Legionário, 9 de abril de 1939, N. 343, pag. 5
Pelo ano de 500, o arianismo dominava na Espanha. O seu rei Leovigildo, com os seus dois filhos Hermenegildo e Recaredo, professavam essa seita, e eram os seus grandes defensores.
Quando esses dois filhos atingiram a maioridade, Leovigildo elevou Hermenegildo ao trono de Sevilha e Recaredo ao de Toledo.
Algum tempo depois, Hermenegildo casou-se com Ingunda, princesa de Austrasia, filha do rei Sigeberto e católica fervorosíssima.
Tendo Leovigildo enviuvado, casou-se em segundas núpcias com Gosvinta, a qual parecia ter feito voto de perverter Ingunda à heresia ariana. Mas essa princesa não só permaneceu fiel à sua religião, mas ainda conseguiu converter o antigo defensor do arianismo: o seu próprio marido. Este, com grande pompa, abjurou o erro, e foi admitido na Igreja Católica por São Leandro, Bispo de Sevilha.
A conversão do rei de Sevilha de tal modo desgostou a Leovigildo que este o ameaçou com a destronização, caso não voltasse ao arianismo. Respondeu Hermenegildo respeitosamente ao pai que, na proximidade em que se achava, preferia antes desobedecer ao pai do que a Deus, estando disposto a perder a coroa para satisfazê-lo.
Leovigildo imediatamente partiu com grande exército, e pôs em cerco Sevilha. Depois de uma luta de um ano, Hermenegildo foi obrigado a fugir, refugiando-se em Córdoba, e depois em Osseto, cidade bem fortificada. Mas nem aí encontrou abrigo seguro. Em breve convenceu-se da inutilidade da sua resistência. Recolhendo-se a uma igreja, esperou tranquilamente o pai.
Um menino irmão de Hermenegildo procurou-o e lançando-se ao seu pescoço pediu-lhe que fizesse as pazes com o pai, prometendo-lhe o seu perdão. Aceitando a proposta do irmão, o rei de Sevilha esperou pelo pai, e quando este chegou, prostrou-se aos seus pés pedindo perdão. Leovigildo mostrou-se enternecido, vendo aos seus pés o rei seu filho, pedindo a Hermenegildo para acompanha-lo. Lá chegando, mudou a sua atitude. Imediatamente deu ordem para que despojassem a seu filho de todos os emblemas reais, e prendê-lo com correntes no fundo de uma masmorra.
Hermenegildo tudo recebeu com firmeza e confiança em Deus. A todas as propostas de apostasia, respondeu sempre que tudo preferia perder a perder a fé católica. “Não me custa renunciar a uma coroa terrena, passageira, quando espero outra eterna”.
Com estas palavras despediu o bispo ariano que viera lhe trazer a comunhão pascal, por ordem do rei. Quando Leovigildo soube como o filho recebera o prelado, foi tomado de tanta raiva que resolveu a morte do filho. Essa sentença foi comunicada, para maior efeito, ao prisioneiro, pelos próprios algozes. Contra toda a expectativa, Hermenegildo, tranquilo, ajoelhou-se e deu graças a Deus. Nessa atitude, um algoz prostrou-o sem vida.
Uma vez praticado o crime, o velho rei sentiu-se perseguido por remorsos terríveis, arrependendo-se sinceramente do seu procedimento. Na última doença, chamou ao Santo Bispo Leandro, e pediu-lhe que instruísse na fé católica ao rei Recaredo.
O martírio de Hermenegildo foi o primeiro passo para a conversão de toda a Espanha.
* * *
É assim que a Providência se vinga de seus perseguidores. A fé católica bruxuleia e quase se extingue, mas assim que se derrama o sangue do mártir, ela readquire o seu antigo esplendor.
Como é infantil, e sinal da máxima ignorância, esses perseguidores que cantam vitória antes de ganhá-la, e dizem, como se fossem eternos: “Se acaso eu faltar…”