GRIGNION DE MONTFORT. A “bomba atômica” da Providência e que tem um nome muito doce: “O Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem”.

 Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Grignion de Montfort

 

 

 

 

Legionário, 21 de Outubro de 1945

 

São Luís Grignion entrega o “Tratado” à Nossa Senhora (monumento do altar-mor da igreja dos Montfortanos, em Roma)

Chamam-nos muitas vezes de pessimistas. Lendo, por exemplo, as reflexões que fizemos hoje, nos “7 dias em revista”, pensarão muitos que estamos enxergando com cores carregadas a questão dos Lugares Santos. Não é tal. Somos otimistas, e mais otimistas mesmo do que o comum das pessoas. Nossa combatividade não é, mesmo, senão otimismoOnde muitos acham que “está tudo perdido”, e que os católicos estão reduzidos a mendigar com melúrias, achamos pelo contrário que “nada está perdido”, e que a situação ainda é bastante boa para pleitearmos a defesa de nossos direitos com vigor, galhardia e desassombro. A diferença que vai de nossa posição a de muitos dos que não nos compreendem, é precisamente esta. Enquanto eles concebem a tática católica como a do súplice pedinte, de chapéu na mão, cabeça baixa, voz débil e olhar fito no chão, nós a concebemos como a de um homem que se defende cônscio de sua força, de seus direitos, e sereno quanto à sua vitória. Resumamos. Não sentimos nossa situação de católicos en mendiants, mas en combattants.

Exemplifiquemos. Quando pelas arenas políticas do mundo espumava o touro totalitário, rasgando concordatas, espezinhando tratados, e investindo contra Bispos, na Alemanha como na Itália e em outros lugares, o Legionário preconizou a tática do ataque frontal e direto. Nada de farpas no flanco, de paninhos de abana, de falsas investidas e escapatórias ágeis. Era enterrar a espada na “fera” de frente, bem de frente, num golpe só. Lembro-me bem, quando veio Munich, e a tática contrária prevaleceu, como nos atacaram! É que tínhamos cometido esta enormidade: sustentar que Munich era uma capitulação, uma loucura, uma traição ao mundo e à civilização. O que depois se passou, mostrou bem que com certa qualidade de touros o sistema é este e só este: ferir, ferir de frente e, ferir fundo, ferir na cabeça. Por maior que seja o risco, é o que de menos arriscado se pode fazer.

Confiar nesta tática, esperar precisamente dela a vitória, ter a certeza de que ainda quando a Igreja não tem em suas mãos ouro nem canhões, pode atirar desassombradamente em seus adversários qualquer pedregulho de beira de estrada, e o pedregulho fará o papel da funda de David: não é isto o verdadeiro otimismo, um otimismo que chegará, aos olhos de muitos, às raias da temeridade?

Passaram-se os anos. Agora, está na liça o comunismo. Nossa tática continua a ser a mesma. Ainda que tivéssemos em mãos um só alfinete enferrujado, enfiá-lo-íamos displicentemente no focinho do touro vermelho, precisamente no momento em que sua fúria estivesse mais acesa. O alfinete reproduziria a seu modo a proveitosa tarefa da funda de David. As virtudes de sua ferrugem seriam mais letais do que o gume de mil espadas. Dentro de um tempo mais ou menos longo, teríamos o touro, a nossos pés, inane e inofensivo como o mais vulgar dos gatos mortos.

Por que isto? Há momentos de falar e momentos de calar, nos diz a Escritura. Assim também, há momentos de avançar e momentos de ficar paradoEm diplomacia há momentos de recuarAs tradições de sagacidade, prudência, agilidade quase infinitas da Secretaria de Estado da Santa Sé nos mostram bem, que nem sempre o melhor meio de chegar à vitória é o ataque frontal. Mas desde São Leão até Pio X, desde Átila até os nazi-comunistas, a História nos mostra também que há momentos em que uma só atitude é verdadeiramente capaz de surtir efeito: agir de frente, firmes os olhos nas mãos de Deus, do Qual nos vem toda a vitória e todo o bem.

