A verdadeira majestade supõe reflexão, risco e a dor – A majestade da Santa Igreja Católica

Auditório São Miguel, 27 de novembro de 1982 — Sábado, Santo do Dia

 

A D V E R T Ê N C I A

O presente texto é adaptação de transcrição de gravação de conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a sócios e cooperadores da TFP, mantendo portanto o estilo verbal, e não foi revisto pelo autor.

Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras “Revolução” e “Contra-Revolução”, são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plínio Corrêa de Oliveira em seu livro “Revolução e Contra-Revolução“, cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de Catolicismo, em abril de 1959.

 

 

 

A Igreja é a fonte de toda a majestade. E se algo na terra merece ser chamado majestade, não é senão porque participa em algo da Igreja.
Eu compreendo bem a objeção que a chicana poderia fazer: se a majestade é a expressão do poder supremo, o poder supremo não emana necessariamente da Igreja. Houve uma porção de Estados, com poder legítimo e até poderes muito amplos e muito altos na ordem temporal, que não emanaram da Igreja. Assim, por exemplo, os imperadores romanos, os imperadores persas, e de tantos outros potentados que a História conheceu antes de Jesus Cristo. O faraó, por exemplo. Não se pode negar aos faraós uma importante dose de majestade. Como sustentar que sendo anteriores à Igreja, a majestade deles da Igreja emanava? O que quer dizer o Dr. Plinio quando ele vai afirmando inconsideradamente, e logo de cara na sua exposição, que toda majestade emana da Igreja?”
Toda a majestade emana da religião, e com o laicismo não há majestade.
Do ateísmo emana uma vulgaridade carcerária, de campo de concentração, que a fisionomia de Breznev ou de Andropov exprime perfeitamente.
E eu quero dizer que uma vez que a Igreja foi instituída por Nosso Senhor Jesus Cristo, nos povos onde Ela entrou, a majestade só passou a ser dos povos que se deixavam tocar por Ela e se deixavam influenciar por Ela, estes chegaram ao píncaro da majestade.
Os que saíram dela foram perdendo lentamente a majestade, e os poderes supremos do Estado foram perdendo o seu alcandor ponto a ponto, a ponto de chegar a ser o que não é senão um reizinho, um enfeitado diretor de cooperativa de laticínios. Não é mais do que isso…
É claro que os Estados que vivem fora dessa órbita, na medida em que são Estados religiosos e na medida em que eles reconhecem ao poder real uma essência religiosa, nessa medida eles têm alguma majestade. Na medida em que eles negam isso, a majestade se afasta deles. Majestade é conjunta com a religião.
O fato de a majestade ser conjunta com a religião levanta uma outra ideia que é a seguinte: a majestade é conexa com a reflexão, porque religião só pode decorrer de profunda reflexão. Só é profundamente religioso o homem profundamente refletido. O homem que não reflete, que é estúrdio, que é doidivanas, esse não tem religião, esse não tem reflexão e ele é laico na medida em que ele é estúrdio.
Quando eu vejo uma pessoa, que pode até ser de Comunhão diária, mas que no resto do dia passa brincando, dizendo coisas engraçadas, pensando em coisas fúteis, superficiais, eu tenho vontade de dizer a ele:
Você pode ter uma corrente carregada de medalhas, pode ter um terço com quantas indulgências queira, pode comungar quantas vezes quiser, você é laico! Porque esta risota que é o produto predileto de seu espírito, o que você [faz] quando você pensa, você já pensa para arrancar de si um pensamento engraçado para se divertir e divertir os outros, esta risota é laica, nela não há reflexão e nela não há religião. Por isso nela não há distinção. Meu caro, você não é distinto, você não é sério, você não é homem!
Porque até lá chega a minha censura.
É próprio à condição varonil ter qualquer coisa que participa da majestade, e seja esse homem de que condição social for, tenha ele que papel for na ordem econômica ou social das coisas, pouco importa. Na medida em que ele é homem, ele é sério e tende a algo de majestoso. E se algo disso não há nele, ele não é inteiramente sério.
Mas, mas… majestade envolve reflexão. Não há majestade que não venha de muita reflexão. Qual é a razão disso?
A gente poderia dizer que a majestade não se define apenas como um poder supremo, mas é um poder supremo refletido e querido. Quer dizer, a pessoa para poder exercer o mando supremo, o mando majestático adequadamente – valeria a pena os senhores tomarem as fotografias de alguns reis e verem um pouco as caras deles. Eles não têm reflexão. Absolutamente não tem reflexão. Resultado: eles são muito bem educados, mas os senhores examinem, eles não têm reflexão. Não tendo reflexão, eles de fato não têm majestade.
E a reflexão não é uma reflexão qualquer, é preciso que sobre o cargo supremo eles tenham uma reflexão, que eles compreendam o quê que é ser supremo, o que é a supremacia. Majestade é “major state”, está no estado máximo, está num píncaro portanto, e num pináculo.
E se o sujeito está num alto píncaro, mas tem uma vista fraca por onde ele não consegue senão ver algumas nuvens que estão em torno dele, tanto lhe faria estar no fundo de um galinheiro. E se ele é um rei, ou um potentado dotado de grande poder, mas ele não refletiu a respeito do cargo majestático em qualquer situação dele [que] ele tem, se ele não refletiu nisso, ele não mediu tudo quanto ele simboliza, ele não mediu tudo quanto ele tem que pensar para coordenar tudo e para fazer tudo caminhar para os mais altos fins simbólicos e sobrenaturais – e não apenas para o bem estar administrativo, farmacêutico comum, não é um ministro nem de Bios nem de Mamon, mas de Jesus Cristo que morreu na Cruz por nós… é uma coisa inteiramente mais elevada e não tem comparação.
