Plinio Corrêa de Oliveira

 

O Santo Sudário:

reflexo da alma de Nosso Senhor Jesus Cristo

"Santo do Dia" – 10 de março de 1973 

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A D V E R T Ê N C I A

O presente texto é adaptação de transcrição de gravação de conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a sócios e cooperadores da TFP, mantendo portanto o estilo verbal, e não foi revisto pelo autor.

Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras "Revolução" e "Contra-Revolução", são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plínio Corrêa de Oliveira em seu livro "Revolução e Contra-Revolução", cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de "Catolicismo", em abril de 1959.

 

* O Santo Sudário: reflexo da Alma de Nosso Senhor

 Como nós estamos na novena da Sagrada Face, me parece muito oportuno projetar aos senhores uma

reprodução  autêntica da Sagrada Face, que nos foi mandada por Madre Letícia, e que veio com um selo do Vaticano.

Trata-se do Sudário que envolveu a Nosso Senhor Jesus Cristo depois de morto e que depois de uma série de sucessões inesperadas acabou caindo nas mãos da casa de Sabóia, que se tornou mais tarde a casa reinante da Itália. Hoje está guardado na Capela do antigo palácio real de Turim, residência da casa de Sabóia antes da unificação da Itália, e pertence a essa mesma casa [Nota: Desde 1983, pertence ao Vaticano, depois de uma doação de seus proprietários].

O Santo Sudário é particularmente emocionante, porque ele nos dá praticamente uma fotografia de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Parece que a exalação do Precioso Sangue, combinada não sei bem por quais meios, com sais e outros aromas com que Ele foi sepultado, produziram uma exalação no Sudário. E esta exalação do Sudário fotografada dá, no negativo, uma perfeita fotografia de Nosso Senhor Jesus Cristo. De maneira que nós podemos vê-Lo mais ou menos como se víssemos uma fotografia contemporânea.

Naturalmente a fotografia é de um morto, de um cadáver. E de um cadáver que passou por tomentos inenarráveis antes de morrer, e em que portanto algo está desfigurado. Não devemos imaginar que Ele em vida tenha sido exatamente assim, Ele foi muito parecido com isto, mas [não] com as deformações da morte e sobretudo de um longo tormento.

Numa aparição que eu li, Ele explicava que seu rosto ficou alongado, ficou em algo deformado, o nariz também comprimido pelas pancadas recebidas etc., apesar do que se pode restabelecer o muito da impressão que Ele podia causar.

Qual é o alcance de nós contemplarmos a Sagrada Face de Nosso Senhor Jesus Cristo? É que nós sabemos que em todo homem a face é um símbolo da alma. Nos homens habitualmente é um símbolo muitas vezes mentiroso. Mentiroso não só porque muitas vezes os homens fazem uma fisionomia especial para encobrir os seus defeitos, mas também porque pelo pecado original, pelos defeitos do homem, esta fisionomia, mesmo não intencionalmente, é ambígua, não exprime tudo quanto vai na alma. De maneira que uma pessoa que não seja muito exercitada, pode não perceber em alguém a alma de que aquela fisionomia é um símbolo. Pode não perceber o valor simbólico daquela fisionomia.

Mas isto não era assim em Nosso Senhor Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem. Enquanto Homem era Homem perfeitíssimo, era o mais perfeito dos homens que jamais houve e haverá. De maneira que a sua fisionomia era de fato a expressão perfeita de sua santidade insondável.

Embora muitos dos senhores [tenham a fotografia] do Sacro Volto [Sagrada Face], me pareceu que seria interessante projetar esta para avivar em nossa recordação esta consideração altamente piedosa. 

* Uma perfeita definição da figura do Santo Sudário: “Eu sou Aquele que é”

Nós temos então aqui, quer a fotografia do Volto [Face], quer do Sudário em alguns dos seus aspectos.

Os senhores vêem o corpo inteiro. E os senhores podem perceber pela proporção entre o tamanho do rosto e do corpo a grande estatura e a atitude majestosa dEle. Naturalmente esta posição dos braços foi posta; um cadáver não toma sua própria posição, mas algo do porte dEle é muito expressivamente dito através disto.

Estas manchas são manchas do lençol, houve incêndio, houve inundações, a ação do tempo naturalmente prejudicaram muito o lençol, dobras e tudo.

Aqui os senhores vêem a fisionomia muito mais de perto, foi focalizada muito mais de perto. Os senhores vêem aqui no nariz qualquer coisa de partido, de quebrado. Não se percebe portanto a verdadeira forma do nariz, mas dá para notar a extraordinária semelhança com as imagens correntes de nossas igrejas.

É uma coisa curiosa, mas não se sabe bem como é que as imagens correntes de nossas igrejas acabaram sendo tão semelhantes com o Santo Sudário. Porque as imagens dos primeiros séculos não apresentam Nosso Senhor parecido com isto. Depois, em determinado momento é que começaram a apresentá-Lo assim. E é facilmente reconhecível por qualquer um de nós como sendo Nosso Senhor Jesus Cristo.

