Plinio Corrêa de Oliveira

Plinio Corrêa de Oliveira

 

Consagração a Nossa Senhora segundo o método de São Luís Maria Grignion de Montfort

 

Santo do Dia – 02 de maio de 1973 

(Texto adaptado a partir de transcrição de gravação magnética de conferência para sócios e cooperadores da TFP, sem revisão do autor)

 

Segunda semana preparatória: pedir o conhecimento de Nossa Senhora - O segredo de Maria

( Clique aqui para ler o texto referente à primeira semana preparatória )

 

"Durante a 2ª semana [as pessoas que desejarem se consagrar a Nossa Senhora] aplicar-se-ão em todas as orações e obras quotidianas em conhecer a Santíssima Virgem. Implorarão este conhecimento do Espírito Santo; poderão ler e meditar o que já dissemos a respeito; recitarão, como na 1ª semana, as ladainhas do Espírito Santo, a "Ave Maris Stela" e mais um rosário todos os dias, ou pelo menos um terço nesta intenção" [A respeito deste assunto vide os seguintes tópicos do "Tratado da Verdadeira devoção à Santíssima Virgem": Capítulo I, arts. 1 e 2; capítulo V, art. 3; capítulo VI: art. 2.]

 

Os Srs. estão vendo que o plano de São Luís Grignion de Monfort se desenvolve muito metodicamente: a semana anterior foi o conhecimento de nós mesmos; a semana seguinte é o conhecimento de Nossa Senhora. Ele modestamente recomenda, entre outras leituras possíveis, o que o "Tratado da Verdadeira devoção à Santíssima Virgem" – escrito por ele – trata a respeito.

Mas uma vez que estamos seguindo seu método, nada melhor para nos consagrarmos a Maria Santíssima segundo este método, do que estudarmos as indicações que ele mesmo dá de Nossa Senhora.

Como São Luís Grignion de Monfort procura nos dar o conhecimento de Nossa Senhora? Sem dúvida nenhuma, nos fala algo a respeito dEla do ponto de vista sensível, quer dizer procura também tocar nossa sensibilidade.

Mas valeria muito a pena os Srs. procurarem no "Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem" as partes referentes ao conhecimento dEla. Trata-se de um conhecimento por assim dizer científico. Ele expõe quanto a teologia nos ensina sobre Nossa Senhora: o fato dEla ser Mãe, de ter sido concebida sem pecado original, o papel dEla na economia da graça, Seu papel na salvação dos homens, etc. Qual é a mentalidade que Ela deve ter para desempenhar este papel e então nós A conhecermos quase que obliquamente. Através do fato dEla ser Mãe de Deus, conhecemos Seu ofício. Através deste, conhecemos as virtudes transcendentalíssimas que A devem adornar.

E depois – é o lado mais bonito, mais nobre e mais transcendente do que São Luís Grignion trata sobre Nossa Senhora – algo das formas possíveis de união com Nossa Senhora, e aquele assunto misterioso entre todos, nobre entre todos, elevado entre todos, que é o mistério de Maria. Quer dizer uma certa forma de mistério que há das almas se unirem a Nossa Senhora e de Nossa Senhora se unir às almas, uma certa forma misteriosa que faz com que a alma progrida rapidamente, etc.

Ele dá as descrições do segredo de Maria, no sentido de algo que se passa nos recônditos, nos páramos mais altos, mais sublimes da vida sobrenatural do católico, e da ação de Nossa Senhora sobre as almas que se passa nesta zona. Ele diz que é um segredo excelso, dado a conhecer a poucos, magnífico etc. e que sobre o qual entretanto ele não trata muito. Percebe-se apenas que se trata de uma forma de aliança de Nossa Senhora com as almas por onde Ela atua de um modo especialíssimo. E que tal aliança torna a vida espiritual mais direta na obtenção dos seus fins, mais fácil, mais frutuosa, mais heróica, mais nobre etc.

O que isto poderá ser? Tenho a impressão – naturalmente eu não posso ter certeza – mas tenho a impressão de que seja algo como o seguinte: uma pessoa pode dar um conselho a outro, colocando-o e mantendo-o no caminho da virtude. É uma coisa possível.

Por exemplo, uma pessoa escreve um livro que apresenta um raciocínio muito lógico e contém um bom conselho. O escritor morre. Muitos anos depois, este livro é lido por alguém e aquele conselho frutifica no espírito deste leitor. Então, este último abandona a vida de pecado por exemplo, ou a heresia ou a incredulidade, e passa a viver de acordo com aquele conselho que leu.

