São Pio V: modelo de Pastor que dá a vida por suas ovelhas, de inquisidor, de firmeza e de severidade para consigo mesmo

Santo do Dia, 4 de maio de 1967

A D V E R T Ê N C I A

O presente texto é adaptação de transcrição de gravação de conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a sócios e cooperadores da TFP, mantendo portanto o estilo verbal, e não foi revisto pelo autor.

Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras “Revolução” e “Contra-Revolução”, são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plínio Corrêa de Oliveira em seu livro “Revolução e Contra-Revolução“, cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de “Catolicismo”, em abril de 1959.

 

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A ficha a respeito de São Pio V, que comentarei resumidamente à vista do fato de já ter sido tratado, é extraída do livro do Cardeal Grente: “São Pio V, o Papa dos grandes combates”:
No físico, São Pio V era um homem de atitude e de fisionomia muito pronunciadas. O rosto longo e magro, austero, a fronte calva, a barba copiosa e branca; o nariz forte e muito arqueado, os olhos vivos e sua sem feiura desaparece na chama do olhar que ele dardejava reto, profundo e irresistível. Sua palavra soava clara e imperativa; simplesmente em ouvi-lo e vê-lo, se pressentia o chefe”.
A gente tem vontade de dizer: quanta saudade! Às vezes tem-se saudade do que não se conheceu. A delícia – eu quase diria – a volúpia de alma de ter um chefe que manda, que é chefe, que dirige, que é pastor, que protege, que toma a dianteira. Ah! meu Deus do Céu! No supremo degrau da Igreja Católica ter uma sublimidade dessa! Um verdadeiro pastor que dá a vida pelas suas ovelhas. Que dilatação de alma!
Sua inteligência possante e lúcida, inimiga dos verbalismos, das nuvens e das quimeras...”
Isso é escrito por quem estava na época em que o verbalismo tinha atingido o auge, as nuvens, as quimeras, a mitologia…
“…perscrutava sem esforço as questões mais variadas, e sua memória prodigiosa facilitava a sua aplicação”.
Os senhores precisam compreender o seguinte: São Pio V, antes de ser Papa, foi inquisidor. Esses todos são os predicados próprios à alma de um santo inquisidor: conhecimentos vastos. O físico já é de um inquisidor. Aquele olhar dardejante, profundo, irresistível, perscrutando os refolhos de uma alma herege e vendo ali a fedentina da heresia e qualificando…
Isso tudo já é alto porte de santidade!
Bastava-lhe falar com alguém, estudar, ou tratar de negócios para se lembrar exatamente do fato, a longo tempo. O conde de la Trinità tinha, há muito tempo, esquecido seus tratos descorteses para com o padre Alexandrino, quando a corte de Savóia o delegou como embaixador a Roma…
Padre alexandrino seria o futuro Pio V.
Pio V o reconheceu imediatamente e acolheu as suas homenagens, por esta expressão semi irônica: “Conde, eu sou aquele pobre dominicano que o senhor quis, outrora, jogar num poço. Vede, Deus protege o inocente“…
Como isso é diferente de uma bondade adiposa [gordurosa], roliça, um sorriso contínuo e continuamente insincero, escachoando dos lábios de gente falsa. Aqui, nesse dito de São Pio V, tem espírito, tem “panache” [altivez sem orgulho, n.d.c.], tem fogo!
Mas observando a extrema confusão que aterrorizava o embaixador…”
Também, não dava para menos!
“… ele o reconfortou, chegou até a osculá-lo e lhe prometeu atenções especiais no curso de sua missão”.
Mas São Pio V quis primeiro dar uma… e fez muito bem!
Nenhum caráter foi mais alto nem mais respeitável. Ele possuía eminentemente essa varonil sinceridade que é a virtude dos fortes, e toda a sua vida ele levou o amor da verdade até à paixão, e a coragem de dizer até a audácia”.
Entenderam a frase, não? Ele tinha um amor à verdade, durante toda a vida, que chegava até a audácia. Durante toda a vida. Isso é o bom pastor que dá a vida pelas suas ovelhas! Não se incomoda de lutar, não tem atrapalhações, vence tudo, enfrenta todo mundo, não recua diante de nada!
Daí seu horror do ceticismo e da indiferença, que Pascal chama, como um estigma, a falta de coração”.
Para que citar Pascal num tema tão alto? É o latido do cachorro no meio do cantochão.
(Aparte: É um xodó de certos franceses)
É uma das chagas deles.
Daí sua antipatia declarada contra toda tolerância com qualquer opinião malsã e sua indignação igualmente reavivada por cada hipocrisia”.
A respeito de tudo isso pode-se dizer apenas: “que beleza!” Não pode dizer outra coisa.
Agora o trecho de uma carta de São Pio V a um bispo regalista, na Polônia. É um bispo que queria por demais se sujeitar à autoridade do rei, com detrimento da autonomia da Igreja:
O rei Segismundo queria divorciar-se e ameaçava com cisma se o Papa não concedesse a anulação de seu casamento. “Poderia ser – exclama o Papa – que bispos mostrassem menos energia em defender a Igreja, do que os protestantes mostram zelo para oprimi-La? Vossos pais na fé, esses santos mártires dos quais vós ocupais as sedes, estimaram mais glorioso morrer para a honra de Deus do que assistir a servidão da Igreja. Vós não tereis a fraqueza de degenerar e, sob pena de expor vossa vida, vós vos lembrareis, sem medo de expor vossa vida, vós vos lembrareis de que morrer por uma causa santa é uma honra e um dever“.
Que bonito trecho de uma carta que poderia ser enviada aos bispos de além Cortina de Ferro [ou seja, nos países sob o jugo comunista]. Podia mandar assim mesmo nesses termos. Não precisava mais nada…
Vinte dias depois de sua coroação, Pio V escrevia ao bispo de Cracóvia: “Uma vez que é evidente que os maus sacerdotes causam a perda dos povos, e que a detestável heresia, que se estabelece pelo ferro e pelo fogo, não tem outros pretextos além da sua perversidade, nós vos imploramos que trabalheis com dedicação pastoral para reformar o vosso clero, pois esse é o meio mais apropriado para restaurar a dignidade da Igreja”.
Quando ele recebeu com fé e devoção os últimos sacramentos, fez com que se aproximassem de seu leito os cardeais Alexandrin, Rusticucci, Peretti, Caraffa, Aquaviva, d’Arezzo, o geral dos dominicanos Cavalli, e então, num supremo retorno de energia, legou-lhes esta nobre despedida: “(…) Vós não ignorais com quanta paixão eu desejava ver derrubado o império dos turcos. Mas já que meus pecados me tornaram indigno desse admirável triunfo, eu adoro os julgamentos de Deus e aceito a sua vontade. Agora eu vos recomendo a Santa Igreja que tanto amei. Empregai-vos em eleger para mim um sucessor zeloso, que não procure senão a glória do Salvador e que não tenha outro interesse aqui embaixo senão a honra da Santa Sé Apostólica e o bem da cristandade“.
Depois ele expirou.
São as palavras supremas que são, em tudo, a glorificação de sua vida. Inclusive essa severidade para consigo mesmo que faz os santos. Olhar bem para ver se tem alguma culpa no fato de seu apostolado não dar tudo quanto se esperava. Até esse exemplo magnífico ele nos deu ao morrer!

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