Os senhores percebem também que na fisionomia algo está alongado, está estirado, que não seria inteiramente o normal dEle.

Apesar de morto nota-se entretanto nEle uma coisa curiosa. Ele só tinha 33 anos quando morreu, mas para nossa ótica de homens de hoje, parece muito mais maduro do que 33 anos. Eu daria a Ele facilmente 45 anos. Nosso Senhor Jesus Cristo quando morreu tinha 33 anos,  a idade perfeita do homem. Ele viveu até a plena maturidade do homem. E aí os senhores têm a noção de uma maturidade absoluta.

Os senhores notam uma decisão enorme e uma maturidade absoluta. Uma pessoa que está inteiramente consciente de tudo quanto pensa, que tem um juízo sumamente maduro, de um lado, e de outro lado uma vontade absolutamente forte e determinada. Ele sabe tudo quanto quer, Ele quer tudo quanto lhe convém querer. Uma idéia de uma ordem absoluta, de uma varonilidade, de um domínio de si absoluto.

Santo Sudário:

Recusa e horror ao pecado cometido

Vendo o Santo Sudário de Turim, impressiona-me a recusa e a repulsa que nele há em relação ao que está próximo. Nosso Senhor contempla a si próprio, olha o Padre Eterno, e sabe que a seus pés encontra-se Maria Santíssima — cor unum et anima una (coração e alma unidos a Ele).

Não vejo naquelas pálpebras cerradas o menor sinal de compaixão. Tenho impressão de que elas se cerraram em recusa e em horror ao pecado que os homens cometeram.

Na Sagrada Face notam-se as marcas dos golpes que recebeu, seus cabelos estão rarefeitos e desordenados. Ele foi maltratado de todos os modos. Percebe-se seu protesto diante de tudo isso, mas também sua dignidade.

Ele afirmara que o próprio Salomão, no auge de sua glória, não se vestiu tão esplendorosamente como os lírios do campo (Cfr. Mt 6, 28-29). Eu teria vontade de dizer: “Quem era Salomão em toda a sua glória, se comparado à majestade deste Rei?”. Comparados a tal majestade, quanto são pobres e pequenos os lírios do campo! Quanto é pobre e pequeno Salomão!

Além da recusa, também vejo nessas pálpebras cerradas uma decisão e uma incompatibilidade que arrebentou as portas da morte e as transpôs. É a matriz da incompatibilidade completa e do ódio completo. É uma lúcida, firme e serena incompatibilidade com seus algozes; uma recusa completa de qualquer afinidade e condescendência com seus inimigos; uma posição de quem sente tal horror ao pecado cometido, que afundou num oceano de horrores para, legítima e dignamente, recusar aqueles que ativa ou passivamente participaram da Crucifixão.

Esse é o estado de espírito que também nós devemos ter.

Excertos da conferência proferida pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira em 26 de janeiro de 1980.

Transcrito de "Catolicismo" Nº 798, Abril de 2009

Mas muito por cima dessas qualidades, os senhores notam uma sacralidade (*) extraordinária. Os senhores não terão dificuldade em perceber a suma responsabilidade desta figura, e a segurança de si. Têm-se a impressão de lembrar, olhando para a Sagrada Face, aquele episódio do Evangelho quando os algozes que O iam prender, [perguntaram] se Ele era Jesus Nazareno. E Ele respondeu: "Sou Eu!" E todos caíram com a face no chão, aqueles mesmos que O iam prender. Tal era a sua majestade, sua segurança.

Esta resposta: "Sou Eu!", lembra a definição que Deus deu de si mesmo a Moisés na sarça, quando Ele apareceu numa sarça ardente. Moisés perguntou quem Ele era. Ele disse: "Eu sou Aquele que é!" Se disséssemos que esta figura se define assim: "Eu sou Aquele que é!", estaria absolutamente definida, porque é uma comunicação com o todo absoluto, uma posse do todo absoluto, uma segurança de si por onde se vê que Ele é o padrão e a medida de todas as coisas, e que julga, como Rei e como Deus, todas as coisas em função de si mesmo, o que é uma verdadeira maravilha.

Ao mesmo tempo nós entrevemos o que poderia ter de divinamente suave e afável seu olhar. O que poderia haver de supremamente afável na linguagem e no timbre de sua voz. É a coexistência de todas as virtudes, de todas as perfeições, em todos os graus que possam caber na natureza, como reflexo da natureza divina ligada a Ele pela união hipostática.

De outro lado é interessante os senhores notarem a severidade da expressão. Nosso Senhor morreu vítima de um crime atroz. Do pior de todos os crimes, o crime do deicídio produzido e operado pelo maior tormento de que há notícia na história.

Os senhores olham para esta fisionomia, os senhores vêem que Ele está como um Juiz diante de seus algozes. E que há uma rejeição, uma censura, um desacordo, e uma condenação àqueles que O mataram, expressa aí, que é uma coisa verdadeiramente divina. Como quem diz: "Eu sou a Lei, Eu sou o Juiz, e Eu sou a Vítima! E julgo a esses três títulos o crime que contra Mim foi praticado". Quer dizer, é verdadeiramente majestoso e assombroso.

