[Os sublinhados e as palavras em maiúsculas são do original]
Sem data, mas do primeiro semestre de 1935
Achei magnífica sua “carta aos seminaristas”. Tenho certeza de que causará entre eles verdadeiro entusiasmo. Deposito muita confiança nas novas gerações de sacerdotes, que me parecem cheias de um ardor de apostolado e de uma vida interior verdadeiramente reconfortantes.
Tomo a liberdade, agora, de pôr em relevo um fato, ao qual o Sr., que me conhece, sabe perfeitamente que eu não me referiria se fosse apenas levado pelo desejo de lhe ser agradável, e de lhe fazer alguma lisonja banal, tão deprimente para quem a faz, como para quem a aceita.
Mas a luta em que o Sr. está empenhado é árdua. É, portanto, necessário abastecer-se de coragem com os fatos consoladores que Nosso Senhor nos envia no meio de tantas contrariedades. Chamo por isto sua atenção sobre a grande significação que tem a visita que lhe fizeram os seminaristas. É este um daqueles pequenos fatos – banais apenas na aparência – que indicam perfeitamente o que seu apostolado intelectual significa para a consciência católica do Brasil. Sua conversão foi o sintoma mais agudo da volta do Brasil à Igreja. E sua ação está sendo o mais legítimo florão de glória do Catolicismo em nossa vida intelectual. Gostaria que Nosso Senhor lhe fizesse ver realmente todo o bem que sua ação produz. Seria um grande estímulo para sua luta.
É certo que, muitas vezes, o sofrimento é condição absoluta de êxito. Em matéria de apostolado, e principalmente de apostolado intelectual, o sofrimento é tão necessário quanto a cultura, a erudição ou a inteligência. Sem ser fecundada pela dor, toda a pregação católica é inútil, fosse ela a do angélico São Tomás. Lacordaire, depois de seus sermões, tomava a disciplina na cela. E S. Tomás introduzia a cabeça dentro do próprio sacrário, para resolver as dúvidas intransponíveis para sua inteligência que, no entanto, era das mais poderosas. São dois fatos que atestam plenamente a necessidade da intervenção do elemento sobrenatural em nossas lutas e isto pelos seus dois grandes meios de ação: a oração e o sacrifício. Se, portanto, como de longe eu posso bem discernir, em muitas ocasiões o combate lhe possa parecer duro, violento mesmo, lembre-se do bem que sua ação faz à causa de Deus, e do muito que o próprio sofrimento pode fazer, para aumentar este bem.
São estes alguns pontos em que a modéstia deve ceder seu lugar a uma visão nítida da realidade.
Passando a outra ordem de assuntos, peço-lhe o obséquio de me informar qual a tiragem e qual a circulação da “Ordem”. O tal rapaz do Vanadiol precisa destes dados, para apresentar o tal plano. Embora eu perceba toda a dificuldade que há em dispor de qualquer ordem de recursos para tocar adiante o negócio, peço-lhe permissão para enviar o plano. Continuo a achar que falta publicidade à “Ordem”. E continuo a esperar que, no decurso das negociações, apareça um modo qualquer de se conciliarem os interesses. Isto tudo na hipótese do plano lhe agradar. O Sr. é juiz muito melhor do que eu, a este respeito, porque nada entendo deste assunto.
Peço-lhe o favor de me mandar com a possível brevidade os dados que lhe pedi.
Como vai o Jesuitinha? E a catapora das meninas já passou?
Peço-lhe que me recomende muito atenciosamente aos seus, e que agradeço à sua Senhora, mais uma vez, sua gentileza.
Agradecendo-lhe todas as gentilezas que me dispensa no Rio, envio-lhe um afetuoso abraço.
Do amigo em Nosso Senhor
Plinio
N.B. Recebi o projeto do Dr. (…), com alterações que excederam de muito as combinações que fizemos. Efetivamente, pode-se dizer que todas as modificações que eu propus, ou melhor o Centro Dom Vital de São Paulo por meu intermédio, foram aceitas finalmente.
Como todo bom engenheiro, o Dr. (…) é um homem inteligente, culto etc. Mas não deixa de ter seu lado infantil na insistência que faz em certos detalhes. Aliás são assim todos os engenheiros que eu conheço. São intelectualmente plantas petrificadas pelas álgebras.
Nota: Clique aqui para consultar a vasta correspondência entre o Prof. Plinio e Alceu de Amoroso LIma (Tristão de Athayde), de 1930-1939.