Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

A Igreja e o judaísmo

 

 

 

 

 

 

"A Ordem", nº 11, vol. V (nova série), Ano XI, janeiro de 1931, pp. 44 a 52

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"Deus de bondade, Pai das misericórdias, nós Vos suplicamos, pelo Coração Imaculado de Maria e pela intercessão dos Patriarcas e dos Santos Apóstolos, que lanceis um olhar de compaixão sobre os restos de Israel, a fim de que eles cheguem a conhecer nosso único Salvador Jesus Cristo, e que eles participem das graças preciosas da Redenção. Pai, perdoai-lhes, porque eles não sabem o que fazem"

(Leão XIII, 100 dias de indulgência)

É frequente encontrar-se historiadores, pouco conscienciosos ou pouco profundos, que não hesitam em lançar contra a Igreja a pecha de ser a incitadora de todas as perseguições movidas contra o povo judeu.

Hoje em dia, porém, a verdadeira ciência está procedendo a um exame imparcial sobre a atitude da Igreja na questão judaica, e como bonecos de neve que derretem à luz do sol, as calúnias armadas contra o Catolicismo se desfazem sob a ação de investigações rigorosas e profundas.

Meses atrás, tive ocasião de evidenciar que, em todos os desmandos da Inquisição, não cabe à Igreja a menor parcela de cumplicidade.

Venho hoje estudar a situação da Igreja em face do problema judaico.

Muito se tem escrito a este respeito. Não houve fábula, por mais absurda que fosse, nem afirmação, por mais inverídica, que não encontrasse eco em determinado público, sempre disposto a veicular, sem maior exame, todas as afirmações favoráveis às suas paixões.

Em primeiro lugar, em que consiste o problema do judaísmo?

Dispersado o povo deicida, graças ao castigo divino que sobre si atraiu há quase vinte séculos, erram os judeus sobre a face da Terra, sem se fundir com raça alguma.

Dotados de notáveis qualidades intelectuais, têm os judeus produzido homens ilustres em quase todos os ramos do saber humano. Sua grande capacidade comercial lhes trouxe fortunas imensas, ou seja, em outras palavras, uma influência colossal sobre a marcha dos negócios públicos.

Basta, para demonstrar esta afirmação, recorrer às orgulhosas frases dos próprios judeus. Bernard Lazare, em suas obras, afirma que foram os judeus que, pela infiltração do espírito de dúvida, prepararam a Reforma, suscitaram novas concepções artísticas que inspiraram os pintores e escultores da Renascença, despertaram na inteligência dos sábios as primeiras noções de humanismo, prepararam a mentalidade da qual sairiam os espíritos incréus de Voltaire, Rousseau e outros, provocaram a Revolução Francesa, o movimento liberal de 1830 em França, e finalmente o socialismo. Não há, termina Bernard Lazare, frase feliz, dito irônico hoje célebre, que se tenha dirigido contra o Cristianismo, e que não seja senão o eco de alguma palavra espirituosa ou profunda, pronunciada pelos judeus no isolamento dos seus guetos, bairros em que viviam segregados (Bernard Lazare, L'Antisémitisme, son histoire, ses causes).

Ninguém mais autorizado do que Bernard Lazare para fazer as afirmações acima. Foi ele um dos grandes líderes do movimento moderno semítico europeu, e seu nome figura entre os dos maiores chefes do judaísmo em nossos dias.

Disraeli, que se gabava de ser judeu e que, como notável político que era, falava com conhecimento de causa, jactava-se de que "o mundo está, hoje, em mãos de potências desconhecidas, que governam nos bastidores", e de que a influência do judaísmo se fazia sentir por toda parte, na Europa, citando depois uma lista enorme de personagens de seu tempo, todos judeus. Acrescenta que a "misteriosa diplomacia russa", bem como o movimento intelectual e político alemão, e todos os movimentos importantes da Europa, são guiados por judeus (Disraeli, Coningsby, pp. 183-184 - tradução francesa).

Já vimos que Bernard Lazare contemplava com satisfação a influência dos judeus no movimento socialista. Quem ignorará que Marx era judeu? Quem ignora que a grande maioria dos cargos da atual administração soviética está confiada a judeus? Quem desconhece a origem judaica de Trotski? François Coty, no seu magnífico livro Contre le Communisme, demonstra à saciedade a grande influência dos judeus, em benefício dos comunistas, na França.

Ora, diante do imenso poderio dos judeus, que têm a [seu] serviço desde os milhões dos capitalistas Rothschild, até a administração e as baionetas dos "camaradas" soviéticos, surge uma pergunta: qual a situação do mundo civilizado em geral, se estes judeus conservaram entre si uma grande solidariedade? Quem poderá prever as consequências incalculáveis que poderia acarretar para o mundo uma coesão de todos os judeus, todos tão bem colocados? Como a trindade bramânica, que se compõe de Brahma, a força criadora, Vishnu, a força conservadora, e Siva, a força destruidora, o judaísmo teria em suas mãos o poder de criar, conservar ou destruir a seu bel-prazer os mais poderosos tronos, as mais importantes repúblicas.

