Capítulo IV

 

Nas regras e normas de conduta dos
Institutos religiosos, estabelecidas
ao longo dos séculos, se manifesta uma
preocupação constante de incutir no Religioso
o desapego em relação aos parentes

 

 

 

 

 

 

 

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188. Entre os antigos monges do Oriente, fazer visitas por motivo de parentesco era coisa alheia à profissão

Das Regras Breves de São Basílio (329-379), pai e legislador do monaquismo do Oriente:

"Que atitude se deve tomar face aos membros da família?

"Aos que foram recebidos definitivamente na Fraternidade, os superiores não devem absolutamente permitir que se afastem desta por qualquer motivo, nem que se separem dos Irmãos e vão viver sem testemunhas, sob pretexto de visitar os parentes, ou de assumir a proteção de interesses de seus familiares.

"Deve-se, com efeito, recusar absolutamente o emprego das palavras "meu' e "teu' entre os Irmãos, pois está escrito "os fiéis tinham apenas um coração e uma alma e ninguém chamava de seu o que possuía' (Act. IV, 32). Consequentemente, se os parentes ou os irmãos de alguém vivem segundo Deus, que sejam honrados por todos na Fraternidade como pais e irmãos de todos, uma vez que disse o Senhor: "Aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos Céus, é ao mesmo tempo meu irmão, minha irmã e minha mãe' (Mt. XII, 50), e nos parece que é ao superior da Fraternidade que cabe cuidar deles.

"Quando estão implicados na vida ordinária, não temos nada em comum com eles, nós que nos esforçamos por praticar fielmente e sem esmorecimento a lei de Deus. Além de não podermos lhes prestar serviço algum, encheremos nossa vida de perplexidades e agitações, e nos deixaremos arrastar para as ocasiões de pecado.

"Com mais razão, se nossos próximos de outrora são violadores das leis divinas e desprezam a vida religiosa, normalmente não podemos recebê-los, quando nos vêm visitar, porque não amam o Senhor que disse: "Aquele que não Me ama não observa meus mandamentos' (Jo. XIV, 24). Ora, "que relação pode haver entre a justiça e a iniquidade, entre o fiel e o infiel?' (II Cor. VI, 14-15).

"Em especial, deve-se fazer tudo para afastar cuidadosamente das ocasiões de pecados os que ainda se exercitam na virtude. Dessas ocasiões, a mais funesta é a lembrança da vida passada, pois há que recear lhes ocorra o que exprimem estas palavras: "Seus corações se voltaram ao Egito' (Num. XIV, 4); ora, tal desgraça acontece muitas vezes em consequência de frequentes contactos com os parentes e conhecidos.

"Em geral não se deve portanto permitir a quem quer que seja, parentes ou estranhos, ter conversas com os Irmãos, a menos que se esteja certo de que o fazem para a edificação e o progresso espiritual da alma.

"Como devemos considerar os companheiros de outrora e os parentes que nos vieram visitar?

"Como o Senhor indicou e ensinou quando lhe disseram: "Vossa mãe e vossos irmãos estão fora e querem vos ver' (Lc. VIII, 20), – "Quem é minha Mãe e quem são meus irmãos?' respondeu Ele severamente: "Aquele que faz a vontade de meu Pai celeste, este é minha mãe, meu irmão, minha irmã' (Mt. XII, 48-50).

"E se eles nos convidam a visitá-los, devemos aceder a seu desejo?

"Se é para o bem espiritual, que se envie aquele que é sabido que pode edificar, mas se se trata de uma simples amabilidade, que se ouça a resposta do Senhor àquele que dizia: "Permiti-me de ir ordenar meus negócios em casa'. – "Aquele, diz Ele, que põe a mão no arado e olha para trás, não é digno do reino dos céus' (Lc. IX, 61-62). Se é tão grande a falta daquele que queria se despedir dos seus uma vez por todas, o que dizer do caso do qual falamos?

