Plinio Corrêa de Oliveira

 

A Alocução Pontifícia

 

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 20 de junho de 1943, N. 567, pag. 2

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Infelizmente, foram muito incompletas as notícias, ou antes as partes do último discurso do Santo Padre Pio XII [de 13-6-1943], transmitidas ao Brasil por via telegráfica. O Santo Padre falou no dia 14 pp., dirigindo a palavra a vinte mil operários italianos, aos quais fez uma alocução radiofônica transmitida a todo o mundo. Em momento tão delicado da vida do mundo, a palavra do Vigário de Jesus Cristo tem importância maior do que nunca. Todos os fiéis, que vêm na Cátedra de São Pedro a infalível rocha da verdade, teriam evidentemente imenso desejo em conhecer o texto completo, palavra por palavra, do que disse o Sumo Pontífice. O telégrafo nos forneceu simplesmente migalhas. Mas, como veremos, são migalhas substanciosas como as do maná. Vale, pois, a pena analisá-las.

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Passamos muito de leve pela parte do discurso do Santo Padre em que ele desmente a acusação de que a Santa Sé tenha qualquer responsabilidade pela deflagração da presente guerra. A calúnia é tão evidente que não nos resta senão lamentar que haja ambientes onde ela possa assumir aspecto de verossimilhança a tal ponto que o Santo Padre, em sua paternal caridade, tome o trabalho de a desmentir.

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Registramos antes de tudo que o Sumo Pontífice julgou necessário tomar mais uma vez a defesa da instituição da propriedade privada, declarando que ela constitui o "fundamento da estabilidade da família". Mais de uma vez, os Pontífices têm erguido a sua voz para afirmar o mesmo princípio. Se, pois, o Santo Padre julga necessário voltar ao assunto, é porque, evidentemente, entende que a propriedade continua ameaçada. Por quem? Segundo muitos otimistas, por ninguém. Os comunistas estariam sendo convertidos. Os nazistas, ao que parece, nunca teriam sido contrários à propriedade. Os beveridgeanos ainda muitíssimo menos. Onde está então o ataque à propriedade individual?

Será que o Santo Padre se está impressionando com um perigo irreal? Ou antes o inimigo está embuçado atrás de uma ou de algumas dessas inocentes aparências que a propaganda bolchevista está multiplicando em nossos dias?

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Pio XI escreveu que o mundo contemporâneo está pervertido, que se encontra na iminência de cair em miséria moral pior do que aquela de onde o tirou a Redenção de Nosso Senhor Jesus Cristo. O Santo Padre, em outro documento, chegou mesmo a dizer que era tal a situação contemporânea, que seria o caso de se perguntar se já não teria chegado o momento de aparecer o Filho da Iniquidade, o homem de maldição que será o anticristo. E apesar disto os dias de hoje continuam a ter calorosos apologistas. Para eles, vai tudo na melhor das maravilhas. Ouçam, pois, essa recente declaração do Sumo Pontífice Pio XII, no discurso que analisamos: “os fundamentos da sociedade foram completamente abalados”.

Está bem uma casa cujos alicerces estão “completamente abalados?” É uma sociedade? É uma civilização?

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A Santa Sé é mãe de todos os povos. As mães sabem ser especialmente carinhosas para com os filhos que sofrem. E por isto a Santa Igreja sempre ressentiu uma especial ternura para com a classe operária.

Veja-se com que ternura o Papa Pio XII lembra tudo quanto a Igreja tem feito pelos operários: “Nossos predecessores e Nós não perdemos oportunidade de fazer compreender a todos os homens as vossas necessidades pessoais e familiares, proclamando como requisitos prévios e fundamentais da concórdia social essas reivindicações que tão caras são: o salário que cubra os gastos da subsistência da família, para permitir aos pais o cumprimento do dever de criar filhos sadios, alimentando-os e vestindo-os, e a possibilidade de dar-lhes instrução e educação e fazer provisões para os momentos de penúria, enfermidade e viuvez”.

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Isto não obstante, a Santa Sé condena, até nessas nobres e justas reivindicações tudo quanto possa ser revolucionário, intemperante, excessivo. Ouçamos ainda a mesma alocução papal:

O peso das atuais dificuldades é sentido pelas massas operárias que estão sobrecarregadas e aflitas em maior grau que as demais classes; porém, não são as únicas a sentirem esse peso. Cada classe deve levar sua própria carga, mais ou menos dolorosa e difícil de suportar”.

E em outro tópico o Sumo Pontífice acrescenta: “o homem e a mulher que trabalham, conscientes de sua grande responsabilidade no bem comum, sentem e compreendem que seu dever não é agravar a carga de extraordinárias dificuldades que os povos suportam com apresentação de exigências nestas horas imperiosas de necessidades universais”.

É sempre o perfeito equilíbrio da Igreja. Oxalá nos compenetremos bem deste espírito.


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