Meditações de Dr. Plinio para o Natal, especialmente para quem é, ou foi… ou será da TFP

Auditório São Miguel, sexta-feira, 23 de dezembro de 1988 – Santo do Dia

 

A D V E R T Ê N C I A

Gravação de conferência do Prof. Plinio com sócios e cooperadores da TFP, não tendo sido revista pelo autor.

Se Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras “Revolução” e “Contra-Revolução”, são aqui empregadas no sentido que lhes dá Dr. Plinio em seu livro “Revolução e Contra-Revolução“, cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de “Catolicismo“, em abril de 1959.

 

Meus caros, estamos na ante vigília do Natal. Poucas horas nos separam da meia-noite, e quando soar a meia-noite teremos entrado na vigília de Natal. É natural que nossas atenções estejam, portanto, todas voltadas para a festa do Santo Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo, isto é, do Santo Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo e que, portanto, é natural, que esta noite tenha sido destinada à leitura do texto magnífico do Pe. Manoel Bernardes, um dos clássicos da língua portuguesa, mas sobretudo teólogo muito ortodoxo, muito profundo, de uma concisão, de uma riqueza enorme no seu pensamento. São os tesouros dessa alma que os Srs. acabam de ouvir aqui, belamente proclamados, conjecturando o que Nossa Senhora diria ao Menino Jesus, imaginando a oração de Nossa Senhora ao Divino Menino Jesus, que nós acabamos de ouvir aqui.

Foram esses os tesouros que nos foram abertos e nós pudemos examiná-los como quem examina pedras preciosas. Palavra por palavra, pensamento por pensamento, fazendo-os rebrilhar à luz da Fé e nos encantando com isso.

Haveria algum comentário a fazer às palavras do Pe. Manoel Bernardes?

* Expressão do afeto verdadeiro, sem nada de meramente sentimental

Antes de tudo o seguinte: os srs. viram que são palavras repassadas de emoção, e de emoção profunda. Alguém dirá: “Não será meio `emerisiana’ [piedade meramente sentimental]? Não será meio “Émery” [piedade meramente sentimental] de  tudo o que nós acabamos de ouvir?”

Eu diria: É uma pergunta ultra oportuna, porque o que nós acabamos de ouvir é o contrário do “Émery”. É qualquer coisa de muito sensível, mas não tem nada de “emerisiano”.

É certo que o afeto da criatura que é Nossa Senhora para com Deus que é seu Criador, o afeto da mãe para com o filho, portanto também – quão é razoável, quão é explicável -, o afeto d’Aquela Mãe Celeste para com seu Filho único e incomparável, que tudo isto tenha sido posto aí. Mas não é a primeira nota, por onde (se) abre a sequência dos afetos que saem de sua alma.

* Humildade de Nossa Senhora que se exprime

Pelo contrário, como criatura humilde, Nossa Senhora era o modelo da humildade, Ela não se aproxima do Divino Salvador antes de ter manifestado todo o respeito e toda a admiração que o Divino Salvador merece, de um lado. E que Ela, enquanto criatura, criatura humílima, portanto criatura que está diante da Verdade e sabe o que Ela é, enquanto criatura, quer dizer, sabe que Ela é a chave de cúpula da Criação, entretanto não poderia deixar de se colocar nessa posição humilde diante do Salvador. Porque a mais alta das criaturas está tão infinitamente abaixo do Criador que Ela pode falar a Nosso Senhor como se fosse a última criatura. Mais ou menos como a distância que vai daqui ao sol.

Os Srs. imaginem uma pessoa que se julgue mais próxima do sol porque ela é dez centímetros mais alta do que o comum dos homens. A gente dá risada, porque na distância daqui ao sol, o que são dez centímetros? Se perdem…

Deus é de tal maneira, e no sentido mais radical e verdadeiro da palavra, Deus é infinito, que até mesmo a distância, tão, tão, tão grande que separa Nossa Senhora de nós, até mesmo essa distância é pequena diante da distância que separa a Ela, a mais alta das criaturas, de Deus Nosso Senhor. De maneira que é compreensível a série de atos de humildade que Ela põe na presença de Deus.

