Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Minha

 

Vida Pública

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Parte XII

Livros e Campanhas de grande repercussão na década de 1990

 

Capítulo V

Campanha contra a Reforma Agrária e a Reforma Urbana no governo Collor (1992)

A comissão de sócios e cooperadores da TFP no Congresso Nacional para a entrega do abaixo-assinado contra o projeto de Reforma Agrária do governo Collor

 

1. Projeto de reformas stalinistas: mudança completa da fisionomia do País

Enquanto eu trabalhava o manifesto contra o Tratado de Maastricht [77], estava tramitando no Brasil um projeto de lei de Reforma Agrária e outro de Reforma Urbana, ambos terrivelmente esquerdistas e que feriam a fundo dois princípios fundamentais da civilização cristã e dois princípios básicos da economia brasileira e da economia de todo o mundo ocidental: a propriedade privada e a livre iniciativa.

Se esses projetos fossem aprovados, o Brasil teria entrado na maior crise que teve desde a Independência [78].

No governo Collor, parlamentares brasileiros não tiveram dúvidas em dar acelerado andamento aos projetos de lei 11D/91 e 71B/89, sobre Reforma Agrária, e ao projeto de lei 5.788/90, sobre Reforma Urbana, que, sob a alegação de regulamentar os dispositivos do Título VII, Capítulos II e III, da Constituição Federal, visavam instaurar no Brasil as duas mais gigantescas reformas até então propostas por legisladores não declaradamente comunistas [79].

Esses projetos, se aprovados, teriam feito passar nosso País do regime da livre iniciativa e da propriedade privada, para o de um capitalismo de Estado quase completo [80].

Dita reforma conferia atribuições com amplidão típica de uma ditadura stalinista - ou mais ou menos tanto - ao Estado, o qual ficaria com poderes absolutos para pôr e dispor segundo o arbítrio de seus mais altos órgãos, dos bens e da situação pessoal de todos os agricultores e pecuaristas do País [81].

Quanto à Reforma Urbana, os terrenos das cidades ficavam tão sujeitos à desapropriação quanto os do campo. E o direito do proprietário urbano se via reduzido a muito pouco.

Basta um exemplo para se ver o alcance dessa lei: ninguém poderia construir uma casa sem que a prefeitura visse se essa casa oferecia condições para que nela habitasse o maior número possível de pessoas. Ou seja, o proprietário não teria direito de construir sua casa como quisesse, mas ficava obrigado a ajeitar-se dentro de uma casa que a prefeitura planejou para ele. Mais outra ocasião para perseguições políticas [82].

Tínhamos, portanto, que fechar essa porta também [83].

2. Vigorosa campanha de abaixo-assinado: 1.133.932 brasileiros pedem plebiscito

Esses projetos de lei em questão - os da Reforma Agrária e da Reforma Urbana - se arrastaram por largo tempo, silenciosos e ignorados, pelos meandros da tramitação dos processos parlamentares.

Quando o período legislativo ordinário de 1992 já se encerrara, os Srs. deputados foram convocados a prolongá-lo extraordinariamente, por motivos da crise política nacional que redundaria na renúncia do Presidente Collor de Melo.

Coincidentemente, os projetos de regulamentação da Reforma Agrária foram tirados de sua morosidade, e foram apresentados de modo surpreendente ao Plenário em regime de urgência urgentíssima.

A pressa foi tal que, na hora da votação, violentando as regras de praxe, o relator, deputado Odelmo Leão, leu um texto final do qual os parlamentares não tinham conhecimento prévio.

O projeto acabou sendo aprovado pelo voto simbólico das lideranças, uma vez que não havia em plenário quorum suficiente para a votação [84].

Quanto ao projeto de lei da Reforma Urbana, por sua vez, foi posto na pauta das matérias [85].

Quer dizer, o povo não percebeu, o povo não foi informado, os jornais deram muito pouca notícia a respeito desse fato de um alcance tão enorme para os destinos da Nação. E, por mero voto de liderança, o assunto ia diretamente para o Senado.

