Plinio Corrêa de Oliveira
Certo interlocutor, progressista antimilitarista, fez-me a objeção seguinte: “A ação doutrinária da TFP contra o comunismo e o que V. chama os corolários “católicos” deste, o democristianismo e o progressismo, carece de alcance prático. Estamos sendo governados por militares. Deixem, pois, que os militares resolvam, com os seus meios específicos, os problemas atuais. Os jovens da TFP fariam melhor em abandonar esta luta colocada em termos de força, e empregar em atividades economicamente produtivas o tempo e as energias preciosas que dedicam à ação ideológica”.
Deixo de lado certos aspectos psicológicos da objeção, como o mal disfarçado desejo de criticar as Forças Armadas e de as privar de qualquer simpatia no meio civil, ou então a evidente vontade de acabar com a atuação da TFP. Tomo a objeção em tese. E passo a lhe dar resposta.
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Logo à primeira vista, o que me chama a atenção é o caráter anacrônico das concepções de meu progressista. Em nossa época, a eficácia da ação e da contra-ação psicológicas foi plenamente posta em evidência pelos acontecimentos. E, por isto, nenhum homem público – civil ou militar, pouco importa – acredita em soluções colocadas apenas em termos de força.
Espanta, pois, que este objetante afirme ser possível focalizar e resolver o problema da subversão, no Brasil, em meros termos de força…
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De outro lado, a mentalidade de meu objetante choca por sua dureza.
Suponhamos que a Forças Armadas – de nosso ou qualquer outro país – consigam atemorizar e assim reduzir ao silêncio toda a população civil. Pergunto se há algo de mais triste para militares autênticos, do que tratar sua própria pátria como uma terra conquistada, que só pelo chanfalho obedece à lei. Então, uma ação ideológica que esclarece o povo, levando-o a compreender e a admirar a ação anti-subversiva dos poderes competentes, e a colaborar com estes na repressão aos subversivos, não seria, também nesta hipótese, de um valor moral inestimável?
Será que o fanatismo progressista – só a fim de ter pretextos para atacar as Forças Armadas – chega a ponto de desejar para o Brasil este tratamento de país vencido, no qual o mero chanfalho mantivesse a ordem, cessado todo esforço persuasivo contra a subversão?
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Ouço meu progressista sussurrar que nessa ação esclarecedora, os próprios órgãos militares a poderiam exerce sem o apoio de mais ninguém. A ação da TFP seria portanto inútil… o que por sua vez conduziria a reduzir ao silêncio a TFP.
Também aqui, se bem que progressista, meu objetante se revela desconcertantemente anacrônico. Pois todos os pedagogos e sociólogos insistem hoje em geral até com grande exagero na importância da cooperação de alunos e subordinados, para o êxito da autoridade docente ou governamentista. Meu objetante, pelo contrário, finge conceber a ação suasória do poder público como a de um mestre-escola obsoleto, que ensina sua cartilha a um povo inteiro, quieto e passivo.
Não. Ao poder público, seja ele exercido por militares ou civis, cabe indiscutivelmente uma importante missão no informar e orientar a opinião nacional. Mas tal missão não pode ser realizada adequadamente sem a cooperação de múltiplas forças vivas, espontaneamente nascidas do próprio povo, cheias de convicção, de idealismo, e de sadia autodeterminação.
E é precisamente na conta de uma dessas forças, que milhões de brasileiros têm a TFP…
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Na realidade tudo quanto há de estreito e canhestro nas concepções de meu objetante se torna ainda mais palpável se considerarmos a essência do comunismo e, mais ainda, a essência do que realmente afirmo serem os corolários “católicos” deste, o democristianismo e o progressismo.
O comunismo é fundamentalmente uma seita ideológica. Seus adeptos se aglutinam em torno de uma concepção filosófica peculiar, do universo, do homem e da vida. O objetivo supremo deles é impor tal concepção a todos os homens.
Pela própria natureza dessa seita, o modo específico de a combater tem de ser ideológico também. Em lutas como esta, a força tem por vezes um papel legítimo e indispensável, mas que jamais é exclusivo. Pois em última análise, idéias com idéias se combatem.
A História está cheia de exemplos de estruturas políticas e sociais que – apoiadas na mera força – ruíram pela ação ora tempestuosa e rápida, ora lenta e sorrateira, de ideologias contrárias. Faltou-lhes a sustentação ideológica indispensável.
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Tal afirmação, que é certa quanto ao comunismo, é evidentissima quanto ao progressismo.
Este último é um problema, uma crise ou – se assim se pode dizer – uma doença na Igreja. Ora, pelo próprio caráter natural e sobrenatural desta, os problemas internos dEla não podem ser resolvidos com preterição das questões de doutrina e da ação ideológica.
É isto tão certo, que em 20 séculos de existência, nunca uma crise doutrinária, no seio desta, chegou a termos sem remédios também doutrinários.
Dada a diversidade, por assim dizer infinita, das circunstâncias de tempo e de lugar, o modo pelo qual a Igreja tem chegado ao desfecho doutrinário de conflitos como este variou muito ao longo dos séculos e dos milênios.
Mas, frequentemente – e talvez na maioria dos casos – a presença do erro dentro da Igreja suscita de início apreensões e críticas da parte de membros mais clarividentes: por vezes padres ou simples leigos.
Atacados, os partidários do erro se defendem ocultando o cunho herético de suas doutrinas e acusando a parte adversa de difundir calúnias. Estes treplicam com provas. Daí se incendeia uma “guerra” ou “guerrilha” doutrinária, que é afinal resolvida pela autoridade, em termos de ensinamento doutrinário.
Longe estamos de negar ao poder público o direito de preservar o Estado dos efeitos funestos que esta ou aquela corrente doutrinária heterodoxa possa ter no âmbito temporal.
Mas inegável é que – enquanto problema interno da Igreja – a crise doutrinária não se soluciona fora do campo doutrinário.
Ora, quem denuncia, neste campo, os erros religiosos nocivos ao Estado, presta relevante serviço a este, e não só à Igreja.
Pois quando um erro doutrinário de implicações sociais e econômicas ferve na Igreja, é como um vulcão cujas lavas tendem sempre a transbordar para a esfera do Estado.
A luta doutrinária levada a cabo pela TFP, contra as implicações sociais e econômicas do progressismo é, pois, indispensável no quadro dos problemas que ora se põem à nossa atenção.
Tudo isto torna bem explicável porque querem os progressistas silenciar a TFP.
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Ouço ainda meu progressista rosnar com escárnio: “Tudo isto é mito. Na realidade a força não precisa do apoio da doutrina, mas da fartura. Com energia, boas finanças e boa administração tudo se resolve”.
Desta feita, não lhe respondo. Para que responder? Que argumento dar a quem nega ao pensamento o direito de cidadania nos domínios do real?
Calo-me. E fico a pensar em certa raça de almas de que fala Claudel, utilitárias a ponto de desejar que os astros caiam do céu e se transformem em batatas…
Paul Claudel (* 6-8-1868 + 23-2-1955) poeta, dramaturgo e diplomata francês