* Humildade não egocêntrica, mas teocêntrica, de admiração pelo Homem-Deus

Mas não é uma humildade egocêntrica, é uma humildade teocêntrica. Ela não começa apenas a dizer “eu sou a última das criaturas”, mas Ela tem em vista, mais ainda do que tem em vista a sua condição limitada de criatura, Ela tem em vista a grandeza infinita de Deus. E por isso seus afetos começam por atos de admiração. Ela começa admirando e declarando tudo quanto Ela admira em Deus, e por onde Deus é digno de toda admiração. Deus e o Homem-Deus.

Primeiro Ela declara – nos textos de Pe. Manoel Bernardes – toda a sua admiração e todo o seu respeito, para depois começar a falar a respeito de seu amor.

* Admiração: fundamento do amor

Há aqui uma ordem, uma ordenação lógica das coisas, que merece um comentário embora esse comentário seja muito rápido. Quer dizer, quando nós queremos muito bem a alguém, nós devemos começar por admirá-lo. Porque a admiração é o fundamento do amor. Amar por quê? Amar só como alguém ama um bonequinho? Nhe, nhe, nhe? Isso é “emerisiano”.

Mas no caso concreto dEla, Ela tinha para amar Aquele que era o mais admirável de todas as criaturas enquanto era homem, e enquanto Homem-Deus, hipostaticamente vinculado à Santíssima Trindade, Ele estava acima de tudo. A Santíssima Trindade então, nem tem palavras para admirar. Mas se não tem palavras para admirar, não tem palavras para exprimir suficientemente o amor. O amor é a defluência da admiração.

* Pensamentos de Nossa Senhora diante do Deus Menino

Os Srs. dirão: “Dr. Plinio, eu contesto isso. Tome a mãe com seu filho recém-nascido, e pergunto: o que ela pode admirar no seu filho recém-nascido? Entretanto ela ama seu filho recém-nascido”.

É verdade. Mas ela tem razões para amar seu filho recém-nascido que estão muito acima do fato de que ele é muito engraçadinho, bonitinho, bonequinho, tétété. Isso tem seu papel legítimo também, eu estaria longe de contestar isso. Mas que não está “emerisianamente” colocado no começo. Muita gente imagina que Nossa Senhora viu o Menino e que olhou e disse: “Que engraçadinho! Que bonequinho! Té, té, té”. Absolutamente isso não está à altura da circunstância. E o Pe. Manoel Bernardes o focaliza muito bem. Isso não está à altura da circunstância.

O que está à altura da circunstância é que Ela conhecia por revelação divina, feita diretamente a Ela, que o Filho que foi gerado nEla pelo Espírito Santo, era o Filho do Espírito Santo e era a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade. E o primeiro assombro é: “Tão fraquinho, tão pequenino, entretanto Deus, na sua infinita grandeza, e na sua “admirabilidade” incomensurável, Deus está aí!”.

Então o primeiro pensamento dEla é para Deus, depois o pensamento dEla é para o Menino, mas no que Ele tem de grandioso. Depois é para o Menino no que tem de pequenino. E depois Ela mede o espaço que vai de Um a Outro, a profundidade desta União Hipostática, e a glória que essa União faz defluir, a torrentes solares, sobre o Menino; para depois começar a analisar o Menino, e aí com afeto de mãe, ver no olhar dEle o sol de Deus que se faz refletir. Aí há uma análise de todo o corpinho dEle. Ela toca se não me engano nos braços do Menino Jesus e os sente frios, tem também uma referência qualquer aos pezinhos do Menino Jesus. Começa a entrar então a ternura da mãe porque Ele é pequenino.

* Admiração e afeto d’uma mãe por seu filho

Os Srs. dirão que nessa hora então a admiração sumiu. Estaria ficando puramente o afeto? Eu digo não, porque na hora em que a admiração morresse, o afeto morria. Como também na hora em que morresse o afeto morreria a admiração.

A admiração e o afeto são duas posições de alma correlativas e que vão bem continuamente uma com a outra.

Quer dizer, quando uma mãe, uma mãe comum e não Nossa Senhora, tem um filhinho, ele nasce tão engraçadinho, etc., e ela se enternece com o menino, está no subconsciente dela o seguinte: “Ele é homem – ou é menina – que grandeza há em que uma criatura humana, chamada a levar toda uma vida de duração grande, a cumprir deveres graves, os deveres da paternidade, os deveres da maternidade, mas sobretudo os deveres para com Deus, a ser boa filha da Igreja Católica ou bom filho da Igreja Católica, dominar as suas paixões, santificar-se, ir para o Céu por toda a eternidade. Esse como que projeto de anjo que está aqui, que coisa extraordinária é! E como eu fico enternecida vendo como uma coisa tão grande cabe em tão pouco”.

