontem, hoje, em todos os séculos, eis a grande Verdade que deve iluminar a paz cujos albores o mundo, libertado por oras do pesadelo nazista, começa a antegozar.