Plinio Corrêa de Oliveira

 

Santa Francisca Romana:

táticas do demônio para perder as almas e como se precaver contra as insídias infernais

 

 

 

 

 

 

Santo do Dia, 8 de março de 1967Bookmark and Share

 

A D V E R T Ê N C I A

O presente texto é adaptação de transcrição de gravação de conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a sócios e cooperadores da TFP, mantendo portanto o estilo verbal, e não foi revisto pelo autor.

Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério tradicional da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras "Revolução" e "Contra-Revolução", são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plínio Corrêa de Oliveira em seu livro "Revolução e Contra-Revolução", cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de "Catolicismo", em abril de 1959.

Santa Francisca Romana (1384-1440), de nobre e rica família, casou-se muito jovem, teve três filhos, fundou as "Oblatas de Maria" e em março de 1433 também fundou o mosteiro em Tor de' Specchi, perto do Campidoglio (Roma). Quando seu marido morreu, em 1436, ela se mudou para esse mesmo mosteiro e se tornou a prioresa.

Ernest Hello, em sua obra “Physionomies de saints, escreve o seguinte sobre Santa Francisca Romana:

A vida de Francisca reside nas visões. Suas visões mais singulares, mais estupendas, mais características, são as visões do inferno. Inúmeros suplícios, variados como os crimes, lhe foram mostrados no conjunto e nas minúcias”.

Vem agora uma descrição do inferno, onde há uma ordem às avessas, é a desordem, que constitui como que o princípio constitutivo da ordem do inferno:

Santa Francisca Romana viu o ouro e a prata derretidos, acumulados pelos demônios nas gargantas dos avarentos”.

Os senhores precisam considerar que o homem vai para o inferno com o próprio corpo. Imaginem o que representam uma pessoa passar, digamos, uma hora com ouro ou prata derretidos e quentes dentro da garganta, sem anestésicos, sem os mil cuidados dos nossos hospitais? Imaginem o que é passar a eternidade com ouro e prata derretidos na garganta; querer engolir e não poder, queimaduras horrorosas, sensações atrozes. Tudo isto é que Santa Francisca Romana viu como martírio dos avarentos. Ela teve revelações numerosas, singulares, pormenorizadas, assombrosas.

Viu as hierarquias de demônios, suas funções, seus suplícios e os crimes a que eles presidem”.

É um quadro completo: a hierarquia existente, o que cada demônio faz, os suplícios que sofrem e os crimes a que presidem. 

Afresco representando a visão que Santa Francisca Romana teve do inferno (Mosteiro de Tor de'Specchi, pintura de Antoniazzo Romano, 1468)

Viu Lúcifer, consagrado ao orgulho, chefe geral dos orgulhosos, rei de todos os demônios e de todos os condenados. Esse rei é muito mais desgraçado do que todos os seus súditos".

Normalmente, todo rei deve ser mais feliz do que seus súditos, mora num lugar de delícias, está num trono. Um demônio, não; é mais infeliz; o rei da desgraça tem que ser mais desgraçado e, por causa disso, é ordenado que Lúcifer seja mais infeliz de todos.

O inferno é dividido em três partes: o inferno superior, o inferno médio e o inferno inferior. Lúcifer está no fundo do inferno inferior".

É claro, é o rei das trevas, o rei da desordem. Na terra e nas coisas que são de Deus, o rei está acima. Mas o rei da desgraça, do crime, da infâmia, está abaixo de todos.

Sob Lúcifer, chefe universal, acham-se subordinados três chefes a ele e prepostos aos demais”.

Ou seja, ele tem uma espécie de “vigário geral” para cada um dos setores do crime; é bem ordenado...

Asmodeu, que preside os pecados da carne, era um querubim”.

Os senhores vejam as tristezas: um querubim que brilhava como um puro espírito, santo aos olhos de Deus e que se transforma no demônio do pecado da carne.

