Qual o alcance da invocação de Nossa Senhora do Bom Conselho?

Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Qual o alcance da invocação

a Nossa Senhora do Bom Conselho?

 

 

 

 

Santo do Dia, de 16 de dezembro de 1975

 

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Nossa Senhora do Bom Conselho, aliás, mais precisamente Mãe do Bom Conselho – a invocação bem exata é essa – é Mãe considerada enquanto dando um conselho, enquanto dando uma orientação a um filho espiritual dEla, a um filho gerado por Ela na ordem espiritual.

O que é um bom conselho?

Todos nós já sabemos isso: o espírito humano é susceptível de erro, de perplexidades muito grandes, e muitas vezes não é capaz, por si mesmo, de atinar com a solução de um problema que tenha diante de si. Ele precisa de um conselho de uma mentalidade mais alta, que veja mais do que ele, e lhe explique uma coisa, lhe diga algo como é, e lhe trace uma diretriz para seguir.

Nesse sentido, nós podemos imaginar o conselho habitualmente como uma norma para a ação. Esse é o sentido corrente da palavra conselho.

E nesse sentido ainda nós podemos dizer que para toda espécie de ações – mesmo as ações puramente interiores, espirituais – Nossa Senhora pode dar um conselho, pode dar uma norma. Está, por exemplo, uma pessoa solitária, com uma perplexidade espiritual muito grande. Por exemplo, continuará ou não continuará a usar tal tipo de devoção, deixará ou não deixará de se abster de tal outra coisa, como fará?… É um problema puramente interior relativo a um fazer que é um mero fazer do espírito, que não se traduz, a não ser por via de conseqüências, numa operação externa. Mas o homem pode ter perplexidade a esse respeito e tendo perplexidade precisa de um conselho.

O conselho espiritual, o conselho para as dificuldades de apostolado, o conselho para os estudos, o conselho para o trato com os outros, o conselho para tudo. Em todas as circunstâncias o homem precisa do conselho.

Um dos frutos da Civilização Cristã é ter tornado bem clara a necessidade do conselho como norma de vida

Nós podemos mesmo dizer que um dos frutos da Idade Média, da Civilização Cristã, é ter tornado bem clara essa necessidade do conselho como uma norma de vida e até das instituições ocidentais.

Os senhores analisam a primitiva história das monarquias pagãs do Oriente, mesmo das grandes monarquias – Egito, Pérsia, China, Japão –, e os senhores notam que em geral o monarca é um monarca absoluto, que tem o poder de pôr e de dispor dos seus súbditos como entenda, e que não ouve quase conselhos. De vez em quando aparece na história um indivíduo que dá a respeito de uma situação, a um monarca, um determinado conselho. Mas os monarcas terem conselhos, habitualmente, como uma instituição, que eles consultam habitualmente como rotina a respeito das coisas, os senhores não vêem. O monarca está no seu isolamento e resolve as coisas por si mesmo, e se lança. Ele de vez em quando pedirá um conselho a alguém, mas não tem aquilo que chamamos Conselho de Estado.

Nós vemos aparecer na Idade Média, pelo contrário, a instituição do Conselho. Quer dizer, o reconhecimento da falibilidade, da imperfeição do espírito dos mais poderosos monarcas, que por causa disso organizam, todos ou quase todos, habitualmente, Conselhos nomeados por eles, mas que são órgãos coletivos, aos quais costumam levar os seus problemas mais importantes, debatem com eles esses problemas em reunião e de onde sai, a solução que o rei aceita ou não aceita. Mas o rei habitualmente resolve em seu Conselho. Quer dizer, reconhecendo a precariedade, a falibilidade do espírito humano, os monarcas então instituem Conselhos para lhes ajudarem a resolver os seus problemas.

Essa idéia, essa pendência, passou da monarquia para outras formas de governo que havia na Idade Média. As repúblicas aristocráticas governavam-se por Conselhos. Por exemplo, o famoso Conselho dos Dez de Veneza, que assessorava o Doge e que tinha um poder enorme. As repúblicas burguesas, as cidades livres da Alemanha, por exemplo, eram governadas por Conselhos, nesse sentido de que o burgomestre era assessorado, e era a expressão de um Conselho eleito pela cidade.

