"O Jornal", Rio de Janeiro, 28 de julho de 1972

Segurança claudicante

Cogita-se presentemente de realizar, em Helsinque, uma reunião pan-européia de segurança, à qual comparecerão representantes das nações de aquém e além cortina de ferro. E, provavelmente, também delegados dos Estados Unidos e Canadá. A perspectiva desse relevante acontecimento sugere um rápido comentário.

Pergunto-me se a Espanha será convidada para o conclave. Até aqui, não se chegou ao conhecimento qualquer notícia neste sentido. O que parece indicar que não o será. Ora, a terra da Reconquista e do Cid participa da Europa, não só por toda sorte de vínculos históricos e culturais, como pela mais evidente continuidade geográfica. – Qual poderia ser, então, o motivo dessa estranhável exclusão?

O problema estará no regime político. Personalidades influentes da "Europa dos Dez" – entre as quais Sicco Mansholt – se têm declarado contrários à inclusão da Espanha no nascente grupo europeu, porque classificam de ditatorial o regime franquista. Em rigor de lógica, este motivo levaria os Dez a vetar a presença da Espanha em Helsinque.

Não indago aqui se é justa essa apreciação sobre o regime espanhol. Pergunto apenas se serão coerentes com ela, outros aspectos da projetada conferência.

A possível exclusão da Espanha só se faria em nome de um princípio: ditadura, não. Esta viola a liberdade individual. Liberdade para os homens e para as nações: é sob a égide desta aspiração que se realizará o encontro pan-europeu de segurança.

Não julgo aqui esse princípio. Tomo-o como se apresenta. Em face dele, pergunto: – Se é em nome da liberdade dos indivíduos e dos povos que a Europa se reunirá, como explicar a presença das nações comunistas? Haverá ditadura mais feroz do que a soviética? Haverá opressão de povos mais evidente do que a praticada por Moscou sobre os satélites? Como se pode rejeitar a Espanha, sob a alegação de que ali não existe liberdade inteira para os indivíduos, e se aceitar os países do mundo comunista, no qual não existe liberdade nenhuma, nem para os indivíduos, nem para as nações?

A meu ver, ou se realizam com urgência plebiscitos, sob controle internacional, para apurar se os russos desejam o regime soviético e os satélites desejam a dominação russa; ou então a Conferência de Helsinque construirá sua obra sobre a contradição, má base para uma segurança séria.

Sejamos realistas, replicará alguém, a Rússia jamais aceitará a realização desses plebiscitos, porque sabe que os perderia. Respondo: sejamos, então, ainda mais realistas, e reconheçamos que essa segurança claudicante, apoiada numa contradição escandalosa imposta pela ameaça soviética, de nada valerá.