"Deve-se ter pena dos parentes segundo a carne e desejar sua salvação?

"Aquele que, segundo a expressão do Senhor, nasceu do espírito (Jo. III, 8), e recebeu o poder de se tornar filho de Deus (Jo. I, 12), se envergonha do parentesco carnal. Ele considera como seus próximos aqueles que o são na fé, a exemplo do Senhor que disse: "Minha mãe e meus irmãos são aqueles que ouvem a palavra de Deus e a põem em prática' (Lc. VIII, 21). Deve-se ter, evidentemente, pena de todos os que estão afastados de Deus, mas de seus parentes segundo a carne como se fossem outros quaisquer. (...)

"Deve-se fazer visita aos que no-la pedem?

"Visitar é coisa agradável a Deus, mas é preciso que o visitante seja capaz de escutar com inteligência e de responder com prudência, conforme esta palavra: "Vossa conversa será sempre amável e temperada com sal, de maneira que saibais como responder a cada um' (Col. IV, 6).

"Quanto a fazer uma visita por motivo de parentesco ou de amizade, isto é uma coisa alheia à nossa profissão (monástica)" (São BASLIO, Les Règles Monastiques, Éditions de Maredsous, Bélgica, 1969, pp. 110-111, 271-272 e 345 / Imprimatur: F. Toussaint, vic. gen., Namurci, 101969).

189. Na Espanha visigótica, penas severíssimas para o monge que tomasse alguma deliberação em conjunto com a família

Diz uma conhecida enciclopédia sobre a Regra de São Frutuoso (sec. VII), Arcebispo de Braga, fundador e legislador de numerosos mosteiros na Península Ibérica:

"O monge de São Frutuoso, ao entrar para a vida religiosa, pronunciava estas palavras, que davam ao Abade inteiro poder sobre seu corpo: "Se algum de nós for contumaz, desobediente etc., tu terás poder para reunir os irmãos e diante de todos repreendê-lo, açoitá-lo e excomungá-lo.

* "E se algum, contra o que dispõe a regra, tomar alguma deliberação em conjunto com seus pais, filhos, irmãos... terás poder para arrojá-lo numa cela escura onde viverá a pão e água, descalço, descingido e revestido de um cilício e, se se recusar a cumprir essa penitência, receba 72 açoites estendido no chão e, uma vez despojado do hábito monástico, seja expulso do mosteiro vestido com um traje em farrapos para expô-lo à vergonha pública'.

"A fórmula de profissão, de onde foram tiradas estas palavras, que se chama "pacto de São Frutuoso', esteve muito em voga na Espanha até boa parte do século X. Pouco a pouco medidas tão extremas foram cedendo terreno às mais suaves e mais civilizadoras da regra beneditina que, introduzida (na Espanha) durante a dominação visigótica, não conseguiu vencer os costumes anteriores senão quando já ia bem avançada a Idade Média" (Enciclopedia Universal Ilustrada ESPASA-CALPE, t. XLIII, p. 317).

190. Na Regra de São Bento, proteção especial dos monges contra as infiltrações do mundo

Dos comentários à Regra de São Bento (480-547), escritos por Dom Ildefonso Herwegen, Abade de Maria-Laach:

"Todo o capítulo anterior foi consagrado por São Bento ao cuidado de proteger seus monges contra as infiltrações do mundo, provenientes do trato com os hóspedes. Não podia, pois, dar liberdade à correspondência escrita pela qual o mesmo mundo quer penetrar no mosteiro.

"Assim, sem permissão do Abade, é expressamente proibido aos monges receber de seus pais ou de quem quer que seja, cartas, eulógias (*) ou quaisquer presentes, ou enviar aos mesmos tais objetos. (...)

(*) Eulógias são dádivas bentas, lembranças de solenidade litúrgicas, como por exemplo, pão bento, óleo tirado da lâmpada de um mártir etc.