A nosso ver, perante o nazismo e seus consectários, o comunismo e suas variantes, a tática deve ser esta e só esta.

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Como condição de vitória, sem se desprezar nem de leve as providências concretas, devemos contar essencialmente com os recursos sobrenaturais. A História demonstra que não há inimigos que vençam um país cristão que possua três devoções: ao Santíssimo Sacramento, a Nossa Senhora e ao Papa. Investigue-se bem a queda de nações aparentemente muito fervorosas em sua adesão à Igreja: alguma broca secreta a minava em uma dessas três virtudes-chave.

A vitória, pois, depende de nós. Tenhamos em dia nossa consciência, estejamos tranqüilos em Deus, e venceremos.

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Isto explica o extraordinário relevo que damos a uma notícia apagada, que os jornais reproduziram há pouco: a canonização iminente do Bem-aventurado Luiz Maria Grignion de Montfort.

A notícia nada significa para o comum das pessoas. Ela significa tudo, para os que conhecem o verdadeiro fundo das coisas. A Providência resolveu jogar sua bomba atômica contra os adversários da Igreja. Perto desta bomba, as convulsões de Hiroshima e Nagasaki não passam de inocentes tremedeiras. Há dois séculos que está pronta a bomba atômica do Catolicismo. Quando ela explodir de fato, compreender-se-á toda a plenitude de sentido da palavra da Escritura: “Non est qui se abscondat a calore ejus”.

Esta bomba se chama com um nome muito doce. É que as bombas da Igreja são bombas de Mãe. Chamam-se O Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem. Livrinho de pouco mais de cem páginas. Nele, cada palavra, cada letra é um tesouro. Este o livro dos tempos novos que hão de vir.

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Nosso artigo já está por demais longo, para que demos um resumo biográfico da extraordinária vida desse Bem-aventurado. Não sei de nenhuma que seja mais empolgante e mais edificante. O que em nosso assunto é essencial, em poucas palavras se diz.

O Beato Grignion de Montfort expõe em sua obra, no que consiste a perfeita devoção dos fiéis a Nossa Senhora, a escravidão de amor dos verdadeiros católicos, à Rainha do Céu. Ele nos mostra o papel fundamental da Mãe de Deus no Corpo Místico de Cristo, e na vida espiritual de cada cristão. Ele nos ensina a viver nossa vida espiritual em consonância com essas verdades. E nos inicia em um processo tão sublime, tão doce, tão absolutamente maravilhoso e perfeito, de nos unirmos a Maria Santíssima, que nada há na literatura cristã de todos os séculos, que o exceda neste ponto.

Esta devoção, diz Grignion de Montfort, unindo o mundo a Nossa Senhora, uni-lo-á a Deus. No dia em que os homens conhecerem, apreciarem, viverem essa devoção, nesse dia Nossa Senhora reinará em todos os corações, e a face da terra será renovada.

De que forma? Grignion de Montfort esclarece que seu livro suscitaria mil oposições, seria caluniado, escondido, negado; que sua doutrina seria difamada, ocultada, perseguida; que ela daria automaticamente uma antipatia profunda nos que não têm o espírito da Igreja. Mas que um dia viria em que os homens por fim compreenderiam sua obra. Nesse dia, escolhido por Deus, a restauração do Reino de Cristo estaria assegurada.

Durante séculos, a canonização do Beato Grignion vem caminhando. Por fim, ela chegou a seu termo. É absolutamente impossível que esse fato não tenha um nexo profundo, com a dilatação da Verdadeira Devoção no mundo.

E, nós o repetimos, é essa Verdadeira Devoção, a bomba atômica que, não para matar mas para ressuscitar, Deus pôs nas mãos da Igreja em previsão das amarguras deste século.

Pois bem, nosso otimismo é este: confiamos imensamente mais na bomba atômica de Grignion de Montfort, e em seu poder, do que nós receamos da ação devastadora de toda as forças humanas.

 

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