Plinio Corrêa de Oliveira

 

Veneza e Florença

Duas cidades, duas escolas de arte

 

"Catolicismo" nº 789, setembro de 2016 [*]

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Os artistas venezianos quase sempre são mais apaixonados pelas cores, enquanto os florentinos são mais atraídos pelas formas.

Veneza é colorista por natureza. Isto devido a seus palácios e lagunas, recebendo da presença da água o encanto de um ar colorido. Assim, realça todas as coisas e explica a tendência de seus artistas a salientar a cor como elemento de arte.

Por sua vez, em Florença, seus artistas — não recorrendo predominantemente à cor como principal elemento ornamental — valem-se do desenho, cujas obras de arte são o que há de melhor.

Então, a respeito da diferenciação entre a escola veneziana e a florentina pode-se levantar a seguinte pergunta: como transformar este tema num assunto que se compreenda e desperte interesse? Para isso vamos dar dois exemplos.

Neste primeiro quadro o interior da Basílica de São Marcos em Veneza, pintado por Canaletto, nota-se uma linha mestra: a igreja apresenta uma planta em forma de cruz, que é traçada a partir de uma linha desde a porta principal.

Interior de São Marcos - Canaletto, 1755, Royal Collection, Windsor.

O grande pintor Canaletto colocou-se de costas para a porta e de frente para o altar-mor. Na altura do púlpito, abrem-se duas naves transversais completando o formato da cruz. O estilo arquitetônico é simples, porém tudo é abundantemente pintado e colorido! Um exemplo: a arcada é toda ela repleta de decorações e enfeites. Um esplendor no qual a cor prepondera, porque tudo é muito mais pintura do que escultura. Cores luminosas, vivas e impressionantes.

No segundo quadro, também de outro grande pintor, Piero della Francesca, que trabalhou em Florença, representou uma cena pobre do Natal do Menino Jesus. Observe-se o contraste: enquanto Canaletto pintou uma das basílicas mais suntuosas da Cristandade, na cena do Natal quase tudo é desenho, as cores não têm tanta relevância. Vê-se Nossa Senhora olhando para o Divino Menino deitado numa almofada.

Natal - Piero de la Francesca (1420-1492), National Gallery, Londres.

Os personagens, ao contrário dos venezianos, todos são magros. Em Veneza, tendência para os prazeres da mesa; em Florença, inclinação para uma atitude ascética. Na cidade veneziana, todos os personagens estão fazendo movimentos vivos e exclamativos; na cidade florentina, movimentos muito comedidos. Nossa Senhora olha para seu Filho. Ela aparece enlevada, mas sem transportes exclamativos, mas gestos concisos.

No primeiro plano há figuras tocando instrumentos de corda em louvor do Menino Jesus. Certamente, as canções deles não eram dramáticas, mas sóbrias. Quase todos vestidos de verde, em tons diversos. Nossa Senhora também com um traje verde. No segundo plano há outras pessoas igualmente em vestes de um colorido semelhante. Nos outros personagens também as cores não são muito vistosas.

A vida do quadro reside mais nas linhas elegantes das pessoas, em suas atitudes sóbrias e no desenho perfeito. A cor desempenha papel secundário.


NOTAS

[*] Excertos da conferência proferida pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira em 12 de agosto de 1989. Sem revisão do autor.