Bismarck dizia que nunca se vai tão longe, como quando não se sabe onde se vai. Não se dará o mesmo conosco?

Eis as perguntas que, angustiados, formulam hoje os mais preclaros estadistas.

Notícias trazidas pelo telégrafo nos relatam que houve na Europa, nestes últimos dias, diversas manifestações violentas de anti-semitismo. É a reação censurável e brutal contra um estado de coisas deplorável, é certo, mas que os Estados ocidentais e cristãos foram os primeiros a favorecer.

A Igreja, em nome da clemência cristã, se opõe formalmente ao anti-semitismo violento das massas. Não quer o extermínio dos judeus. Quer proteger suas vidas e seus direitos. Quer perdoar aos que A ofendem.

 As sábias prescrições do Direito Canônico, que recomendava que os judeus fossem humanamente tratados, mas sistematicamente afastados do governo e de qualquer situação em que pudessem adquirir poder, foram esquecidas. E desde há séculos que a humanidade oscila entre extremos de crueldade simplesmente abomináveis, e uma imprudência não menos censurável.

E como se não fosse bastante, ainda os falsos eruditos, aqueles para quem o delenda est Ecclesia é o fim último da existência, atiram justamente à Igreja a pecha de ter sido intolerante para com os judeus.

No entanto, em Roma havia um bairro especialmente destinado a abrigar os judeus expulsos dos outros países europeus.

Os Papas sempre se opuseram a que os judeus fossem perseguidos, e alegavam invariavelmente, para esta atitude, as seguintes justificativas:

1) os judeus dão testemunho da verdadeira fé ortodoxa, tanto porque conservam as escrituras cheias de profecias que anunciam Cristo, quanto porque sua dispersão entre os povos lembra o deicídio por eles cometido;

2) porque eles regressarão um dia à verdadeira religião, e seus restos serão salvos;

3) porque eles próprios se parecem com o Salvador, e Deus é seu criador, como o dos cristãos;

4) a Santa Sé deve sua proteção tanto aos insensatos quanto aos sensatos, e os cristãos devem tratar os judeus como gostariam de ser tratados em países pagãos. Não é necessário que eles, como cristãos, amem a paz e trabalhem pelo direito?

Vem agora a prova a mais absoluta da tolerância da Igreja: No dia 30 de outubro de 1806, Napoleão reuniu em Paris o Sinédrio (*)  hebraico. O rabino Isaac Samuel Avigdor, deputado dos Alpes marítimos, pronunciou o seguinte discurso, pelo qual externava os sentimentos dos judeus em relação à atitude do Clero católico:

"Santo Atanásio, livro I, diz: é uma execrável heresia torturar pela força, pela brutalidade, pelas prisões, aqueles que não foi possível convencer pela razão.

"Nada é mais contrário à Religião do que o constrangimento, diz São Justino, mártir, livro V.

"Perseguiremos nós, diz Santo Agostinho, aqueles a quem Deus tolera?

"Lactâncio, no livro III, diz, a este respeito, que a religião forçada não é mais uma religião; é necessário persuadir, e não constranger; a religião não se encomenda.

"São Bernardo diz: aconselhai, porém não forçai.

"Assim, dado que a moral cristã ensina por toda a parte o amor do próximo e a fraternidade, a ignorância e um preconceito originado pelos costumes são as únicas causas das vexações e das perseguições das quais fostes frequentemente vítimas. Isto é tão verdade, que estas virtudes sublimes de humanidade e de justiça foram frequentemente praticadas pelos cristãos verdadeiramente instruídos, e sobretudo pelos dignos ministros desta moral pura, que acalma as paixões e insinua as virtudes.

"É em virtude dos princípios sagrados da moral que os Pontífices romanos, em diversas épocas, protegeram e acolheram em seus Estados os judeus perseguidos e expulsos das diversas partes da Europa, e que os eclesiásticos de todos os países defenderam frequentemente os judeus.

"Em meados do século VIII, São Gregório defendia os judeus, que ele protegeu em todo o mundo cristão.

"No século X, os Bispos de Espanha opuseram-se com a maior energia ao povo que queria massacrar os judeus. O pontífice Alexandre II escreveu a estes bispos uma carta cheia de felicitações pela conduta sábia que, a este respeito, haviam adotado.

"No século XI, os judeus, muito numerosos nas dioceses de Uzès e de Clermont, foram poderosamente protegidos pelos bispos.

"São Bernardo os defende da fúria dos cruzados, em meados do século XII.

"Inocêncio II e Alexandre III os protegeram igualmente.

"No século XIII, Gregório IX os preservou, tanto na Inglaterra quanto na França e na Espanha, das grandes infelicidades das quais eles eram ameaçados, e proibiu, sob pena de excomunhão, que suas consciências sofressem qualquer constrangimento, e que suas festas fossem perturbadas.

