A Imagem de Nossa Senhora

 

do Bom Conselho

 

do Colégio S. Luís, em São Paulo

 

 

 

 

 

Catolicismo, Ano XVIII, n° 208-209, Abril-Maio de 1968

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Os leitores já encontraram neste número de "Catolicismo", de passagem, referências a várias cópias miraculosas da santa Imagem de Genazzano. Não poderíamos contudo deixar de consagrar um item especial ao quadro que se venera na Igreja do Colégio São Luís, dos RR. PP. Jesuítas, na Capital paulista.

Trata-se de unta tela a óleo, medindo 86 por 64 cm, num retângulo central de 52,5 por 40 cm, está a figura da Senhora com seu Filho no braço esquerdo; na margem inferior, bem maior que a superior, vêem-se os dois albaneses junto ao mar, a contemplar o quadro que se afasta, entre nuvens, conduzido por Anjos, que aparecem nas margens laterais.

Na realidade, o quadro não tem grande semelhança com o Original de Genazzano: o desenho é sensivelmente diferente, as cores são menos delicadas e falta luz ao conjunto. Não obstante, reconhece-se o mesmo gesto meigo e afetuoso do Divino Infante e a atitude enlevada da Mãe, que, sem olhar para o Filho, está toda voltada para Ele.

Não se sabe quem terá sido o seu autor, o seu aparecimento é também cercado de mistério e de maravilha.

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Certo dia do ano de 1785, caminhava o Padre José de Campos Lara pela praia deserta de uma cidade italiana, a pensar talvez na terra natal, da qual o separava o Oceano imenso. Fazia vinte e cinco anos que ele deixara o Brasil, para ser fiel à sua vocação, quando o Marquês de Pombal, o ímpio Ministro de D. José I, conseguira arrancar do Monarca um iníquo decreto banindo a Companhia de Jesus dos domínios portugueses.

José de Campos Lara e seu irmão Miguel — que pertenciam a uma das melhores famílias de Itu —foram presos juntamente com os demais Jesuítas do Brasil; não sendo ainda professos, tiveram que travar tremenda batalha com os parentes e amigos que queriam a todo o custo fazê-los deixar a Companhia a fim de evitar a prisão e o desterro. Nada, porém, pôde demovê-los da fidelidade à graça que os chamara às fileiras inacianas.

Chegaram os Religiosos brasileiros a Civitavecchia após penosa travessia do Atlântico. Daí dirigiram-se para Roma, onde foram paternalmente recebidos pelo Papa Clemente XIII, apesar de todas as pressões e ameaças do Embaixador de Portugal.

Concluídos os estudos teológicos, os irmãos Campos Lara foram ordenados Sacerdotes. Miguel faleceu pouco tempo depois.

No seu longo exílio na Itália, exerceu o Padre José o ministério em várias partes e veio a conhecer ilustres personalidades eclesiásticas, entre as quais o grande Santo Afonso Maria de Ligório e o Cardeal Chiaramonti, mais tarde Pio VII, com os quais manteve estreita amizade, profetizando mesmo a ascensão deste último ao pontificado.

A extinção da Companhia de Jesus por Clemente XIV, em 1773, constituiu um novo golpe para o Padre brasileiro: perdera antes a pátria e o irmão, agora perdia a Mãe amadíssima. A Virgem Senhora não o quis, no entanto, deixar imerso em tristeza por muito tempo, dispondo-se a ser Ela mesma a sua recompensa demasiadamente grande (cf. Gen. 15, 1).

Assim é que naquele dia do ano de 1785 caminhava, como dizíamos, o Padre José de Campos pela praia, quando apareceu diante dele um jovem desconhecido, de porte altivo e maneiras distintas, trazendo consigo um quadro a óleo de Nossa Senhora do Bom Conselho. Apresentou-se ao Padre, dizendo que o levasse para a sua terra, e anunciou-lhe que no lugar onde ela fosse venerada se ergueria um dia um grande colégio jesuíta. Respondeu-lhe o surpreso sacerdote que não dispunha de recursos para a viagem, mas o jovem garantiu que o comandante de um navio que acabava de entrar no porto o admitiria gratuitamente. Consolado com essa notícia, preparava-se o Padre Campos para despedir-se de seu interlocutor, mas eis que este desaparece ante seus olhos! Persuadiu-se assim o Padre de que se tratava de algum espírito celeste que o procurara sob aquela aparência.

Confirmou-o nessa crença o fato de ter podido viajar de graça para o Brasil, no navio que lhe fora indicado.

Desembarcou José de Campos Lara no porto de Santos, trazendo o milagroso quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho. Dali partiu, em seguida, para Itu.

Na cidade natal procurou erguer sem demora, numa chácara herdada de seus pais, uma capela onde se pudesse condignamente venerar a preciosa Madona. Iniciou mais tarde a construção de uma igreja para o mesmo piedoso fim, a qual só foi concluída depois de sua santa morte, ocorrida em 1820.

Seus contemporâneos ouviram-no dizer muitas vezes, em tom profético: "Aqui, nesta chácara e sobrado, ainda virão os Jesuítas estabelecer uma grande casa de educação" (Altenfelder Silva, p. 73).

Era a profecia que lhe havia sido feita pelo Anjo no longínquo porto italiano. Realizou-se ela à letra, contra toda humana expectativa.

De acordo com o testamento do bom Padre Campos, sua chácara, com o sobrado e a igreja apenas começada, veio a pertencer ao seu sobrinho, Padre José Galvão de Barros França.

Autorizou este a Irmandade da Boa Morte e Assunção a utilizar a Igreja, dando prosseguimento às obras. Anos depois, doou a propriedade à Companhia de Jesus, já então restaurada no Brasil, depois de restabelecida em 1814 por Pio VII.

Os Jesuítas lançaram nessa chácara, em 1869, a pedra fundamental do edifício do Colégio São Luís, que logo se tornou um dos mais conceituados estabelecimentos de ensino do Brasil.

Ao mesmo tempo, celebraram eles com a Irmandade da Boa Morte uma convenção pela qual recebiam os móveis e alfaias pertencentes à antiga capela do Padre Campos, enquanto a mesma capela, que fora transformada em consistório da igreja em construção, ficava reservada à Irmandade. Foi então que os Padres do Colégio receberam o quadro de Nossa Senhora do Bom Conselho, que foi colocado na capela-mor da igreja.

Ficou assim a Imagem na posse definitiva dos filhos de Santo Inácio. Quando, em 1918, mudaram eles o Colégio para São Paulo, levaram-na consigo; ainda hoje é o quadro venerado em um altar lateral da Capela do Colégio, dedicada a São Luís de Gonzaga (à Rua Haddock Lobo, n. 400).

Apenas instalado o Colégio São Luís na chácara do Padre Campos, em 1872, o Reitor, Padre Vicente Cocumelli, fundou com doze jovens, que se destacavam pelo seu bom procedimento, uma Congregação Mariana sob a invocação de Nossa Senhora do Bom Conselho. Mais tarde, em 1925, criou o Padre José Visconti uma outra Congregação, feminina, sob o mesmo vocábulo.

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A devoção, pois, à Imagem de Nossa Senhora do Bom Conselho trasladada de Scutari, de forma prodigiosa, para Genazzano, e trazida numa cópia, de modo também milagroso, até o Brasil, aqui deitou fecundas raízes, iluminando as almas de gerações sucessivas de alunos do famoso Colégio São Luís, e enlevando os congregados marianos que se reuniam aos seus pés.

Luiz Sérgio Solimeo


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