Plinio Corrêa de Oliveira

 

Livros versus canhões

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 8 de abril de 1945

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Precisamente neste momento de tanta desorientação dos espíritos, vem a lume no Brasil três obras que, muito diversas entre si, constituem entretanto elementos preciosos para dissipar na opinião católica as apreensões exageradas, as confusões e a incerteza.

De um lado, a Faculdade de Filosofia "Sedes Sapientiae" edita e anuncia a monumental tradução, para o português, da "Suma Teológica" de S. Tomás de Aquino. Essa obra não precisa de elogios. Ela vinha sendo esperada com o maior interesse por todos os círculos intelectuais do País e corresponde a uma verdadeira e premente necessidade para quem quer que estude a sério S. Tomás de Aquino. Feita pelo prof. Alexandre Correia, que é sem dúvida quem melhor poderia realizar esse empreendimento no Brasil, ela constituirá, pelo valor das credenciais intelectuais do seu autor, como que uma versão oficial de São Tomás. Mesmo aos conhecedores do latim, aliás acessível do Angélico, a obra será muito útil, porque facilitará a intelecção perfeita do texto, em assunto que exige, mais do que qualquer outro, o conhecimento absolutamente preciso do sentido de cada termo. Ademais, havendo uma tradução de tal valor, em português, estaremos livres das citações estropiadas de S. Tomás, feitas em vernáculo, que com tanta freqüência encontram-se em livros e artigos nacionais ou portugueses. Por fim, os exemplares da Suma são raríssimos em nosso mercado de livros. A edição de formato cômodo e elegante, que a Faculdade "Sedes Sapientiae" edita agora, franqueará o estudo de S. Tomás a todos os brasileiros. O Doutor universal deixará de ser o "tesouro escondido" que era até aqui para nossos jovens estudiosos. Houve quem o comparasse ao sol. Esse sol vai brilhar agora com toda a intensidade, nos ambientes intelectuais do Brasil.

Basta conhecer um pouco de S. Tomás para compreender o que isto significa de ordem, de clareza, de vida, de ação em profundidade, mesmo em uma época - ou principalmente em uma época - na qual só parece ser verdadeiramente eficaz a linguagem dos canhões que troam.

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Nestes tempos de reestruturação política e social, é premente que os assuntos concernentes à pessoa humana, à família, à profissão, ao Estado, à sociedade internacional, sejam estudados com especial atenção pelos católicos.

Para isto, acaba de vir a lume uma excelente tradução do "Curso de Direito Natural", de Taparelli d'Azeglio. É seu autor o insigne Sacerdote da Companhia de Jesus Pe. Principessa Rossetti, que em meio dos afazeres de sua cátedra na Faculdade de Filosofia que os PP. Jesuítas mantém em Friburgo, encontrou tempo para levar a cabo esse importante trabalho. Diz-se que os jesuítas repousam carregando pedras. A História da Igreja atesta que essas pedras, carregadas em fugidios instantes de distensão, se transformam em flores. Nas mãos do Pe. Principessa Rossetti se transformaram em frutos. Porque são na realidade frutos atraentes, e substanciosos para o espírito, as páginas densas de santa e verdadeira ciência, do livro com que ele acaba de brindar o público brasileiro.

O trabalho de Taparelli d'Azeglio é tudo quanto se possa encontrar de mais sólido a respeito de Direito Natural. Analisando o assunto desde seus últimos e mais remotos fundamentos, Taparelli d'Azeglio dá ao leitor uma noção sólida, completa, de uma clareza cristalina, acerca de toda a concepção político-social do Catolicismo. Lembro-me bem da impressão de verdadeiro deslumbramento que tive, quando o li em meus tempos de estudante. Não o deslumbramento oco e passageiro que as obras de certa fosforescência literária podem produzir. Mas o deslumbramento que a mente reta não pode deixar de experimentar quando é posta em face de um sistema que de seus primeiros princípios extrai com lógica inflexível, uma a uma, as conclusões, terminando por constituir com elas uma vasta e seguríssima estrutura. O espírito humano foi feito para a verdade, e exulta profundamente quando a possui. A vontade humana foi feita para o Bem, e só no Bem encontra seu verdadeiro e perfeito repouso. Não posso me esquecer da satisfação com que, lendo o "Saggio di Diritto Naturale" me fui convencendo plenamente de todas as suas teses. Para mim, que na Faculdade de Direito só convivia com as doutrinas crepusculares do positivismo jurídico, o contraste entre essas penumbras e o esplendor da doutrina católica, era algo de indescritível. E a esse júbilo de possuir a verdade se somava outra. Era a alegria de ver que a verdade era como era. "Anima humana naturaliter christiana". A alma humana encontra na doutrina da Igreja a consonância absoluta com todos os seus anseios. Que alegria em ver que era tão perfeita a ordem moral e jurídica do mundo criada por Deus! Essas são impressões que nunca se apagam do espirito. Não posso pensar em Taparelli sem me lembrar disto. E é de dar graças a Deus, que por fim uma tradução correta, clara, de uma perfeita precisão de termos, venha pôr ao alcance de todos os nossos estudiosos, a melhor obra de Direito Natural que se encontra na Cristandade.