A TFP, inteirada disso por nosso representante em Brasília, imediatamente tomou posição. E mandou um telex para o Presidente Collor, bem como para o presidente da Câmara dos Deputados, o Sr. Ibsen Pinheiro, e para o Presidente do Senado, o Sr. Mauro Benevides, mostrando os erros que havia nessa maneira de conduzir o assunto e fazendo uma proposta.

A essência da proposta da TFP era a seguinte.

Já que se promoveu um plebiscito a respeito de questões como monarquia e república, ou parlamentarismo e presidencialismo, nós não compreendíamos que sobre uma reforma tão imensa, como a Reforma Agrária, também não se fizesse um plebiscito.

E pedimos então que o Senado e a Câmara pedissem um plebiscito ou referendo, para que cada brasileiro fosse consultado sobre se queria ou não essa Reforma Agrária (eu tinha a vivíssima esperança de que, por maioria esmagadora, o plebiscito ou referendo indicaria a recusa do povo brasileiro à Reforma Agrária).

Nós pedíamos portanto que o País fosse ouvido [86].

Simultaneamente, para pleitear a mencionada realização de um plebiscito, a TFP organizou, a partir do dia 11 de agosto de 1992, um abaixo-assinado nacional em que 344 coletores, atuando 7 horas por dia, em 15 Estados, num total de 98 Municípios - coadjuvados nessa ingente tarefa por 135 correspondentes da entidade, que a ela consagraram suas horas de lazer - conseguiram, em cerca de um mês de campanha, 1.133.932 assinaturas.

O abaixo-assinado dirigia-se igualmente aos Srs. Presidente da República, Dr. Fernando Collor de Mello, Presidente do Senado, Dr. Mauro Benevides, e Presidente da Câmara dos Deputados, Dr. Ibsen Pinheiro [87] e contou com uma acolhida popular que a nós mesmos nos causou surpresa.

Tínhamos certeza da boa acolhida popular, mas não pensávamos que ela chegasse a ser tão calorosa. No primeiro dia de campanha, andávamos já por perto de cem mil assinaturas [88].

Uma comissão de 20 sócios e cooperadores da TFP entregou, no dia 1º de dezembro de 1992, no protocolo do Palácio do Planalto, 40 caixas contendo 117.973 folhas de abaixo-assinado com o aludido número de assinaturas. Analogamente, foram encaminhados ofícios aos presidentes do Senado e da Câmara Federal, comunicando a entrega daquela documentação no Palácio presidencial* [89].

* Na data da entrega desse abaixo-assinado, Collor de Mello estava interinamente afastado da função de Presidente, devido ao processo de impeachment em curso na Câmara e no Senado. Ocupava então a Presidência da República o Vice-Presidente Itamar Franco. A 29 de dezembro de 1992, Collor renunciou ao mandato.

 

 

3. Campanha contra a Reforma Agrária no governo Fernando Henrique: audiência com o Ministro da Agricultura  (1995)

Três anos depois, já no governo de Fernando Henrique Cardoso, houve um desdobramento desse lance contra a Reforma Agrária.

Organizada pela Campanha SOS Fazendeiro, da TFP, uma comissão seleta de brasileiros esteve em Brasília no dia 17 de maio de 1995, para levar ao Ministro Andrade Vieira, da Agricultura, Abastecimento e Reforma Agrária, a manifestação de sua inconformidade com a Reforma Agrária*.

* Essa Reforma Agrária estava sendo impulsionada sob a égide do Presidente Fernando Henrique Cardoso.

A comissão incluía sacerdotes (entre eles, o então Cônego, hoje Monsenhor José Luis M. Villac), representantes de sindicatos, produtores e trabalhadores rurais e o deputado federal Lael Varella. Vários produtores apresentaram com calor, nessa entrevista de 30 minutos, as reivindicações da classe. Esta foi a primeira reação dos agropecuaristas contra o pacote de desapropriações de quase um milhão de hectares, decretado pelo Presidente Fernando Henrique em seus primeiros 90 dias de governo.