E foi-se assim afirmando o princípio de que ter um Conselho é o complemento natural de todo governo, e que não se compreende que de um modo ou de outro um governo não seja assessorado e não tenha seus conselheiros.

Mesmo quando a forma de governo é como no Brasil, Estados Unidos, por exemplo, – regimes presidenciais em que não há um ministério que exerça o governo independentemente ou mais ou menos independentemente do chefe como é na Inglaterra, – os ministros são pessoas de confiança do Presidente da República, e é o presidente que governa.

Se os homens têm dificuldade de encontrar a sua própria via em circunstâncias espinhosas, então deve-se pedir a Deus o conselho

Mesmo assim, os senhores têm visto na história desses governos que as decisões importantes são tomadas pelo Presidente da República numa reunião de ministros. Habitualmente, ouve-se todos os ministros sobre coisas de ocasião e importância excepcional, pelo hábito que passou para uma segunda natureza no Ocidente, de que é em Conselho, por meio dos Conselhos que os assuntos verdadeiramente se resolvem.

Mas se isso é assim, e se os homens devem pedir conselhos uns aos outros, se os homens devem reconhecer que eles por si próprios têm dificuldade de encontrar a sua própria via em circunstâncias espinhosas, difíceis, etc., então é sobretudo verdade que o homem podendo-se comunicar com Deus por meio da oração, a Deus peça o conselho. E deve ser um dos hábitos de nossa vida espiritual, uns dos hábitos de nossa piedade pedirmos conselho a Deus. Pedirmos que Deus Nosso Senhor nos ilumine e nos faça compreender aquilo que nós devemos fazer.

Os senhores conhecem o fato, mais de uma vez mencionado por mim, de São Tomás de Aquino, que quando tinha problemas filosóficos muito delicados, muito difíceis e que não conseguia resolver, introduzia a cabeça dentro do sacrário e ficava ali rezando para o Santíssimo Sacramento, até que viesse a solução por ele desejada. Os senhores estão vendo que ele pedia portanto um conselho a respeito dos estudos a Nosso Senhor Sacramentado.

O mais alto, o mais belo conselho é evidentemente de Deus Nosso Senhor, autor de toda verdade, de todo bem, de toda luz, e a quem nós devemos pedir.

Então esta postura de alma de não só pedir conselho aos outros no campo terreno e natural, mas sobretudo de nesse campo natural e no campo sobrenatural pedir conselho a Deus Nosso Senhor, essa postura de alma é a postura católica por excelência.

A atitude habitual de, por meio de jaculatórias, pedir conselhos deveria ser comum em todas perplexidades

Vemos tantas pessoas que se curam de tal doença, de tal outra, vão a Aparecida, deixam objetos de cera para lembrar a cura, pedem graças de toda ordem e recebem essas graças, e às vezes são graças materiais.

Deus Nosso Senhor, a fortiori, que Se encarnou para salvar as nossas almas, e não para salvar os nossos corpos que a morte vai devorar, Deus Nosso Senhor deseja a fortiori nos dirigir, nos fazer conhecer a verdade e o bem nas matérias espirituais, nas matérias que sejam a direção da vida do homem.

E portanto, essa atitude habitual de, por meio de jaculatórias, pedir conselhos, deveria ser comum, deveria ser corrente em todas perplexidades.

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O Prof. Plínio em oração ante o milagroso Afresco de Nossa Senhora do Bom Conselho em Genazzano, Itália, setembro de 1988

Nossa Senhora do Bom Conselho leva a Deus Nosso Senhor nossos pedidos de bons conselhos e é Ela que nos obtém tais graças

Ora, como acontece que Nossa Senhora é a intermediária de todas as graças, nós temos todo fundamento, diante de uma imagem de Nossa Senhora do Bom Conselho, de fazer uma oração considerando que Ela é que leva a Deus Nosso Senhor os nossos pedidos de bons conselhos. E que Ela traz para nós a graça do bom conselho. Quer dizer, aquilo que o Espírito Santo comunica à Ela e que nós devemos saber para nossa orientação.

