[Os sublinhados e as palavras em maiúsculas são do original]
( I H S )
São Paulo, 17 de fevereiro de 1939
Meu caro Dr. Alceu,
Quando lhe escrevi pela última vez, não tinha à mão nem bloco, nem papel de carta. Por isto, fui obrigado a lhe escrever em um cartão de visita, o que me forçou a diminuir muito a letra e resumir o assunto. Provavelmente por isto, não me consegui fazer entender pelo sr.
Quando o sr. me escreveu pela primeira vez sobre o Pe. Marcondes, já entendi perfeitamente do que se tratava, e já me comuniquei com ele. Ele fora transferido, dias antes de sua carta me chegar, da Diretoria Arquidiocesana de Ensino Religioso, para o cargo de professor do Seminário do Ipiranga, e estava muito absorvido pelas novas funções. Por outro lado, não guardara cópia do tal relatório. Isto posto, ele será forçado a fazer tudo de novo, o que, evidentemente, toma algum tempo. Entretanto, ele procederá com a máxima celeridade possível e, logo que tenha terminado o serviço, m´o entregará para que eu o transmita ao sr. Eu, pessoalmente, não conheço o tal relatório. Compreendo, entretanto, a urgência do assunto, insisti fortemente com o Pe. Marcondes para que agisse com presteza.
Sobre o Congresso de Educação a respeito do qual o sr. me pediu que falasse com o Alexandre e o Van Acker, eu lhe pedi, em meu último cartão, alguns esclarecimentos urgentes, que, novamente, peço agora: 1) de quantos membros deve constar a delegação paulista; 2) que aspecto de professores podem constituir a delegação, se apenas universitários ou pré-universitários, ou se também ginasiais; se professores públicos apenas, ou se também particulares etc.
Quanto ao assunto daquela minha representação à Junta Nacional, ainda não foi feita a retificação. Seria possível ao sr. dar nova providência?
Realmente, tudo indica que precisamos de um novo Pio XI, como o sr. me escreveu. O que me pareceu impressionante é a popularidade sólida de um Papa que, como ele, tinha tudo para ser impopular no sentido corriqueiro da palavra. Em suma, Leão XIII tinha em seu benefício um talento excepcional, Pio X aquela bondade angélica que o tornava tão atraente, e Bento XV a grande missão de pacificador, que as circunstâncias do seu pontificado lhe ditaram, e que, por si mesmas, não poderiam suscitar senão simpatias. Pio XI, pelo contrário, conquanto tivesse todas as qualidades de seus antecessores, não tinha nenhuma oportunidade de as aplicar de modo a impressionar o público. Sua inteligência, ele a teve de empregar para completar com importantíssimas minúcias a obra doutrinária de Leão XIII. Por isto mesmo, porque foi um comentador de Leão XIII, suas Encíclicas só revelavam seu magnífico talento aos espíritos mais enfronhados na doutrina católica, não tendo sido possível, a Pio XI, fazer uma única Encíclica com os amplos e majestosos desdobramentos lógicos e doutrinários de Leão XIII. Sua grande e real inteligência ficou, pois, velada ao grande público. Por outro lado, sua grande bondade o forçou a atitudes de uma energia cortante, sublime para quem sabe conhecê-la, mas certamente pouco acessível à percepção das massas. Finalmente, sua missão de pacificador não consistiu, como para Bento XV, em conciliar inimigos declaradamente em guerra, mas em guerrear os causadores mais ou menos ocultos das guerras, com Hitler à testa. Pois a despeito de tudo isto, parece que nenhum Papa teve tão imponentes funerais, e nenhum foi sepultado no meio de uma mais sincera e profunda veneração popular. Prova isto claramente como o desempenho austero do dever impressiona o pego. A popularidade de Pio XI se explica, em última análise, pelos mesmos motivos que explicaram as de Dom Duarte e de Jacson [de Figueiredo].
Penso que já é tempo de tratarmos de uma série de conferências feitas pelo sr., este ano, em S. Paulo. Em que época poderiam ser? Qual seria seu tema predileto?
Com um afetuoso abraço, peço-lhe que me recomende aos seus.
Plinio
Nota: Clique aqui para consultar a vasta correspondência entre o Prof. Plinio e Alceu de Amoroso LIma (Tristão de Athayde), de 1930-1939.