"As cartas e presentes devem estar sujeitos à inspeção do Abade por um regulamento monástico. (...)

"Os próprios objetos que os monges recebem dos pais pertencem à comunidade, obedecendo isso ao princípio: "omnia omnibus communia'. O Abade distribuí-los-á segundo as necessidades de cada um. Se o irmão a quem foi enviado o objeto, não ficar contente com o destino que lhe tiver dado o Abade, provará que ainda tem pouca compreensão da vida comunitária e muito apego à vida própria. O demônio acharia aí ocasião propícia para a tentação, pondo em gravíssimo perigo a vocação do irmão. Quem, num caso desses, não visse de boa vontade que o Abade age assim para o bem de todos, deveria ser tachado de presunçoso, ficando sujeito à disciplina regular.

"São Bento não pretende que se cortem as relações com os pais, parentes e amigos; sabe apreciar, muito bem, o valor da amizade e da veneração que seus filhos espirituais e o mosteiro recebem das pessoas de fora. Mas esta amizade e veneração não devem transformar-se em perigo para a comunidade" (Dom ILDEFONSO HERWEGEN OSB, Sentido e Espírito da Regra de São Bento, Edições "Lumen Christi", Rio de Janeiro, 1953, pp. 314-315 / Com aprovação eclesiástica).

191. O cartuxo deve ser e permanecer um verdadeiro solitário

De um livro sobre a Ordem dos Cartuxos, fundada por São Bruno (1035-1101):

"A solidão é o elemento característico da vida do cartuxo; é o lugar de sua união com Deus, o meio principal do qual ele dispõe para atingir a intimidade com Cristo. (...)

"A solidão exterior se realiza pela clausura monástica e pela vida de cela. Ela contribui eficazmente para dar ao cartuxo o meio de buscar seu ideal.

"Para praticar esta vocação de solidão, algumas regras, à primeira vista severas, foram estabelecidas. Nenhuma saída da cela sem séria razão; além do que só se pode falar com um estranho excecionalmente e tendo autorização do Padre Prior. Os noviços, durante o ano canônico do noviciado, não estão autorizados a ver ninguém, nem mesmo os membros de sua família (portanto nada de visitas por ocasião da tomada de hábito); em seguida, raras e curtas visitas dos parentes próximos são admitidas, a critério do Padre Prior; as senhoras só podem ser recebidas no albergue exterior do mosteiro.

"Durante o postulantado, o noviciado, e os votos temporários, todas as cartas recebidas ou enviadas são lidas pelo padre Mestre de Noviços; após a profissão solene, é somente o Padre Prior quem as controla. Só se troca correspondência na medida em que as necessidades e as conveniências o exijam.

"Este austero costume se explica facilmente: o cartuxo deve ser e deve permanecer um verdadeiro solitário. Seria um erro ver aí uma falta de amor para com o próximo e especialmente para com os parentes. O cartuxo, na própria medida de sua união com o Deus de amor, não pode deixar de amar cada vez mais seus semelhantes, mas com um amor sempre mais puro, com o próprio amor de Deus. Pois sem cessar se recorda interiormente de viver não para si, mas para Deus e sua Igreja, e para as almas. E está persuadido de que os que lhe são caros se beneficiarão largamente com sua consagração a Deus" (L'Ordre des Chartreux, Grande Chartreuse, Isère, 1958, 3ª. ed., pp. 42 e 44 / Imprimatur: Cyprianus, Epis. Montispessulani, 19-6-1958).

192. "Todas as pessoas da Ordem devem evitar e fugir das visitas de seus parentes"

De outro livro sobre a Ordem dos Cartuxos:

Pergunta do repórter: "Estão autorizadas as visitas dos parentes?"

