Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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 "Folha de S. Paulo"

Janeiro de 1979 - Almoço oferecido pela "Folha de S. Paulo" aos colaboradores de sua secção "Tendências e Debates". Vê-se o prof. Plinio Corrêa de Oliveira à esquerda do diretor do jornal, Octávio Frias

Folha de S. Paulo, 18 de junho de 1969

Um espectro se afasta do mundo e outro ameaça a Inglaterra

No meio de tantas notícias dramáticas, que a todo momento as agências noticiosas despejam sobre as multidões superexcitadas de nossos dias, bom é que se dê relevo a uma informação altamente auspiciosa. Devemo-la ao Sr. Addeke H. Boerma, diretor-geral de Alimentação e agricultura das Nações Unidas (FAO).

Quando de sua recente passagem pelo Rio, o sr. Boerma - o qual, dado seu alto cargo naquele organismo internacional, dispõe presumivelmente do mais completo conjunto de informações existente no mundo sobre a matéria - afirmou, em entrevista coletiva à imprensa, que não haverá fome em nosso planeta na década de 1980. Esclareceu ele que o fato de muitos países estarem próximos de atingir o desenvolvimento agrícola, e o incremento, em escala mundial, da qualidade das sementes - entre outras causas - estão afastando a fome das regiões mais necessitadas. Mencionou ele o exemplo típico do Paquistão e das Filipinas, que antes importavam alimentos e se encontram agora a ponto de exportar cereais. Assim, conclui o sr. Boerma, é para a abastança, e não para a miséria, que o mundo caminha.

Não sou especialista nesta matéria, porém não tenho dificuldade em aceitar as afirmações do diretor-geral da FAO. Tanto mais quanto os argumentos sobre os quais assenta sua previsão se circunscrevem ao mero terreno agrícola. E paralelamente, nos vêm, de outro setor, informações igualmente auspiciosas. Conhecedores profundos das riquezas submarinas vêm afirmando, ultimamente, haver nos Oceanos recursos alimentícios incalculáveis, que as técnicas modernas podem por, perfeitamente, à disposição dos homens. Foi, se não me engano, o chanceler Magalhães Pinto que - baseado em informes científicos - declarou à imprensa, há não muito tempo, serem as riquezas contidas nos mares ainda mais amplas para abastecer o homem, do que as proporcionadas pela terra. Como se sabe, a técnica moderna está capacitada para extrair, desde logo, e em larga medida, tais riquezas.

Se realço estes aspectos alvissareiros de nossa conturbada realidade, não é apenas para distender o leitor. É também para pôr em embaraço os demagogos de todo naipe.

Quando a Encíclica "Humanae Vitae" condenou o uso da pílula anticoncepcional, asseverou-se que a Igreja concorria assim para que ficasse superpovoado o planeta já a caminho da miséria. Como sustentar agora esse prognóstico sombrio?

De outro lado, os argumentos mais sonoros dos incorrigíveis paladinos da demolição da propriedade privada se baseiam em uma suposta indigência, na qual o mundo se iria atolando mais e mais. No que ficam, à vista destes dados, os seus prenúncios morbidamente trágicos?

Não penso abalar com isto os demagogos. Em todos os tempos foram eles infensos ao dado concreto, ao fato real, à investigação séria. Seu mundo é o do vazio e da quimera.

Mas, pelo menos, dou aos leitores alguns argumentos para os reduzir ao mutismo.

E que boa obra é emudecer um demagogo!

* * *

Uma grande revolução está em vias de se dar na Grã-Bretanha. A Câmara dos Comuns aprovou recentemente um projeto de lei "alargando" os casos em que se concede o divórcio. Se tal projeto for aprovado, o divórcio também será dado por consentimento mútuo, depois de dois anos da separação dos cônjuges.

Em outros termos, isto eqüivale quase ao amor livre adotado na Rússia e em outros países comunistas. No regime do amor livre, é verdade, não se exige para o divórcio o consentimento dos dois cônjuges; basta o requerimento de um deles. Porém, nada é mais fácil ao cônjuge descontente do que forçar o outro a concordar com o divórcio: basta brutalizá-lo. A futura lei inglesa é, pois, um incentivo à crueldade. Também é verdade que, na Inglaterra, serão necessários dois anos para que um divorciado contraia nova união. Nos países comunistas, pelo contrário, um novo "casamento" é possível logo depois da separação. Porém, nos numerosíssimos casos em que a causa real do divórcio for uma relação extraconjugal, haveria muita ingenuidade em supor que essa relação se interrompa castamente, em respeito à lei, para só se refazer dois anos depois. De qualquer modo, a perspectiva da "liberdade" dentro de dois anos dará aos concubinatários o alento para uma espera que será um verdadeiro "casamento de experiência" com vistas à nova união legal.

Em artigo publicado nesta seção, há 15 dias, citei a opinião da revista russa "Agitador", segundo a qual a erosão da moral ocidental vai encaminhando o mundo livre para a aceitação de um aspecto característico e fundamental do regime comunista, isto é, o amor livre. Assim, será para o comunismo que Inglaterra dará um passo agigantado, se o projeto em questão for convertido em lei. Agora, resta a pergunta cruel: nesta emergência, o que fará a Câmara dos Lordes, o que fará a Rainha? A primeira aprovará, a segunda sancionará o projeto comunistizante? Ou recusarão a essa vitória do comunismo a chancela das tradições veneráveis, dos altos princípios que representam? Se não resistirem, acontecer-lhes-á algo de pior do que o perecimento: terão perdido o significado e a razão de ser...


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