Carta de Dr. Plinio para Alceu Amoroso Lima, 14 de dezembro de 1938

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[Os sublinhados e as palavras em maiúsculas são do original]

 

( I H S )
São Paulo, 14 de dezembro de 1938
Meu Caro Dr. Alceu,
Há muitos dias, tinha o desejo de lhe escrever, abraçando-o saudosamente, e pedindo-lhe desculpas por não ter comparecido ao seu embarque, conforme meu firmíssimo propósito. Provavelmente, e com não pequena razão, o senhor terá atribuído minha ausência à minha já famosa aversão às grandes madrugadas. Na realidade, o caso foi outro. Saindo do Colégio Arquidiocesano, tive de passar pelo colégio São Luiz, a fim de cumprimentar o visitador da Companhia de Jesus, que ali se encontrava. Na saída, um conhecido com que me encontrei, acompanhou-me até a casa de meu tio, onde eu estava hospedado por alguns dias, e… só me largou a uma e meia da manhã! Não tendo despertador, não querendo acordar a esta hora os criados, fiquei inteiramente impedido de me levantar à hora necessária para acompanhá-lo. E, por isto, faltei ao meu compromisso.
Aí vai a entrevista que o senhor nos autorizou a redigir. Por falta de tempo, não pudemos conclui-la senão agora. Peço-lhe o favor de dar o “imprimatur”, ou fazer os eventuais retoques, de sorte a estar de volta na segunda ou terça-feira da próxima semana se possível. Procuramos ser muito minuciosos, a fim de aproveitar integralmente suas declarações, todas muito importantes. Omitimos apenas uma ou outra coisa de caráter mais íntimo, mas que não faremos dúvida em publicar se o senhor quiser. Para tanto, será suficiente uma indicação sumária de sua parte, feita à margem da entrevista, porque nós recomporemos convenientemente o texto.
Também lhe envio a consulta referente à Ação Católica. Eu procurei redigir a consulta de modo a sugerir à Junta Nacional a definição de todos os princípios ali enumerados, definição esta que, ao menos para São Paulo, é da mais absoluta necessidade e urgência. Ao meu ver, a crise mais séria que a Ação Católica terá de enfrentar é esta, inicial, da seleção no recrutamento dos seus membros. É preciso que, como o senhor disse uma vez, sacrifiquemos por enquanto, o prestígio dos nomes emplumados e das falanges numerosas, ao espírito da obra. Isto feito, dentro de algum tempo “haec omnia adjicientur nobis”, teremos, dentro da autenticidade do espírito, a força efetiva que queremos prematuramente ostentar. É o cêntuplo prometido exclusivamente aos que renunciem às miragens de um aparato de que Nosso Senhor não precisa.
É muito verdade que a Ação Católica é o meio que a Providência deu ao Brasil para que, num supremo esforço, se salve, e que ninguém pode prever as ruínas que resultarão de um fracasso da Ação Católica. Não menos verdade, no entanto, é que a Ação Católica só vencerá por um estrondoso milagre, daqueles que se podem esperar de braços cruzados sem tentar a Deus, caso ela não repudie nossas tradições de ecletismo, de otimismo psicológico e de confusionismo, e não basear toda a sua organização sobre uma preparação séria e profunda de seus membros.
De acordo com o que nós dois conversamos aqui, isto é fundamental. De que nos valem as cifras numéricas esmagadoras de muitas associações? Se a A.C. não der um resoluto pontapé nessa mania das cifras, e não opuser a essa mania uma outra mania salutar da boa formação, que progresso podemos esperar?
Porque o senhor sabe e está profundamente persuadido de tudo isto, peço-lhe que faça aprovar pela Junta a representação inclusa. Empregue todos os seus esforços e toda a sua autoridade no sentido de uma aprovação plena. Será a meu ver um dos maiores benefícios que o senhor poderá fazer ao Brasil. De qualquer forma, peço-lhe uma solução urgente.
Convém acentuar que, na minha representação, distingui cuidadosamente as questões de fato das questões de princípio, de tal maneira que, aprovando nossas considerações, a Junta terá resolvido estas, sem todavia se ter pronunciado sobre aquelas.
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Passando para outro assunto, devo dizer-lhe que gostei imensamente da ideia da criação de um secretariado de imprensa e outro de cinema. Acho que estas Associações de Jornalistas Católicos que por aí se multiplicam, constituem excrecências que devem ser substituídas.
Há qualquer estudo em organização, sobre este ponto? Quando se espera criar isto?
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Quanto às leis sobre nacionalização do ensino etc., enviar-lhe-ei dentro de poucos dias alguns apontamentos, que estou acabando de coligir.
Antes de terminar, envio-lhe mais um afetuoso abraço por seu aniversário, e me recomendo muito dos seus.
Do amigo em Nosso Senhor
Plinio
P.S. – Antes de fechar e pôr no correio a carta e a representação, mostrei-a a Mons. Ernesto de Paula, que continua como Vigário Geral. Ele me incumbiu de lhe mandar muitas lembranças e diz que não só aprova plenamente, mas que pede que, se qualquer alteração for feita pela Junta aos princípios enumerados na representação, seja a minuta desta alteração enviada previamente a ele, para que se combine um modo de redigir o pensamento da Junta, que atenda exatamente a certas questões daqui.
É um favor do senhor e da Junta, que ele agradece vivamente.
P.

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Nota: Clique aqui para consultar a vasta correspondência entre o Prof. Plinio e Alceu de Amoroso LIma (Tristão de Athayde), de 1930-1939.

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