Na ocasião, foram entregues ao Ministro 30.310 petições de brasileiros inconformes com a Reforma Agrária como vinha sendo aplicada no País. O porta-voz da Comissão foi o Dr. Plinio Vidigal Xavier da Silveira, diretor da TFP (cfr. Catolicismo n° 534, junho de 1995).

Assim, pela voz da TFP mais de 30 mil pessoas de todo o Brasil pediam ao governo que apresentasse ao grande público um levantamento dos resultados obtidos pela Reforma Agrária, nas terras em que ela já havia sido implantada desde 1964. E que dissesse ao País que vantagem houve na execução dessa Reforma Agrária.

Tratava-se de um pedido cujo caráter justo entrava pelos olhos.

A acolhida do Ministro foi amável, mas nem tudo na vida se resolve com amabilidades.

Quando está em foco uma injustiça, o assunto só se resolve por meio da justiça. E nós só poderíamos nos sentir satisfeitos quando notássemos que o plano injusto da Reforma Agrária não era mais executado.

Todos sabiam que o imenso território brasileiro comportava vastidões em grande parte ainda não ocupadas por ninguém. Ele é tão extenso que está bem acima das proporções necessárias para a atual população do País.

Ora, se há gente sem terra, por que essa gente não era instalada onde havia terra sem gente, sobretudo no Norte do Brasil? Por que razão o governo, que era o proprietário ocioso dessas terras incultas, lançava mão de propriedades que pertenciam a outros?

4. No que deu a Reforma Agrária até agora? Assentamentos se transformaram em favelas rurais

De mais a mais, a Reforma Agrária já provara ser um fracasso. Fazendas outrora prósperas foram brutalmente sujeitas ao processo de favelização.

Já em1987 a TFP denunciara o resultado "favelizador" da Reforma Agrária socialista. O Prof. Plinio publicou um manifesto em que desnuda o real resultado da RA e apresenta o livro acima mostrado [Ver aqui].

Tanto é que, na audiência concedida pelo Ministro da Agricultura, um sócio da TFP, Dr. Paulo Henrique Chaves, manifestou cordial e respeitosamente ao Sr. Andrade Vieira estar “muito preocupado com o fracasso dos assentamentos”.

A isto, o Sr. Ministro redargüiu: “Alguns”.

Dr. Paulo Henrique então acrescentou: “Eu já visitei uns 10 ou 12 assentamentos. Todos os que eu visitei até hoje, um total fracasso”. O Ministro ficou em silêncio.

Uma vez que isso era assim, tornava-se indispensável ao governo parar com as desapropriações, dar as provas de que a Reforma Agrária não estava favelizando o campo, abrir um debate nacional sobre o assunto e só depois continuar, se fosse o caso. O que não fosse isso, não seria democracia.

Cortesmente pedíamos ao governo as provas do contrário, caso elas existissem. Que fossem publicadas — dizíamos — para que o povo as conhecesse, e mostrar que nós estávamos enganados. Que nos desmentissem! Que o Ministro da Reforma Agrária publicasse os resultados obtidos com a aplicação da Reforma Agrária até aquela data. Que falasse, nós estávamos ali pedindo.

Se essa publicação não fosse feita, se ela não fosse convincente, se um debate sério e proveitoso não viesse a arejar o assunto, ficaria para a História que a Reforma Agrária tinha sido aplicada sem documentação que provasse seu acerto.

Ela seria assim imposta ao País, e aplicada na marra por uma lei injusta. E ficaria patente que não houve progresso nenhum, mas sim a vitória da demagogia que soube impor sua opinião ao governo em detrimento do País [90].

 


NOTAS

[77] Percurso 12/9/92.

[79] O caminho estreito que não tem saída, Catolicismo n° 502, outubro de 1992.

[81] Ameaças para o Brasil: reformas socialistas, press release do Serviço de Imprensa, dezembro de 1992.

[83] Despacho França 28/7/92.

[84] CCEE 12/7/92.

[86] CCEE 12/7/92.

[88] Entrevista à Folha da Tarde (gravação), 18/8/92.

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