(Pergunta: Nosso Senhor teve luz primordial?) 

* Nosso Senhor é a soma de todas as luzes primordiais

 Nós podemos dizer o seguinte: que é a soma de todas as virtudes, e portanto de todas as luzes primordiais (**) possíveis e imagináveis, num grau tão alto que nem a mente humana, nem o olhar humano alcançam.

O que se destaca – ao menos para mim – como uma coisa suprema aí é a conjugação perfeitamente harmoniosa das virtudes mais opostas. Quer dizer, é uma plenitude e a conjugação de todas as virtudes.

Então os senhores têm a força, têm a bondade; os senhores têm a mansidão, os senhores têm ao mesmo tempo a cólera divina. Os senhores têm uma placidez, mas uma capacidade de agir, de tomar iniciativas que é de cegar qualquer pessoa. Mas de tal maneira que tudo isto coexiste nEle de uma tal forma que é preciso analisar para notar. Porque a gente tem a impressão de que, quase que aludindo a cada uma dessas virtudes, desmembra um pouco e diminui um pouco. Ele é muito mais do que só cada uma dessas coisas, Ele é tudo isto junto.

(Pergunta: O senhor poderia comentar um pouquinho o que há de profundo e misterioso nEle?) 

* Ao mesmo tempo que Nosso Senhor tinha a atenção posta nos homens, sua mente permanecia nas mais altas cogitações

 Para se compreender o que há de profundo e misterioso nisto, é preciso imaginar Nosso Senhor dizendo aos Apóstolos: "As minhas cogitações não são as vossas, e as minhas vias não são as vossas".

Porque nós temos na fisionomia deste Varão Divino a impressão de que Ele é cheio das cogitações mais altas, e nas quais Ele vive permanentemente posto de um modo estável, e de outro lado Ele é a via. Quer dizer, o que está de acordo com Ele é certo e o que está em desacordo com Ele é errado.

Pode-se imaginar a Ele dizendo de si mesmo: "Eu sou o caminho, a verdade, a vida", e é isto mesmo, plenamente! Mas há nisso um mistério que é próprio do absoluto. Ao menos eu vendo-O tenho a impressão de que esta prodigiosa certeza que Ele tem de si mesmo Ele a comunica por todo o seu ser de um modo indizível, com a natureza divina, com a Santíssima Trindade, e que a atenção dEle está ao mesmo tempo posta nos mistérios de Deus e nos homens no meio dos quais Ele está. É realmente o Mediador entre Deus e os homens.

(Pergunta: Como Ele exprime a sacralidade? )

Pela enorme elevação de onde procedem todas as cogitações e todas as vias dEle. Vêm propriamente do Céu. Vêm de tão alto e tão alto é o pensamento dEle, as razões pelas quais Ele traça as vias são razões tão superlativamente altas e elevadas, e de outro lado a vida dEle é uma via tão reta, tão santa, tão perfeita que tudo é sagrado nEle.

Se o senhor disser, por exemplo, que Ele é um rei o senhor o diminui. Se o senhor disser que Ele é um grande orador, o senhor o diminui. Todos os títulos que se possam dizer de um homem ficam pequenos em comparação dEle. Se bem que Ele seja o Rei dos Reis, o Senhor dos senhores, nunca ninguém foi pensador como Ele, nunca ninguém foi orador como Ele e nunca ninguém, debaixo de nenhum ponto de vista, pode ser comparado a Ele.

 


NOTAS

(*) Sacral, sacralidade: na maneira de se exprimir de Plinio Corrêa de Oliveira, há uma diferença de matiz entre as palavras sagrado e sacral: sacral é o sagrado posto na ordem temporal ou profana. A sacralidade tem uma profunda relação com as desigualdades do Universo e se apóia sobre os seguintes princípios: a) O Universo — mais ainda, toda a ordem do ser — é hierárquico. b) Ele é insondavelmente desigual de um grau para outro, e infinitamente desigual em relação a Deus. c) O mais alto, a um ou outro título, é sempre causa, modelo, mestre e regente do mais baixo. d) A título próprio, só Deus é causa, modelo, mestre e regente das criaturas. Portanto, todas as hierarquias se reportam a Deus, que é infinitamente nobre, sublime e elevado. e) A escala dos seres é uma escala fechada, no sentido de que o mais alto, que é Deus, toca no último, no ínfimo. Deus e as ordens superiores estão, a um ou outro título, presentes nas ordens inferiores. Portanto não se trata de uma ordem estraçalhada e descontínua, mas harmônica, que se fecha.

(**) Luz primordial: segundo muitos autores espirituais, cada alma tem uma tendência para o mal que é mais forte que as outras, e é por onde é tentada: o vício capital. Em sentido contrário, há uma tendência mestra, que varia de pessoa para pessoa, e que é o aspecto de Deus que mais é chamada a espelhar: a luz primordial. Por extensão, pode-se falar em luz primordial de uma família, uma cidade ou uma região.


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