E então nós entendemos bem o que é a Virgem do Bom Conselho. A Virgem do Bom Conselho é a Virgem por meio da qual nós podemos obter o bom conselho nas nossas aflições, nas nossas perplexidades, nas nossas dificuldades. E este é o sentido da devoção à Nossa Senhora do Bom Conselho.

Aí viria uma resolução prática para nossa vida espiritual: invocarmos muito a Nossa Senhora do Bom Conselho, e não fazermos habitualmente nada de importante sem pedir a Ela o conselho. Mesmo nas coisas pequenas, pedir, porque Nossa Senhora gosta de ser invocada também nas coisas pequenas, nas oportunidades aparentemente secundárias. Nós devemos pedir a Nossa Senhora tudo. Portanto, com freqüência. Nós não sabemos resolver uma coisa: “Minha Mãe, aconselhai-me”. Ainda que seja uma coisa pequena.

Nós somos envolvidos a todo instante pelas influências da Revolução. Se assim é, haverá conselho melhor do que pedir a Nossa Senhora que Ela nos advirta sempre, no interior da alma, contra as coisas revolucionárias? Nos aconselhe sempre: “Meu filho, aquilo é revolucionário, não aceite; aquilo é heterodoxo, não aceite; aquilo conduz ao mal, é imoral, não aceite”.

É preciso tanta sagacidade para a gente se defender contra todas essas influências! Quem melhor pode nos conseguir as luzes, os conselhos portanto, para isso, do que Nossa Senhora do Bom Conselho?

Pedir a Nossa Senhora que nos conceda também os conselhos que não formulamos

Nesse sentido, a invocação de Nossa Senhora do Bom Conselho é idêntica à de Nossa Senhora da fidelidade contra-revolucionária. É por meio dEla, por meio das orações dEla que nós podemos obter essa fidelidade.

E então eu aqui recomendo muito aos senhores que peçam a Nossa Senhora esse conselho, que sejam habitualmente devotos de Nossa Senhora do Bom Conselho, e que peçam a Ela o conselho interno para suas almas, que é dado pela graça do Espírito Santo, da qual São Paulo diz que é tão profunda que entra até a juntura da alma e do espírito.

E eu quereria que isso não ficasse no ar. Eu quereria que os senhores tomassem uma deliberação, que tomassem o hábito de várias vezes por dia pedir conselho à Nossa Senhora.

Os senhores vejam uma coisa curiosa: quantos dos senhores praticam – e sempre com muito resultado – essa devoção às almas do Purgatório, pela qual lhes pedem que os acordem de manhã cedo, a tantas horas. Se as almas do Purgatório por causa de uma pequena oração nos acordam, nos indicam a hora certa, quanto mais Nossa Senhora que é incomparavelmente superior a todos os santos e, portanto, também às almas do Purgatório? Ela que tem uma ciência de Deus como ninguém tem – ninguém vê a Deus como Ela – que é além do mais Mãe de Deus e Onipotência suplicante!

Quantas vezes pode acontecer que Nossa Senhora nos dê um conselho até sem nós pedirmos?

Quer dizer, podemos pedir à Nossa Senhora que Ela nos dê os conselhos que não pedimos, os conselhos que não nos lembramos de pedir, ou que não se tem vontade de receber. Dizer: “Minha Mãe, fazei-me ter o desejo do bom conselho que Vós julgais conveniente me dar, mesmo numa hora em que eu não perceba que aquele assunto é tão importante que vale a pena pedir”.

Quer dizer, pedir para ser aconselhado continuamente por Nossa Senhora.

Bem entendido, bem entendido – eu nem preciso dizer isso – esse conselho no mais das vezes não se dá de modo extraordinário, Nossa Senhora não aparece para dar o conselho. Mas Ela desperta na alma certo pensamento, certa idéia, Ela desvia o espírito para um outro lado, faz notar, de repente, alguma coisa, assim como as almas do purgatório acordam as pessoas de manhã. Elas não aparecem; se aparecessem, eu creio que teriam poucos devotos, porque todo o mundo tem medo de ver – eu sou deles – as almas do outro mundo. Mas elas atuam tão discretamente que a coisa passa. Nossa Senhora, a fortiori, saberá fazê-lo bem.