O Pe. Principessa Rossetti teve a excelente idéia de traduzir, não propriamente o "Saggio", mas o "Curso de Direito Natural", edição didática do "Saggio", feita pela próprio Taparelli. O método do "Curso" é rigorosamente "escolástico - como aliás toda a doutrina do livro - e tem aquela simplicidade, aquela clareza, aquela substanciosa e despretensiosa solidez que caracteriza tudo quanto é verdadeiramente impregnado de espírito tomista. Esse livro tem em seu consenso o elogio unânime da critica católica, e mereceu uma honra raríssima. Taparelli d'Azeglio é o único autor de Direito Natural relativamente recente, que tenha sido citado por algum Papa. Pelo menos, não encontrei outro que fosse citado em toda a rica coleção de documentos pontifícios editada pela "Bonne Presse". Foi Pio XI que citou Taparelli. Para um escritor católico, é esta a maior das consagrações.

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Ao mesmo tempo, o Revmo. Pe. Valentim Armas, CMF, acaba de publicar nova edição de seu livro "Esplendores de Fátima". Editou-a a "Ave Maria" Ltda. É um belo volume de perto de quatrocentas páginas, cuja leitura é da mais absoluta necessidade para o mundo contemporâneo.

Muito já se tem feito no Brasil, em prol da devoção a Nossa Senhora de Fátima. Em S. Paulo, devemos ao zelo dos PP. Terceiros Regulares de S. Francisco de Assis, a esplêndida Igreja que, em honra da Ssma. Virgem aparecida em Fátima, se ergue no alto do Sumaré. O insigne Pe. Fernandes publicou sobre Fátima um trabalho que dizem ser excelente, mas que a despeito de todos os meus esforças ainda não me chegou às mãos.

Um pouco por toda parte, começam a aparecer as Igrejas ou os altares a Nossa Senhora de Fátima, e se multiplicam nos devocionários correntes as orações a Ela dirigidas. A meu ver, entretanto, tudo isto ainda é pouco, e é até muito pouco. Fátima não é um fato ocorrido apenas em Portugal, e nem mesmo interessa apenas a nosso tempo. Fátima é um marco novo na própria História da Igreja. Fátima é, queiram-no ou não o queiram, a verdadeira aurora dos Tempos Novos cujos albores não despertaram nos campos de batalha, nem nas laudas de papel de tantos escritores, mas no momento em que Nossa Senhora baixou à terra e comunicou aos três pastorinhos as lições severas sobre o crepúsculo de nossos dias, e as palavras esperançosas sobre os dias de bonança que a Misericórdia Divina prepara para a humanidade quando finalmente se arrepender.

De tudo isto pode persuadir-se facilmente o leitor, nas páginas atraentes e substanciosas do livro do Revmo. Pe. Valentim Armas. Não hesito em dizer que esse trabalho deveria ser lido e meditado por todos os católicos brasileiros. Ele contém a narração objetiva e documentada, das aparições de Nossa Senhora. Vem, em seguida, a narração exata das mensagens de que Nossa Senhora incumbiu os pastorinhos. E, por fim, se desvenda uma parte dos famosos "Segredos de Fátima", que contém os prognósticos sobre os destinos do mundo. Em apêndice interessante narra os milagres ocorridos em Fátima, pela intercessão de Nossa Senhora. Como se vê, o assunto é tratado em todos os seus aspectos, e constantemente com linguagem sóbria e piedosa, que edifica o leitor.

"De Maria nunquam satis". "De Fátima nunquam satis" poder-se-ia dizer. O assunto é por demais rico e empolgante para que me seja possível dizer tudo nestas linhas. Reservo-me para tratá-lo mais a fundo no próximo número do "Legionário" desde que Nossa Senhora de Fátima me ajude a realizar sobre o assunto um trabalho que seja uma retribuição mínima à imensidade de graças que lhe devo.

Nota: Os negritos são deste site.


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