Se ele não refletiu isso e não compreendeu que braços ele precisa ter para mandar, que vontade ele precisa ter para querer, se ele não compreendeu isso ele não tem majestade autêntica.
A majestade supõe uma reflexão que baixa do céu, uma reflexão ajudada pela graça, iluminada pela graça e elevada pela graça ao seu mais alto alcandor. Sem isso não há majestade.
E é por causa disto, porque tem birra da reflexão, porque a reflexão torna presente ao homem o dever, o risco e a dor – e ter majestade é aceitar o risco, a dor, a reflexão, ainda que seja para ser diretor do Jardim da Luz, compreende o risco que toda administração traz, compreende a reflexão que é preciso ter, compreende a dor que a reflexão e o risco trazem e diz: eu farei! Esse é um grande diretor de jardim, esse tem um grão de majestade!
Se é um tipo folgazão, alegrote, tipo cinema holywoodiano, ou tipo ator de televisão, ele não tem majestade nenhuma, não é capaz de majestade, e não é capaz de ser inteiramente homem no sentido majestoso da palavra.
O mundo contemporâneo, laico por excelência, não pode deixar de ser contrário a essa noção de majestade; o mundo contemporâneo superficial e inimigo da reflexão e da lógica por definição, não pode deixar de ser contrário a esse conceito de majestade; o mundo contemporâneo amigo de tudo quanto é mole e fácil, e detestando a dor e o sofrimento, não pode deixar de ser contrário a essa noção de majestade.
Mas isto não torna essa noção perempta, porque enquanto o mundo for mundo, a ordem de coisas é esta, e na medida em que o mundo se afasta desse conceito, não é o conceito que afunda, é o mundo que afunda!
É mais ou menos como um navio que vai desaparecendo da luz do sol e afundando para o fundo do mar. Esse navio se distancia do sol, mas é um engano pensar que é o sol que vai afundando. É o navio. O sol está parado no alto dos céus!
As grandes verdades, os grandes princípios, as grandes máximas, as grandes normas, os grandes caracteres, as grandes vontades, as grandes resoluções, os grandes planos, as grandes execuções, isso são os aspectos por onde um homem, mesmo de uma condição comum, pode ter majestade. E a essa majestade todo o homem, por pequeno que seja, deve desejar embora ele nisso não entre nenhum pouco em choque com a humildade.
Porque, o que é a majestade? A majestade não é uma faceirice como uma gravata que a gente põe para mostrar para os outros. “Olhe a gravata, veio de Paris, veio de Londres”, não é isso não.
Seja como for, seja como for, a majestade não é enfeite. A majestade nos deixa sempre humildes. Por quê? Porque há uma distinção entre o indivíduo e a majestade que ele tem. O indivíduo que tem majestade se sente sempre pequeno ante a própria majestade; ele compreende sempre que por mais majestoso que ele seja, ele como indivíduo não tem isto. Isso lhe vem da fé, isto lhe vem da influência da Santa Igreja, e ele sempre pode se perguntar se ele levou a sua própria majestade à altura para a qual ele foi criado.
Os senhores querem ter uma ideia dessa altura, pensem nisso: no Céu – consta, segundo a versão corrente – que todos os bem-aventurados, quer dizer, todas as almas que estão lá, sentam-se em tronos, e que esses tronos são os tronos que os demônios deixaram vazios. Quer dizer, todos nós somos levados a brilhar nessa assembleia de reis que há no Céu num trono próprio.
Isto posto, como sempre feita a introdução ao assunto, fica mais fácil nós compreenderemos que ao longo de sua história, desde Pentecostes – o que digo eu desde Pentecostes? – desde o momento em que Nosso Senhor Jesus Cristo morreu – para começar lá – até o momento último em que existir o mundo, o ponto final da história do mundo, a Igreja vai tendo belezas próprias. Ela é uma fonte contínua de majestade e de beleza, que em cada século vai brilhando de uma forma de majestade e de beleza própria, ou em cada era vai brilhando de uma forma de majestade e de beleza própria, que Ela comunica a sociedade temporal na qual ela vive.
E a sociedade temporal toma isto dela como de uma mãe grandiosa, se inspira e se atavia com isso.
Os senhores tomem a mais alta e mais majestosa das instituições temporais que existiu na cristandade: o Sacro Império Romano Alemão. O que foi o Sacro Império Romano Alemão? Não foi outra coisa senão um luzimento da grandeza do Papado. Não houvesse Papas, nós teríamos tiranos. Nós não teríamos imperadores naquele sentido da palavra do Sacro Império.
Os reis católicos, “Rei Cristianíssimo”, “Rei Católico”, “Rei Fidelíssimo”, e assim por diante… – pobres reis da Inglaterra que antes da apostasia se chamavam os “Defensores da Fé” -, que brilho majestoso em tudo isso! Que maravilha! Que estupendo! Que fulgor!

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Ilustração: Foto do Cardeal von Gallen [by Domkapitular Gustav Albers († 1957) – Bildersammlung des Bistumsarchivs Münster, des Erbnehmers der Urheberrechte, CC BY 2.5, https://commons.wikimedia.org/w/index…] e de seu brasão de armas “Nec laudibus nec timore” (indiferente seja aos louvores, seja aos temores) [by I, SajoR, CC BY-SA 2.5, https://commons.wikimedia.org/w/index…]. Para conhecer uma breve biografia sobre quem ficou conhecido como o “Leão de Munster”, clique aqui.

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