Qual foi a operação que o autor produziu sobre a alma desta pessoa desconhecida, que talvez poderia até ter nascido depois dele ter falecido e que, portanto, sequer o encontrou nesta vida? Ele emitiu um bom conselho. Veio a graça e tocou diretamente a alma daquele homem, fazendo frutificar aquele conselho que o escritor deixara consignado.

Este escritor teve, portanto, uma colaboração valiosa na obra da graça. As palavras inertes dele colocadas no papel foram um instrumento para a graça.

Há um outro modo de uma pessoa atuar sobrenaturalmente na outra. Os Srs. tomem o caso a respeito do qual Dom Chautard conta, de um advogado que foi a Ars visitar São João Batista Vianney, e lhe perguntaram o que ele tinha visto em Ars. Ele respondeu: "Eu vi Deus num homem". Ou seja, viu o Santo Cura d’Ars tão penetrado de virtude, tão penetrado de graça, que ele se entusiasmou com aquilo e compreendeu - por um discernimento dos espíritos - que ali estava presente a ação de Deus. E que aquelas qualidades extraordinárias de São João Batista Vianney, superiores à simples força humana, traziam uma tal ou qual filtração da graça. Através desta filtração da graça, ele via indiretamente, obliquamente, algo de Deus.

Assim podemos conjeturar que a ação de São João Batista Vianney sobre este homem tenha sido uma ação especial. Não é mais um texto de um livro que alguém lê e a graça atua sobre o leitor, mas é a graça que havia em São João Batista Vianney e que de algum modo se transmite para a pessoa que o viu. De maneira tal que a pessoa recebe meio misteriosamente uma participação da graça que havia em São João Batista Vianney. O que tem muita importância concretamente, porque recebe algo como que o espírito de São João Batista Vianney, recebe como que a mentalidade dele, algo que vai prolongar a mentalidade de São João Batista Vianney na mentalidade daquele indivíduo que foi tocado pela graça.

É algo como se fosse – é claro que não é isso – a própria alma de São João Batista Vianney que se "transfundisse", de algum modo, na alma do outro, e que passasse a viver de algum modo na alma do outro. Não é isto, porque uma alma não pode se transfundir em outra, mas é uma coisa que seria parecida com isto. De onde, então, o mencionado advogado passar a viver das virtudes, da graça que havia no Santo Cura d’Ars, adquirindo algo de sua mentalidade.

Acho que o mistério de Maria tenha muito disto. Quer dizer, quando se medita a respeito de Nossa Senhora e se trata de saber quais são as qualidades dEla, suas virtudes super-excelsas, etc., há qualquer coisa do espírito dEla, da graça dEla que toca na alma, e que faz com que a virtude passe a ser uma espécie de prolongamento das virtudes de Nossa Senhora.

Não me parece que seja apenas o efeito do texto de um teólogo – no caso São Luiz Maria Grignion de Montfort – que escreveu alguma coisa, e vem a graça e atua em quem o lê e o toca. Há isto, mas haveria o que disse antes.

Como é que se faz isto? Em parte pelo próprio livro. Porque o "Tratado da verdadeira Devoção à Santíssima Virgem", a meu ver, se poderia chamar - forçando talvez um pouco a palavra - um livro carismático. Quer dizer, há trechos em que se tem a impressão de que algo do fogo dele começa a crepitar e a viver no leitor.

Mas há mais. Tenho a impressão que há uma ação misteriosa de Nossa Senhora por onde quem lê o livro de São Luís Grignion adquire como que uma comunicação da graça dEla, como que uma extensão das virtudes dEla.

O que isto representa de concreto? Vamos dizer a virtude da pureza. Uma coisa é a pessoa receber uma extensão da virtude da pureza como ela era em São Luís Grignon ou em São João Batista Vianney. Mas, muito melhor é ter uma extensão da virtude da pureza de Nossa Senhora. Porque ainda que estes dois santos - como todos os santos - fossem ilibadamente puros, eles não tinham aquela pureza transcendente, insondável, que Nossa Senhora tinha. De maneira que receber uma comunicação da pureza dEla, é receber em matéria de pureza algo de tão super-excelente que não se sabe o que dizer.

Mas Nossa Senhora era assim em matéria de pureza e em todas as demais virtudes. E receber as virtudes dEla é receber uma operação do Segredo de Maria.

