Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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 "Folha de S. Paulo"

Janeiro de 1979 - Almoço oferecido pela "Folha de S. Paulo" aos colaboradores de sua secção "Tendências e Debates". Vê-se o prof. Plinio Corrêa de Oliveira à esquerda do diretor do jornal, Octávio Frias

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Folha de S. Paulo, 10 de setembro de 1972 

Fala um grande Bispo 

De S. Excia. Revma. o Sr. D. Antônio de Castro Mayer, Bispo de Campos, recebi esta importante missiva:

"Na Folha de S. Paulo de 27 de agosto passado, li sua carta ao Eminentíssimo Senhor Cardeal Dom Eugênio Salles, a propósito do que Sua Eminência escreveu no Jornal do Brasil de 19 do mesmo mês, sob o título "A força do egoísmo".

"Infelizmente, não consegui mais obter exemplar daquele número do "Jornal do Brasil". De maneira que só pude inteirar-me do conteúdo do artigo do Senhor Cardeal Salles através de sua carta aberta.

"Co-autor consciente do livro - best-seller de livraria a seu tempo - "Reforma Agrária - Questão de Consciência", bem como da "Declaração do Morro Alto", que o completa, sinto-me igualmente atingido pela crítica geral de Sua Eminência, que não excetua ninguém dos anti-agro reformistas, e mesmo põe em dúvida a boa fé de todos eles.

"Como o Sr. muito bem pondera em sua carta aberta, quem apresenta argumentos que "têm consistência e seriedade", deve-se presumir-se sincero nas suas convicções. Nós estamos nesse caso. Não só porque apresentamos argumentação bem fundamentada, como porque nossas razões, desde 1960, estão a aguardar refutação...

"Julgo também doloroso "indicar à antipatia, quando não ao ódio" toda uma corrente da opinião nacional. Como, outrossim, acho de lamentar-se não reconhecer a contribuição que toda uma classe - a que se dedica à agricultura - deu ao desenvolvimento e à riqueza do País. Tanto mais que se trata de uma classe para a qual João XXIII, na sua conhecida Encíclica "Mater et Magistra", pede a mesma consideração que se dá às outras classes produtoras. Neste sentido, desenvolve considerações que ocupam boa parte do terceiro capítulo da Encíclica.

"Como o Sr. diz, não se trata de debater o problema da reforma agrária. Trata-se de repelir uma acusação desmerecida.

"Não ponho em dúvida a existência de casos em que haja abusos em matéria de propriedade. A generalização, porém, que atinge toda uma classe, é sempre injusta e agressiva. A não ser que se queira pôr em dúvida o princípio que justifica a existência dessa classe. Tenho, no entanto, a certeza de que não se trata do princípio, que no caso é o da propriedade privada dos bens de produção, uma vez que semelhante principio faz parte do Depósito da Revelação, como atesta o ensinamento constante dos Papas que trataram do assunto.

“Estas considerações em nada afetam o respeito que devo ao Eminentíssimo Senhor Cardeal Dom Eugênio Salles, a quem devo gentilezas que me é grato reconhecer.

"Estou certo, Dr. Plinio, de que sua carta tenha servido para elucidar a opinião pública e espero que o Sr. continue, sem mais tropeços, sua benemérita obra, esclarecendo as questões obscurecidas pela atroada das paixões".

Agradecendo estas palavras alentadoras do Sr. Bispo de Campos, mudo de assunto.

Li no maior diário chileno, "El Mercurio", edição de 21 de agosto p.p., a notícia do ocorrido em uma reunião da Esquerda Cristã, parcela da coligação política que sustenta o marxista Allende. O secretário-geral da entidade Bosco Parra, que discursava na presença do Ministro da Agricultura (o fanático líder agro-reformista Chonchol), propôs que o problema da fome, no Chile, se resolvesse com a decretação de um "consumo básico igualitário" a toda a população.

O demagogo "cristão" qualificou o projetado jejum cívico de "justo, digno, ordenado e estético". Sua sem-cerimônia é de desconcertar. Pois deixa sem explicação um fato básico. Antes havia fartura no Chile. Começou-se a dividir igualitariamente tanto as terras quanto as empresas... e as panelas começaram a ficar vazias. - Não é de suspeitar que entre uma coisa e outra - reforma igualitária e panelas - há uma relação de causa e efeito? Se o "camarada" Bosco Parra desejasse realmente eliminar a fome, não seria normal que ele explicasse porque não propõe que o Chile volte ao regime anterior? Por que em vez de voltar à antiga abastança, prefere ele que o povo fique jejuando na atual penúria? Pergunto: onde quer, afinal, chegar este estranho "cristão"?

E não se pense que Bosco Parra está isolado em sua atitude bizarra. Os "Cristãos para o Socialismo", de Antofagasta, à vista da miséria criada pelas reformas socialistas chilenas, não levantam o menor protesto. Pelo contrário, mostram-se inteiramente conformados, e, por sua vez, recomendam aos católicos a resignação religiosa ante a pobreza generalizada no país: "O cristão - dizem - não teme o jejum; está familiarizado com ele. O jejum é a caderneta de identidade de seus profetas (...). Jesus iniciou a sua atividade pública com um jejum voluntário. A liturgia (...) põe o jejum como o estribilho de suas festas" e "reserva a sexta-feira para a abstinência". Com esse argumento, os "Cristãos para o Socialismo" tentam acostumar o povo à miséria igualitária.

E ao mesmo tempo acusam os burgueses de utilizar a Religião como ópio para o povo!...

* * * 

A Revolução Francesa foi a mãe maldita, a precursora genuína do comunismo.

O que se passou durante a Revolução Francesa, em matéria de jejum cívico, é altamente significativo. A política igualitária das sucessivas assembléias revolucionárias dispersara as elites, forçara a baixa da produção e acarretara a desorganização dos transportes. O deputado Verginaud propôs então, à convenção, que convidasse o povo a apertar o cinturão por meio de um jejum cívico feito à maneira dos jejuns religiosos. A Convenção julgou o projeto digno de deliberação. Outro deputado, Légendre, encareceu a idéia, propondo que o "jejum cívico" não fosse apenas sugerido, mas imposto pela Convenção ao povo francês. Ele aventou mesmo o estabelecimento de uma "quaresma cívica", para que a queda do consumo compensasse, pelo menos algum tanto, a queda da produção ("Histoire Parlamentaire de la Révolution Française" - Buchez et Roux, vol. XXVI, pag. 39 e vol. XXXVII, pags. 9, 10 e 11).

Nenhum convencional pensou em corrigir a situação pela base, abolindo uma igualdade que estimulava forçosamente a iniciativa particular, reduzia ipso facto a produção, e lançava o povo na miséria. - Desde que tudo estivesse nivelado e dividido, que importava aos demagogos a fome do povo?

Tais são os igualitários de todos os tempos...


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