Resposta: "Este ponto não foi regulamentado desde o começo da Ordem. Na época não se pôs a questão. As primeiras Cartuxas estavam situadas em solidões inacessíveis e as viagens propriamente ditas eram quase desconhecidas. Pouco a pouco as coisas mudaram. Agora os Estatutos indicam que "todas as pessoas da Ordem devem evitar e fugir das visitas de seus parentes'. Este é o dever do religioso e a consequência de sua vocação de solidão. Na realidade, o Superior é quem decide o que convém fazer depois de examinar as circunstâncias particulares. Hoje é costume admitir uma visita por ano dos pais, ou de quem ocupe seu lugar. Em geral, com os anos, as visitas se vão rareando, a morte torna mais profundo o vazio, e, às vezes, os pais, com o tempo, acabam compreendendo melhor a vocação de seu filho" (ROBERT SERROU e PIERRE VALS, En el "desierto" de la Cartuja, Ediciones Stvdivm, Madrid, 1961, p. 107 / Imprimatur: José María, Ob. aux. y Vic. Gral., Madrid, marzo 1961).

193. O religioso é um outro Abraão ao qual Deus disse: "sai de tua casa e de tua parentela"

Do livro A Instrução dos Noviços (*), do dominicano francês Padre Jacinto Cormier (1832-1916), que foi Geral de sua Ordem e cujo Processo de Beatificação está em curso em Roma:

"O espírito religioso é um espírito de recolhimento interior, de silêncio, de oração, de mortificação e de penitência, de humildade e de pobreza evangélica; ora, no mundo, tudo o que se vê leva à dissipação; não se ouvem senão conversas más ou inúteis; tudo aquilo que acontece não serve senão para distrair durante a prece e a oração.

(*) Embora se destinasse principalmente à formação dos noviços dominicanos, o subtítulo da obra indica que "pode igualmente servir aos Noviços e Noviças de qualquer outra Ordem ou Congregação, aos outros Eclesiásticos e às pessoas piedosas".

"A experiência faz ver que os religiosos que têm maior comércio com o mundo são ordinariamente os mais dissipados, e isso não é de causar espanto, pois o mundo é o inimigo de Deus, foi amaldiçoado por Jesus Cristo por causa de seus escândalos, e àqueles que o frequentam faz quase necessariamente contrair um espírito oposto ao do divino Mestre. (...)

"É em vão que, para ter facilidades de frequentar o mundo, se apresentará o pretexto de ir visitar os parentes. Um verdadeiro religioso é um outro Abraão ao qual Deus disse: "Sai de tua casa e de tua parentela'; ou como um Melquisedec, que São Paulo apresenta "sem pai, sem mãe e sem genealogia' (Hebr. VII, 3); ou como a filha de Sião, figura da alma religiosa, que o Espírito Santo, pela boca de David, assim exorta: "Esquece o teu povo e a casa de teu pai' (Ps. XLIV, 11).

"Dissipamo-nos com nossos parentes não menos que com outros seculares. Daqueles que se comprazem em frequentar uns ou outros podemos dizer igualmente aquilo que David conta dos Israelitas: "Tendo-se misturado com os gentios, aprenderam suas obras e serviram a seus ídolos, e isto lhes foi uma ocasião de queda' (Ps. CV, 35)" (Pe. HYACINTHE MARIE CORMIER OP, L'Istruzione dei Novizi, Marietti, Torino, 1923, 2a. parte, pp. 125 a 127 / Imprimatur: C. Franciscus Duvina, Prov. Gen.).

194. Na formação dos noviços dominicanos, uma prudente e solícita vigilância no que se refere a visitas de parentes e correspondência com eles

Da mesma obra do ilustre filho de São Domingos de Gusmão:

"As visitas são, para os Religiosos, um embaraço e uma ocasião de dissipação, porque tudo aquilo que ouvem e tudo aquilo que vêem, enche sua memória e sua imaginação de mil impressões, que se lhes reapresentam durante o ofício e a meditação, e porque lhes oferecem muitas ocasiões de perder o espírito de seu estado. Eis porque alguns grandes santos jamais queriam fazer visitas, e São Jerônimo dizia que a cidade lhe parecia um inferno, enquanto considerava sua áspera solidão como um paraíso. Por isso, os noviços que fazem o ano de provação não visitam ninguém, e não se lhes permite nem sequer ir ver seu pai e sua mãe. Nesse tempo, eles não devem pensar a não ser em sua salvação e deixar ao mundo – que na perspectiva deles é como um morto – o cuidado de enterrar os seus mortos (Mt. VIII, 22).