Volto a dizer que é uma hipótese que estou fazendo, não tenho certeza, mas a impressão de que quando este segredo de Maria atua prolongadamente na alma, ele pode por assim dizer fixar-se nela e a alma adquirir habitualmente, estavelmente, uma participação em toda a vida sobrenatural de Nossa Senhora. E por esta forma ela pode dizer de um modo mais racional talvez do que o próprio São Paulo disse a respeito de Nosso Senhor Jesus Cristo: "Já não sou eu quem vivo, é Maria quem vive em mim". Quer dizer, toda a vida espiritual da pessoa é uma extensão da vida espiritual dEla, é uma comunicação da vida espiritual dEla. E, evidentemente, é a mais alta forma de união que se pode ter com Deus.

Digo "com Deus" de propósito, porque quanto mais se está unido a Nossa Senhora, mais se está unido a Nosso Senhor Jesus Cristo, Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, mais se está unido portanto às outras Duas Pessoas.

Isto posto, sem que eu ao menos sinta segurança para afirmar que isto é assim, é possível que haja isto na ordem sobrenatural. E sendo possível que haja isto, é mais do que razoável que nós o peçamos.

Os Srs. compreendem que é mais do que razoável nós lermos em São Luís Grignion o que ele escreveu a respeito dEla para termos uma idéia de como é o espírito dEla e pedirmos a Ela que nos conceda Seu espírito, que nos conceda esta comunicação de Suas graças de um modo estável. Embora depois Nossa Senhora pudesse querer muitos heroísmos, muitos lances de generosidade da parte de quem foi favorecido com tais graças.

Mas podemos pedir que Ela nos transforme como a água foi transmudada em vinho nas bodas de Caná. Nas bodas de Caná parece que Nosso Senhor não deu nenhuma resposta a Ela, porque quando Ela pediu para fazer o milagre, Ela só disse isto: "Eles não tem vinho", que era um pedido implícito: "tenha pena deles"... Ele não respondeu nada, e mandou vir água, o que parecia quase uma recusa. Trouxeram água e Ele transmudou em vinho.

Podemos pedir a Nossa Senhora que sejamos como outros tantos odres de água e que Ela, por uma palavra, nos transmude em vinho.

De que maneira isto poderia se dar? Estive examinando atentamente a fotografia daquela imagem de Nossa Senhora de Fátima que chorou em New Orleans, e me pareceu – se pudesse usar esta expressão, ao menos a julgar pela fotografia – altamente irradiante. Há qualquer coisa nela de uma especial comunicação do espírito de Nossa Senhora.

É uma imagem triste, que contempla, que chora. Há em seu olhar uma grande compenetração da gravidade do pecado contemporâneo, da gravidade do castigo que este pecado merece, da extensão do drama no qual a Igreja está posta, no qual a humanidade está posta. Mas ao mesmo tempo é um olhar com uma grande esperança, uma esperança obstinada de, por meio de um punhado de gente, vencer a batalha.

Tudo leva a crer que a participação no espírito dEla será a participação na tristeza dEla. Mas para ter tal participação é necessário antes de tudo e previamente participar da seriedade dEla, da profundeza de horizontes mentais com que Ela cobre, com um olhar, a terra inteira, de Sua elevação de alma sobrenatural com que acompanha os acontecimentos, do zelo que Ela tem pela Igreja Católica e pela glória de ganhar a luta.

Então, fazendo o resumo da exposição de hoje:

I) para aprofundar no conhecimento de Nossa Senhora, estudar em São Luís Grignion: Capítulo I, arts. 1 e 2; capítulo V, art. 3; capítulo VI, art. 2. Estudar Nossa Senhora como ele estuda, na sua virgindade, na sua maternidade divina, no seu papel na economia da graça, em suas virtudes.

II) Pedirmos que o conhecimento dEla abra para nós as portas do segredo dEla.

III) Este segredo talvez seja a extensão das graças que há nEla, portanto, das virtudes que A distinguem, e portanto ainda, do próprio espírito dEla. É a mais alta forma de união com Deus.

IV) Nossa Senhora opera o seu segredo, a sua ação misteriosa de um modo suave, rápido, direto, como foi a transmutação da água em vinho obtida por Ela nas bodas de Caná. É o que devemos pedir-Lhe. Teremos então os perfeitos escravos segundo indica São Luis Grignion, prontos para os acontecimentos previstos em Fátima. Escravos livres daquela liberdade suprema de que tratamos no sábado passado (28 de abril).

[Nota: para consultar uma versão do livro de S. Luis Grignion de Montfort acima citado: https://www.scribd.com/doc/10780605/Tratado-Da-Verdadeira-Devocao-a-SSvirgem]


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