Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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 "Folha de S. Paulo"

Janeiro de 1979 - Almoço oferecido pela "Folha de S. Paulo" aos colaboradores de sua secção "Tendências e Debates". Vê-se o prof. Plinio Corrêa de Oliveira à esquerda do diretor do jornal, Octávio Frias

Folha de S. Paulo, 27 de fevereiro de 1972

Simples, claro, terrível

As relações entre os dois mundos — o comunista e o não comunista — vão passando por tantas transformações, que uma vista de conjunto sobre elas se torna cada vez mais útil. Muito especialmente nestes dias em que se dá a jogada espetacular da visita de Nixon a Pequim.

Como todos sabem, esse lance é apenas o primeiro da série. Depois de ir a Pequim o presidente norte-americano visitará Moscou. E já se propala que ele irá em seguida a Havana...

Essas démarches de Nixon apresentam um sem número de aspectos. Dentre todos eles, um há, ao qual o chefe de Estado ianque tem dado relevo todo especial. É o seu cunho pacifista.

Pode-se discutir ao infinito sobre a viabilidade desse objetivo de Nixon. Contudo nem os seus mais encarniçados adversários contestam a autenticidade do desejo de paz, que o move. Assim, toda a vista panorâmica sobre as relações entre os dois blocos pode delinear-se legitimamente a partir desta meta suprema do chefe da mais poderosa nação da terra.

* * *

Começo a tarefa ponderando que a política desenvolvida por Nixon em escala mundial é a mesma que Willy Brandt, primeiro ministro da Alemanha Ocidental, vem levando a cabo em escala européia. Bonn espera uma paz definitiva entre os os dois blocos — comunista e livre — no Velho Continente, resolvendo primeiro as fricções existentes entre as duas Berlins, depois as que existem entre as duas Alemanhas, e por fim as que opõem as nações da NATO às do Pacto de Varsóvia.

Em escala menor, age o general Lanusse. Lançou ele a sua política de "queda de barreiras ideológicas", apoiando primeiramente, no plano internacional, o Presidente marxista que vai arrastando para a miséria e o caos o Chile. E, feita essa jogada inglória, prepara-se ele para tentar a reintegração na OEA, de Cuba, a antiga Pérola das Antilhas, reduzida por Fidel a pobre camundongo.

- Como vemos, Nixon, Willy Brandt e Lanusse aplicam, em cenários diferentes, o mesmo esquema. Sem falar de Trudeau no Canadá.

* * *

Se o esquema é o mesmo, pode-se prever que ele se realizará na América Latina, na Europa e no mundo por processos afins.

- Quais são eles precisamente? - Pelo menos até o dia em que escrevo — quinta-feira — os planos práticos de Nixon a este respeito são herméticos. Idem os do general Lanusse. Assim, é para os de Willy Brandt que se deve voltar nossa atenção.

Estes últimos são claros. Numa primeira etapa, deseja ele reunir em um só bloco, as nações da Europa livre. A "Europa dos Seis", há pouco transformada em "Europa dos Dez", deverá constituir um vasto Estado federal. Virá, em seguida, a aglutinação dos dois blocos europeus, o livre e o comunista, em uma só federação, os Estados Unidos da Europa. Algo de análogo aos Estados Unidos da América.

Aplicado o processo Willy Brandt às relações entre as superpotências, o resultado será a formação dos Estados Unidos do Mundo, ou seja, de uma República Universal dirigida por um governo mundial.

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O exemplo europeu nos faz sentir ao vivo um reflexo dessa convergência entre as nações. É a convergência entre os regimes político-sociais.

Com efeito, não se pode pensar em uma nação — ou supernação, como os Estados Unidos da Europa — em cujo território estejam vigentes simultaneamente dois regimes contraditórios. Máxime em nossos dias, quando o entrelaçamento das relações culturais, sociais e econômicas entre as várias partes de um país, mesmo muito vasto, é intenso e ininterrupto. O corolário da fusão de todas as nações européias — ou mundiais — é necessariamente a amálgama dos respectivos regimes. Em outros termos, a convergência entre as nações conduz à adoção de um só regime, semicomunista, semicapitalista.

Segundo os planos comunistas, o país pioneiro — ou cobaia — para tal amálgama, deveria ser a Itália. Numa alegre farândola para ela caminhavam, de braços dados, o PC, os dois PS e o PDC. A fórmula "Berlinger-Amendola", da qual já tratei ("Folha de S. Paulo" de 21-11-71), deveria facilitar a obtenção desse resultado. Mas alguns revezes eleitorais sérios obrigaram os comparsas a suspender a caminhada...

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A tal propósito, registro a impopularidade de todo esse programa, na Europa Ocidental. Na Alemanha, Willy Brandt está encontrando os maiores obstáculos para fazer aprovar, no Parlamento, os tratados que assinou com a Rússia e a Polônia, marcos preliminares de sua política de convergência. Na Inglaterra, o gabinete conservador, a despeito das mais fortes pressões sobre a Câmara dos Comuns para obter a aprovação do ingresso do país na "Europa dos Dez", venceu pela insignificante maioria de oito votos. Na França, a maior parte dos políticos profissionais é favorável à convergência, porém não conheço uma só manifestação importante da opinião pública a favor dela.

- "Mas como?" exclamará algum leitor. "Estes opositores da convergência estão loucos? Querem uma nova guerra?"

Aos olhos de incontáveis pessoas, o medo da guerra é o grande argumento em favor da amálgama de povos e regimes. - Mas, pergunto, donde parte essa ameaça? - Evidentemente não de Nixon. A ameaça parte, obviamente, de Moscou e de Pequim.

Ora, as raposas vermelhas de uma e outra capital bem sabem que o resultado dessas ameaças vai sendo o progresso da tendência "convergencialista" na "saparia" e em setores ultrapacifistas do Ocidente. Daí se infere que Moscou e Pequim fazem suas ameaças de guerra para levar o mundo à convergência de nações e de regimes. Ou seja, que esta convergência é, em seus planos, uma etapa — a última, aliás — para a conquista do mundo. Quando se tratar do super governo mundial, esse será comunista, ou sairá guerra. E será preciso mais uma vez ceder.

Logo, a convergência de nações e de regimes resulta da ameaça comunista e convém aos governos dos quais essa mesma ameaça procede. É isto de uma evidência primária.

Portanto, russos e chineses estão certos de que as viagens de Nixon a Pequim e a Moscou, marcos sensacionais da convergência, trarão ao comunismo o domínio do mundo.

É isto tão simples, tão claro, tão terrível! Entretanto, ao que parece, quase ninguém o vê...


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