Plinio Corrêa de Oliveira

 

O Sacrifício indispensável

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O Legionário, 9 de junho de 1935, n. 173

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Não é a qualquer pessoa que é dado exercer o duro ofício de pescador de pérolas. As compleições fortes são capazes de resistir à pressão da água e às agressões dos polvos, para descer até o fundo do Oceano e colher lá a pérola alvíssima que procuram. Mas os organismos débeis se sentem asfixiados desde que se aprofundem um pouco nas águas verdes do Oceano, e são forçados a retroceder com as mãos vazias, para respirar a brisa amena e retornar à pressão fraca longe das quais são incapazes de viver.

É o que se dá também no mundo do espírito. Há certas almas capazes de descer à profundeza das mais sérias cogitações onde vão buscar a pérola inestimável da verdade. Outras, porém, se sentem asfixiadas desde que as idéias se tornam um pouco mais densas, e retrocedem imediatamente, de mãos vazias, àquela banalidade estéril que é o único ambiente que conseguem suportar.

* * *

O grande sentido da vocação da geração que atualmente atingiu a mocidade é o sacrifício.

Ou esta geração enfrentará a dureza de sua vocação com a generosidade do martírio, ou ela será inevitavelmente devorada pelas tempestades que as gerações anteriores acumularam por seus erros, e que estão prestes a desabar sobre o mundo contemporâneo.

Mas o sacrifício que se requer não é o do sangue. Não é a morte, que a graça impõe ao moço de hoje como perigo supremo a enfrentar, mas a própria vida. Não é mais o tempo de atestarem os crentes a sua fé, pelo testemunho sangrento do martírio. O que hoje a Igreja pede aos seus fiéis é o testemunho de uma vida exemplar, e o sacrifício generoso de toda a nossa personalidade à grande causa porque é mister lutar.

Este sacrifício é o sacrifício dos bens temporais. É o sacrifício do tempo que se emprega no apostolado quando poderia ser utilizado na caça ao dinheiro. É o sacrifício das atitudes que se tomam para salvar as almas, com prejuízo da reputação social, das mais caras relações de família ou de amizade, das mais preciosas simpatias.

Mas sobretudo este sacrifício é o da alma que se purifica pela prática da virtude, que se imola no sofrimento interior, que sobe espontaneamente ao altar das mais dolorosas provas espirituais, com aquela resolução magnânima com que caminhavam para o martírio os primeiros cristãos. Porque o mundo atual foi perdido pelo pecado, e só pela virtude se há de resgatar. Porque de nada vale a mais útil das obras de apostolado aos olhos de Deus, quando o apóstolo leva na alma aquele mesmo espírito do mundo que combate por suas ações.

É precisamente isto que o mundo não quer compreender, e é a esta incompreensão que atribuo o pequeno número de vocações entre nós.

A vocação sacerdotal é, por excelência, a vocação para o sacrifício. Em primeiro lugar, é toda a ambição humana que se sacrifica, pela humildade voluntariamente abraçada, e que é inseparável do estado sacerdotal.

Em segundo lugar, é a santidade que se tem em vista. E quem diz santidade diz o sacrifício completo de toda a felicidade que o mundo pode dar, através de sua sistemática bajulação dos sentidos, através de sua louca exaltação da concupiscência e do orgulho da vida.

E, em terceiro lugar, vem o sacrifício supremo, em que o sacerdote já não imola à justiça de Deus apenas a sua própria pessoa, mas o próprio Filho de Deus, feito Homem para resgatar os pecados do mundo.

* * *

Vejo às vezes passar pelas ruas algum seminarista, trazendo na gravidade do traje e na humildade do porte a afirmação de todos os princípios de renúncia que o mundo detesta.

Muitos seguem-no com o olhar. Ora são alvejados pelo ódio, ora pelo escárnio.

Em torno de mim, o mundo se agita febrilmente. O jornal que tenho em mãos me dá notícia de que grandes estadistas querem salvar o Brasil, reerguendo seu câmbio, saneando suas finanças ou reformando sua administração.

E, em meu coração, eu me rio por minha vez da loucura do mundo. Não é o grande estadista, nem o grande cientista, nem o grande jornalista que todos aplaudem que salvará o Brasil.

Seminarista humilde de que todos se riem, tu serás santo, e serás tu o verdadeiro salvador do Brasil.


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