"Clemente V não se limitou a protegê-los, proporcionou-lhes os meios de se instruírem.

"Clemente VI lhes concedeu um asilo em Avignon, quando todo o resto da Europa os perseguia.

"Nos meados do mesmo século, o bispo de Espira impediu que os devedores dos judeus fossem dispensados de pagar suas dívidas, medida esta pedida sob o pretexto tantas vezes renovado da usura.

"Nos séculos seguintes, Nicolau II escrevia à Inquisição para lhe proibir que forçasse os judeus a aceitar o Cristianismo.

"Clemente XIII acalmou a inquietude dos pais de família judeus que se alarmavam pelo destino de seus filhos, que eram frequentemente arrancados do seio das próprias mães.

"Seria fácil citar uma infinidade de outras ações caridosas das quais os israelitas foram, em diversas épocas, objeto por parte dos eclesiásticos instruídos dos deveres dos homens e dos de sua Religião.

"Estes homens virtuosos nada podiam, no entanto, esperar de sua coragem filantrópica senão esta doce satisfação interior que as obras de caridade fraterna proporcionam aos corações puros.

"O povo de Israel, sempre infeliz, sempre oprimido, nunca teve ocasião de manifestar seu reconhecimento por tantos benefícios, reconhecimento este que lhe é tanto mais agradável manifestar quanto é tributado a homens desinteressados e duplamente respeitáveis.

"Depois de 18 séculos, a circunstância em que nos achamos é a primeira que se nos depara para tornar conhecidos os sentimentos de que nossos corações estão penetrados.

"Esta grande e feliz circunstância, que devemos a nosso augusto e imortal Imperador, é também a mais conveniente e a mais bela, como a mais gloriosa, para exprimir aos filantropos de todos os países, e notadamente aos eclesiásticos, nossa absoluta gratidão para com eles e seus predecessores.

"Aproveitemos pois, Senhores, esta ocasião memorável, prestando-lhes este justo tributo de reconhecimento que nós lhes devemos; façamos repercutir neste recinto a expressão de nossa gratidão; ostentemos com solenidade nossos sinceros agradecimentos pelos benefícios sucessivos de que cumularam as gerações que nos precederam".

Em resposta, a Assembleia resolveu o seguinte:

"Os deputados do Império de França e do Reino da Itália ao sínodo hebraico, decretado aos 30 de março p.p., penetrados de gratidão pelos benefícios sucessivos do Clero cristão, nos séculos passados, em favor dos israelitas dos diversos países europeus;

"Cheios de reconhecimento pela acolhida que diversos Pontífices (Papas) e diversos outros eclesiásticos dispensaram em tempos diversos aos israelitas dos diferentes países, enquanto a barbárie, a ignorância e os preconceitos, reunidos, perseguiam e expulsavam os judeus do seio das sociedades;

"Determinam que a expressão destes sentimentos seja consignada no processo verbal deste dia, para que fique como um testemunho autêntico e duradouro da gratidão dos israelitas desta Assembleia por todos os benefícios que as gerações que lhes precederam receberam dos eclesiásticos dos vários países da Europa;

"Resolvem, também, que uma cópia destes sentimentos será enviada a S. Exa. o ministro dos Cultos".

Não poderia a Igreja receber uma mais significativa homenagem. Não poderiam seus detratores sofrer um mais formal desmentido. Esvai-se completamente a lenda da intolerância da Igreja, diante deste significativo documento (que se encontra no Procès verbal des séances de l'assemblée des députés français professant la réligion juive, pp. 169 ss.).

Depois de tentar uma política de exagerada largueza para com os judeus, Napoleão mudou de rumo e, restringindo suas regalias, declarava que os defeitos do povo judeu não provinham da raça, mas da constituição que a governava. E justificou assim a política da Igreja, tão prudente, dentro da clemência cristã. E, efetivamente, quem é que, conhecendo as determinações infames do Talmud, não justifica esta prudência? Quem é que não receia a influência de um povo governado por um código religioso que considera pecado o não se prejudicar o mais possível os cristãos?

Para terminar, contam os padres Leman, de origem judia, que, quando Pio IX teve conhecimento dos ataques que lhe faziam os judeus depois do 20 de Setembro, ajoelhou-se e, em companhia dos dois judeus convertidos, rezou pela conversão dos israelitas.

Imitemos o grande Pontífice. Oremos para que os judeus, enfim convertidos, não nos mereçam mais a prevenção, de que os culpados são eles próprios, e não nós (**).

Notas:

(*) O Sinédrio é a assembleia religiosa máxima dos judeus, que desde a dispersão do povo hebraico, sob Tito, não se reunia. Equivale a nossos concílios, mais ou menos.

(**) A maior parte das informações do presente artigo foram tiradas de (Mons. Henri) Delassus, La Conjuration Anti-Chrétienne.


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