Seria desejável que nunca recebessem visitas

"Se aos noviços professos se permite visitar os parentes mais próximos, isso deve ser coisa raríssima, a não ser que se apresente alguma ocasião extraordinária. Os parentes não devem levar a mal que as visitas sejam tão raras, certos de que isso não provém de uma falta de respeito, de afeto ou de reconhecimento, mas das obrigações contraídas na vida religiosa. (...)

 "Se é de desejar-se que os noviços façam poucas visitas, seria também desejável que nunca as recebessem. (...)

"Assim permite-se dificilmente aos noviços ir ao locutório. Entretanto concede-se-lhes receber os seus parentes próximos e as pessoas de respeito, desde que venham poucas vezes e escolham um tempo conveniente. Mas despede-se aos demais, salvo alguma razão especialíssima.

No locutório, os noviços estejam sempre acompanhados por outro Religioso designado para tal

"Igualmente, se os primeiros (os parentes) tivessem a indiscrição de vir com demasiada frequência e de dissipar assim os noviços, seria preciso pedir-lhes que não se apresentem de forma tão assídua; e se ainda assim continuassem, se lhes faria responder que os religiosos que procuram estão impedidos. Os noviços, de fato, estão sempre ocupados ou em rezar, ou em estudar, e isto é para eles muito mais vantajoso do que perder miseravelmente seu tempo com pessoas de fora. (...)

"Os noviços jamais se apresentarão ao locutório sem uma permissão especial, e sem levar consigo um irmão designado para tal. Caso não haja ninguém no noviciado para lhes conceder a licença, não irão ver aqueles que os visitam. (...)

"O companheiro, salvo licença expressa, não deve separar-se daquele que é visitado, de modo que veja tudo o que se faz e ouça tudo o que se diz.

Não deve o acompanhante temer incomodar com sua presença os que fazem a visita

"Se porém se trata de receber um pai ou uma mãe, ou ainda de algum assunto íntimo da família, o irmão poderá separar-se ou retornar ao noviciado. Não deve temer incomodar com sua presença aqueles que fazem a visita. Já é bastante que se lhes permita ver noviços que devem viver em completo retiro. Se se escandalizassem das regras de prudência adotadas a este respeito e não retornassem mais, isso não seria de lamentar.

"No caso de acontecer no locutório alguma coisa considerável contra a boa ordem, o companheiro deveria advertir o superior, sem deixar de fazê-lo por uma mal entendida reserva. É uma norma essencial, observada nas Ordens mais regulares, que seja obrigatório agir de tal modo. O bem geral e o bem do próprio irmão o exigem. (...)

Uma prudente vigilância sobre a correspondência dos noviços

"Os noviços não devem escrever ou expedir carta alguma sem permissão. O Mestre de noviços tem a incumbência de lê-las sempre antes de serem seladas, não só para ver se não contêm nada que seja contra a caridade, a verdade, a prudência ou alguma outra virtude, mas ainda para examinar se são escritas com aquela correção, educação e cortesia que convém a um religioso.

"Ele lerá também todas aquelas que os noviços recebem, porque devem examinar se não contêm nada de perigoso para sua vocação, e também se nelas não se encontra alguma notícia dolorosa que se lhes deva comunicar com discrição. Esse regulamento da vida religiosa é bastante judicioso, e se alguém o violasse em segredo daria prova de uma falta completa de obediência, de regularidade, de prudência e talvez de caridade; de fato, por que escreveria alguém sem permissão, se não para escrever nada que não seja justo e razoável e conforme o Espírito de Deus? (...)

