Plinio Corrêa de Oliveira

 

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A estranha aliada

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 8 de outubro de 1944, N. 635, pág 2

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Afinal, renderam-se os insurrectos de Varsóvia. Após mais de dois meses de luta heroica os soldados do valoroso General Bor tiveram de entregar-se, à míngua de munições e de víveres. Só a sua coragem inaudita não era suficiente para enfrentar um inimigo muitas vezes superior em homens e armamentos. Mas, assim mesmo, esta coragem fez ultrapassar todos os limites das contingências humanas, levando a resistência a um nível quase milagroso. Tudo em vão, porém.

As tropas russas que avançavam impetuosamente Polônia adentro, detiveram-se às margens do Vístula. Não houve quem não pensasse que, mais um arranco, Varsóvia seria libertada. Repetiu-se, então, o episódio da revolução parisiense, deflagrada em idênticas circunstâncias. As forças de resistência, de há muito latejantes no subsolo, preparadas e organizadas através de mil perigos e trabalhos sem conta, vieram a lume tal como em Paris, no momento em que os exércitos antinazistas batiam às portas. O plano parecia infalível: precisamente na ocasião em que os nazistas tinham necessidade de concentrar todos os seus esforços, o fogo se atearia dentro de sua própria fortaleza; a confusão nas fileiras hitleristas seria indescritível, e seriam inevitavelmente levadas de roldão.

Em Paris, todos se lembram, o plano deu resultados extraordinários, e os nazistas só puderam reconstituir suas linhas na própria fronteira da Alemanha. Em Varsóvia, porém, não aconteceu assim. Os russos deixaram-se ficar às margens do Vístula, enquanto os titãs do General Bor se debatiam desesperadamente na cidade bloqueada, uma longa agonia que terminou na sua derrota. Assim, o que para os franceses foi uma aura de vitória, foi para os poloneses mais um golpe mortal.

Entretanto, se o funesto acontecimento fosse devido aos azares inevitáveis da guerra, ainda seria suportável. Porém, tudo indica que estamos não diante de um fato militar, mas de um golpe político. Os russos não só nada fizeram pelas tropas do Gen. Bor, como impediram que os aliados as auxiliassem. Conforme foi amplamente noticiado, o governo soviético não permitiu que a aviação anglo-norte-americana, levando reforços aos insurrectos de Varsóvia, pousassem nos territórios ocupados pelos russos. Assim, aqueles tiveram de ser abandonados à própria sorte.

Esta atitude do governo soviético está intimamente ligada ao estabelecimento de um governo polonês comunista em Lublin, concorrente do governo polonês exilado em Londres. Este governo títere manifestou-se oficialmente contra o Gen. Bor. Patenteia-se, portanto, que Moscou não vê com bons olhos o movimento espontâneo de resistência, nascido da alma heroica e católica da Polônia, tanto que não hesitou em deter a marcha da guerra, atrasando consequentemente o dia da Vitória e da Paz, a fim de dar tempo aos nazistas de esmagar tal movimento. Agora o caminho está livre, e Moscou poderá desenvolver os seus planos políticos na Polônia.

O caso do Gen. Bor veio lançar muita luz sobre outros casos semelhantes ocorridos nos Bálcãs. Sistematicamente, o governo soviético procura destruir os movimentos espontâneos de resistência ao nazismo, substituindo-os por uma trama de agentes submissos a Moscou. Percebe-se, pois, que mesmo quando lutam entre si, nazismo e comunismo ainda colaboram. Daí, certamente, provem a situação assaz equívoca da Rússia, no quadro das Nações Unidas, e que não poucas dificuldades tem criado à luta contra o nazismo. Basta que nos lembremos da atitude visivelmente embaraçada de Churchill ao referir-se, na Câmara dos Comuns, ao caso polonês.

Porém, isto é bom para desfazer muitos entusiasmos apressados - inclusive de alguns católicos espevitados - pelas benemerências do comunismo.


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