Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Artigos na

 "Folha de S. Paulo"

Janeiro de 1979 - Almoço oferecido pela "Folha de S. Paulo" aos colaboradores de sua secção "Tendências e Debates". Vê-se o prof. Plinio Corrêa de Oliveira à esquerda do diretor do jornal, Octávio Frias

Folha de S. Paulo, 20 de dezembro de 1970

Para os pobres: a esquerda, esse perigo

Corre às mil maravilhas abençoada por Deus e apoiada vivamente pelos homens, a campanha da TFP em favor do Natal dos pobres. E de todos os lados nos chegam ecos dos mais alentadores acerca da admiração suscitada, pelo espírito de sacrifício de nossos sócios e militantes. Com efeito, esses jovens, na sua maioria universitários, secundaristas, comerciários e operários, se revezam dia a dia, no Viaduto do Chá, consagrando uns suas férias, outros suas horas de lazer, à dura faina de pedir óbolos para que os necessitados tenham este ano um Natal mais feliz. Essa árdua tarefa é realizada gratuitamente, a despeito da canícula e da chuva, unicamente para servir a um tríplice ideal: Tradição, Família e Propriedade. Com efeito, a campanha de Natal é uma decorrência lógica desse lema. Pois a caridade está no núcleo de nossas tradições cristãs. Está na índole da instituição da família ser um foco de bondade que extravasa da família que tem posses para a família pobre. E a propriedade privada nunca se mostra mais simpática do que quando a mão do que tem se abre espontaneamente para auxiliar o que não tem.

* * *

Não propriamente disto, entretanto, que vou entreter meus leitores hoje. Numa época de crises e de convulsões, parecer-me-ia inautêntico que ele pôde contemplar neste dias, triunfalmente ensolarados, quando viu o rubro de nossos estandartes flutuar sobre o vale do Anhangabau, quando contemplou nossos jovens arautos, realçados por suas boinas, suas capas e seus emblemas, conclamando para a caridade, do alto das pilastras do Viaduto, a paulicéia operosa. E quando teve a alegria de dizer sim ao pedido de nossos jovens, dando um óbolo para o Natal dos pobres.

Durante estes dias, continuou desencadeada sobre o mundo a "procella tenebrarum" (S. Judas, 13), e não é lícito abstrair dela.

Tanto mais quanto esteve ela presente também no Viaduto. E aí pôs à mostra o que é - em certo sentido - o mais hediondo de sua fisionomia.

* * *

Como todos sabem, a campanha foi para os pobres. E dada a alta idoneidade moral da TFP e da Associação das Damas de Caridade de São Vicente de Paulo, dúvida não cabe, nem poderia caber, de que os óbolos aos pobres serão entregues.

Entretanto, das esquerdas, que não cessam de alardear seu interesse pelos pobres, surgiram elementos que não duvidaram em atacar, baixa e ferozmente, essa campanha destinada ao bem dos pobres.

De que forma? Alguns desses inimigos da caridade pertenciam à esquerda abastada. Com efeito, um certo número de "sapos", teve a triste coragem de passar por nossos jovens e sussurrar-lhes: "vá trabalhar, vagabundo". Elementos da esquerda descabelada (muito inimiga de todos os ricos, mas sempre sincronizada com os "sapos") se entregaram à prática de atos bem à altura deles, como seja atirar papeis com imundícies nos recipientes destinados aos óbolos, jogar do alto de arranha-céus, anonimamente, objetos pesados sobre nossos militantes etc.

Rebaixar-me-ia, e rebaixaria o leitor, se condescendesse em analisar e qualificar devidamente, segundo a ética cristã, essas diversas manifestações de um estado de espírito bem conhecido.

* * *

Mas uma pergunta fica de pé. É mesmo por amor aos pobres, que essa gente hostiliza o Natal dos pobres?

A pergunta se impõe. Com efeito, os dias de hoje nos fazem ver, por toda a parte, o comunismo a atormentar os pobres. No meu último artigo, falei do fracasso da safra açucareira em Cuba e do conseqüente empobrecimento da ilha. Há dias, o mundo foi abalado pela notícia do levante dos pobres nas cidades polonesas de Gdansk, Gdynia e Sopot, indignados com a carestia. Gdansk é a antiga Dantzig, porto de mar que se tornou dos mais prósperos da Europa na Idade Média e conservou essa categoria até cair sob o domínio dos comunistas.

Diante da pobreza de Cuba e dessas cidades polonesas, esses paladinos dos pobres não têm uma palavra de compaixão.

E essa atitude não constitui uma exceção. Cito mais alguns exemplos.

Nos primeiros dias de setembro, o diário dos sindicatos soviéticos chamado "Trud", publicou uma catilinária contra os "trabalhadores voluntários" (míseros párias, forçados pelos sovietes ao trabalho gratuito nas fazendas do Estado, à maneira dos cortadores de cana "voluntários" de Fidel Castro), porque estes, ao longo de seu trabalho escravo, "roubavam" gêneros para comer ou para os levar para os seus. Diante deste fato, eu sinto pena. E estou certo de que o leitor também. Pois, em lugar de se condoer deles, o "Trud" não lhes poupa os mais duros insultos. E, por certo, muitos deles estão sofrendo, a estas horas, torturas inexoráveis nas enxovias siberianas.

A todos nós - repito - esses coitados causam lástima. Quanto aos "sapos", e seus desgrenhados correligionários da extrema esquerda, preferem não falar do caso. E trabalham para que os pobres do mundo inteiro sejam sujeitos a idêntico regime!

Pergunto: é assim que se ama aos pobres?

* * *

Na mesma data, publicavam os jornais uma notícia singular. As nações capitalistas do Mercado Comum Europeu estão obtendo uma tão elevada produtividade agrícola, que deixa longe a dos países soviéticos. A tal ponto que a troca de objetos industrializados dos países capitalistas por produtos agrícolas dos países comunistas se vai tornando inútil e desinteressante para os primeiros.

O fato de tal maneira salta aos olhos, que os representantes da Rússia, Tchecoslováquia, Polônia, Hungria e Bulgária no Conselho do Comércio e Desenvolvimento da ONU pediram ao secretário geral do referido Conselho um relatório sobre as chamadas práticas discriminatórias do MCE contra os países comunistas: manobra visando protelar a ampliação, ao campo agrícola, do Mercado Comum Europeu, que presentemente só existe para produtos industriais.

Este episódio deixa transparecer o contraste impressionante entre a fartura agrícola dos países que vivem sob o regime da propriedade privada, e a penúria das nações comunistas.

Sem embargo do que, os esquerdistas, que se dizem amigos dos pobres, querem para o Brasil e para o mundo inteiro o regime de geral penúria.

O que são, à vista disto, esses estranhos amigos dos pobres?

* * *

Para encerrar, lembremos o dito bem conhecido de Voltaire: "Oh Deus, livrai-me de meus amigos, que dos meus inimigos liberto-me eu".

Que Deus livre os pobres dos estranhos amigos da esquerda...


Home