Carta de Dr. Plinio para Alceu Amoroso Lima, 3 de outubro de 1935

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[Os sublinhados e as palavras em maiúsculas são do original]

 

( I H S )
São Paulo, 3 de outubro de 1935
Meu caro Dr. Alceu
O dia de hoje está assinalado por três circunstâncias, uma religiosa e duas políticas. Religiosamente, é o dia de Santa Teresinha. Politicamente, é o aniversário da famosa “arrancada” como se diz em estilo João Neves, arrancada que, realmente, arrancou muita coisa do lugar, deixando os buracos vazios. E a outra circunstância política são as gravíssimas notícias que o telégrafo nos traz da Itália! Onde iremos parar? Neste momento tormentoso, as nossas preocupações estão voltadas para Roma. Qual será a situação do Santo Padre? Quais os riscos, para a Igreja, desta cartada formidável que Mussolini resolveu jogar? É um lugar comum lamentar-se a gente sobre os danos da guerra. E, no entanto, como não fazê-lo, quando se está à beira do cataclisma? E nosso Brasil? Que fará ele? Terá o bom senso de se manter rigorosamente neutro, enquanto não esteja em jogo, eventualmente, a causa da civilização, ou em outros termos a causa da Igreja? E, por outro lado, a esperança me vem de que tudo isto seja apenas um pouco de nuvem, e que acabe tudo bem, com o restabelecimento da paz!
Esta carta é para lhe mandar um recado do Sr. Dom José. A instâncias, minhas, ele falou com o Sr. Arcebispo, pedindo-lhe a intervenção para o caso do casamento religioso, pois que a rejeição do veto me parece absolutamente indesejável, como ao Sr. O que se poude obter é que o Sr. Arcebispo escreva ao Waldemar Ferreira, pedindo-lhe que retarde a discussão do assunto até que o Sr. Cardeal regresse da Europa. A carta neste sentido já foi enviada. E, portanto, o Sr. Dom José me pede que lho comunique. Aliás, esta deliberação foi tomada e executada antes de ser eu ouvido. Porque parece-me que, em qualquer hipótese, teria sido melhor mandar a carta para que o Sr. a fizesse chegar ao destinatário quando o Sr. julgasse oportuno. Em todo o caso, o que está feito está feito. E parece-me que poderá surtir bom resultado.
Quanto às razões do veto, tenho a impressão de que o Getulio quis ter esta ocasião de obsequiar pessoalmente o Sr. Arcebispo do Rio Grande do Sul. Se ele tivesse feito pressão sobre a maioria, evidentemente a favor, seria menos visível, pois que o Sr. Arcebispo poderia conservar sempre a impressão de que a Câmara não estava tão rebelde quanto se poderia supor, e que a rejeição do veto era devida, em grande parte, à influência pessoal dele, Arcebispo, sobre a bancada gaúcha, bem como à atuação do Sr., refletindo o seu prestígio pessoal e o do Sr. Cardeal. O Getulio, que é finório, e que está precisando de simpatias no Rio Grande para promover a reconciliação, resolveu então deixar que se chegasse à pior situação, para mostrar que o ponto de vista católico foi salvo por ele, e que sem ele não teria sido salvo. Mas, no fim das contas, o que nos importa isto? Contanto que o bom ponto de vista seja vitorioso!
Um outro assunto que eu tenho a tratar consigo é o seguinte: com este último artigo que lhe enviei, já é o segundo que é publicado no Rio, e não em São Paulo, isto mostra que a Coligação tem entregue regularmente os artigos, mas que alguém, nos “Diários Associados” de lá ou de cá, retém os meus. Não vale a pena pedir que eles sejam publicados. Mas eu teria curiosidade em saber se a dificuldade vem do Rio ou está aqui. Isto, tão somente para ter um juízo do modo por que me consideram os Chateaux [proprietários do referido jornal, n.d.c.] daqui, e não porque os artigos valham este trabalho. Seria possível dar-me qualquer informação QUE NÃO CUSTASSE TEMPO NEM TRABALHO?
Um afetuoso abraço ao Sr., e recomendações aos seus.
Plinio

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Nota: Clique aqui para consultar a vasta correspondência entre o Prof. Plinio e Alceu de Amoroso LIma (Tristão de Athayde), de 1930-1939.

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