Plinio Corrêa de Oliveira

 

Ingênuos

 

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 13 de julho de 1941, N. 461

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O Instituto Gallup de opinião pública divulga que os últimos acontecimentos produziram na opinião norte-americana um movimento de reação contra a política intervencionista do Sr. Roosevelt, engrossando, assim, as fileiras dos que, conforme os interesses da política nazista, preferem preservar os Estados Unidos alheios à guerra.

Segundo certos indícios fazem supor, o original intuito do Dr. Gallup obedece à tendência nazista, o que torna suas declarações particularmente curiosas no que concerne às considerações que faremos no presente artigo.

Realmente, esta notícia mostra que o nazismo está começando a colher os frutos que teve em vista ao romper hostilidades contra a Rússia.

Até aqui a opinião católica, que adquire dia a dia nos Estados Unidos maior influência, não tinha razões para ver no Sr. Adolf Hitler senão uma segunda edição revista e melhorada de Juliano o Apóstata, e por isto tinha razões para tomar a sério o papel de épico lutador contra o comunismo, que o führer se arrogara em certa fase de sua carreira política multicolor.

Com efeito, o famoso pacto Ribbentrop-Molotov tornara impossível qualquer ilusão a este respeito, e por isto não era só em círculos católicos, mas em elementos de todos os setores de opinião conservadoras dos Estados Unidos, que um ceticismo profundo dominava os espíritos no tocante aos propósitos apostólicos e evangelizadores do III Reich. Não é difícil perceber como toda essa ordem de idéias contrariava os interesses da expansão nazista.

Aos dirigentes germânicos, tudo isto não passava desapercebido. Mas as vantagens imediatas que, por ocasião da luta contra a França e seus aliados, a 5ª coluna auferiu com a colaboração dos partidos comunistas de toda a Europa eram tais que não convinha ao totalitarismo retomar o simulacro da cruzada anti-bolchevista.

Agora, porém, quase todo o continente europeu se acha nas mãos do Sr. Hitler, e de nenhum auxílio lhes podem ser as células bolchevistas. Do que ele agora precisa é de simpatias universais que impeçam a Inglaterra de mobilizar contra ele novos adversários. E, para tanto, pareceu-lhe conveniente restaurar os velhos leitmotivs antissoviéticos.

A manobra deu resultados. Nos Estados Unidos, parece que novamente os ingênuos - que são os melhores colaboradores do nazismo - começam a acreditar no caráter ideológico do conflito nazi-russo. E a propaganda nazista, sempre habilíssima, alimenta por todas as formas essa ilusão pueril. Parece-nos que toda essa ordem de fatos não é alheia às verificações a que chegou o Instituto do Dr. Gallup.

Assim, as vantagens da agressão à Rússia vão beneficiando desde logo o Sr. Hitler, e nossas previsões se confirmam: a luta contra o comunismo não é para seu sósia, o nazismo, senão um expediente político que tanto mais impressionará as massas, quanto mais prolongada for a guerra contra a URSS...

Tudo isto nos leva à seguinte situação:

a) falou o Sr. Hitler, para justificar a luta contra a Rússia, e em todo o seu longo discurso não levantou um só argumento em que ele se fizesse de cruzado;

b) depois dele, falou o Santo Padre, que não disse uma única palavra capaz de ser interpretada como uma autenticação do caráter de “cruzada” que se pretende atribuir a esta guerra;

c) e, apesar de os dois maiores interessados no assunto não terem reconhecido a “cruzada”, continua a haver ingênuos que acreditam nela.

Tínhamos ou não tínhamos razão para afirmar que os ingênuos são os melhores aliados do totalitarismo?


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