Plinio Corrêa de Oliveira
Não me canso, nem jamais me cansarei de afirmar que o esquerdismo não é um fenômeno de massa, mas tão somente um sintoma — e que triste sintoma — de deterioração das elites. A subversão social encontra seus prosélitos mais radicais e dinâmicos em certas sacristias, universidades, redações de jornal e boates de grã-finos. Mas a fermentação ideológica procedente desses focos não atinge profundamente as massas, como aliás também não a maioria das próprias elites.
Se bem que uma pressão publicitária quase alucinante procure criar a impressão generalizada de que o esquerdismo corresponde ao anelo das multidões a verdade é que estas pouco se interessam por ele. É notório, por exemplo, que as guerrilhas acendidas há alguns anos por Fidel Castro na Colômbia e em outros países sul-americanos se extinguiram porque as populações rurais detestavam os guerrilheiros que as queriam “libertar”, e denunciavam à polícia os esconderijos nos quais eles se acoitavam. É notório que as massas rurais brasileiras se mostraram tão indiferentes à reforma agrária socialista e confiscatória de Jango, que este chegou — em um de seus últimos discursos — a se queixar sentidamente delas. No Chile, os trabalhadores rurais vão protestando com crescente vigor contra a reforma agrária de Frei. O fracasso da “colheita-recorde” de Cuba se deve indiscutivelmente à insensibilidade dos pobres cortadores de cana aos apelos de Fidel. E assim os exemplos poderiam se multiplicar.
Entretanto, talvez não tenha havido um só episódio, nos dias de hoje, em que tão claro ficasse o alheamento das massas trabalhadoras em relação à esquerda, do que no desfile operário monumental realizado há dias em Nova York, em apoio à política internacional de Nixon.
Como todos puderam ler nos jornais, 150 mil operários, comerciários e escriturários desfilaram pela Wall Street, proclamando sua vontade de lutar pela contenção e pela derrota do comunismo. Para incentivá-los na atitude patriótica, um verdadeiro mar de papéis picados era jogado sobre eles de todos escritórios que lotam os arranha-céus da grande artéria. Esta a atitude da população no maior centro norte-americano.
Em contraste com a multidão de manifestantes sérios, ordeiros e dignos, que desfilaram dando vivas à pátria e empunhando a bandeira nacional, o que foi o protesto esquerdista realizado dias antes em frente da Casa Branca?
Certos jornais paulistas disseram que havia cem mil pessoas presentes ao comício. Fontes norte-americanas dignas de mais crédito falaram em apenas 75 mil: a metade dos que desfilaram em Nova York.
Os 75 mil contestatários foram arrebanhados por uma propaganda estrepitosa. Vieram dos quatro cantos do país. São como que uma varredura do que havia de mobilizável, em matéria de esquerdistas, na imensa população do território americano. Um conglomerado de minorias locais. Como isto é menos expressivo — e sem representatividade — do que a massa compacta dos membros de uma só classe — os operários — aplaudidos pelas de outra, os funcionários de escritório de uma só cidade.
De outro lado, como a atitude dos manifestantes esquerdistas de Washington destoa da dos trabalhadores patrióticos de Nova York. Em Washington, o ambiente era de uma feira de diversões. Em um palanque, se exibiram vedetes literárias, artísticas ou políticas a que ninguém dava atenção. O povo conversava durante os discursos. Grande número dos presentes, enquanto a manifestação se desenrolava, se banhavam nos tanques do logradouro público. Diversas moças com o busto literalmente nu tentavam dar um condimento pornográfico e “prá frente” à manifestação sensaborona. O auge da “desinibição” freudiana estava em dois moços que perambulavam de um lado para outro, inteiramente nus. Curioso e sintomático encontro entre o esquerdismo e a corrupção. Quem constituía esses 75 mil prosélitos da decadência política e da deterioração moral do país? Segundo tudo faz crer, a grande maioria deles era formada por estudantes vagabundos, de elementos “no vento”, da “inteligentzia” etc. De operários, pouco ou nada.
A verdade se torna patente. Repito-a à maneira de conclusão final: não é a massa que é esquerdista. São os elementos deteriorados das elites.
Neste sentido, merece especial atenção o artigo de János Lengyel — publicado pelo “O Globo” do dia 1º do corrente — o qual informa que “uma recente enquéte popular na Alemanha Federal provou que a maioria dos operários prefere um aumento direto de 5 a 8% e alguns dias mais de férias pagas, do que a idéia da participação ou da co-gestão. E, na França, o decreto-lei degaullista de 17 de agosto de 1967, que estabelece a obrigatoriedade da participação não passa de um meio-fracasso.
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Chegou-me às mãos a fotocópia de um convite publicado no dia 18 de abril p.p. pelo jornal “El Siglo” de Santiago do Chile. No ângulo esquerdo, bem no alto, está um croquis representando Lenine, e ao lado dele a foice com o martelo. Um pouco mais abaixo, vem os dizeres: “Homenagem a Lenine na igreja de Santa Catarina, em Salvador Cruz Gana — Hoje, sábado 18 às 7 da tarde — Falará Carlos Maldonado, Secretário Geral do Instituto de Investigações Marxistas — Será projetado o filme-documentário ‘Lenine em outubro’”. Segundo informações que tive, trata-se de um templo católico.
Lendo esta enormidade, e pensando no padre Comblin que continua a agir com o placet de tantas autoridades eclesiásticas, penso com tristeza no abaixo-assinado em que 2 milhões de sul-americanos pediram a S.S. Paulo VI medidas contra a infiltração comunista na Igreja. E me ponho a rezar.