Serviço de Imprensa da TFP, 15 de abril de 1992

Absenteísmo sadio, mas não sábio

Realizaram-se recentemente eleições gerais na Colômbia e os resultados indicaram uma baixa de comparecimento impressionante.

Segundo os jornais, foram votar somente 30% dos eleitores. Sendo que, do total de votantes, 17% votaram em branco.

Se a grande maioria do eleitorado não quer votar, porque não tem empenho em que alguns dos candidatos sejam eleitos, isso significa, em última análise, que ela não quer saber de nenhum daqueles que foram apresentados. E isso é uma derrota simultânea de todos os partidos. No fundo, uma derrota do regime representativo naquela nação.

A situação de todos esses partidos é mais ou menos como a de um homem que oferece um banquete a um grande número de amigos, e apenas 30% de seus convidados comparecem. Equivale a dizer que o círculo de relações daquele homem está indisposto com ele. O seu banquete não atrai, a sua conversa não interessa, a sua companhia não agrada. Tal é o resultado dessa atitude do eleitorado. E isto, aliás, vai sendo cada vez mais assim na América do Sul e na Europa.

O significado ideológico dessa atitude do eleitorado não é a favor de uma corrente contra outra, de conservadores contra liberais, ou vice-versa, porque é do corpo eleitoral contra todos os candidatos ou quase todos.

Essa atitude que perigo oferece para os restos de ordem normal, natural, digamos de ordem cristã que ainda há em nosso continente? Tal rejeição não é sadia? Não se trata – pensará alguém – de uma reação contra um amontoado de abusos que desagradam o povo?

Poderíamos dizer que ela é sadia, mas não é sábia. O matiz se exprime na mudança de uma letra por outra.

De fato, não basta rejeitar algo, é preciso saber o que se quer. E da atitude geral do povo deveriam emergir tendências boas, e outras equipes políticas dispostas a substituir as atuais, com outros programas. Ora, isso não se dá.

Há nisso um exemplo característico da atitude moderna diante da crise de nossos dias. A massa das pessoas não gosta dos partidos e dos candidatos, mas não sabe o que deseja. Nem toma diante daquilo de que não gosta uma atitude suficientemente reativa para pensar como deveria ser o que conviria vir em substituição do que lhe desagrada. As pessoas simplesmente estão aborrecidas, descontentes com a atual situação, e a empurram com a ponta dos pés, como quem diz: "levem embora essa tralha, porque eu não a quero".

– Então o que é que V. quer? indagará alguém.

– Eu não quero pensar, não quero me ocupar com isso, eu quero me interessar tão-só pela minha vidinha particular e não pela causa pública. Aconteça o que acontecer, muito trágico não poderá ser. E por causa disso eu me abstenho!

Ora, essa atitude de absenteísmo, de ausência, de não presença nos debates políticos, causa o vácuo, e esse vácuo é exatamente um passo para o caos. A situação presente não pende para este ou aquele lado, ela pende para o caos. É o pior dos vazios, que não é o vazio onde não há nada, mas onde necessariamente elementos de desordem se infiltram.

É uma atitude de alma disposta a receber qualquer surpresa, a não reagir diante de nenhum absurdo. O que a maioria não quer é incomodar-se. É o statu quo, o gozo da vidinha imediata e sem interesse por mais nada.

Poder-se-ia objetar talvez que, na Colômbia, esse absenteísmo não é de hoje. Ele data de há muito. Tal objeção não prova que ele não seja um mal, mas que semelhante mal é inveterado.

Aliás, o mesmo mal está longe de ser só colombiano. No país irmão, o voto não é obrigatório, e por isso quase ninguém vota.

À vista disso, perguntamos: se no Brasil houvesse a liberdade de não votar, quem votaria? Talvez seja preferível nem responder...