* Mistérios da geração de um ser humano

Bem, depois, quando ela considera não uma mera criança ali – porque isso é uma consideração que qualquer um de nós pode fazer de uma mera criança – mas que ela considera o filho dela, ainda aí entra uma ternura muito grande. Mas entra também uma grande admiração. “Que mistério admirável, pelo qual eu, criatura humana, gerei outra criatura humana! – não tomando em consideração o Homem-Deus, tomando só em consideração o que uma mãe comum sente para com o seu filho, comum também, está fora, portanto, da união hipostática, a coisa é essa -, que coisa misteriosa, que coisa profunda! Nasceu de mim, foi alimentado por mim, formou-se no meu claustro, eu o liberei para a vida e aqui está ele tão pequenino, tão minúsculo, mas para ele existir realizou-se um imenso mistério”.

* Mistérios da infusão da alma por parte de Deus

De um lado, o mistério belíssimo, incompreensível pela ciência, quer dizer, não são todos os aspectos do mistério que ela compreende, o mistério belíssimo pelo fato através do qual de uma criatura humana nasce outra criatura humana. Mas depois – mais ainda – esse outro mistério: a hora exata, que não se sabe qual é, na qual Deus se debruçando sobre aquele embrião que está começando a se formar, sopra uma alma ali. E lhe dá algo que a mãe não gerou, que não veio do ato nupcial, mas que veio de fora e que Deus cria ali uma alma. E essa alma como tal, por ser espiritual, dá àquele embrião uma participação na natureza dos próprios anjos. Que coisa magnífica!

* Mistérios dos horizontes que se abrem para a nova vida: lutas, batalhas, alegrias, sofrimentos

E na ternura de uma mãe verdadeira, da mãe bem orientada para com seu filho, aparece isto. Toda essa série de mistérios, que se formaram nela, que se desenvolveram nela, e que ela deu origem, e que fizeram com que sobre essa carne da carne e sangue do sangue dela, sobre esse “outro eu mesmo” dela, pairasse o Divino Espírito Santo, e criasse uma alma que não foi dada por ela, em que a obra de Deus se somou à obra dela para fazer uma coisa tão imensamente maior: ligar ali uma alma. E essa ligação da alma, os horizontes que abre para aquela criança! Horizontes na terra, horizontes de luta, de batalha, horizontes de abnegação, horizontes também de dias de alegria, de dias de vitória, em que se tem a impressão de estar tocando o Céu com as mãos. Mas também horizontes de tristeza, de abatimento, de desfalecimento, em que se tem que pedir graças a Deus para continuar na luta que vem.

Então, aparece um outro aspecto do nascimento de uma simples criança. É que, segundo a Igreja, a vida de toda criatura é comparável à de um herói que se prepara com exercícios, e que depois na hora de entrar na arena se prepara por fricções de óleos perfumados etc., para que toda a musculatura esteja em condições para enfrentar as feras que vai combater, ou então outros gladiadores com os quais vai lutar. Então pega as armas, pega o escudo e com tudo em forma entra para dentro da arena. Quem olhasse para um herói desses na sala dos gladiadores, na sala dos domadores de feras, e o visse sentado esperando o chamado, tranquilo, pronto, para uma imensa batalha, não poderia deixar de admirar.

* Mistérios futuros da batalha individual: como será a glória que dará a Deus?

Ora essa é uma criança que entra no mundo. Ela está na entrada de uma imensa batalha. E seja menino, se a mãe tiver uma verdadeira noção das coisas, a mãe diz: “Batalhador! Batalhadora! Eu te admiro, porque és combatente do bom combate! Teu dever é este. Uma vez que recebas o Batismo, a Graça te chamará. E a partir desse momento começará uma vida sobrenatural em ti que é mais ou menos como uma vela na qual alguém ateia um fogo”.

Então a criança que nasce é para a mãe como uma vela que daqui a pouco vai ter um fogo. Ela mesma vai levá-la ao padre que vai acender ali a luz da graça, participação criada na vida incriada de Deus. Ela olha e diz: “Quanto vai arder esta alma? Que bem fará? Que glória dará a Deus?”

* Como serão as misérias e as grandezas resignadas da mediocridade?