Uma verdadeira necessidade, e imperiosa conveniência – os únicos motivos que justificam escrever uma carta à família

"As cartas devem também ser raríssimas. Da mesma forma que os noviços não podem visitar, a não ser muito raramente, os seus parentes quando moram no mesmo lugar, assim também não devem escrever senão pouquíssimas vezes quando estão longe deles.

"Uma verdadeira necessidade e imperiosas conveniências são os únicos motivos suficientes para escrever uma carta. Quem escreve muitas vezes e sem graves razões, perde muito tempo e revela um espírito irrequieto; e demonstra que não sabendo ocupar-se na solidão, em santificar-se pela oração e pelo estudo, gosta de imiscuir-se em muitos assuntos de fora sem que para isso Deus o chame, e sem que isso contribua seriamente para a santificação do próximo" (Pe. HYACINTHE MARIE CORMIER OP, L'Istruzione dei Novizi, Marietti, Torino, 1923, 2a. parte, pp. 98-99, 109-110, 112-113, 153 a 155 / Imprimatur: C. Franciscus Duvina, Prov. Gen.).

195. Também na Companhia de Jesus, as mesmas precauções

As primitivas Regras da Companhia de Jesus, escritas ainda em vida de Santo Inácio, estipulavam, entre as obrigações do Mestre de Noviços:

"Não permita que (os noviços) conversem em casa ou fora com parentes ou amigos seculares; se se permitir por alguma causa, que ele (Mestre de Noviços) esteja presente ou indique para tal algum companheiro; e não consinta que escrevam ou recebam cartas, a não ser por motivo especial, e se este for duvidoso, referirá o caso ao Superior ou o consultará" (Obras Completas de San Ignacio de Loyola, BAC, Madrid, 1952, p. 612 / Imprimatur: José María, Ob. Aux. y Vic. gral., Madrid, 14-5-1952).

196. Nenhum Irmão Lassalista podia falar de sua família, nem de seu passado

De uma vida de São João Batista de la Salle (1651-1719), fundador do Instituto dos Irmãos das Escolas Cristãs:

"Um dos pontos que mais o tinha preocupado foi o das "recreações', que até então não tinha sido objeto de nenhum regulamento especial. Nelas falavam os Irmãos sobre o que bem lhes parecia, sem restrições de nenhum tipo, o que fez ver ao vigilante superior que, por causa daquela liberdade, se emitiam conceitos que, sem chegar a ser pecaminosos, podiam às vezes constituir um perigo para o fervor e a boa ordem da Comunidade. (...)

"O Santo Fundador mediu estes perigos, e para evitá-los prescreveu que nenhum Irmão tomasse a palavra sem antes obter a licença do Irmão diretor, fazendo-lhe uma ligeira saudação.

"Proibiu o jogo e o falar dos ausentes, quando não fosse para louvá-los. Nenhum Irmão podia falar de sua família, nem de seu passado, nem das irregularidades de outras Comunidades, nem de novidades mundanas" (Pe. FRANCISCO GARZN SJ, San Juan Bautista de la Salle, Apostolado de la Prensa, Madrid, 1947, 4ª. ed., p. 94 / Imprímase: Casimiro, Obispo Aux. y Vic. Gen., 6-3-1947).

197. Não se imiscuirão as Filhas da Sabedoria em assuntos temporais de seus parentes

Das Regras das Filhas da Sabedoria, fundadas por São Luís Maria Grignion de Montfort (1673-1716):

"Não se enredarão em negócios temporais do mundo, sob pretexto de que poderia vir daí algum proveito, tais como contratos de sociedade, loterias etc.; quem é verdadeiramente pobre de espírito não deseja nenhum bem temporal que não possui.

