Plinio Corrêa de Oliveira

 

Urgente Definição

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O Legionário, 23 de junho de 1935, N. 174

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Destinado a ser um dos órgãos do pensamento católico, o “Legionário” tem procurado manter-se sempre acima das divergências partidárias em suas apreciações sobre as questões políticas, em que uma simples atitude de silêncio e desinteresse evidenciaria uma incompreensão injustificável da própria ação da Igreja nesse terreno.

Nesses termos, não podemos deixar de protestar contra uma publicação do Departamento de Publicidade da Ação Integralista Brasileira no “Diário de São Paulo” do dia 9 do corrente, intitulada “A Urgente definição”, mesmo porque se em nossos trabalhos timbramos em ser só e sempre católicos, sentimo-nos também visados com as injúrias contidas naquele documento.

Não o fazemos por qualquer prevenção de nossa parte contra o integralismo, sobre o qual já nos temos referido muitas vezes com a maior imparcialidade, reconhecendo suas qualidades e apontando suas deficiências.

Queremos apenas fazer com que os integralistas de boa vontade compreendam a nossa atitude e, ao mesmo tempo, chamar a atenção do Departamento de Publicidade da Ação Integralista pelas expressões desrespeitosas que usou para com a autoridade da Igreja. Se deixamos lavrado nosso protesto contra tais afirmações não é em absoluto por qualquer sentimento de amor-próprio, nem apenas - o que já seria suficiente - em defesa da nossa dignidade e da nossa honra, mas sobretudo porque foram ofendidas insólita e arrogantemente a própria dignidade e a honra da Igreja, da qual nos confessamos filhos amorosos e submissos.

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Começa o escrito em questão perguntando porque não se pronunciam os católicos definitivamente sobre o integralismo. Ora, os católicos não têm obrigação alguma de se definir em relação ao integralismo. De mais a mais, o pensamento dos católicos só pode ser definido pela autoridade da Igreja. Podem eles ter suas opiniões individuais sobre várias questões de ordem temporal e política, dentro dos limites permitidos pela doutrina católica, mas só a Igreja pode, pelo Papa e pelos Bispos, “pronunciar-se definitivamente” sobre tais questões, quando afetam a fé e os costumes e quando tal definição se impõe por motivos que igualmente só à Igreja, divinamente assistida, cabe julgar. Portanto, solicitando a definição dos católicos, em termos de um verdadeiro desafio, as afirmações que rebatemos não se dirigem apenas aos católicos individualmente, mas chegam a atingir de um modo geral a própria Igreja.

O integralismo é que precisa definir-se, de uma vez para sempre, em relação ao catolicismo, por uma exposição minuciosa e tranquilizadora de sua atitude quanto às liberdades da Igreja e ao reconhecimento da preeminência da Igreja Católica sobre qualquer outra força espiritual do Brasil, por direito doutrinário e histórico. Cumpre-lhe afirmar claramente se a sua “concepção da vida” é a concepção católica, e no caso da resposta afirmativa, não mais permitir referencias insultuosas do seu Departamento de Publicidade à Igreja.

Não contestamos que a Ação Integralista aceite um número maior de princípios preconizados pelo catolicismo na reforma da sociedade do que outros partidos, mas por isso mesmo não tem os motivos destes para evitar uma definição categórica do seu pensamento. Acrescente-se a isso a declaração do próprio integralismo de que não é um partido mas trabalha por uma reforma até mesmo espiritual, a sua intransigência doutrinária e a sua disciplina rígida (que não estamos censurando mas apenas constatando), para se concluir que deve a Ação Integralista ser mais explícita em relação à doutrina e aos direitos da Igreja.

* * *

Não lutamos pela violência, não nos organizamos “tão fortemente como o integralismo” porque a Igreja não precisa dos homens, mas os homens é que precisam da Igreja. Afirmar o contrário é não ter fé, é não confiar nos meios sobrenaturais que constituem a força própria da Igreja e não conhecer o que seja a Igreja.

A nossa confiança não está no integralismo nem em qualquer outra organização humana, mas só na Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo. Autênticos soldados da cruzada iniciada por Jackson de Figueiredo, ainda estamos em que o mundo de hoje está tão perdido que só uma ação puramente católica o poderá evitar.

Sabemos que “Deus quer que o homem diligencie”. Sabemos que é preciso “ter o expediente do bom Samaritano”. Mas diligenciaremos como Deus o quer, seguindo, portanto, as ordens do Papa, pois o Papa é o intérprete da Vontade de Deus, como Vigário de Jesus Cristo. Diligenciaremos, pois, organizando-nos na Ação Católica e cumprindo as determinações que forem dadas pelos Bispos. Precisamente no momento em que o Departamento de Publicidade da Ação Integralista injuriava desabridamente os católicos, eram assinados pelos Bispos do Brasil os planos da Ação Católica Brasileira. Esta é a única autoridade a quem cumpre organizar os católicos para trabalhar também e não “apenas rezar”. Ninguém mais tem direito a dar ordens aos católicos!

Concluindo estas considerações que a consciência nos ditou, queremos tornar patentes os dois erros fundamentais que inspiraram o “desafio” do Departamento de Publicidade da Ação Integralista.

Não é exato que à Igreja Católica, no cumprimento da missão que lhe atribuiu seu Fundador, faltem os meios necessários para a reedificação em Cristo da sociedade contemporânea. Os obreiros que, prescindindo da Igreja Católica, quisessem trabalhar fora do Corpo Místico de Cristo para o mesmo fim, nada obterão. “Nisi DOMINUS aedificaverit domum in vanum laboraverunt qui aedificant eam”.

Também não é exato que a qualquer obreiro da civilização Católica (e não apenas cristã) assista direito de dirigir críticas veladas ou indiretas à autoridade eclesiástica, a quem incumbe de modo exclusivo a guarda e direção do rebanho de Cristo. Prescindir das autoridades da Igreja que, melhor do que ninguém, conhecem o lobo que se esgueira entre as ovelhas para devorá-las, ou pretender dar-lhes lições quanto ao exercício de seus deveres pastorais, é eliminar o próprio Cristo da direção do seu rebanho, tentando substituí-lo por autoridades meramente humanas. Ora, é o próprio Espírito Santo quem nos diz que: “Nisi Dominus custodierit civitatem, frusta vigilat qui custodit eam”.


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