E se for um medíocre, se for uma pessoa poca, mas tiver a coragem de assumir a própria mediocridade:

“Eu nasci e Deus me criou de inteligência medíocre, de saúde medíocre, de capacidade de atrair medíocre, de capacidade de agir medíocre, eu todo sou medíocre. Mas em mim uma coisa não é medíocre: eu adoro a Deus de todo o meu coração! Creio na Santa Igreja Católica com toda a minha alma, e estou disposto a viver a minha vida medíocre e a carregar a minha cruz de mediocridade, que me imporá em todas as circunstâncias o segundo, o terceiro, o quinto lugar – pouco importa! -, mas eu carregarei tudo isso comigo até o fim. E quando eu morrer, eu entregarei a Deus a minha mediocridade ornada. Ornada pelo meu sacrifício, ornada pela minha aceitação, ornada pela minha humildade. Deus receberá esta mediocridade ornada com o amor com que Ele a criou medíocre. E na escala de valores posta por Ele, Ele amorosamente me destina um lugar no Céu.

Que maravilha ter a fronte no Céu iluminada por toda a eternidade com esta nota: é um medíocre que amou sua mediocridade com todo o amor, porque assim realizava os desígnios de Deus. Ó grande homem!”.

Enquanto na mesma hierarquia dos seres celestes, nós poderemos encontrar talvez grandes homens, com grande inteligência, e na fronte escrito: “Grande homem, teve grandes dotes e fez algo por Deus”. Isto lhe valeu um certo lugar no Céu.

Assim é como uma mãe olha para o seu filho.

Mais ainda, se uma mãe tiver a coragem de levar os seus raciocínios até o fim, ela não poderá deixar de dizer:

“Mas não será que esta criança vai algum dia para o inferno? Não será que ela vai ofender a Deus? Não será que ela vai abusar da paciência de Deus? Não será que um dia Deus descarregará sobre esta criança a sua cólera e ela irá para o inferno? E eu estou amando esta criança, por que Deus me deu uma criança capaz de ir para o inferno? A mim como mãe, que preparei para ele este berço tão delicado, este berço tão esplendoroso, a mim como mãe, como me dói pensar que esta boquinha que chora aqui é capaz de ser condenada, de tal maneira que blasfemará contra Deus por toda a eternidade. E eu – já estou velha, já não estou longe do porto – provavelmente me salvarei. E do alto do Céu, por toda a eternidade, eu verei esta criancinha, feita homem, feita mulher madura, e que vai blasfemar contra Deus por toda a eternidade! E a mãe dirá: “Meu Deus! Não teria sido melhor que não tivesse nascido a correr esse risco?”

Uma verdadeira mãe não dirá [isso]. Se ela for verdadeira mãe, é porque ela antes de tudo soube ser verdadeira filha de Deus. E ela pensará de outra maneira.

É essa a meditação de uma mãe levada até o último ponto. E são pensamentos mais ou menos assim e que eu me limito a parafrasear, a desenvolver um pouquinho, que o Pe. Manoel Bernardes desenvolve no magnífico trecho que os srs. acabaram de ouvir.

 

* Considerações de Nossa Senhora, Mãe de Deus, na Gruta de Belém

É também como nós devemos adorar Nosso Senhor no Santo Natal? É também assim? É preciso ir com cuidado. O Pe. Manoel Bernardes pinta Nossa Senhora como normalmente se poderia imaginar, quer dizer, ali junto ao berço, pensando no Menino etc. Não trata de uma outra questão. Ele abstrai disso, para não complicar demais o trecho dele com orações e considerações que tornariam por demais longo o trabalho dele, como essas considerações em que eu vou me embrenhar aqui, correm o risco de tornar por demais longo o nosso Santo do Dia.

Mas em duas palavras, ele trata Nossa Senhora como Mãe do Verbo de Deus Encarnado, que tem todo o conhecimento do Mistério do Verbo de Deus Encarnado etc., mas que não sabe qual é o futuro que vem depois. A única referência que Ela tem ao futuro é quando Ela diz que sobre a cruz dos braços d’Ela, Ela vai deitar esse Menino, para que Ele durma tranquilamente até o momento de Ele dormir nos braços de uma Cruz. É um jogo de palavras, a cruz dos braços, e os braços trágicos da Cruz. São dois extremos e a comparação é muito bonita, é uma comparação muito tocante. Mas fora disso, que é profético, em que Nossa Senhora manifesta conhecer qual é o fim que Ele vai ter, fora disso eu não notei pelo menos referência nenhuma dele ao que aconteceria com Nosso Senhor e com o mundo.

