Plinio Corrêa de Oliveira

 

Comentando...
 
A divisão administrativa

 

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 10 de dezembro de 1944, N. 644, pag. 2

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Afinal, saiu a nova divisão administrativa e judiciária do Estado. Graças a Deus, é preciso reconhecer que houve um grande esforço no sentido de fazer vencer o bom senso, no que se refere às denominações das localidades. Como se sabe, trata-se presentemente de uniformizar a nomenclatura de todos os centros de povoação do Brasil, de modo a evitar as repetições dos mesmos nomes. Em consequência, um grande número de localidades deve mudar de nome. Para isso, o Conselho Nacional de Geografia estabeleceu as seguintes regras, de que agora nos lembramos: na concorrência de mesma denominação, conservará o nome a localidade mais antiga; os novos nomes deverão ser constituídos de uma só palavra, dando-se preferência ao vocabulário indígena.

São patentes os inconvenientes destas regras, se seguidas à risca. Em primeiro lugar, a exigência estrita de nomes constituídos de uma só palavra elimina, ipso facto, os nomes de Santos, tão piedosamente abundantes na toponímia nacional. E, se a isso acrescentarmos a adoção de nomes indígenas, teremos, uma verdadeira repaganização do Brasil, nesta matéria. Além disso, existe o aspecto tradicional, que é muito mais sério do que se pensa, e que não pode ser sacrificado sem mais, a exigências meramente utilitárias. A tradição, a história, são realidades vivas e palpitantes na sociedade, e não apenas matéria de museus ou de arquivos; aliás, quando isto acontece, é sinal de que uma sociedade morreu, e só conserva o seu cadáver mumificado. Em último lugar, é preciso considerar que o critério da antiguidade, aplicado absolutamente, redunda em muitas injustiças, pois faz com que muitos núcleos de população, de ponderável importância na história, na cultura, na vida social, nas atividades econômicas, cedam seus nomes a burgos sem qualquer significação.

Felizmente, a nova divisão do Estado está muito longe de ter seguido à risca tais determinações, e vê-se facilmente que tudo se fez para atenuar o que havia de excessivamente rígido, cristalizado e morto, o que revela uma nítida compreensão dos valores histórico-tradicionais.

Em certos pontos, a reforma foi mesmo útil, restabelecendo nomes primitivos, encurtados pela lei do menor esforço. Assim por exemplo, Rio Preto voltou a ser São José do Rio Preto, e Palmeiras voltou a ser Santa Cruz das Palmeiras, outros nomes adquiriram acentuado sabor tradicional, tais como São Joaquim da Barra, Santa Bárbara d'Oeste, Boa Esperança do Sul, Redenção da Serra; e não há nada mais poético do que Veadinho do Porto ou Vista Alegre do Alto.

Entretanto, sacrifícios bem pesados se fizeram às determinações do Conselho Nacional de Geografia. São Miguel virou Baquirivú, Santo Ângelo se transformou em Jundiapeba, Santa Luzia decaiu para Araxaus e Santa Maria foi impiamente desbatizada como Tupanci, de modo que, em lugar da Rainha do Céu e da terra, veio Tupã recuperar seu poder demoníaco. Mas o ridículo se torna inexcedível com Ocauçú, que substituiu Casa Grande (Casa-oca; Grande-uçú); ou Montesina, que substituiu Aparecida de Monte Alto.

O que vale é que o bom senso popular é enorme e, em última análise, é o povo que dá os nomes as coisas. Quem se lembra, por exemplo, que o nosso Largo do Arouxe já se chamou de Alexandre Herculano, e posteriormente recebeu outras denominações?


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