"Catolicismo" Nº 165 - Setembro de 1964

 

Jornal católico francês responde à carta aberta

publicada em “Kierunki”

 

Plinio Corrêa de Oliveira

Continua a repercutir amplamente nos meios católicos europeus o estudo do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira sobre “A liberdade da Igreja no Estado comunista”, publicado nesta folha, e posteriormente traduzido em francês, inglês, espanhol e italiano pela Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade, seção do Rio de Janeiro, e reproduzido por órgãos de imprensa de nove países.

Ainda agora chega-nos às mãos o numero de 3 de maio p.p. do prestigioso e combativo quinzena rio católico “L'Homme Nouveau”, de Paris, que contém — na seção “L'Eglise dans le monde” — uma replica à “Carta Aberta” dirigida ao Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, através do jornal “Kierunki” de Varsóvia, pelo Sr. Zbigniev Czajkowski, do grupo “Pax” (demos noticia desta em nosso nº 161, de maio último). Trata-se de um artigo do Sr. Henri Carton, o qual, tomando conhecimento da “Carta Aberta” através dos próprios serviços de divulgação de “Pax”, sentiu-se impelido a intervir no debate, refutando os ataques do progressista polonês às teses defendidas em “A liberdade da Igreja no Estado comunista”.

No numero 162, de junho p.p., publicamos a resposta do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira ao Sr. Z. Czajkowski. Julgamos oportuno trazer hoje ao conhecimento dos nossos leitores a incisiva e brilhante argumentação que o Sr. Henri Carton desenvolve no seu artigo, intitulado “Lettre ouverte à Monsicur Czajkowski”.

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O Sr. Henri Carton começa por recordar a estupefação do Sr. Z. Czajkowski diante da afirmação de nosso ilustre colaborador, de que a implantação do comunismo representa para um pais um risco grave de extirpação da Fé e, como tal, é um mal maior do que a guerra, pois a perda da Fé é um mal maior do que todo o extermínio que uma guerra, mesmo atômica, possa causar. E lembra ainda que o espanto e a indignação do jornalista polonês cresceram quando soube que uma petição assinada por mais de 200 Padres Conciliares do mundo inteiro — que lhe pareceu inspirada nos mesmos princípios que presidiram à elaboração do artigo “A liberdade da Igreja no Estado comunista” — tinha sido entregue à Santa Sé, pedindo uma nova condenação do comunismo e do socialismo, pelo Concilio.

Segundo o Sr. Z. Cjakowski, não se põe o dilema que o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira diz poder-se deparar às nações do Ocidente: ou a aceitação de um regime comunista, com risco de extirpação da Fé, ou a luta, com risco de guerra termonuclear. A prova disso seria a situação do Catolicismo na Polônia, que não é nem “idílica” nem “de catacumbas”: ela se traduz num modus vivendi, no sentido de um respeito verbal das respectivas doutrinas por parte de comunistas e católicos, colaborando todos na edificação de uma sociedade conforme aos princípios da ideologia marxista.

Mas, justamente, sr. redator-chefe — prossegue o Sr. Henri Carton, dirigindo-se ao jornalista polonês —a sua esperança dá razão ao Dr. Plinio, que teme que o modus vivendi à maneira polonesa conduza à debilitação na atitude anticomunista”. Aceito o modus vivendi nas condições descritas, os católicos continuariam talvez a recitar o Credo com a ponta dos lábios, mas o seu coração e o seu espírito estariam embebidos de todos os erros do comunismo, o que equivaleria, concretamente, à perda da fé.

Assim sendo, para evitar o mal imenso que representaria a perda de milhões de almas, não valeria mais aceitar a luta contra o comunismo, embora isto acarretasse o risco de uma guerra termonuclear?

Quando o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira responde afirmativamente, “ele nada mais faz — observa o Sr. H. Carton — do que traduzir o ensinamento de Cristo e da Igreja; ele não é por isto um “belicista”, mas um cristão lógico e fiel, animado por uma sã “violência”, que é necessária a todos aqueles que desejam o reino de Deus. Ele toma a sério o ‘de que serve ao homem ganhar o mundo inteiro se vier a perder a sua alma?’

O Sr. Z. Czajkowski, porém, opta pela aceitação de uma vitoria total do comunismo. Sustenta, então, que essa vitoria não significaria a perda da fé, “mas antes a sua conservação e purificação, sob a condição de que os cristãos se tornem os mais zelosos e desinteressados aliados dos comunistas, para construir o mundo conforme o plano destes”.

H. Carton mostra que, segundo o próprio Lenine, para acabar com a religião é mais importante introduzir a luta de classes no seio da Igreja do que atacá-La de frente. E tanto isto é verdade, que os que não quisessem adotar tal tática, de fato beneficiariam a Igreja, cujos defensores “nada mais desejam do que ver substituída a divisão dos operários no plano da greve por uma divisão no plano da fé em Deus” (Lenine, “Parti ouvrier et religion” — “Pages choisies” — tomo II, p. 315).

Portanto, “inaugurando a nova tática (de coexistência pacifica), Kruchev não se mostrou menos comunista que Lenine; pelo contrario, deu provas de um leninismo mais fiel”.

É, assim, indesculpável a posição dos chamados católicos de esquerda que se prestam a esse jogo de falsa conciliação, pretendendo mostrar à grande massa dos fiéis, conforme escreve o Sr. Z. Czajkowski, que, “sendo-se católico, pode-se ao mesmo tempo realizar a concepção socialista do desenvolvimento social e econômico do próprio país”.

Sua habilidade tática vai tão longe — replica com ironia o Sr. Henri Carton — que por pouco o Sr. não me convenceria de que, quanto mais se é bom cristão, mais se é comunista”.

Mas eu continuo persuadido —conclui — de que, para a salvação das almas, os cristãos devem aceitar a luta que o marxismo lhes impõe”.

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A intervenção do Sr. Henri Carton no debate em torno das teses propugnadas pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira foi muito oportuna, e contribuirá para chamar ainda mais a atenção dos meios intelectuais franceses, e europeus em geral, para a transcendental importância do problema tratado em “A liberdade da Igreja no Estado comunista”.