* São José, Padroeiro da Boa Morte

Mas nós vamos adorar Nosso Senhor no presépio no ano de 1988. E aí já há junto ao presépio todo o desenvolvimento de uma história. Da história pessoal d’Ele, de todos os trinta anos que Ele passou recolhido na Casa de Nossa Senhora, assistiu a morte de São José, o Padroeiro da Boa Morte, porque não se pode morrer em melhores condições do que assistido por Nossa Senhora e pelo próprio Menino Jesus, não se pode morrer melhor, de maneira que a Igreja andou com muito acerto, com muito tato, quando Ela o proclamou Padroeiro da Boa Morte. Algum de nós, que de repente se encontre numa das voltas da vida, se encontre com a morte, já deve saber que tem que rezar a São José para ajudá-lo nesse transe, que é realmente um transe muito grave, muito difícil.

* Convívio com Nosso Senhor na sagrada Casa de Nazaré

Então os Srs. tomem em consideração que na história d’Ele se passou o tempo na Casa d’Ele em Nazaré, depois a morte de São José, depois a assistência prestada a Nossa Senhora – ficou viúva -, e as conversas d’Ele com Ela. Quando estavam os dois sozinhos na casa à noite, tinha terminado a refeição, refeição muito sóbria, mas cheia de agrado, em que Eles estavam juntos, se olhavam e se queriam bem. E de tal maneira gozavam, fruíam esta enorme felicidade de estarem juntos, de se olharam e de se quererem bem, de falarem um com o outro, de trocarem pensamentos etc.

Então, na sagrada Casa de Nazaré, Nossa Senhora pensando no que aconteceria, pensando inclusive, que viria um determinado momento, em que os anjos haveriam de pegar essa casa santa, e levá-la pelos ares para não cair nas mãos dos maometanos. Que a Santa Casa de Nazaré, ia ser pousada num lugar chamado Loreto, e que ali, um número incontável de peregrinos, provavelmente até o fim do mundo, iriam venerar as paredes santas onde ecoaram essas conversas. Onde se ouviram os risos cândidos e cristalinos do Menino Jesus; onde se ouviu, a voz grave, paterna, afetuosa de São José, onde se ouviu a voz modelada quase ao infinito como um órgão, de Nossa Senhora, exprimindo adoração, exprimindo a veneração em todos os seus graus, em todas as modalidades. Em tudo isso Ela pensava.

* Os milagres da vida pública de Nosso Senhor e Sua Paixão

Ela pensava nos milagres da vida pública de Nosso Senhor, nos milagres que Ele iria praticando, nas almas que Ele iria atraindo, como tudo isto daria, no momento em que Ele começava a ser recusado pelos judeus, depois recusado – ou se fosse respeitoso usar a palavra – “zupado” [esquecido com menosprezo] até pela nhonhozice [comodismo idolatrado] dos próprios Apóstolos, a traição de Judas.

* Pentecostes, Constantino, São Bento, a Idade Média

Depois Pentecostes, a dilatação da Igreja por toda a bacia do Mediterrâneo, em lugares misteriosos por onde andaram os apóstolos, enchendo a terra com a presença deles. A libertação da Igreja por Constantino, a Igreja que brilha na face da terra, depois a invasão dos bárbaros, e depois São Bento, que se desprende daquele pantanal, que caminha até Subiaco, e que ali começa uma vida espiritual da qual nascerá a Idade Média.

* A Revolução…

Vem a Idade Média, mas como réplica infame a São Bento, o pecado imenso do príncipe Gastão de Foix – por hipótese – que começa a Revolução, e as ondas que sobem, e as ondas que sobem, as ondas que sobem, as injúrias atrozes. O Renascimento, o Humanismo, o Protestantismo, depois a Revolução Francesa, depois a Revolução Comunista, depois a IV Revolução. Os Srs. a veem aí em gestação, tão enigmática, tão difícil de definir em seus verdadeiros contornos, em tudo quanto dela já sabemos.

* Uma pétala a boiar sobre esse mar de lama: a TFP

Tudo isso, mas também, também, também… um desígnio de Nossa Senhora que em certo momento, sobre este mar de lama, começasse a boiar uma pétala de rosa… e essa pétala de rosa era a TFP. Os anjos do céu cantando: “Tradição, Família, Propriedade!” Tudo quanto isto significa!