Mamon, que preside aos pecados de avareza, era um trono”.

É interessante notar que o dinheiro fornece – só por aí – uma das três categorias...

Belzebu preside aos pecados da idolatria”.

Todo crime ligado às práticas de magia, do espiritismo etc., é da alçada de Belzebu. Naturalmente, a heresia também é da alçada dele, as más doutrinas, os erros contra a fé etc., são da alçada de Belzebu.

Então, vemos os quatro pecados: impureza, orgulho, avareza e idolatria. E são essas as grandes avenidas da infâmia, do crime e do inferno.

Belzebu é particular e especialmente o príncipe das trevas. É torturado pelas trevas e é por meio das trevas que tortura suas vítimas”.

Os senhores podem imaginar o que é uma cegueira profunda e irremediável, embotamento do espírito total e trágico, em que nada adianta nada, em que ele mesmo sente sua própria insuficiência mental e, naturalmente com isto, atormenta também os que caíram no inferno, vítimas dele.

Uma parte dos demônios fica no inferno; outra reside no ar e outra reside entre os homens, buscando a quem devorar.

São, portanto, três “habitats” de demônios.

Os que ficam no inferno dão as suas ordens e enviam seus deputados; os que residem no ar agem fisicamente sobre as perturbações atmosféricas e telúricas, lançam por toda parte influências más, empestam o ar física e moralmente”.

Esta idéia do ar moralmente empestado, acho muito interessante. Em certas grandes metrópoles, por exemplo, quando a gente avista ao longe São Paulo, vê-se uma espécie de névoa que paira sobre a cidade e que é a síntese de todas as poeiras, de todas as sujeiras, de todas as impurezas de respiração. Contaram-me que aos médicos legistas, nos necrotérios, lhes basta abrir o pulmão do morto para saber se a pessoa morou em uma metrópole ou no interior do Estado: o pulmão de quem morou no interior é rosado e o de quem morou, por exemplo, em São Paulo é carregado de todos esses ares poluídos. Tem-se a impressão de qualquer coisa de maldito que paira no meio dessas influências físicas más. Isto é o resultado da ação de demônios dessa natureza.

O seu escopo é principalmente debilitar a alma. Quando os demônios encarregados na terra vêem uma alma debilitada pela influência dos demônios do ar, atacam-na no seu esmorecimento para vencê-la mais facilmente”.

Não sei se já tem acontecido aos senhores, mas às vezes a gente nota coisas imponderáveis assim: passa-se por algum lugar e percebe-se que ele é mais propício ao pecado. Não é absurdo admitir que aquele lugar seja infestado por algum demônio do ar, que o empesta, que cria ali condições inconvenientes para a prática da virtude. Depois, um demônio da terra atua ali mesmo e na ação que ali desenvolve, atormenta, persegue a alma, já debilitada, para ela cair mais depressa.

Atacam-na no momento em que ela desconfia da Providência”.

Daí recomendarmos tanto o “Livro da Confiança” (do Abbé Thomas de Saint Laurent). Porque quando se desconfia da Providência é a hora em que todas as tentações vêm. Enquanto a pessoa é confiante, a tentação pode vir, mas tem um âmbito restrito.

Esta desconfiança de que os demônios do ar são especialmente inspiradores preparam a alma para a queda que os demônios da terra dela vão solicitar”.

Essa tentação pode vir assim: “Não adianta resistir... Você vai cair mesmo... Renda-se, entregue-se!...” Isto já é o demônio da terra que está preparando o campo para o pecado próximo.

A partir do momento em que ela esteja enfraquecida pela desconfiança, inspira-lhe o orgulho, em que ela tanto mais facilmente cai, quanto mais débil se encontre”.

Quer dizer, a pessoa fica amuada e irritada de estar tentada, com seu orgulho ferido: é o demônio que está inspirando o orgulho à pessoa.

