Legionário, N.º 793, 19 de outubro de 1947

7 Dias em Revista

Telegrama procedente de Londres noticiou que, há poucos dias convidados por uma associação de "Cavaleiros da Mesa Redonda" jantaram juntos, na Capital britânica, S.E. o Cardeal Griffin, Arcebispo de Londres, o "arcebispo" anglicano da Cantuária, um bispo cismático, e outras personalidades de destaque pertencentes à Igreja e a várias igrejas. O telegrama acrescentava que um dos motivos dessa reunião consistia em dar aos "fiéis" (termo genérico para designar igualmente infiéis e fiéis) do mundo inteiro um exemplo de íntimo e cordial convívio.

É bem possível que S. E. o Cardeal Arcebispo de Londres tivesse realmente comparecido a tal reunião. Teria sem dúvida, para isto, motivos especiais. Mas é falso que ele tenha querido, com isto, dar um exemplo a ser ordinária e geralmente seguido pelos fiéis do mundo inteiro.

Uma primeira razão de nossa afirmativa salta aos olhos: o ilustre purpurado está à testa de uma das dioceses mais difíceis do mundo. Londres ainda é a maior cidade contemporânea. Suas ruas tem uma extensão total com a qual se faria um caminho indo de Lisboa aos Montes Urais. Na sua maioria, a população da grande metrópole londrina é protestante. As condições em que se desenvolve o Catolicismo na Inglaterra são difíceis e pouco seguras. Tudo isto dá para formar uma cruz bastante grande para os ombros de um prelado. Não cremos que ele tivesse querido agravar o peso desta cruz acrescentando-lhe o peso do mundo inteiro. Já basta - e quanto! - Londres para pastorear. É absolutamente improvável que ele tenha querido ainda ocupar-se em dar exemplos para o resto do mundo.

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Acresce que, se é perfeitamente explicável e legítimo que um prelado compareça a reuniões como estas em circunstâncias muito excepcionais, e portanto muito raras, é obvio que todo o seu esforço consiste, não em incitar os fiéis a fazer o mesmo, mas em lhes sugerir toda a cautela na matéria.

Com efeito, a Igreja vê com apreensão o convívio dos fiéis com os infiéis, e [...] Ela desaconselha formalmente que os fiéis se misturem habitualmente aos hereges. O convívio entre fiéis e infiéis não é, nem pode ser aconselhado pela Igreja.

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Hoje em dia “as liberdades humanas” cedem diariamente maior lugar às doutrinas  utilitárias do planismo. O que é bom para a sociedade é considerado automaticamente bom para o indivíduo. O culto de Deus está sendo substituído pelo culto do homem. Desse ponto à veneração do Estado não vai senão um passo. O homem então não será mais que uma peça da máquina, um dente da engrenagem. Estaria então destituído de todos seus direitos. Palavras sensatas, criteriosas, profundas essas que acabamos de reproduzir. Elas mostram claramente que o grande perigo que os católicos de nossos dias devem recear não é mais o liberalismo, mas a ação invasora dessa verdadeira hidra que se chama o Estado contemporâneo.

De quem [são] estas palavras que certamente desagradarão aos mesmos leitores que já não gostaram de nosso comentário sobre as supostas intenções com que o cardeal Griffin compareceu ao jantar dos “Cavaleiros da Mesa Redonda”? Do próprio cardeal Griffin.

 Estamos bem certos de que, se S.E. não quis de modo algum inculcar, ao mundo inteiro, com seu exemplo, o convívio entre católicos e hereges, terá contudo grande prazer em saber que ensinamentos tão justos, sábios, oportunos, ecoam e impressionam, mesmo fora de sua vasta Arquidiocese.

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 As eleições municipais de Roma acabaram sendo uma verdadeira luta entre católicos e comunistas. Todos os outros aspectos do pleito desapareceram em face deste. Ninguém se interessou em saber se os outros partidos ganharam ou perderam. Mas quiseram, todos, saber se na capital do mundo católico teriam maioria de votos os católicos ou os anti-católicos.

 Este fato, que o noticiário dos jornais deixou bem patente, prova que tínhamos toda razão em afirmar que o próprio fundo da política italiana - como aliás do mundo inteiro – é, no momento presente, a luta entre o paganismo totalitário e panteista, e o catolicismo.

 Este fato fundamental, certos próceres do Partido Democrata Cristão da Itália parecem ter desejado encobri-lo ou atenuá-lo de todos os modos. E, por isto, engendraram a famosa “política da mão estendida”, que não passa de um colossal equívoco.

 Mas o próprio PDC italiano fez a experiência de quanto era inviável a sua política, e, quisesse ou não, acabou funcionando como frente única dos católicos contra o comunismo. Preciosa lição: peçamos a Deus que seja também proveitosa.

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 Lutas destas são forçosamente de vida e morte. Por isto, muito bem andaram os monarquistas italianos pedindo ao parlamento, por intermédio do deputado Beneditini, a dissolução do Partido Comunista.

 É possível que alguns anticomunistas de água de flor de laranja ajam julgado violenta e antidemocrática a proposta do parlamentar monárquico. Isto não obstante, os comunistas - que não são jamais do tipo "flor de laranja" - e que se preocupam muito pouco com a democracia, e a democraticidade de seus processos políticos, entenderam as coisas de outro modo. Um deputado comunista Bardini, ao ouvir esta proposta, se levantou, cobriu de doestos o parlamentar monárquico, e só não o agrediu fisicamente pela interferência de outros deputados presentes.

 Assim, pois, os comunistas têm o direito de matar na Rússia o Czar e toda a sua família, exterminar os nobres como se fossem cães, e colocar os monarquistas fora da lei: isto é a democracia. Mas os monarquistas não podem pedir na Itália o fechamento do Partido Comunista: isto é antidemocrático.