Depois o nosso chamado. Cada um dos srs. pode voltar ao pé do Presépio para sua história individual, como caminhou a graça na sua alma, antes de receber o chamado para a TFP, depois como foi com o chamado, depois sua entrada na TFP com a alma já brilhante do tau. E depois dentro da TFP, os altos e baixos, os “sins” e os “nãos”, os movimentos do orgulho – meu Deus! – os movimentos da sensualidade, a vitória, às vezes a derrota, mas depois de novo a vitória e a misericórdia de Deus. Mas alguns que caem pelo caminho, que ficam ao longo da estrada, e a prece dos que não caíram por aqueles que caíram e a mão de Nossa Senhora que de vez em quando reergue algum, para que ele volte ao bom caminho.

* Considerações ao pé do Presépio

Tudo isto através das obscuridades que nós não conhecemos, do momento em que venha o “Grand Retour”, que venha a “Bagarre” (*). Tudo isso nós devemos considerar quando estivermos ao pé do Presépio, e dizer: Ele é a pedra de divisão, a pedra de escândalo, que divide a História pelo meio. Tudo quanto é com Ele, é a Contra-Revolução, tudo quanto é contra Ele é a Revolução.

Aqui está um militante a mais, Senhor Jesus Cristo, trazido pela graça, que vossa divina Mãe, vossa celeste Mãe obteve, por Suas preces, obteve de Vós; aqui está este militante, este batalhador, ajoelhado diante de Vós, antes de tudo para Vos agradecer:

Agradeço a vida que destes ao meu corpo, agradeço o momento em que insuflaste minha alma, agradeço o plano eterno que tinhas a respeito de mim como de qualquer homem, um plano determinado e individual, por onde deveria haver, nos desígnios de Deus, alguém que seria eu, que dentro da coleção dos homens haveria de empregar este lugar, mínimo que fosse, mas um lugar no enorme mosaico de criaturas humanas, que devem subir até o Céu.

Agradeço-Vos por terdes posto uma luta no meu caminho, para que eu pudesse ser herói, agradeço-Vos a força que Vós me destes para resistir e para espancar, para espancar e rezar… “A Dios orando e com el mazo dando”, dizia Santo Antonio Maria Claret, o Fundador dos padres do Coração de Maria.

Agradeço-Vos tudo isso, mas agradeço mais, eu Vos agradeço todos os anos de minha vida que já se foram e que se tenham passado na vossa graça.

Agradeço-Vos os anos que se foram e que não se passaram em vossa graça, porque Vós os encerrastes, num determinado momento, com vossa graça, e eu abandonei o caminho da desgraça, para entrar de novo na vossa graça.

Agradeço-Vos, ó Divino Infante, ó Divino Menino Jesus, eu Vos agradeço a hora em que eu procurei a TFP, a hora em que eu disse sim ao “tau”, a hora em que eu comecei a militar.

Eu Vos agradeço tudo o que eu fiz lá de difícil para combater os meus defeitos, eu Vos agradeço por não Vos terdes impacientado comigo, e por me terdes conservado vivo para que eu ainda tivesse tempo de corrigi-los até a hora de morrer. E se uma prece eu Vos posso fazer nesta noite de Natal, Senhor Jesus, a prece que vos faço é essa, está nos salmos:

“Não tireis a minha vida, na metade dos meus dias”. Eu a transformo um pouco; não quero saber quantos foram os meus dias – talvez já tenham uma duração exorbitante -, mas eu altero a prece: “Não me tireis os dias, na metade da minha obra”, e me ajudeis a que meus olhos não se cerrem pela morte, meus músculos não percam seu vigor, minha alma não perca a sua força e a sua agilidade, antes que eu tenha, por vossa glória, em mim vencido todos os meus defeitos, galgado todas as alturas interiores que Vós me criastes para galgar, e que no vosso campo de batalha, eu tenha por feitos heroicos, prestado a Vós toda a glória que Vós esperáveis de mim quando Vós me criastes.

[Brado] Por Maria!

Tradição! Família! Propriedade!

(*) “Bagarre” é uma palavra francesa que indica uma situação de confusão, devida a uma disputa ou uma rixa. O Prof. Plinio a utiliza como neologismo para se referir ao castigo que espera a humanidade se esta não se converter, conforme advertiu Nossa Senhora em Fátima.

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