"Não se misturarão em negócios temporais de seus parentes e, em consequência, não entabularão processo algum, ainda que legítimo, preferindo antes perder a túnica e o manto a conservar ambos, perdendo, porém, a paz de coração, a caridade para com o próximo e a pobreza de espírito" (São LUÍS MARIA GRIGNION DE MONTFORT, Obras, BAC, Madrid, 1954, p. 642 / Imprimatur: José, Obispo de Santander, Santander, 19-6-1953).

198. Aos Missionários Claretianos: "guardai-vos de ir à casa dos parentes, ainda que seja para fins piedosos"

Da já citada obra do Padre José Xifré (1817-1899), amigo de Santo Antonio Maria Claret, co-fundador e terceiro Superior-Geral da Congregação Cordimariana:

"Guardai-vos também de ir às casas dos parentes, ainda que seja para fins piedosos. São Bernardo diz que conheceu alguns que por essa razão se desviaram da Religião em que haviam entrado; os Santos fugiram delas, e assim triunfaram do amor ao sangue, e os Jesuítas e outros o têm por estatuto rigoroso, porque conhecem o dano e a gravidade do perigo.

"Afastai-vos, repito, de vossos parentes, e não queirais saber nada deles, porque se vos relacionais com os mesmos, ou sabereis deles notícias prósperas ou adversas: no primeiro caso, vosso coração se alegrará com estas materialidades, naturalmente desejará mais, a imaginação tomará sua parte, logo tereis desejos de escrever e saber, e vede aqui uma tentação e uma divagação terrível que vos dissipará e fará perder o recolhimento e a oração.

"Se as coisas lhes correm mal, padecereis e por via oposta suceder-vos-á o mesmo se eles vos falam de seus desgostos, de suas desuniões, dos gênios que as motivam, de suas perdas e enfermidades: se acrescentam, como naturalmente sucederá, que com vossa presença se remediaria tudo, dizei-me: como ficará vosso coração? Ser-vos-á muito fácil fazer desvanecer aquelas impressões? Não se põe num perigo muito grave a própria vocação? Este é um dos pontos mais perigosos para o Missionário: é aqui onde o espírito maligno se transfigura em anjo de luz, fazendo esquecer as razões da importância de seguir a divina vocação, e pintando com sofismas e razões aparentes e exageradas os motivos de piedade em relação àqueles de quem se recebeu a existência. Pelo que, irmãos caríssimos, vigiai-vos e acautelai-vos a fim de que não vos alcancem as trevas; e assim, a vossos pais não lhes escrevais sem conselho de vosso Diretor e Superior e nem pergunteis por eles, e se eles vos enviam suas cartas, depositai-as nas mãos de vosso Superior, e a conselho seu respondei-lhes as palavras de Jesus à sua Santíssima e aflita Mãe: "Não tínheis por que Me buscar, nas coisas de Deus convém que Eu esteja' ou permaneça" (Pe. JOSÉ XIFRÉ, Espíritu de la Congregación de Misioneros Hijos del Inmaculado Corazón de María, Imprenta de la S. E. de S. Francisco de Sales, Madrid, 1892, pp. 97-98).

199. Entre os Jerônimos, uma medida de precaução

Das Constituições dos Monges Jerônimos, antiquíssima família religiosa espanhola restaurada em princípios deste século:

* "Se o pretendente for natural de algum lugar próximo ao Mosteiro em que pretende ser recebido, não será admitido sem licença do Padre Geral, que não a concederá sem causas justas e tais que prevaleçam, na utilidade dos mosteiros ou da religião; o mesmo se entenda quando os pais do pretendente residam em local próximo do mosteiro, ainda que tenham nascido em outros locais' " (ANTONIO ORTIZ MU?NOZ, Los Caballeros encerrados, Ediciones Stvdivm, Madrid, 1961, p. 32 / Imprimatur: José María, Ob. Aux. y Vic. Gral., Madrid, junio-1961).

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