Quando o orgulho lhe tenha aumentado a fraqueza, chegam os demônios da carne que lhe insuflam seu espírito; quando os demônios da carne a enfraqueceram ainda mais, chegam os demônios incumbidos dos crimes de dinheiro”.

Vê-se, portanto, que há um espírito do demônio da carne que toma conta da pessoa quando ela não se prepara e não se fecha à tentação. Depois vem, então, o amor à ganância.

E quando este (demônio do dinheiro) tenha nela diminuído mais ainda os recursos da resistência, chegam os demônios da idolatria que completam ou rematam o que os outros começaram. E assim é uma crise espiritual completa”.

Começa pela desconfiança em Deus, passa para a impureza, depois ao orgulho, chega até a avareza e acaba na idolatria. E é o esboroar completo da alma através de ondas sucessivas de demônios que lhe vão atacando.

Todos se combinam para o mal e aqui se tem a lei da queda: todo pecado no qual se detém ("tout péché que l'on garde..."), arrasta a outro pecado. Assim, a idolatria, a magia e o espiritismo aguardam no fundo do abismo aqueles que de precipício em precipício lhe escorregam nas cercanias.

“Todas as coisas da hierarquia celeste são parodiadas na hierarquia infernal. Nenhum demônio pode tentar uma alma sem licença de Lúcifer. Os demônios  que estão no ar ou na terra não sofrem atualmente a pena de fogo, mas aturam outros suplícios terríveis e particularmente à vista do bem que fazem os santos”.

Esta é uma coisa muito interessante: o demônio fica atormentado ao ver o bem que fazem os santos e aqueles que não são santos, mas que procuram imitar os santos.

Quando, por exemplo, fazemos uma campanha de difusão do livro “A liberdade da Igreja no Estado comunista”, ou do "Diálogo" ("Baldeação ideológica inadvertida e diálogo"), bem como de outros trabalhos nossos, é um ato público de virtude que praticamos e os demônios sofrem terrivelmente com isto. Porque eles sofrem mais em ver o bem do que em todos os tormentos do inferno. Houve um santo que chegou a dizer o seguinte: o fato de Deus mandar o demônio para o inferno, não deixou de ser um ato de misericórdia, porque do contrário o demônio sofreria muito mais se tivesse que ver a Deus. Ele odeia tanto a Deus, que prefere os piores tormentos do que estar vendo a Deus. Por causa disso o tormento do ato de virtude lhe é crudelíssimo. O homem que faz o bem inflige ao demônio uma tortura tremenda. 

 

Tomando o aspecto de Santo Onofre (sec. IV), que Santa Francisca Romana venerava, o demônio lhe convidou para que fosse à sua ermida para afastá-la de sua vocação de fundar a Congregação das Oblatas (afresco no Mosteiro de Tor de'Specchi, de autor desconhecido - 1485)

Quando Santa Francisca era tentada, sabia - pela natureza e pela violência da tentação - de que altura caíra o anjo tentador e a que hierarquia pertencera”.

Isto é que é entender do assunto!... Saber se foi tentado por um querubim, ou por um trono, que foi tal coisa assim, isto pelo próprio dinamismo sinistro da tentação. Vejam que admirável! O que é a alma de uma santa e o que é o discernimento dos espíritos de uma santa!

Porém, quando uma alma é salva, também o demônio tentador é escarnecido pelos outros demônios”.

Deve ser uma cena de uma molecagem infame quando um demônio volta frustrado para o inferno após haver fracassado!... Uma sarabanda de caçoadas terríveis, de apôdos etc., em que ele volta zombando também e todos os demônios se recolhem frustrados aos seus respectivos antros e lá ficam coaxando eternamente, até vir sobre eles um novo tormento igualmente merecido.

É conduzido perante Lúcifer que lhe inflige um castigo especial, distinto das suas outras torturas”.

Os senhores podem ter uma alegria a mais quando são tentados e rechaçam o demônio: fiquem sabendo que aquele demônio vai para o inferno e lá sofrerá um tormento especial e os senhores são vingados. Não é em vão que aquele demônio está atormentando os senhores...