Por vezes vejo pessoas com perplexidades e tenho vontade de dizer: “Mas meu caro, por que você vem pedir conselho a mim? Você já pediu a Nossa Senhora do Bom Conselho? Não é uma coisa incomparável? Do que adianta eu lhe dar um conselho se Nossa Senhora não reforçar o meu conselho junto à sua alma? Simplesmente pelo valor lógico do meu conselho eu posso muito pouco. Pelo contrário, com o apoio dEla pode-se tudo”.

Então, eu recomendo isso: peçam continuamente, e os senhores poderão ter uma renovação da sua vida espiritual, da eficácia do seu apostolado, da sagacidade dos seus métodos de ação em todos os campos. Nossa Senhora do Bom Conselho é a Conselheira por excelência, Aquela que sabe tudo, Aquela que pode tudo, e Aquela que quer tudo.

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Representação dos dois heróicos albaneses caminhando sobre o Mar Adriático, seguindo a milagrosa pintura de Nossa Senhora do Bom Conselho

A graça do heroísmo tem normalmente como ponto de partida algo que poderíamos chamar de bom conselho

(Alguém pergunta sobre a relação entre a graça do bom conselho e o heroísmo católico, portanto segundo a Lei de Deus e dos homens)

A graça do heroísmo tem normalmente como ponto de partida algo que nós poderíamos chamar de bom conselho. Porque o heroísmo se obtém quando uma alma tem com muita clareza o bem ou a verdade para a qual está se imolando, para a qual vai correr o risco. E não só percebe que aquela coisa é verdadeira e boa, mas percebe o pulchrum, a beleza daquela coisa.

Quando isso brilha muito diante da pessoa, ela é capaz de heroísmos de que não seria capaz quando isto tudo está embaçado. De maneira que o fazer ver isso para se ter o heroísmo necessário, isso é um conselho, porque é um avivamento de horizontes, uma abertura de horizontes, é uma linha de ação virtualmente indicada por Nossa Senhora em determinadas circunstâncias.

Eu vou ser mais terra-a-terra. O senhor imagine um cruzado que vai tomar Jerusalém. Ele está a uma certa distância de Jerusalém, está cansado, um calorão… areias, terras abandonadas, etc. Ele passa por aquilo tudo. De repente, vê Jerusalém. Ele pode ter a seguinte reação de alma: “Agora que eu cheguei, escalar essas muralhas e tomar essa cidade… que aborrecimento!… Uma viagem tão enorme e no fim da viagem uma batalha”.

Mas ele pode ter também um lampejo de alma: “A cidade sagrada onde Nosso Senhor morreu! A cidade sagrada onde foi instituída a Sagrada Eucaristia, foi rezada a primeira Missa! A cidade sacrossanta onde está o Sepulcro de Nosso Senhor Jesus Cristo! Onde Ele ressuscitou! Onde Nossa Senhora morou! Onde Nossa Senhora teve, na cena da Piedade, o seu Divino Filho sobre o colo! Eu não permitirei isso!” Aparece numa maravilha, num lampejo. “Eu vou atacar!” Esse homem exausto vai, escala as muralhas e sobe.

Quer dizer, ele recebeu o quê? Uma iluminação, uma noção especialmente viva daquela magnificência, que no momento fez dele um herói.

O senhor está vendo como o bom conselho pode conduzir ao heroísmo.

Às vezes é de outra maneira. É numa aridez tremenda, em que não se resolve, mas a alma sente dentro dela uma força que diz: “Você está na aridez, mas tem de lutar e lute, porque esse é o seu dever”. E a alma resolve, e na aridez dá a carga de cavalaria e derruba o adversário. É um outro modo altamente meritório em que o conselho se faz no fundo da alma, de um modo que a pessoa nem percebe que foi aconselhada, mas em que recebeu uma força extraordinária para uma circunstância extraordinária. É por esta forma que Nossa Senhora do Bom Conselho nos orienta.

 

 

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