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      Uma 
      tendência muito freqüente nos artistas cuja produção possa ser reputada 
      tipicamente "século XX" consiste na deformação do homem. Fugindo de copiar 
      a realidade com as formas em que as vê habitualmente o olho humano, 
      representam-na com alterações destinadas a lhes manifestar o aspecto mais 
      profundo. Tomado em tese, este processo nada tem de mau. Entretanto, chama 
      a atenção que, quando alteram os aspetos correntes da realidade, muitos 
      artistas, dos mais tipicamente modernos, de fato deformam a realidade 
      quase até a hediondez. Assim nos quadros modernos, não é difícil encontrar 
      figuras humanas perfeitamente cônicas: cabeça minúscula, ombros pouco mais 
      largos do que a cabeça, cintura 
      muito mais larga do que os ombros, pernas que parecem ir crescendo até o 
      tornozelo no qual se entroncam pés literalmente imensos. Em certas 
      esculturas, os pescoços não são apenas grossíssimos, mas deformados, 
      apresentando num ou outro ponto bócios alarmantes. Em suma, se algum 
      mágico aparecesse a qualquer homem normalmente sensato, e lhe oferecesse 
      um líquido para transformar sua fisionomia e seu corpo no de uma 
      figura-tipo da arte moderna, tal oferecimento seria seguido de uma 
      imediata e enérgica recusa... Esta obsessão do disforme, do feio, até 
      mesmo do hediondo, chegou em certas produções artísticas aos limites do 
      inconcebível. Veja-se por exemplo o quadro intitulado "Nossa Imagem" 
      (David Alfaro Siqueiros, "Nuestra imagen actual", 1947. Col. Museo de 
      Arte Moderno, INBA, México), que 
      aqui publicamos. É a figura moral do gênero humano, como a quis apresentar 
      um artista tipicamente ultramoderno. *   *   * Que haja no universo disformidades físicas e morais 
      terríveis, e que seja lícito ao artista representá-las sempre que daí não 
      decorra ofensa aos bons costumes, ninguém o contesta. Entretanto, pintar 
      só o horror, não pintar nem esculpir senão para deformar, como se o 
      universo não fosse senão um receptáculo de ignomínias, eis o que revela um 
      estado de espírito errado, e uma concepção indiscutivelmente falsa e 
      perigosa, quer dos homens, quer do mundo. Esta tendência para o hediondo 
      tem em sua raiz uma visão  
       desesperada e blasfema da criação, que é obra de 
      Deus. As pinturas ou esculturas feitas à influência desta visão deformam a 
      alma; e os ambientes impregnados deste estado de espírito só podem 
      degradar o homem, extinguindo nele todos os surtos de inteligência e de 
      vontade para um ideal verdadeiramente nobre, puro e elevado. 
      A 
      título de contraste, apresentamos aqui, tirado a esmo da imensa produção 
      artística dos séculos passados, um quadro que representa um homem na sua 
      maturidade. E muito mais do que o físico deste homem, seu estado de 
      espírito, seu feitio moral. É Richelieu, pintado por Philippe de Champaigne em três atitudes diferentes. Todas as qualidades - e também 
      todos os defeitos - do grande estadista se refletem neste admirável 
      estudo, em que a alma humana pôde ser retratada no que tem de mais íntimo, 
      vivo e sutil, sem que o artista precisasse recorrer, para isto, a 
      deformações que degradam a própria natureza humana. 
 
      
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