Este demônio entra às vezes, em conseqüência, no corpo de animais ou de homens e então faz-se passar pela alma de um morto. Quando o demônio conseguiu perder uma alma, após a condenação dessa alma, torna-se o tentador de outro homem, porém é mais hábil do que na primeira vez. Aproveita a experiência que lhe deu vitória, é mais hábil e forte para perder”.  

Sete demônios aparecem a Santa Francisca sob a forma de ovelhas elogiando suas virtudes, mas ela começou então a zombar deles. Estes últimos, então, transformaram-se em lobos que tentavam devorá-la (afresco no Mosteiro de Tor de'Specchi)

Os senhores estão vendo que a tese de que há um “demônio da perdição” de alguém, como existe também um Anjo da Guarda, é fortemente ratificada por esta passagem.

Isto é muito bom para adquirirmos um verdadeiro ódio ao nosso “demônio da perdição” e para tomarmos uma tática de combate em seu confronto, já sabendo que é ele.

Devemos pedir a Santa Francisca Romana que ela nos dê o suficiente discernimento para compreendermos quando determinadas ações são do demônio, para termos ódio a elas e começarmos a talhá-las logo que se iniciam.

Muitas vezes o demônio se apresenta de longe, por vias indiretas, sugere-nos uma coisinha que parece insignificante, uma pequena idéia fixa a respeito de uma ninharia. Por exemplo, uma pessoa passou perto de nós e nos olhou de modo “atravessado”. E a gente começa a achar meio deleitável pensar nisto: “o que aquele fulano fez? Ele me olhou de atravessado!... Lembra-se de tal caso? De tal outro?” Depois essa ninharia cresce. E vem uma outra sugestão ao espírito: “Você já prestou atenção que fulano também te olhou de atravessado? Ouça agora o vozerio: o Grupo te olha de atravessado! Você já pensou?!” Passa um certo tempo e essa idéia se retira um pouco, e a pessoa considera “é um engano”. Mas tentação volta de outro jeito: “Você não vai num cinema imoral hoje à noite?” É outra questão  completamente diferente. É a ação do demônio... E como é que a gente faz? Corta essas coisas no começo! Há um princípio de sabedoria que diz “principia obstat”, corte no começo! Caso contrário, não adianta.

Tudo quanto é idéia fixa, gosto de ficar se remoendo com idéias que aborrecem, agitação, perturbação, isso é início da ação diabólica e como tal deve ser cortado energicamente!

Vamos pedir a Santa Francisca Romana que nos dê o discernimento de tudo isto e nos faça compreender como - sobretudo nesta época que é uma espécie de Idade Média do demônio - o católico precisa estar preparado para lutar contra essa pluralidade de influências. E nos previna contra uma doutrina errada - e infelizmente tão freqüente - de que a tentação do demônio só é aquela que nos leva diretamente para o pecado e que quando não leva para o pecado diretamente, isso não é tentação do demônio. Não senhor! Aquilo que prepara o ambiente para o pecado, já é tentação do demônio. Então, as perturbações, as cóleras, as agitações, as fermentações da imaginação, facilmente podem ser tentações do demônio e a gente precisa se precaver contra elas. Vamos pedir a Santa Francisca Romana que nos dê uma clara e lúcida visão dessas verdades.

Acima, Capela do Mosteiro de Tor de'Specchi das Oblatas de Santa Francisca Romana. Quem tiver a dita de se encontrar em Roma no dia de sua festa (9 de março), poderá visitar esse magnífico Mosteiro, cujas paredes externas não fazem imaginar as belezas que nele se encerram. Localiza-se à Via del Teatro Marcello, 32, em Roma, nas proximidades do Campidoglio. Abaixo, a igreja aonde se encontram as relíquias desta Santa que tanto fez pelos habitantes da Cidade Eterna.


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