O “Legionário" Nº: 744,    10-11-1946

7 Dias em Revista

Segundo um telegrama publicado nesta capital, 22 sacerdotes católicos da Colômbia romperam com a Santa Igreja, decidindo constituir uma seita nacional independente de Roma. Não sabemos se o fato é verdadeiro. Mas infelizmente o tom do telegrama não é nada tranqüilizador.

Não ousamos, pois, desmenti-lo. Admitindo que seja real, com que palavras o comentar? Há certos fatos tão nefandos que, segundo diz a imaginação popular, quando chega ao Céu o conhecimento deles, os Anjos de Deus velam suas faces. Façamos o mesmo.

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Deixando de comentar o fato em si mesmo, não podemos entretanto abstrair de um pormenor importantíssimo, mencionado pelo telegrama em questão: esses infelizes apóstatas pensam ligar sua igreja nacional à seita aqui fundada pelo desgraçado ex-Bispo de Maura, e "enriquecida" pelos Bispos que ele aqui sagrou.

À primeira vista, a notícia parece contraditória. Como podem estar unidas duas igrejas estritamente nacionais, se cada uma tem um âmbito que não excede o das fronteiras pátrias?

O problema está longe de ser insolúvel. Também as igrejas cismáticas do Oriente constituem um só todo, mas do ponto de vista do seu governo interno são estritamente nacionais. Seria esta a fórmula?

Neste caso, caberia outra pergunta. Já vimos que as igrejas nacionais cismáticas estão sendo apoiadas pela URSS ativamente. Que lucro para elas se pudessem incorporar a si essas igrejolas nacionais da América Latina.

Moscou tem a ganhar com o curso que as coisas estão tomando. E isto justifica outra pergunta: não estará Moscou articulando com isto com que tanto pode lucrar?

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Nunca será supérfluo acentuar que as almas fracas não se devem abalar com desgraças destas. Um bispo que apostata, um sacerdote que rompe com a Santa Igreja é como uma coluna do firmamento que se parte, ou uma estrela que se apaga no Céu.

Choremos, pois, aos pés do altar acontecimentos como estes. Mas não permitamos que eles nos abalem a Fé. Nada seria mais estúpido.

A santidade da Igreja não consiste em que jamais se verifiquem em suas fileiras fatos como estes. Senão, a santidade da Igreja teria morrido com a apostasia de Judas. A história de nossa religião contém numerosos fatos ainda mais tristes do que estes. Enumeremos apenas alguns.

Quando do cisma do Oriente, nações inteiras, tendo à testa seus bispos e seus sacerdotes, apostataram miseravelmente da unidade romana. Quando do protestantismo, bispos, sacerdotes seculares, às vezes conventos quase inteiros se deixaram contaminar pelo erro. Quando da Revolução Francesa, as apostasias atingiram todos os graus da hierarquia, e grande massa de fiéis. Nem por isto a Igreja de Deus deixou de ser santa por sua doutrina inalterável, que contém o mais alto ideal moral que a mente possa excogitar, ideal que por suas próprias forças os homens decaídos pelo pecado original e prejudicados pelos outros pecados posteriores, não podem sequer conhecer e amar. A santidade da Igreja se manifesta pelo fato de que ela, e só ela é capaz de produzir e ininterruptamente produz estes modelos supremos de perfeição moral, que são os santos. Fora da Igreja, não existe a verdadeira perfeição moral, que é fruto exclusivo do solo espiritual do catolicismo. Só a Igreja, pois, é verdadeiramente santa.

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E, para fechar de uma vez por todas a boca dos Srs. comunistas e protestantes, como de costume cheia de chacotas a respeito de fatos tão tristes, lembramos que estas apostasias de modo algum podem induzir a que se desconsidere o clero que permanece fiel.

Há, houve, haverá ainda sacerdotes e até bispos apóstatas. Para um católico, do ponto de vista de sua perseverança na Igreja, isto não tem absolutamente nada de mais. O primeiro dos apóstatas foi Judas, como dissemos, e nem por isto se há de pretender que os seus irmãos de colégio apostólico não fossem verdadeiramente homens de Deus.

O que provam tais apostasias? Quanto mais freqüentes forem, tanto mais demonstram que é árdua a perseverança nos deveres que a Igreja impõe ao seu sacerdote. E tanto mais devem inspirar admiração pelos que suportam com heroísmo sobrenatural o peso desses deveres.

Imagine-se uma batalha terrível, em que muitos soldados desertam, tornando ainda mais penosa a situação de um grupo que continua a lutar. Este grupo, porém, não desanima, e antes redobra de intrepidez.

Perguntamos: porque alguns fugiram desse exército, devemos desprezar os numerosos heróis que continuam a combater? Ou devemos admirá-los ainda mais?